sábado, 25 de fevereiro de 2023

CD Lucio Zapparoli Tributo/Santa Gang - Por Luiz Domingues

Ao final da década de setenta, muitas bandas de Rock foram criadas na cidade de São Paulo, ainda influenciadas pelas estéticas clássicas tradicionais, apesar do vento ter estado a soprar na direção oposta, com a euforia em torno do Punk Rock e seus derivados a se encontrar em alta voga, além de outra corrente, o Heavy-Metal também em crescimento.

E foi nesse bojo de boas bandas que a Santa Gang iniciou a sua trajetória, conduzida pelo seu mentor, o vocalista, Lucio Zapparoli. A intenção imediata do trabalho pendeu para o Rock’n’ Roll com forte base do Blues presente e a produzir na prática um Blues-Rock de qualidade e forte presença interpretativa nas suas apresentações e lançamentos fonográficos. 

Rubens Gióia, meu saudoso amigo e colega n'A Chave do Sol, teve uma passagem pela Santa Gang entre 1980 e 1981. Esta foto acima o mostra em ação com a Santa Gang, mas infelizmente eu não tenho melhores informações sobre a circunstância desse registro, tampouco o crédito do fotógrafo. Fonte: Blog 2112, do bom ativista cultural Carlos Retamero

A banda teve uma boa carreira ao atuar na cena até o ano de 1988, com a realização de muitos shows e a obter sucesso. Em sua formação, muitos músicos passaram, alguns com fama construída em outras bandas importantes a posteriori e entrou para a história com todo o mérito.

Lucio Zapparoli em ação com a Santa Gang nos anos oitenta. Fonte: Blog 2112. Click: Antonio "Tony" Carlos Monteiro

Lucio, além de cantor e “band-leader”, também se revelou como um ótimo técnico de áudio para comandar o PA de shows ao vivo. E assim, foram muitas bandas que tiveram a qualidade assegurada em seus shows, sob o comando preciso dele na mesa de mixagem e com a garantia extra dele ser um Rocker convicto e portanto, preparado para atender a demanda, exatamente por conhecer a necessidade de seus pares e a resolver com perfeição, exatamente por também cultivar a mesma paixão mútua pelo Rock. 

Foto contida no encarte do CD Lucio Zapparoli Tributo/Santa Gang, mostra a Santa Gang em ação nos anos 1980.

Ao prosperar na atividade técnica e em paralelo à carreira artística, Lucio montou uma empresa de sonorização própria e mediante o seu equipamento, garantiu a realização de uma infinidade de shows musicais de diversos estilos e sobretudo shows de Rock, incluso para a banda deste que voz escreve.

E assim, mesmo depois do término de atividades da Santa Gang, ele jamais deixou de fazer parte da cena, pois atravessou os anos noventa e dois mil a operar shows, portanto a colaborar diretamente com a cena do Rock paulista.

Foi quando surgiu a oportunidade para a banda retornar e mais do que promover um show apenas com caráter nostálgico, houve a intenção de uma retomada com o lançamento de músicas inéditas. Reunida em um estúdio de Fort Lauderdale, Florida, nos Estados Unidos, a banda gravou em abril de 2019 e logo a seguir, marcou uma apresentação em São Paulo. 

Dessa forma, eu tive o prazer de assistir ao vivo a reentrada da Santa Gang na cena, através de um belo show, quando fizeram o espetáculo de abertura de uma outra banda moderna que admiro, o Power Blues, nas dependências de uma casa noturna que fora muito famosa na década de oitenta, o “Madame Satã”.

Todavia, a ótima perspectiva que a Santa Gang teve anunciada à sua frente, naquele momento tão feliz de agosto de 2019, mediante um belo show de reunião super bem-sucedido, teve um arrefecimento logo a seguir por conta da explosão da pandemia mundial da Covid. 

O pior ainda ocorreu quando em junho de 2021, a notícia do falecimento do Lucio chocou a todos. O seu legado já estava garantido pela história construída e materializado pelo compacto que a Santa Gang lançara em 1981, mas eis que o guitarrista Wagner Anarca, também famoso na cena do Rock paulista dos anos 1980, através do trabalho da sua lendária banda, "Anarca", e que arregimentara toda a condição para que a Santa Gang se reagrupasse e gravasse em 2019, nos Estados Unidos, sendo também ele um músico participante ativo da gravação e compositor, arranjador & produtor da obra, resolveu prensar o álbum em CD físico a acrescentar o áudio na íntegra do show que a Santa Gang realizou no Madame Satã de São Paulo em agosto de 2019, e a compor e anexar uma canção inédita por ele composta, chamada: “Song For Lucio” a se revelar uma bela e justa homenagem ao amigo que partiu.

