Vivemos
em sociedade, em meio à inúmeras demandas. As necessidades estruturais
são múltiplas para que possamos viver com conforto; bem estar; segurança
e sobretudo a usufruir do meio ambiente e de suas reservas naturais. Contudo,
essa equação é dificílima para fechar-se, na medida em que tudo,
absolutamente tudo, depende do dinheiro para ser movimentado.
Pareço
óbvio ao falar sobre isso, mas pense bem : se tudo depende do dinheiro, torna-se
justo que cada um forneça uma contribuição pessoal para que providencie-se
obras fundamentais, ao visar suprir as necessidades de interesse comum. Cáspite,
outra obviedade. Isso existe desde a antiguidade, quando ainda nas
civilizações mais rudimentares, percebeu-se que sem tal esforço
coletivo, nenhuma providência para o bem estar do grupo, poderia ser
cumprida.
Concomitantemente,
a tentação em desviar o dinheiro arrecadado pela coletividade, constituiu-se em um caminho aberto para o ego humano desenvolver essa patologia chamada,
"corrupção", e assim a humanidade pôs-se a caminhar, ao manter essa relação pouco
saudável dentro da sociedade. Todavia,
esta matéria não é sobre ética, apesar de ser inevitável mencionar a
questão da lisura, quando fala-se a questão do erário público; tributação & gerência governamental. O que eu desejo enfocar nesta matéria, é a formação do cidadão, sob o ponto de vista educacional.
Evidentemente
que a sociologia engloba o assunto de uma forma muito ampla,
ao distribuir entre várias vertentes das ciências sociais, tais estudos ajuda-nos a entender os meandros da organização social como um
todo. O que é público e o que é privado, como complementam-se etc. Mas
como formar o cidadão comum, no básico, é a questão, pois parece
ineficaz considerar que tal estudo restrinja-se aos estudantes das
Ciências Sociais. Independente
de quem aspire seguir esse caminho acadêmico e assim a especializar-se em suas
múltiplas graduações, o cidadão médio deveria saber o básico sobre o
funcionamento da máquina pública, ao meu ver. E essa máquina, é gigantesca, repleta por subdivisões e por que não dizer, contradições.
Se
para um estudante de sociologia; economia; ou direito, já é complexo
tentar compreender as entranhas dessa máquina monstruosa (o "monstruosa"
aqui, tem duplo sentido, eu sei), imagine para o cidadão comum. Só
que existe um detalhe nessa predisposição, que eu considero fundamental :
estamos no século XXI, e ante tal constatação, não tem cabimento que o cidadão que paga
impostos (e tudo o que consome é tributado, fora os impostos por bens,
renda e serviços), não saiba como esse dinheiro é usado, nem com
funciona a máquina pública.
Já
estou a imaginar alguns leitores a considerar-me um tremendo ingênuo por escrever isso, pois há
séculos que o modus operandi das autoridades, baseai-se na prática contrária, ou seja, em não explicar nada, e
assim não favorecer nenhuma ação que propicie transparência sobre o
funcionamento da máquina. Eu sei disso. Falo sobre o que seria ideal, não sobre o que é errado desde que a humanidade começou a organizar-se. Quando
o governo autoritário, aumentou o seu poder de influência repressiva, após a promulgação do AI-5, tais autoridades baixaram decreto a instituir a obrigatoriedade da matéria
: "Educação Moral e Cívica" no ensino fundamental (ainda ao final da era
do curso primário e posterior curso ginasial); "OSPB" (Organização
Social e Política Brasileira"), no ensino médio e "EPB" (Estudo dos
Problemas Brasileiros"), no ensino superior, além de militarizar as
aulas de educação física, com a obrigatoriedade em fazer uso da "ordem unida".
No
discurso, ou desculpa para falar o português claro, a ideia foi ensinar
as crianças e adolescentes a conhecer o funcionamento da sociedade, mas tal prerrogativa não foi a mais correta. O
objetivo foi outro, com a exaltação do nacionalismo, sob um viés a incutir valores
religiosos quase explícitos, sendo que o estado deveria ser laico, e o
pior de tudo, ao desestabilizar a capacidade de reflexão, e assim instituir a
obediência cega como o valor máximo a ser observado.
Para
corroborar com tal estratégia, os militares instituíram licenciaturas
de curta duração nos cursos superiores, ao quebrar os cursos de História &
Geografia, e assim a incentivar a formação de professores muito
despreparados para ministrar as aulas de Educação Moral e Cívica nas
escolas, o mais rápido que pode ser estabelecido.
Quando a repressão acabou, tais cursos foram suspensos, enfim. Não sou professor, portanto não tenho elementos para opinar com profundidade sobre a pedagogia. odavia,
tenho em mente, que o cidadão tem o direito em entender o funcionamento
da máquina governamental que rege a sociedade, desde o ensino básico, pois é condição básica do
exercício da cidadania.
Se
alguém joga um papel de bala na calçada, precisa ter a consciência do
dano ambiental que aquilo causa à coletividade. Por exemplo, se as
pessoas tivessem a consciência de que é errado jogar lixo nas ruas,
quanto economizaríamos com as enchentes que atormentam as cidades a cada
temporal ? Se
não houvesse a ocorrência de enchentes, quanto economizar-se-ia em saúde pública,
ao considerar-se que uma enchente é na prática, um caldo asqueroso, a constituir-se em uma sopa infecta, repleta por bactérias
? Quanto o departamento de zoonose gastaria menos, se não houvesse a proliferação de insetos; ratos e baratas que tal sujeira proporciona ?
