sexta-feira, 30 de maio de 2025

Filme: Go, Johnny Go! (Johnny Melody) - Por Luiz Domingues

Mais um filme produzido no calor gerado pela euforia em torno do Rock’n’Roll primordial cinquentista, o filme, “Go, Johnny Go” (!) foi um pouco além da simplicidade em que a maioria dos filmes com tal teor e realizados nessa década, pautou-se, ao preocupar-se em apresentar uma história, e assim justificar um mínimo de dramaturgia para chegar perto de um conceito cinematográfico e não apenas caracterizar-se por ser um documentário. 
 
É bem verdade, que um documentário assumido é uma peça muito digna em via de regra e ao analisar-se friamente, é preferível em relação à algumas tentativas medíocres de produzir-se filmes com teor dramatúrgico absolutamente insípido, apenas para justificar a promoção de artistas musicais, é preciso deixar o conceito bem claro. 
Nesses termos, a história que envolve esse filme, é bastante singela, no entanto, ao oferecer uma substância mínima para justificar o filme e claro, vamos ao que realmente interessa, a presença de artistas musicais bem significativos do espectro do Rock cinquentista e naturalmente a abranger muito da Black Music e do Pop em geral.
Bem, sobre a trama, a ideia foi dramatizar a história de um cantor Pop, conhecido como: Johnny “Melody” (interpretado pelo cantor/ator, Jimmy Clanton), e no filme, o roteiro privilegiou o recurso do “flashback”, pois logo no início, mostra-se o tal jovem cantor no auge do sucesso, a cantar ao vivo em um grande teatro, perante os seus fãs delirantes. 
 
Na coxia, o radialista e empresário, Alan Freed e o grande astro, Chuck Berry, ambos a interpretar as suas respectivas personas, comentam sobre o sucesso do cantor em questão e como quase o destino o afastou do glamour da carreira artística e muito pelo contrário, como o garoto poderia ser apenas um delinquente juvenil, encarcerado por um crime cometido no passado. 
 
Indo além, Freed relata sobre o destino do rapaz ter sido decidido pela ação da sorte em torno de uma escolha feita por uma moeda. Uma reflexão é sugerida sobre como Freed conhecera o rapaz, tempos antes e assim, volta-se ao passado para conhecer a sua trajetória.
Johnny fora um garoto órfão e pobre que cantava em um coral. Apesar de ser reconhecido pelo seu talento nato, ele é cobrado por ter simpatia pelo Rock’n' Roll e briga com o maestro. Por conta de ser órfão e a justificar que não teria como comunicar aos seus pais a sua insatisfação, o maestro simplesmente o despede do coral. Johnny arruma emprego em um teatro, mas ali não dura nada pois é repreendido por ter sido flagrado a dançar o Rock’n’ Roll pelos bastidores. 
 
Ele reencontra uma amiga de infância, Julie Arnold (interpretado pela cantora, Sandy Stewart), e Johnny conta-lhe que está a economizar dinheiro para gravar uma Demo-Tape. Eles reencontram-se em um estúdio de gravação, onde Julie estava a gravar e a cantora aproveita para participar da gravação de Johnny, a colaborar com backing vocals pontuais.
Então, tal gravação chega à mãos de Alan Freed, mas por um contratempo pontual, demora para que o radialista tome contato com o talento do garoto, embora Chuck Berry tenha percebido isso antes. Nesse ínterim, Johnny e Julie, apaixonam-se e a moça demonstra desejar possuir um broche, como presente de natal, no entanto, o rapaz não tem recursos, visto que a sua carreira ainda nem esboçou engrenar. 
No afã em presentear a sua namorada, Johnny penhora o seu trompete. Infelizmente, o dinheiro que recebeu da penhora do seu instrumento, mostra-se insuficiente e Johnny parte para uma loucura, ao atirar um tijolo na vitrine da loja de joias e assim visar roubar a peça que seria um objeto de desejo da sua namorada. 
 