Portanto, é nesse contexto que o álbum “Lucio Zapparoli Tributo/Santa Gang” foi produzido pelo Wagner Anarca e chegou às lojas e órgãos de imprensa.

Sobre a capa do CD, a foto do Lucio em versão 2019 a cantar ao vivo e com a sua alegria estampada no semblante, revela o quanto estava esperançoso por viver o sonho do Rock com intensidade na volta triunfal da banda. Para edulcorar tal impressão, a foto passou um tratamento a ganhar traços de um desenho feito com crayon ou algo similar e assim, ganhou a beleza lúdica extra.

No encarte, há uma grande profusão de fotos dessa reunião da banda em 2019, algumas com caráter informal e também da banda nos anos oitenta, mediante a presença de um bom texto explicativo sobre a produção e declarações de solidariedade ao Lucio e nesse aspecto, me chamou a atenção que só há a menção ao carinho dos seus amigos e nenhuma fala mais incisiva sobre o seu falecimento. Nesse aspecto, considerei uma tremenda sacada da produção ao não lastimar a sua ausência e sim, enaltecer a sua presença que é eterna como artista e amigo.

Sobre o repertório do disco, tenho outras seguintes considerações para acrescentar. Além das músicas gravadas em 2019, o show ao vivo de São Paulo e a canção póstuma, houve também a inclusão de um tema gravado em ensaio. Dessa forma, cercado de grandes músicos, Lucio perpetrou uma dose maciça de Rock’n’ Roll, Blues e até Hard-Rock através dessas canções gravadas em 2019.  

Chiclete” é uma versão moderna para o clássico da Santa Gang gravado no compacto de 1981, “Chiclete de Hortelã”, e nesta regravação, o Rock’n’ Roll tradicional observado como intenção original da música foi preservado, porém amalgamado com um certo sabor Hard-Rock.

My Friend” é uma versão livre do standart do Blues, “Sweet Home Chicago”. Na letra adaptada, Lucio discorre sobre essa ponte estabelecida entre velhos amigos Rockers que se encontram em São Paulo e Miami para celebrar o Rock e o Blues, portanto, é autobiográfica praticamente ao descrever essa reunião feliz da banda nos idos de 2019.

Estamos Indo” é um belo Blues-Rock que também fala sobre a reunião festiva dos velhos e novos amigos em torno do ressurgimento da banda na cena, portanto contém essa carga de emoção. Essa canção ganhou um bonito clip para promoção e infelizmente, dada a constatação triste que o mentor da banda partiu logo a seguir, se tornou uma peça melancólica. No entanto, tenho certeza que o Lucio não desejaria transmitir esse sentimento e assim, que prevaleça a sua alegria contida nas imagens a registrar o momento em que amparado por amigos queridos, estava radiante pela volta da banda para a estrada. 

Blues for Brian” é um ótimo slow blues, com aquela dinâmica que convida o ouvinte a absorver a sutileza da música e viajar longe.

Meu Negócio” é um Rock’n’ Roll rasgado, acelerado, empolgante, com aquela carga de energia setentista na veia, a honrar as tradições da banda em seus primórdios. Essa faixa é proveniente de um ensaio, portanto, o tratamento sonoro se mostra inferior, mas isso não desabona em nada a sua colocação no álbum e pelo contrário, tem uma energia viva contagiante. Até o fato do som dos pratos da bateria estourar em alguns momentos se revela charmoso de certa forma, pois traz aquela sensação de uma banda de garagem a tocar ao vivo, de forma orgânica, a fazer suar, literalmente as paredes da sala de ensaio.

Já a sexta faixa é aquela contínua a conter o show ao vivo de 2019, na íntegra, realizado no palco da casa noturna Madame Satã de São Paulo e traz exatamente a adrenalina mediante aquela emoção embutida que eu mesmo em pessoa pude testemunhar de forma auditiva e ocular in loco, portanto, fico contente por saber que esse material tenha sido preservado e devidamente anexado ao álbum.

