domingo, 26 de abril de 2020

Filme: Rock You Sinners - Por Luiz Domingues


Segundo consta na história, o primeiro filme produzido sobre o Rock'n' Roll na Inglaterra, foi em 1957, com "The Tommy Steele", mas logo a seguir, eis que foi lançado mais uma película a abordar o fenômeno, chamado: "Rock You Sinners", nesse mesmo ano. Produção muito simples, não deixa a desejar apenas pela falta de melhores recursos técnicos, mas sobretudo pelo roteiro fraquíssimo, a sugerir ter sido uma sketch que foi arrastada ao máximo, para justificar a extensão mínima para um ser considerado como um filme com longa metragem e não um curta, tamanha a sua insipidez enquanto história para ser desenvolvida.
Contudo, como apresenta a inserção dos números musicais, deu para ludibriar a audiência razoavelmente ao ponto de não provocar irritação ou bocejo da parte dos espectadores. Apesar dessa parte cinematográfica ser muito incipiente, é claro que a obra tem alguns méritos, como documento de época e sobretudo pela música.
A trama resume-se em torno DJ (Johnny Laurence, interpretado por Phillip Gilbert), que entusiasmou-se pelo advento do Rock'n' Roll nos salões de dança de Londres e tem a ideia de promover uma apresentação especial como demonstração a visar endereçar tal atração para um programa de TV, portanto, ele precisa convencer os dirigentes de uma emissora sobre a viabilidade de uma eventual produção nesse sentido. Para garantir o elemento romântico na história, existe a personagem da namorada do DJ Carol Carter (interpretada por Adrienne Scott).
A apresentação dá certo, mas o problema é que alguns mal-entendidos, em situações criadas que mostram-se muito ingênuas, gera quase o fim do relacionamento do casal. Ao final, música vai & música vem, e o casal acaba bem... e nessa hora o espectador vai achar que as novelas brasileiras são muito sofisticadas, tamanha a fragilidade dessa trama, mas tudo bem, o que importa na verdade é a música e a documentação de época, pensará o menos exigente cinéfilo.
Dá para citar algumas curiosidades interessantes e inerentes sobre tal obra. Primeiro ponto: há um clube onde supostamente existe uma cena musical, frequentado pelo DJ Johnny, chamado: "Brazil". Ora, para nós que somos brasileiros e vemos a intenção ali representada, torna-se risível ver o quanto era e ainda é equivocada a visão que os europeus em geral tem de nós. A ambientação é sugerida como tipicamente brasileira, mas parece algo caribenho, com orientação hispânica e um artista toca um suposto "samba" ao violão, mas que na verdade é um "calypso". 

A despeito desses equívocos de avaliação, a canção e o artista são bons, portanto, tem o seu valor (George "Calypso" Browne, também conhecido como "Tiger" Browne, artista oriundo de Trinidad & Tobago e no filme, a interpretar, Jack Brown).
Segundo aspecto, e isso passa muito rápido, trata-se tão somente de uma porção de alguns poucos "frames", mas em uma cena a envolver a dança de vários casais, vê-se uma garrafa de Coca-Cola vazia a balançar no piso do salão, por conta da movimentação dos casais que dançam. Se foi uma metáfora a criticar o Rock como fenômeno "yankee" a corromper a juventude britânica, ou coisa que o valha, fica a dúvida 

E não é à toa que na Inglaterra o fenômeno da tribo "Mod", tenha sido tão forte, poucos anos depois, para demarcar o nacionalismo britânico em contraponto à tribo dos "Rockers" acintosamente aculturados pelo Rock norte-americano. Entretanto, pode ter sido apenas uma singela ideia do diretor a querer demonstrar a vibração do Rock enquanto fenômeno a provocar histeria etc. e tal.
Sobre a música em si, é interessante notar que o fenômeno do Rock'n' Roll estava a engatinhar na Inglaterra e toda a informação que dispunha-se vinha eminentemente das notícias vindas dos Esados Unidos da América e naturalmente sobre os seus artistas.

