Naquela
euforia de prosperidade criada durante o governo de Juscelino Kubitschek, quando vendeu-se a ideia de que cinco anos de trabalho teriam o efeito de cinquenta, no
progresso que o país alcançaria, muitos aspectos subliminares dentro do
empreendedorismo moderno, começaram a implantar-se no Brasil.
E dentro
dessa prerrogativa, a cidade de São Paulo que estava quase a ultrapassar a então capital
federal, o Rio de Janeiro, para tornar-se a maior cidade brasileira, e assim borbulhava
com planos ambiciosos para assumir o protagonismo econômico da nação, ali no
calor da segunda metade dos anos cinquenta.
Diante desse
panorama auspicioso, um empreendedor chamado : Caio de Alcântara Machado,
formado em direito, mas publicitário por ofício e comerciante por DNA familiar,
criou em 1958 a 1ª Fenit (Feira Nacional da Indústria Têxtil), realizada no
Parque do Ibirapuera, e que tornou-se um sucesso instantâneo. A tratar dos
segmentos inerentes à indústria têxtil, e naturalmente por abordar setores
ligados à moda, foi uma espécie de bisavô da "São Paulo Fashion Week" dos dias
atuais. Rápido e
audacioso, Alcântara tratou por criar outras feiras e a abranger outros nichos da
produção industrial, tão poderosos quanto. Nesses termos, ele lançou a "UD" (Feira das Utilidades
Domésticas), que tratava de eletrodomésticos em geral e a partir de 1960, uma
de suas mais vitoriosas criações e que aliás perdura até os dias atuais, o
Salão do Automóvel, que é considerada já faz tempo, uma das maiores feiras de
automóveis do mundo.
Mas foi em
1961 que Alcântara lançou a sua Feira mais lúdica, a enfocar o universo infantil e as suas
múltiplas possibilidades de negócios inerentes : o Salão da Criança. Isso agitou
o mercado de uma forma sintomática, por agregar não apenas a obviedade do interesse
das fábricas de brinquedos sedimentadas no Brasil, mas para atrair também a indústria alimentícia, o
mercado editorial; o setor de roupas infantis e tudo que se relacionasse direta ou indiretamente com as
crianças. A primeira Feira realizou-se no Parque do Ibirapuera, com apoio muito forte dos meios de comunicação, a começar pelos comerciais veiculados nas emissoras de Rádio e TV, e a contar com o super simpático jingle gravado pelo palhaço "Carequinha", um artista muito famoso na ocasião.
Ouça abaixo o jingle :
“O primeiro
Salão da Criança / A bandinha de música voltou / E o palhaço chamando as crianças
/ Avisando que a festa começou / No Ibirapuera tem competição / Tem pra
criançada muita diversão”...
Não só
propaganda paga na imprensa, mas apoios em paralelo foram costurados inteligentemente e essas
foram ações bem modernas para a época. Por exemplo, programas de TV destinados
ao público infantil participaram ao longo dos seus primeiros anos de existência, de uma forma incisiva. Isso
ocorreu com o seu elenco de artistas a participar ao vivo na Feira e muitos
testemunhais a ser cumpridos na TV, além de promoções as mais diversas, com apoio de patrocinadores.
Logo na
primeira edição de 1961, por exemplo, o elenco infantil do programa : “Turma dos
Sete”, veiculado pela TV Record, canal 7 de São Paulo, participou ativamente.
Foram sete atores mirins e alguns adultos, a interpretar os pais dessas crianças, e entre eles, a
saudosa atriz, Jacyra Sampaio, que fez muitas novelas na TV Tupi nos anos sessenta e
setenta e na Globo, em 1977, ficou imortalizada como a "Tia Anastácia" do Sítio
do Pica Pau Amarelo.
Uma novidade absoluta para as crianças, o Salão marcou-se como algo tão incrível em uma época onde não haviam muitas opções direcionadas diretamente à elas, que tornou-se um sucesso imediato e total. E assim sedimentou-se, ao entrar para o calendário de eventos da cidade, sendo realizado sempre no mês de outubro, a coincidir com o “Dia da Criança”.
Uma novidade absoluta para as crianças, o Salão marcou-se como algo tão incrível em uma época onde não haviam muitas opções direcionadas diretamente à elas, que tornou-se um sucesso imediato e total. E assim sedimentou-se, ao entrar para o calendário de eventos da cidade, sendo realizado sempre no mês de outubro, a coincidir com o “Dia da Criança”.