Para encerrar, há a presença da faixa póstuma, gravada como uma justa homenagem ao Lucio. “Song for Lucio” revela esse sentimento sincero de seus amigos que sentem a sua falta. Trata-se de um Slow Blues instrumental muito bonito, melódico e emotivo na dose certa para exprimir a saudade. Lucio vive, o Rock & o Blues nunca morrem. 

Para finalizar, está de parabéns o guitarrista Wagner Anarca pelo seu esmero para produzir esta bela homenagem ao saudoso e talentoso, Lucio Zaparolli por tudo o que ele fez em sua vida, como artista, técnico de áudio e ativista cultural, sempre fiel aos seus princípios e mediante a sua declarada paixão pelo Rock.

Faixas 1 a 4 e 7 gravadas no “Studio 107” de Fort Lauderdale, Florida – USA em 21 de abril de 2019.

Selo/editora: Music Anarca (info@anarca.com)

Produção geral: Wagner Anarca

Técnico de captura e mixagem de áudio: Brian Harelick

Faixa 6 (Show na íntegra do Madame Satã de São Paulo

Captura de áudio: Cesar Gavin

Faixa 5 (material de ensaio): não divulgado detalhes sobre a sua gravação

Lucio Zaparolli: Voz

Wagner Anarca: Guitarra

Giovanni Chacon: Voz

Barreto Junior: Voz e bateria

Ricardo Cicarelli: Bateria

Celso Meireles: Teclados e gaita

Brian Harelik: Baixo e teclados

Daniel Gerber: Guitarra

Dalam Junior: Baixo, guitarra e voz

Willian Kusdra: Baixo e guitarra

Fabio Xepa: Bateria

Marco “Magoo” Placha: Baixo

Técnico de áudio e luz ao vivo: Paulo Zapparoli

Para conhecer mais sobre a história da Santa Gang e da trajetória pessoal de Lucio Zapparoli, acesse:

Matéria no Blog 2112:

http://furia2112.blogspot.com/2020/09/arquivo2112-santa-gang.html

Matéria no Blog da Webradio Stay Roc k Brazil:

https://www.stayrockbrazil.com.br/post/2019/08/05/santa-gang-anuncia-retorno-da-banda-com-show-no-madame

Podcasting Programa Drops Star Trips/Edição 67:

https://www.mixcloud.com/betaostartrips/programa-drops-star-trips-edi%C3%A7%C3%A3o-no-67-26082020-banda-santa-gang/

Entrevista de Wagner Anarca para o site de Antonio Celso Barbieri:

https://www.celsobarbieri.co.uk/index.php?option=com_content&view=article&id=836:lucio-zapparoli-tributo-wagner-anarca-grava-e-produz-cd-homenagem-a-grande-musico-e-amigo&catid=21&Itemid=66

Matéria no Site Gaveta de Bagunças:

https://gavetadebaguncas.com.br/santa-gang-o-genuino-rock-n-roll-feito-no-brasil/

O compacto triplo da Santa Gang de 1981

https://www.youtube.com/watch?v=AxuSvQAcNzs

A apresentação de 2019, filmada por Cesar Gavin (Canal Vitrola Verde):

https://www.youtube.com/watch?v=oNVNyJU3ruI&t=939s

Entrevista de Lucio Zapparoli para o músico e ativista cultural, Cesar Gavin (Canal Vitrola Verde):

https://www.youtube.com/watch?v=bdT2Dw61V-M 

Entrevista de Lucio Zapparoli para o músico e ativista cultural, William Kusdra - Programa Direto da Toca - Stay Rock Webradio

https://www.youtube.com/watch?v=JC0dZcnCohQ

 

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

CD Cuidado Garota/As Radioativas - Por Luiz Domingues

Esta resenha trata de um álbum que foi lançado há dez anos, ou seja, pela luz de 2023, quando iniciei o exercício desta escrita. Todavia, o fator “lapso” de tempo não desabona de forma alguma o valor da obra, daí a minha intenção estar justificada.

Falo sobre o CD “Cuidado Garota”, lançada pela banda de Rock, “As Radioativas” em 2013, pela gravadora Baratos Afins.