Dessa forma, o que vê-se em "Rock You Sinners", é a presença de combos jazzísticos a aventurar-se pelo Rock'n' Roll, sem muito trejeito para tal, essa é que é a verdade. Contudo, não se pode afirmar ser uma participação musical ruim, longe disso, aliás, pois tratou-se de músicos muito tarimbados, ao analisar-se a aparência desses senhores que já eram veteranos na música, nessa ocasião.

Nesses termos, apenas uma cantora jovem apresenta-se, chamada: "Curly" Pat Barey e entre os outros combos jazzísticos que fornecem a boa base musical do filme, vê-se: "Art Baxter and His Rockin' Sinners" e "Don Sollash and His Rockin' Horses".
Outros atores que participaram da trama: Colin Croft (como Pete), Jackie Collins (como Jackie), Michael Duffield (como Paul Selway), Beckett Bould (como McIver), e outros.

Escrito por B.C. Fancey e dirigido por Denis Kavanagh. Lançado em fevereiro de 1958.

Bem, como já salientei, trata-se de um filme muito simples, singelo se houver uma extrema boa vontade do espectador, mas que exibe os seus pontuais méritos. Foi lançado no formato VHS, e posteriormente em DVD e faz tempo que saiu da grade até de canais especializados em filmes antigos, mas é encontrado no You Tube, com facilidade nos dias atuais de 2020.
 
Esta resenha foi escrita para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll". Encontra-se disponível para a leitura através de seu volume II, a partir da página 61.

sábado, 11 de abril de 2020

Filme: Backbeat (Os Cinco Rapazes de Liverpool) - Por Luiz Domingues


Como já afirmei muitas vezes, anteriormente, há uma quantidade significativa de cinebiografias sobre a carreira dos Beatles, sim, mas nenhuma película pode ser considerada um primor e principalmente se levarmos em conta que um grupo da magnitude artística dos Beatles, merece algo à sua altura e isso ainda não ocorreu. “Backbeat” foi mais um filme produzido a mostrar os primórdios dos Beatles, porém, assim como “The Birth of the Beatles”, produção de 1979, fechado no período imediatamente anterior ao grande início do estouro da banda ao final de 1962, portanto entre o final de 1960, com maior ênfase em 1961 e no início de 1962, quando os seus componentes estavam empolgados com o sucesso que estavam a alcançar, que era muito grande para os seus padrões da época, mas infinitamente inferior ao que alcançariam no futuro e eles nem sonhavam com essa possibilidade estratosférica, então.
Pois então, é o foco da parte da biografia da banda onde eles fizeram a famosa excursão para Hamburgo, na Alemanha e ali, a tocar em espeluncas situadas no cais do porto dessa cidade alemã. Os rapazes de Liverpool passaram por muitas situações, algumas engraçadas, outras dramáticas e na realidade, foi uma mola propulsora para ofertar-lhes uma cancha de palco enorme e com tal experiência forte, adquiriram bagagem  para enfrentar o mega sucesso que o destino estava a projetar para eles, em pouco tempo.

No caso de “Backbeat”, em relação ao filme, “The Birth of the Beatles”, há por ressaltar-se que trata-se de um filme melhor acabado. De fato, apesar da película anterior ter os seus méritos, entre 1979 e 1994, ano de lançamento de “Backbeat”, houve um tempo grande, convenhamos e nesse aspecto, muitas circunstâncias técnicas mostraram-se favoráveis para que esse filme tivesse um melhor apuro técnico. 

E deixo claro, não é um “remake”, mas simplesmente existe a coincidência dos dois filmes retratarem a mesma história, focada nesse período da biografia dos Beatles. Todavia, e reforça-se a ideia de que não trata-se de uma refilmagem, há diferenças significativas entre um e outro, na elaboração de seu roteiro.


Por exemplo e esse é o aspecto mais incisivo, o foco é baseado na relação do baixista, Stuart  “Stu” Sutcliffe, com a namorada que arrumou em Hamburgo, a bela, Astrid Kirchherr e o quanto tal fator foi decisivo para provocar modificações importantes para que a banda achar a formação que a projetou mundialmente, bem pouco tempo depois. Nesse aspecto e por ter tido a decisiva colaboração da própria, Astrid, como assessora na elaboração do roteiro e dos diálogos, o filme ganhou essa conotação fortemente. 