Nesse ínterim, Allan Freed finalmente coloca para tocar a música de Johnny Melody na sua emissora e a resposta do público é muito animadora, com múltiplos telefonemas oriundos da parte de fãs instantâneos. Ele, Freed, decide então procurar o artista, imediatamente, e nessa busca pela noite, acompanhado da namorada de Johnny (Julie), Freed não sabe por onde procurar o rapaz e tem uma ideia: lançar uma moeda e buscar na sorte, a direção por onde seguir com o seu carro para tentar achar o rapaz. 
 
Bem, o resultado da moeda favoreceu Johnny inteiramente, visto que no momento em que o rapaz havia atirado o tijolo na vitrine da joalheria, o carro de Allan Freed e Julie dobra a esquina e ambos presenciam a cena. 
Freed toma uma atitude heroica ao apanhar outro tijolo em sua mão e exigir que Johnny e Julie desapareçam dali ao usar o seu carro. Em meio à sirene da loja, assim que o casal evade-se do local do crime, a polícia chega e Freed finge estar embriagado e assim simular que apenas vandalizara a loja por conta de seu torpor etílico e de fato, a joia não fora roubada. Tudo resolvido, Freed assumiu o pequeno delito inconsequente e Johnny teve a sua vida e carreira salvas.
 
Bem, história muito singela, simplista e bastante ingênua, mas devo acrescentar, porém (como já havia dito), serviu para justificar a produção do longa-metragem e não deixar os números musicais a esmo. Tudo bem, entendo perfeitamente a preocupação de seus produtores, todavia, se não houvesse dramaturgia alguma, creio que o filme valeria a pena ser assistido simplesmente pela parte musical, sem dúvida alguma. 
Ainda a falar sobre a dramaturgia, há por registrar-se que a atuação do astro, Chuck Berry, como ator, foi surpreendente. É claro que ele não teria nenhuma obrigação de desempenhar tal função com um mínimo de qualidade, no entanto, a sua atuação foi acima da média para quem simplesmente não era e jamais pensou em ser ator. 
 
O mesmo pode ser atribuído para Jimmy Clanton e Sandy Stewart, aliás, com um maior destaque ainda, visto que sustentaram papeis mais complexos do que o defendido por Chuck, que atuou como ele mesmo, afinal de contas. 
 
E sobre a parte musical, o filme tem ótimas surpresas. Chuck Berry, para início de conversa e claro que o título do filme a evocar uma das suas mais famosas canções, não poderia faltar na película. Eddie Cochran, em sensacional aparição e Ritchie Valens, que filmou a sua participação mas não assistiu o filme, visto que infelizmente morreu naquele fatídico acidente aéreo, antes do seu lançamento. 
 
O número defendido pelo grupo vocal, The Flamingos”, é espetacular. Os rapazes não apenas cantavam muito, com aquelas típicas vocalizações em harmonia no espectro do R’n’B, mas faziam encenações muito criativas, a usar teatralidade & humor, em dose maciça.
“The Cadillacs”, outro grupo muito estiloso os cantores: Jo Ann Campbell, Adriano Celentano, Jackie Wilson, Harvey e Sandy Stewart, também contribuem, além do próprio, Jimmy Clanton, a usar o personagem do cantor, Johnny Melody, acrescenta também com a ótima estrutura musical dessa obra.
Além dos atores ou atores improvisados já citados, o elenco do filme contou com: Herb Vigran (Bill Barnett), Frank Wilcox (Mr. Arnold), Barbara Wooddell (Mrs. Arnold) e mais alguns atores de apoio. Escrito por Gary Alexander. Foi dirigido por Paul Landres e Piero Vivarelli (que também fez uma ponta como ator, a aparecer como ele mesmo, um diretor de cinema, italiano). 
 