Vamos aos fatos: conheço de longa data a gravadora Baratos Afins e sobretudo o espírito empreendedor do seu presidente, o abnegado Luiz Calanca. E por ser amigo dele há décadas e também ter trabalhos meus alojados no catálogo de sua gravadora, sei bem o quanto ele se entusiasma quando se encanta com um artista novo, ao ponto de não medir esforços para lhe oferecer o melhor aparato possível em termos de produção de um álbum e a suprir todo o suporte no campo da divulgação, distribuição e até apoiar o gerenciamento artístico, graças aos contatos que mantém no mundo do show business, no âmbito da música profissional “underground” e até alguns do patamar mainstream.

Em suma, se o Calanca apostou no som d’As Radioativas, certamente foi porque o trabalho provou conter substância artística, ou seja, se trata de uma espécie de chancela adquirida pelo conjunto da obra da parte dele, Calanca, que desperta a atenção de todos na cena artística brasileira. 

Eis que em um dia de 2013, um amigo pelo qual eu nutro grande estima, Kico Stone (Rocker de carteirinha e film-maker de shows ao vivo de muita categoria), me ofertou uma cópia do álbum, que eu ouvi e achei interessante, contudo, diversos fatores alheios à minha vontade fizeram com que eu postergasse a tarefa de me debruçar efetivamente na análise propriamente dita, e assim, tal demora chegou em um ponto no qual eu deduzi que o tempo passara em demasia ao determinar que se perdesse a sua a contemporaneidade, ou seja, a se tornar inviável.

Até que eu pensasse sob um outro ponto de vista ao assumir que se eu não sou um crítico musical profissional a trabalhar em algum órgão de imprensa e daí não estar comprometido apenas a analisar lançamentos, mas pelo contrário ser livre para gerir o meu próprio Blog como me aprouver, a conclusão óbvia é: por que não posso falar sobre um disco lançado há uma década ou mais que isso?

Muito bem, eis eu aqui a digitar no computador e a olhar para a folhinha que demarca estar a viver o mês de janeiro de 2023, absolutamente tranquilo para falar de um disco lançado em...2013...

Vamos lá então: o CD “Cuidado Garota” mostra a essência de um grupo de Rock que buscou a sua identidade naquele Rock visceral, cru, que flerta com o Rock primordial mais cinquentista, porém a se amalgamar com outras influências múltiplas. Os críticos profissionais se apressam sempre em qualificar um som dessa monta como “Punk” ou “Proto-Punk", mas eu não caio nessa rotulação assim tão clichê e tendenciosa, devo acrescentar.

Há um quê, sim, do Punk’1977 no som que a banda apresenta, mas ao ouvir o álbum, nota-se a presença de outras influências diversificadas e neste caso, é simplista demais classificar a banda como apenas, “punk”.

Ao ir mais fundo, acredito que exemplos de bandas e artistas solo internacionais tais como o MC5, o The Stooges, Patti Smith, New York Dolls, The Runaways e até o Girlschool tenham mais a ver com o som d’As Radioativas e não se pode reunir esses artistas citados dentro de um único balaio punk como geralmente os críticos, principalmente os locais, costumam cravar como um pressuposto monolítico.

Existe uma energia primitiva nesse trabalho, no melhor sentido do termo, e isso é agradável, exatamente a respeito da questão da expressão visceral que a banda propôs como o seu pilar estético e claro, reputo isso como um mérito do trabalho.

O outro ponto positivo do álbum é a convicção com a qual a banda elege a sua pauta, sob o ponto de vista musical, na temática e também na sua expressão poética para propor as discussões.

E mais um ponto e eu o deixei propositalmente para o final deste preâmbulo para comentar: trata-se de uma banda feminina, portanto, diversas questões do universo feminino são colocadas em cheque, e nesse ponto, as garotas se valeram muito do quesito da sua dignidade artística para mostrar a devida força na interpretação e certamente a garantir posicionamento firme sobre tais questões propostas.

Musicalmente a banda desenvolveu a contento a sua proposta estética. Há muita energia sob uma condução simples, sem virtuosismos e voos ousados nos arranjos, foi o que a banda se propôs a fazer e nesse caso, entregou muito bem o que prometeu. 

No quesito da capa, o álbum tem capricho na sua concepção e também no lay-out final. A capa ao estilo “dupla” um conceito muito usado pelos antigos discos de vinil, traz a presença de uma garota prestes a detonar uma quantidade enorme de “bananas” de TNT no telhado de um edifício, que tem como horizonte próximo a silhueta dos prédios vizinhos a denotar que a radioatividade vai atingir a cidade toda e com o devido toque feminino ao melhor estilo “Cherry Bomb”. 