Esse
exemplo do papel de bala, é só um item dessa equação. Quantas outras
questões de civilidade não poderiam ser tratadas em sala de aula, desde a
tenra infância ? E a máquina em si, como funciona ?
O
que faz exatamente o prefeito; o governador e o presidente ? Como é arrecadados os montates fabulosos vindos através dos impostos e como distribui-se tais parcelas entre as três instâncias ?
Qual é o papel do legislativo ? Para que serve um vereador; deputado estadual;, deputado federal e senador ? O que são as secretarias que servem o poder executivo ? Para que servem os ministérios ? O que é o tribunal de contas ?
Quem define as prioridades da saúde; agricultura; segurança pública ? Quem traça os planos da educação; infraestrutura; abastecimento, energia ?
O que é o Ministério Público, o que é defensoria ?
O que são autarquias ?
Aposto
que 95 % (ou mais), das pessoas que foram ás ruas na onda de protestos
de 2013, não sabem responder essas perguntas, infelizmente. E
se no bojo, pela essência, eu reconheça que os protestos tiveram a legitimidade
democrática em de demonstrar a insatisfação generalizada, tais protestos
pareceu uma briga de bêbados no escuro, tamanha a confusão que
denotou, com pessoas a protestar sem um critério adequado, assim cobrar
reivindicações para as autoridades que nem tratou dos itens que estavam a levantar como bandeiras. Isso sem mencionar que a manipulação por trás de tais manifestações foi enorme, daí a mostrar-se muito relativa a maneira pela qual foi apresentada.
Nesses termos, ao pedir
para o prefeito abaixar o preço das hortaliças nos supermercados ou
para o presidente cuidar da segurança pública, ou mesmo que o governador
tome providências sobre o mau estado das estradas federais, são
alguns exemplos clássicos de confusão que as pessoas estabelecem sobre a atribuição
de cada instância. E
não para por aí. Cobra-se posturas dos parlamentares, como se fossem do
executivo e vice-versa. Cobram da polícia providências que são
concernentes ao judiciário etc. Portanto,
sou a favor da matéria de estudos sociais, nas escolas fundamentais e
médias, mas sem aquele ranço observado por radicais de outrora, ao observar interesses escusos da parte de grupos elitistas da sociedade, mas sim a criar um conteúdo onde
fosse explicado aos jovens, como funciona a rés pública e como devemos
ser solidários para que possamos obter o melhor convívio possível, e assim conduzir o país,
enfim, para o padrão de uma nação do primeiro mundo.
Fazê-los
entender que a cidade é uma extensão de nossa residência, é
fundamental. Quebrar o paradigma de que a rua não merece consideração
porque "não é de ninguém", além de contribuir para transformar a cidade
em uma lata de lixo decadente, é um caminho permanente para a roubalheira da
corrupção (sei que existe outros fatores e não é só isso que acabaria
com a corrupção). Quando
cada cidadão considerar a rua como parte da sua própria residência, de fato, a mentalidade
generalizada vai ser a de manter tudo limpo, o tempo todo. Logradouros públicos bem
iluminados; com equipamento em perfeito funcionamento e isso a gerar como consequência, a baixa criminalidade; ausência de vandalismo; solidariedade,
fraternidade etc. Utópico
em primeira leitura, eu sei. Mas se em países como a Nova Zelândia;
Dinamarca; Finlândia; Canadá; Alemanha; Austrália; Bélgica; França, e
outros, isso que descrevi é quase uma realidade, penso que o segredo é a
educação e troca de paradigma.
Talvez
demore para chegarmos nesse patamar, mas não acho impossível. Veja o
exemplo da Coréia do Sul e o salto que deu quando passou a investir
pesado na educação. A
própria revitalização de Seul, com a despoluição do rio Han, é um
exemplo. Até bem pouco tempo atrás, tratava-se de um rio putrefato como o Tietê,
com o povo acostumado a jogar detritos nele, como se não importasse
com a sua morte inevitável. Quando o rio passou a ser encarado como um patrimônio da cidade, tudo mudou.
A transformação da sociedade começa na mudança individual do cidadão. Mesmo
porque, se eu não ligo para a minha cidade ( e por extensão, estado ou
país), abro o caminho para que as autoridades também pensem igual, e com
aquela montanha de dinheiro arrecadado nos cofres públicos, a tentação em desviá-lo será enorme.
E
tem um dado a mais : de onde vem os políticos ? De onde saem os
funcionários públicos de carreira ? De onde saem os parlamentares, e os
membros do judiciário ? Pois, são pessoas como nós, do mesmo povo. E
se a mentalidade do povo pauta-se em não considerar o bem público, por quê
você acha que eles pensariam diferente, se são pessoas da mesma formação
cultural; educacional e nacional ? O
que adianta cobrar seriedade e lisura, se você continua a passar incólume pelo
semáforo a indicar a cor vermelha; acha normal jogar lixo na rua; não economiza água;
desperdiça comida; não respeita filas; destrata pessoas humildes e
idosos etc ?
Matéria publicada anteriormente no Blog Planet Polêmica, em 2014
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