O filme foi lançado em julho de 1959 e obteve um discreto apoio do público e da crítica. Naturalmente, com o decorrer do tempo, a obra ganhou outra conotação ao ser valorizada, principalmente pela presença de tantos astros da música cinquentista, notadamente a orbitar no mundo do Rock'n' Roll e a garantir uma ótima trilha sonora.

Passou bastante na TV aberta, por muitos anos, igualmente em canais de TV a cabo, foi lançado em versão VHS, posteriormente em DVD, e é encontrado com facilidade no You Tube. Ingenuidade e fragilidade da produção a parte, vale muito a pena ser assistido, pelo aspecto musical, sem dúvida alguma.

Esta resenha faz parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll" em seu volume II e está disponível para a leitura a partir da página 210

quinta-feira, 15 de maio de 2025

Filme: The Linda McCartney Story - Por Luiz Domingues

Muitas obras cinebiográficas sobre os Beatles e John Lennon em particular, foram produzidas ao longo dos últimos anos, no entanto, o enfoque nos demais componentes do quarteto de Liverpool, ainda deixa bastante a desejar. É bem verdade que entre os muitos lançados até aqui, o filme, “Backbeat” trata de um ex-membro com curta passagem pelo grupo, em uma fase anterior ao sucesso que tal grupo alcançaria em patamares inimagináveis, ao tratar-se do baixista, Stuart “Stu” Sutcliffe. É um fato, que muitos documentários a retratar os demais, são notórios (sobre Lennon, ele foi o mais agraciado com filmes ao seu respeito), entretanto, a ausência de filmes tradicionais em termos de longa metragem, telemovies e até mesmo curtas, são raros, para não dizer inexistentes. 
 
Portanto, em “The Linda McCartney Story”, apesar do enfoque mostrar-se em favor dessa personalidade cinebiografada, pelo fato do seu óbvio vínculo matrimonial com Paul McCartney, este é bastante atendido ao longo da obra, naturalmente. Antes de prosseguir, reforço o que sempre penso sobre a produção cinebiográfica dos Beatles e de seus componentes, individualmente: falta ainda uma obra definitiva sobre os Beatles, com uma grande produção à altura da magnitude da banda e cada membro do grupo merecem também um filme particular, nos mesmos moldes.
Sobre este em específico, a cinebiografada em questão foi Linda McCartney e ela tem uma relevância pessoal e real para o Rock, além de ter sido esposa de Paul McCartney (e alçada à condição de musicista, ao ter sido uma componente oficial do grupo “Wings”, fundado por Paul, ao longo dos anos setenta). Isso porque é público e notório que ela teve uma forte atuação como fotógrafa para veículos que cobriram o Rock nos anos sessenta, principalmente no caso da famosa revista norte-americana, “Rolling Stone”, onde foi colaboradora. Por ter fotografado astros da primeira grandeza do Rock sessentista, Linda ganhou notoriedade como fotógrafa, portanto, todo o comentário maldoso ao seu respeito formulado por supostamente ter apenas tirado proveito da fama do seu marido, para ser respeitada, não pode ser considerado como algo verdadeiro, de forma alguma. 
É evidente, quando tornou-se a senhora McCartney, a sua fama multiplicou-se de uma forma geométrica, mas ela já tinha o seu valor como profissional, e não poderia ser considerada uma mera oportunista, como a opinião popular leviana a tratou. Bem menos que Yoko Ono, é verdade, porém, Linda McCartney também sofreu bastante com a formação de opinião danosa da parte de pessoas mal-intencionadas, ao atacá-la com esse e outros argumentos baixos e sobretudo, infundados. 
Antes de avançar sobre a resenha do filme, propriamente dita, é preciso esclarecer uma outra lenda urbana a seu respeito. Ao contrário do boato que espalhou-se com uma força descomunal e ajudou a criar a imagem de que Linda fora uma garota burguesa e mimada ao apenas “brincar” em ser fotógrafa, e assim poder circular entre artistas famosos, ela não possuía nenhum parentesco como o senhor, George Eastman, o fundador da gigantesca empresa ligada ao mundo da fotografia, Eastman-Kodak. O fato de seu nome como solteira ter sido, Linda Eastman, e por ser fotógrafa, gerou a confusão (e a má intenção) ao fomentar a lenda urbana que ela seria neta ou mesmo filha do velho, George Eastman, o magnata da fotografia e portanto, herdeira bilionária desse império industrial.
 