Nada contra; se fosse um filme comum a abordar uma história de amor com forte componente dramático e envolvido em uma tragédia humana terrível, pois abordou a história de um rapaz que larga uma carreira para ficar com a sua namorada por quem apaixonara-se, entretanto, vem a morrer, a seguir, por conta de um tumor cerebral que nem sabia ser portador, portanto, perdeu a carreira; o seu amor e a vida, propriamente dita. 

Dessa forma, uma história trágica, mas com elementos suficientes para render um bom filme melodramático, entretanto, por ter sido uma faceta real da biografia dos Beatles, deixa a desejar por esse aspecto, pois não obstante a memória de Stu Sutcliffe ter que ser respeitada e mencionada, neste caso em específico, o filme mostra-se muito soturno em meio a diálogos longos e muitas vezes enfadonhos, no afã de valorizar a questão do drama pessoal do pobre rapaz, que não queria ser um artista da música com o mesmo ímpeto dos seus companheiros. Isso sem contar a questão da sua paixão arrebatadora pela fotógrafa, Astrid Kirchherr, que minou ainda mais a sua vontade em prosseguir como componente do conjunto.

Apesar de haver esse excesso de cenas introspectivas, com diálogos morosos em meio a ambientes escuros, o filme observa também os seus méritos. A parte musical com a banda a atuar nos palcos, é bem produzida e assim como em “The Birth of the Beatles”, recorreu-se a um suporte com músicos verdadeiros para gravar a trilha sonora e assim garantir um áudio bom para que os atores pudessem encenar a sua dublagem cênica com segurança. No filme citado, de 1979, foi uma banda cover ou “Tributo”, chamada “Rain” que teve tal missão, mas em “Backbeat”, a produção montou uma banda formada por músicos que estavam na crista da onda nos anos noventa, para cumprir tal missão e ela foi cumprida com louvor. 

Dave Grohl, que foi baterista do “Nirvana” e posteriormente ficaria ainda mais famoso como guitarrista e vocalista do “Foo Fighetrs”, está nessa banda de apoio e de fato, nos anos posteriores, mostrou-se um entusiasta contumaz do Rock vintage e conhecedor da carreira dos Beatles, portanto, na época pode ter soado surpreendente, mas ao passar do tempo, hoje tem-se a certeza que foi uma escolha acertada da produção.

No entanto, apesar de haver bastante cenas da banda a atuar nas casas noturnas de Hamburgo, em “The Birth of the Beatles” isso foi melhor explorado, pois como já enfatizei, em “Backbeat”, o mote principal foi contar a história de Stu e Astrid, sem dúvida alguma. Por conta desse foco, é imprescindível anotar que o casal de atores, Stephen Dorf e Sheryl Lee tenham tido a oportunidade em ser bem observados, e neste caso, foram muito bem, com elogios da crítica especializada, da época, inclusive. Mostra-se também o talento de Stu como artista plástico, aliás, fora na escola de artes que John Lennon o conhecera e uma vez amigos, surgiu o convite para que Stu tornasse-se o baixista da banda, mesmo sem saber tocar exatamente o instrumento e por amizade ele, comprometeu-se a estudar e desenvolver-se musicalmente, mas na verdade, a música não seria a sua maior predileção e uma vez que conheceu, Astrid, isso tornou-se um dilema para ele. 

Outro mérito da película, foi ter dado espaço para mostrar a importante intervenção do baixista e fotógrafo alemão, Klaus Voorman, que foi o propiciador da banda a embarcar nessa aventura para tocar em Hamburgo. Klaus assistira a banda em Liverpool, tempos antes e movimentou os seus contatos para levar o grupo para o seu país. No filme, ele foi interpretado pelo ator, Kai Wiesinger. 

