segunda-feira, 5 de junho de 2023

Filme: Mister Rock and Roll (1957) - Por Luiz Domingues

Este é um dos filmes mais singelos, entre todos os mais ingênuos que foram produzidos nos anos cinquenta, porém, dada a sua riqueza musical, toda a fragilidade da história, há por ser perdoada. Na verdade, é mais crível descrever este filme como uma peça musical a apresentar uma ausência de história, propriamente dita. O fraquíssimo roteiro justificar-se-ia como uma rápida sketch para a TV, no máximo, pois o mote é simplório ao extremo e o seu desenvolvimento, mais ainda. 
A rigor, a história trata de uma repórter de jornal (Lois O’Brien, interpretada por Carole Hendricks), que é designada por um jornal, para entrevistar um astro do Rock em voga (Teddy Randazzo, como ele mesmo). Ela cumpre a sua tarefa, entretanto, e quase que instantaneamente, tal moça e o cantor galã, apaixonam-se. Entre as cenas do namoro, intercalam-se os números musicais e a ação maquiavélica do editor do jornal (Jay Prentiss, interpretado por Joe Barney), para distorcer a entrevista e atacar não apenas o cantor, mas também o Rock’n’ Roll, sob uma postura bastante reacionária. Tudo esclarece-se ao final e o casal encerra a história feliz, a reboque do triunfo do Rock.
 
É só isso, mesmo? Exatamente, uma história fraquíssima, apenas a justificar um mínimo de dramaturgia para qualificar tal obra como um filme e não um documentário, praticamente. O que realmente importa nesta película, é a parte musical e o fato de após tantos anos, tornar-se naturalmente um material arqueológico a registrar os primórdios da história do Rock. Sobre a parte musical, são vários os destaques. 
O primeiro ponto para ser exaltado, dá-se justamente no início do filme. A introdução é muito animada e até instrutiva, quando uma explicação sobre a origem do Rock, é feita sob uma cantoria e mediante o apoio de um simpático desenho animado. Fala-se sobre como o Rock’n’ Roll foi formado através do Blues, Dixieland, Gospel e do Jazz. Curioso, não é citada a raiz branca do Country & Western, primordial nessa junção, mas tudo bem, apesar dessa ausência fundamental, isso não extrai a beleza dessa cena inicial. Quem faz essa vocalização didática é o bandleader e xilofonista, Lionel Hampton. 
Cenas dos bastidores do show televisado, comandado por Alan Freed (ele mesmo), intercalam-se à singela história do romance entre a repórter e o cantor, além de pequenas inserções com o apoio de outros atores, entre os quais, o comediante, Lou Marks (a interpretar o contra-regra, Lou), que garante as cenas mais engraçadas, inclusive quando ele também canta um número em duo com Teddy Randazzo, completamente desafinado, para justamente produzir o humor na cena.
Os outros artistas musicais são: Rocky Grazianno, Frank Lymon and the Teenagers, Lionel Hampton and His Big Band, Chuck Berry, Little Richard, Clyde Mcphatter (o fundador do grupo, The Drifters), La Vern Baker, Shaye Cogan, Brook Benton, o estrambótico, Screamin’ Jay Hawkins, The Moonglows e Felin Husky (um cantor Country).
Bem, com todos esses artistas a apresentar-se, a parte musical vale tudo nesse filme. O Rock’n’ Roll in natura é apresentado com muita energia, além de inserções de música Pop romântica em voga na época, Calypso e insinuações do Twist, muito R’n’B e até pitadas de Jazz. Ou seja, um desfile espetacular de ritmos variados, expressos através de artistas sensacionais e posso afirmar sem nenhum exagero, históricos.
Cenas rápidas a mostrar a atuação do radialista, Alan Freed em sua emissora, são mostradas, assim, como o gabinete do editor do jornal que faz uma campanha difamatória contra o Rock. Inclusive, quase ao final do filme, há uma cena que mostra Alan Freed, a usar a sua locução para responder aos ataques que o jornal estava a publicar para denegrir o Rock’n’ Roll, e mostra-se o tal editor a escutar a fala em contraponto aos seus anseios destruidores. 
Há também uma breve reminiscência do próprio, Alan Freed, a elucidar como ele fora a uma loja de discos no início dos anos cinquenta e impressionara-se, ao constatar que jovens brancos estavam entusiasmados em comprar discos de artistas negros, orientados pelo “R’n’B”, uma variante mais Pop e balançada do Blues. Fato real, foi assim mesmo que Freed começou a tocar tais artistas na emissora em que atuava como locutor, em Cleveland, Ohio e posteriormente em uma emissora de maior porte, em Nova York. E certamente a tornar-se um dos, senão o maior difusor do ritmo novo que daí derivou-se, chamado como: Rock’n’ Roll, cujo título, teria sido também uma invenção sua (embora haja a controvérsia, no sentido de que essa expressão seria uma gíria de rua, um “slang term”, a designar o ato sexual).
Enfim, uma produção simples, feita rapidamente para aproveitar a febre do Rock’n’ Roll em seu apogeu cinquentista, e sobretudo a usar a aglutinação em torno da fama do programa radiofônico de Alan Freed e os shows que ele produziu. Foi na verdade, mais um entre vários filmes que foram produzidos nos mesmos moldes, na segunda metade dos anos cinquenta, entre os quais, muitos na órbita do radialista, Alan Freed.

Filmado em preto e branco, teve o seu roteiro escrito por James Blumgarten, ou seja, esse roteirista teve muito pouco trabalho, essa é a verdade. Foi dirigido por Charles Samuel Dubronevski e lançado em outubro de 1957. Repercutiu modestamente nas salas de cinema e foi alvo de inúmeras reprises na TV, nos anos seguintes, inclusive na TV brasileira, durante a década de sessenta, para cair em esquecimento, depois disso. Existe em cópia DVD para a venda e é encontrado com facilidade no YouTube. 

Esta resenha faz parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll" em seu volume III e está disponível para a leitura a partir da página 75

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