Postas tais considerações preliminares sobre a biografia de Linda Eastman McCartney, o filme é feliz por traçar uma amostra fidedigna da sua biografia, no entanto, sob uma aura deveras adocicada, ao seguir o padrão de um telemovie a envolver em seu roteiro, os ingredientes típicos para uma abordagem cinebiográfica/BioPic amena, a conter uma boa dose de romance e drama para intensificar as emoções e também em sutis intervenções discretas de humor.
 
O filme inicia-se com a exposição de fotos de Linda McCartney (interpretada por Elizabeth Mitchell), em Nova York, no ano de 1995. São fotos clicadas por ela nos anos sessenta, a exibir grandes personalidades, as mais diversas no universo do Rock produzido nessa época, incluso os Beatles. Tal material é admirado pelos visitantes, em meio a um cocktail. Linda mostra-se pensativa e daí mergulha em uma lembrança sua, vivida em 1965, quando assistira no Shea Stadium de Nova York, um show dos Beatles. Um pouco além disso, como repórter de uma revista, ele fora designada para fotografar os Rolling Stones em uma embarcação, e ali, foi paquerada com uma certa insistência por Mick Jagger (interpretado por Matthew Harrison) e Keith Richards (interpretado por Claude Duhamel), que também a observa com uma intenção bem clara nessa ocasião. 
Adiante, ela é mostrada em meio a um show do The Doors, em um clube noturno (Andines Club), e daí, convida Jim Morrison (interpretado por Aaron Grain), para uma sessão de fotos particular e os dois mantém um rápido romance, o que é algo ousado se pensado para um telemovie com intenção amena. Entretanto, que bom que houve essa sinceridade da parte da produção, em não esconder tal passagem de sua vida.  
 
Abro um parêntese para comentar três fatos sobre a produção do filme. Primeiro: o recurso do flashback a ser usado logo no início da exibição desta película, é um clichê observado em nove para cada dez cinebiografias e neste caso, o diretor optou pela chamada “zona de conforto”, sem inovar ou renovar tal cartilha.
Segundo ponto: a atriz que interpretou a personagem, Linda McCartney, foi Elizabeth Mitchell que é uma boa atriz e também a tratar-se de uma mulher muito bonita, no entanto, a despeito da semelhança física com a Linda real, não ser muito grande, o fato é que ao viver a personagem, Linda mais madura, foi algo compatível, mas no flashback a retratá-la como jovem nos anos sessenta, ficou um pouco forçado, mesmo com os esforços empreendidos em termos de maquiagem, cabelo e figurino para rejuvenescê-la, visto que a atriz era bem mais madura do que deveria demonstrar nessa fase da vida de Linda. O uso de duas atrizes com a idade biológica diferente entre si, teria sido uma solução melhor para o filme. 
 