Klaus, na vida real, tornou-se um amigo e colaborador eterno para os Beatles, tanto que foi dele o lay-out da capa do LP “Revolver”, que a banda lançaria em 1966 e como músico, ele gravou em diversos discos solo de John Lennon, George Harrison e Ringo Starr, ao longo dos anos setenta, com boa participação por ser um bom baixista. 

Fatos históricos são retratados com maior ou menor ênfase a cumprir a biografia oficial, tais como a questão da prisão de George Harrison por ser menor de idade na ocasião e proibido em tocar nas boites e a gravação do single, “My Bonnie”, quando a banda acompanhou o cantor, Tony Sheridan. 

Ringo Starr, então concorrente a tocar com a banda rival, Rory Storm and the Hurricanes, é mostrado en passant, em contraste com o filme, “The Birth of the Beatles”, onde a relação das duas bandas é melhor mostrada, sobretudo a deixar claro que a amizade com Ringo fortaleceu-se, a despeito da rivalidade entre as bandas e por conta disso, ele seria convidado a ingressar nos Beatles, assim que decidiu-se pela saída do baterista anterior, Pete Best.

E como o foco do filme foi o caso de amor entre Stu & Astrid, mostra-se a influência dela, Astrid nessa fase, por ter sido a responsável pelos primeiros ensaios fotográficos oficiais da banda e por uma via aleatória, eu diria, ter sugerido o corte de cabelo que notabilizaria o início da explosão da Beatlemania, pouco tempo depois, conhecido como “mop top”. E daí em diante, o dilema de Stu em sentir-se impelido a deixar a banda e assumir-se como artista plástico e com total apoio de Astrid, que também mostrava-se uma artista a querer expressar-se no campo da fotografia, permeia o restante do filme, a seguir a cronologia dos fatos e culminar a na descoberta surpreendente de Stu em conter um tumor cerebral e sobretudo por ser absolutamente jovem, isso choca ainda mais, todavia, infelizmente foi o que ocorreu e pior ainda, quando o pior aconteceu e a sua vida foi ceifada muito precocemente.

Bem foi o que ocorreu, lamenta-se e fica o registro de que tal faceta da biografia dos Beatles foi levantada e uma bonita homenagem à Stu Sutcliffe foi prestada através deste filme. Entretanto, eu devo insistir, os Beatles ainda precisam ser representados com uma cinebiografia portentosa, à altura da sua importância na história do Rock. Fiquemos com tal expectativa e torcida.

Outros atores não citados anteriormente: Ian Hart (como John Lennon), Gary Bakewell (como Paul McCartney), Chris O'Neill (como George Harrison), Paul Duckworth (como Ringo Starr), Scot Williams (como Pete Best), Jennifer Ehie (como Cynthia Powell), Wolf Kahler (como Bert Kaemfert), James Doherty (como Tony Sheridan) e outros na figuração.
Tal filme mostrou-se bem nas bilheterias dos cinemas. Entrou com força no circuito da TV a cabo e alcançou  a TV aberta, com sucesso, igualmente. A crítica elogiou a produção e os atores, mas queixou-se do caráter soturno de muitas cenas a revelar-se monótonas, transcorridas em meio à penumbra. 

Produção britânica e germânica, foi dirigido por Iain Softley, aliás, trata-se do seu primeiro trabalho como diretor, que possuía até então, uma experiência mais ligada ás produções na TV,  anteriormente. 

Passou no circuito comercial com relativo sucesso no mundo inteiro e no Brasil também despertou a atenção dos fãs dos Beatles.
Roteiro por Iain Softley, Michael Thomas e Stephen Ward.  Produção de Finola Dwyer e Stephew Hooley. Teve inúmeras exibições na TV aberta e fechada. Foi também lançado em DVD e na versão, Blu-Ray, anos depois. É facilmente acessado no You Tube nos dias atuais de 2020. 

Apesar de carregar a mais no drama pelas circunstâncias, é um bom filme em linhas gerais e vale a pena assisti-lo, eu acredito.
 
Esta resenha foi escrita para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll". Encontra-se, portanto, disponível em seu volume II, a partir da página 55.