O encarte se desdobra em diversas lâminas a conter as letras das canções a ter cores diferentes e sobretudo a chamar a atenção pelas boas fotos individuais de cada componente do grupo, sob clicks muito bem produzidos e a usar daquela predisposição mais “vintage” de se mostrar Rockers a posar com uma expressividade muito grande.

Segue a ficha técnica bem robusta e se o leitor me permite uma pequena crítica construtiva, a tipologia escolhida na diagramação desse texto, o deixou quase inlegível, mesmo para quem enxerga bem, dado o tamanho diminuto das letras e chega a ser menor que bula de remédio. Tudo bem, sei que uma lâmina a mais encareceria muito o projeto, ou seja, conheço como funciona esse tipo de produção de discos na sua parte gráfica de capa e encarte e dou o devido desconto à produção, é claro.

Sobre as canções do disco, vale a pena anotar mais algumas observações:

“Isso é Rock n’ Roll!!”

Eis o link para assistir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=A1c9RQ0Rn84&t=7s

Eis aí a energia primitiva citada anteriormente e que empolga logo de início. O tema abre com um riff de estilo Blues-Rock e logo adentra o caminho para o Rock’n‘ Roll com aquele sentido mais puro das raízes cinquentistas, porém a somar outras influências no seu bojo. É muito bom o trabalho das duas guitarras, a cozinha mantém a banda firme e a voz rasgada da vocalista, Tatiana Siqueira, lembra de certa forma a grande, Suzi Quatro, pelo timbre de voz e sobretudo pela linha de interpretação que defende.

“Enquanto eu Fujo de Você”

Eis o link para ver no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=S_Asq635Jbc

Esse tema começa com uma certa atmosfera inspirada pelas estéticas sombrias do movimento Pós-Punk oitentista, mas logo o clima muda quando a banda entra em algo mais vigoroso, ainda que a conexão com a dita verve alternativa seja mantida via Indie-Rock mais noventista, talvez sob a inspiração de bandas dessa década tais como L7 e Sonic Youth, mas veja bem, isto é uma mera conjectura da minha parte, pois não conversei com as artistas para saber qual foi a real inspiração delas nesse aspecto, portanto, fica a ressalva.

“Cuidado Garota”

Eis o link para escutar no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=chcfvnxHpkY

Neste caso, a sonoridade Indie é bem presente e evoca sim o Punk-Rock, isso é inegável. A opção por riffs que sugerem a semitonada como uma opção estética deliberada não deixa dúvida sobre a intenção anárquica da estética que adotam.

Mais uma vez a voz principal rasgada chama a atenção pela contundência em meio a batidas tribais eficientes feitas pela bateria e um aspecto lúgubre imposto pelo baixo.  

“Lucille”

Eis o link para ver no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=O73TZj-fhn0

Nesta faixa, o Rock’n Roll bem balançado convida o ouvinte a se levantar e dançar para valer. Lembra bem o som do New York Dolls em seus momentos setentistas gloriosos com Johnny Thunders a comandar a farra Drag Queen. Se mostra bem concatenada a sincronia das guitarras e os backing vocals empolgam, além do solo de guitarra a trazer o elemento do Classic Rock como mote. 

“Stupid Boy”

Eis o link para assistir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=Yyc9R6-waVI

Nesta faixa, o som com um certo ar “glitter” tem aquele clima de “Rocky Horror Show” nas entrelinhas. Mais uma vez o trabalho das guitarras se destaca, em meio à sua simplicidade assertiva, mas aí é que está a essência, pois mesmo não tendo nada contra os virtuoses que abundam por aí, devo dizer em alto e bom som: como é bom ouvir uma guitarra Rock’n Roll sem preciosismos histriônicos...  

“Bad Girl”

Eis o link para ouvir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=p_9LW_vCTYQ

Rock’n’ Roll direto, com aquela rebeldia cinquentista explícita e devidamente revisitada pela pegada sessenta-setentista, o tema trata da emancipação feminina em sua letra de uma forma direta, sem ser panfletário, no entanto. É mais um Rock muito balançado, para dançar, mas claro, se faz necessário prestar atenção na mensagem das meninas, certamente. 