E terceiro ponto, no caso específico de uma personalidade tão forte como foi Jim Morrison em vida, fica difícil para qualquer ator interpretá-lo com a mesma intensidade e profundidade, sobretudo, do que o ator, Val Kilmer o fez no filme, “The Doors” de 1991. Portanto, mesmo sendo uma participação curta, e este ator em específico não ter cometido uma performance ruim, pode-se afirmar; o fato é que não convenceu a contento. É difícil um ator que não caia no estereótipo em retratar Morrison como se fosse um malandro de rua qualquer, dotado de uma aura cafajeste ou um menino mimado. Não basta colocar uma calça de couro, uma peruca a simular cabelo comprido e encaracolado e compor a psiquê de um playboy inconsequente, pois Morrison foi um artista muito mais profundo que o seu estereótipo criado no imaginário popular.
Bem, o filme avança e mostra que Linda fora casada e já tinha uma filha, chamada Heather (interpretada por Jordele Ferllan, quando criança). Ela pede um dinheiro adiantado da editora para ir à Londres fazer uma cobertura fotográfica e visita o bairro do Soho na capital britânica. Foi o ano de 1967 e os Beatles estão a anunciar o lançamento de seu álbum icônico, “Sgtº Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. Em uma ocasião em que vai a um Pub londrino, ela encontra-se com Paul McCartney (interpretado por Gary Bakewell), por acaso e ali conversam. Pequenos saltos temporais mostram Paul mais íntimo, a ligar para ela e combinar novos encontros, em lugares diferentes. Eles aproximam-se cada vez mais e finalmente o namoro oficializa-se. Uma passagem interessante mostra Paul ao contar à Linda, que compusera a música, “Let It Be” em homenagem à sua mãe, Mary McCartney (“When I find myself in times of trouble/mother Mary comes to me/speaking words of wisdow / Lei it be”...).
Um novo salto para 1995, mostra uma cena caseira, onde Linda pratica um autoexame em seus seios e nota a presença de um nódulo, que a preocupa. Após os exames de praxe, o médico confirma a presença de um câncer agressivo e anuncia um tratamento quimioterápico contundente. Cenas simbólicas sobre tal impacto gerado pela notícia, são usadas para acentuar a gravidade da situação, como por exemplo o fato dela notar que está a perder os seus cabelos, aceleradamente, por conta da quimioterapia.
 
Um novo flashback e volta-se à 1969, quando Paul convida Linda a assistir as filmagens do filme/documentário dos Beatles, Let it Be. Claro que Linda tinha plena consciência da vida alterada que Paul enfrentava há anos por conta da sua fama, mas no filme, dá-se a entender que somente ali, em 1969, foi o momento em que ela levara um choque de realidade ao mostrar cenas a enfrentar a multidão de fãs que montava vigília permanente no portão da mansão de McCartney e claro, os boatos sobre a sua pessoa já mostravam-se fortes a dar conta de seu romance com Paul, pois ela é hostilizada por garotas fanáticas pelos Beatles, que naturalmente sonhavam em estar em seu lugar. 
Mais cenas emblemáticas surgem, como por exemplo a conversa rápida que ela mantém com a governanta da residência de Paul, onde a senhora com trejeitos simples, mas a ostentar a típica fleuma britânica, adverte Linda para que ela resigne-se com a rotina em torno das fãs a assediar o seu patrão, dia e noite nos arredores da residência. E também a conhecer a cadela de estimação dele, a sheep dog, Martha, que inspirara Paul a compor a canção, “Martha um Dear’, que pode ser escutada no “White Album” dos Beatles, lançado em 1968. Linda sente na pele a hostilidade, com as fãs de seu namorado enfurecidas a xingá-la, sem nenhum pudor.
Mais um pequeno salto e Paul vai a Nova York para encontrá-la. Ao magnífico som da banda norte-americana, The Turtles, vemos Paul a usar um disfarce ridículo para andar livremente pelas ruas, sem correr o risco em ser assediado, junto a Linda. Paul conhece a família de Linda. O pai de Linda, o senhor, Lee Eastman (interpretado pelo veterano ator, George Segal), foi um advogado renomado e homem de negócios. Ele e o seu futuro genro falam sobre negócios e Paul estava mesmo preocupado nessa época com o rumo perigoso que a empresa fundada em sociedade com os demais componentes dos Beatles (Apple), estava a percorrer e de fato, quando a briga acirrou-se ele buscou a ajuda do seu sogro para representá-lo em processos múltiplos que foram movidos, inclusive entre os membros da banda, uns contra os outros.
 