Os
expositores passaram a caprichar a cada ano, para garantir "stands" cada vez mais
elaborados, recheados por atrações e novidades entre os seus produtos. Claro que
os publicitários logo imaginaram lançamentos de produtos a atrelar-se à realização da Feira, nos anos vindouros. Toda a linha
de comestíveis, de balas a chicletes; biscoitos & bolachas; achocolatados
& cereais em flocos e claro, sorvetes; chocolates; refrigerantes e bolos,
passaram a promover fortemente o Salão, com muitas promoções, distribuição de
amostras grátis; premiações etc.
Brinquedos
oriundos de parques infantis foram disponibilizados para a prática de ações lúdicas; exposição de
carros de corrida, aeromodelismo, pistas de autorama, réplicas de aviões para
visitação da cabine do piloto (isso sempre dá certo para atrair a criançada), carro de
bombeiro e blindados militares, castelos medievais, acampamentos indígenas e casinhas de bonecas para as meninas;
gincanas e brincadeiras... enfim, tudo muito moderno e mágico para aquela época. Com o tempo
a passar, mais novidades foram incorporadas. Assim como no caso da "Fenit",
desfiles de moda para roupas infantis e apresentações musicais se incorporaram.
Além dos
shows com mágicos, outras atrações circenses inerentes e palhaços por todos os
cantos, a interagir desde o portão de entrada com a criançada, foram incorporados.
Particularmente, eu mesmo fui uma única vez à Feira, apesar de estar a descrever com todo esse entusiasmo. Foi a edição de nº 7, em 1967. Apreciei muito o avião prateado e um monte de referências à corrida espacial que ali foram disponibilizadas. Estava absurdamente cheio e mal dava para andar nos corredores, apesar de que quase todo stand fosse um convite para a minha então imaginação infantil a bordo de um menino de sete anos de idade.
Particularmente, eu mesmo fui uma única vez à Feira, apesar de estar a descrever com todo esse entusiasmo. Foi a edição de nº 7, em 1967. Apreciei muito o avião prateado e um monte de referências à corrida espacial que ali foram disponibilizadas. Estava absurdamente cheio e mal dava para andar nos corredores, apesar de que quase todo stand fosse um convite para a minha então imaginação infantil a bordo de um menino de sete anos de idade.
Havia um
stand que enlouqueceu-me em especial, promovido por uma indústria petrolífera que havia
associado-se à Marvel, gigante das histórias em quadrinhos norte-americanas e que no Brasil nessa época era
produzida em português pela saudosa editora Ebal. As estampas gigantes dos
super heróis Marvel pareceram mágicas para a minha percepção naquela noite de outubro de 1967, e
de certo, o foram mesmo.
E houve
muita música no ar, também. Claro, bandinhas tocavam o seu repertório circense e prosaico,
mas houve também um serviço de alto-falantes a executar música Pop e a MPB de
então, ao fazer com que tudo parecesse com uma experiência onírica, e de fato, ao pensar nessa
memória hoje em dia, certamente que eu a guardo como um sonho envolto em névoas prazerosas.
Isso sem contar os concursos com bandas, que começaram a partir de 1966, como por exemplo na foto abaixo (e que perdoem-me esses rapazes, que hoje devem ser senhores sessentões, mas não faço a menor ideia quem sejam e se soubesse, eu citaria com prazer)
Ao saborear a
minha barra de chocolate predileta, que o meu pai comprou-me e a observar
tantos atrativos tão chamativos, foi uma experiência inesquecível.
O Salão da
Criança prosseguiu mais um pouco no Parque do Ibirapuera, mas assim que
inaugurou-se o complexo do Anhembi, na zona norte da cidade, mudou-se, assim
como as demais feiras organizadas por Caio de Alcântara Machado, para tal novo espaço, no
início dos anos setenta.
Pelo fato de
feiras semelhantes surgirem como concorrentes, o Salão da Criança não teve uma
continuidade como as demais e assim, encerrou as suas atividades ainda na primeira metade da
década de setenta. Mesmo assim,
deixou a sua marca para fomentar o incentivo à toda a indústria e comércio que lida com produtos
destinados ao público infantil.
Qualquer semelhança com o mote publicitário criado pela ditadura militar, não foi mera coincidência na propaganda acima, da 10ª edição do Salão da Criança, em 1970...
Tal empreendimento inovou em
muitos aspectos pelo pioneirismo da logística das ditas Feiras corporativas e
trouxe um elemento a mais, raro nesse tipo de empreendimento, ao conferir-lhe uma aura lúdica, de certa forma com alguma ligação artística, em tese, ao lidar com um tipo
de consumidor alvo que ainda não pensa no mundo como um ambiente hostil e a cobrar-lhe constantemente atitudes em prol da luta pela sobrevivência tão somente. Pelo contrário, o enxerga com a magia da inocência, e por isso o Salão da Criança não foi uma Feira de negócios tão somente, mas conteve um algo a mais.
Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu, em 2016.