“Seja Você”

Eis o link para escutar no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=KNfZEJ67ENM

Eis aí um riff de guitarra bastante saboroso. Lembra o som de “garage bands” sessentistas, com a devida ressalva de que talvez as artistas não tenham essa referência, ou seja, a se tratar apenas da minha impressão em particular. O importante a se destacar é que se trata de um tema bastante balançado e os backing vocals são agradáveis para fazer o contraponto ao vocal principal mais agressivo e dessa forma, tal combinação ornou muito bem para o arranjo. 

“Come on Baby”

Eis o link para assistir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=hlfaLw9ZY_w

Esse tema se inicia com uma interessante intervenção do baixo e bateria a abrir espaço para as guitarras, uma a marcar com acordes cheios e a outra a executar um bom riff. Logo a banda entra em uma marcação mais Rock’ n ‘Roll a la “AC/DC” com aquele sentido do trem que avança e não descarrila nunca. É um som “Aor” se considerar o fato de que ele é muito bom para se tocar em estádios lotados, com o público a responder e seguir a banda no mesmo comboio animado.

“Doce Ácido”

Eis o link para escutar no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=O3vmoRlV010

Nesta faixa, a banda elaborou o seu arranjo com uma boa dose de inspiração na Surf-Music, pela boa intervenção da guitarra a buscar nos timbres e sobretudo na execução, tal reverência, acredito. O reverber exagerado na guitarra é primordial para demarcar tal predisposição. E a banda segue firme nessa mesma toada.

“Longo Tempo”

Eis o link para ouvir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=TRRiCR4j-pA

Bem, eis um tema mais ameno, com baixo contínuo e sons etéreos de guitarra logo na introdução para mais uma vez denotar influência do Pós-Punk e Indie-Rock, no espectro oitenta-noventista, primordialmente. A interpretação vocal alterna amenidade com maior veemência na medida certa.

Em suma, o trabalho d’As Radioativas é bastante interessante no sentido de celebrar o Rock mais visceral, com simplicidade em suas formas, interpretação forte e mensagens bem contundentes, sem, no entanto, cair na panfletagem.

O aspecto mais triste desta resenha, ao tratar do álbum com tanta defasagem de tempo, se deu no sentido de que a atividade da banda foi extinta em 2015, ou seja, pouco tempo depois do lançamento do disco, em 2013. Gostaríamos que a banda tivesse observado uma continuidade na carreira, mediante mais álbuns gravados e histórias acumuladas, todavia, não foi assim que ocorreu.

Mesmo assim, através de um desfecho que não foi o que as artistas e também o público desejou, creio que o esforço da parte delas foi garantido com tal álbum bem produzido a mostrar um som verdadeiro e que logicamente expressa a mensagem que elas ansiaram transmitir.

CD Cuidado Garota – As Radioativas

Gravado no estúdio Guidon de São Paulo em novembro de 2013

Técnico de áudio (Captura e mixagem): Edmilson

Produção específica de bateria no estúdio: Rafael Rosa

Produzido por Luiz Calanca

Gravadora Baratos Afins

Fotos: Gustavo Vargas

Assistente de Fotografia: Fernanda Oliveira

Produção Executiva: Virginia Das Flôres

Produção, Maquiagem e Figurino do Encarte: Rebecca Carratu

Produção, Maquiagem e Figurino - Gina Golden Girl, Christian Mourelhe

Gina Golden Girl (a modelo que posou para a capa): Virginia das Flôres

Direção de Arte: Paula Reis

Edição de Arte: Leticia Ledoux

Criação de Objetos: Rafael Rosa

Formação d’As Radioativas:

Tatiana Siqueira: Voz

Letícia Ledoux: Guitarra e voz

Natacha Garcia: Guitarra

Crica Campos: Baixo e voz

Leticia Rodrigues: Bateria

Para conhecer mais sobre o trabalho d’As Radiotivas, acesse:

Canal oficial d’As Radioativas no YouTube:

https://www.youtube.com/@asradioativasoficial

Página do Facebook:

https://www.facebook.com/asradioativas

As Radioativas no Soundcloud:

https://soundcloud.com/asradioativas/sets/as-radioativas-cuidado-garota?fbclid=IwAR1aHJyOkxLZr21D4ekFfeNC-Akqy-lwbCGp-nKG89hXYxMoIkEvWb3Giow

Agradecimento especial ao amigo Kico Stone pelo suporte e indicação do trabalho