A seguir, Paul & Linda e mais a filha do primeiro casamento de Linda, Heather Eastman (Paul a adotou legalmente e ela passou a usar oi sobrenome, McCartney, doravante), mudam-se para uma propriedade rural muito rústica que Paul possuía em algum lugar da Escócia. Paul estava fascinado por experimentar uma vida rural onde ele precisasse necessariamente para prover o bem estar da família, cortar a lenha; cuidar de animais e pequenas plantações, como um camponês. Em março de 1969, Paul e Linda casam-se oficialmente e as fãs vão ao desespero, conforme cenas a mostrar a choradeira perpetrada por essas moças (e algumas dessas fãs, nem tão jovens assim).
O clima dentro da banda está péssimo. Por conta de insatisfações as mais variadas e dinheiro incluso, como já salientei ao mencionar a empresa da banda, Apple, sob intenso processo de desmanche. Mostra-se que a filha do casal, Mary McCartney, nasceu. Decorrente das brigas no bastidor dos Beatles, é mostrada uma cena onde Lennon invade a casa de Paul e o hostiliza, inclusive com direito a mostrar violência ao quebrar objetos, bater portas e não respeitar Linda e as crianças, que ficaram bem assustadas com a cena deprimente. 
 
Não posso afirmar que tenha sido um fato real. No entanto, observo que em vários filmes a mostrar o ponto de vista de Lennon em torno da motivação que o levara a ficar nervoso, a história é narrada a mostrar que Paul violara um acordo verbal feito entre ambos, quando Lennon anunciara para a banda que desejava deixar os Beatles e Paul pedira à ele que não comunicasse isso oficialmente pela imprensa e que esperasse alguns meses para tal comunicado ser efetuado. Ocorreu que antes desse prazo pedido, o próprio Paul comunicou à imprensa que deixara a banda e simultaneamente anunciou o lançamento do seu primeiro álbum solo. Neste filme, Paul não dá uma versão mais convincente de que não fora esse o ocorrido, mas apenas mostra-se Lennon irascível, como se não tivesse nenhuma razão, justamente por ter perdido a compostura. 
Em outra cena, ainda pior, mostra-se Lennon a invadir a residência de Paul, para quebrar, mediante uma pedra que acha no jardim, uma vidraça da casa e a seguir proferir uma série de insultos e sair a pular o portão como se fosse um delinquente juvenil. Isso pode ter acontecido, na vida real ou não, a configurar-se como uma licença poética para expressar um momento de tensão, mas certamente que Lennon teve a sua motivação para ter ficado contrariado com a situação.
 
‘Flashforward” novamente e em 1996, Linda está a lutar contra o avanço da doença. O médico propõe o uso de uma medicação ainda experimental, mas que seria algo mais avançado para tentar coibir a devastação cancerígena. Bem, qualquer pessoa a passar por uma situação dificílima desse porte aceitaria qualquer alternativa para salvar-se. Infelizmente, em 1997, Linda piora.
 
Mais cenas mostram o passado, desta feita por volta de 1971, com Paul & Linda na propriedade rural da Escócia e a mencionar, o nascimento de mais uma filha, Stella McCartney. A criação do grupo, Wings, é um momento muito importante na biografia de Paul, mas neste filme, a narrativa logicamente privilegia a presença de Linda nesse contexto. Portanto, a ideia de Paul em incluir Linda, como componente oficial na banda nova que criara, a assusta, logicamente dada a constatação de que ela não era uma musicista. No entanto, a intenção de Paul é estar com a esposa o tempo todo para aliar-se à sua vontade em atuar ao vivo novamente, fator que não exercia desde 1966, quando os Beatles anunciaram que não tocariam mais ao vivo. Então, é mostrada toda a boa vontade de Paul em ensinar Linda a aprender os rudimentos musicais para poder tocar teclados; pandeiro e a cantar afinada nos backing vocals, nem que fosse dentro do limite da simplicidade, visto que ele cercara-se com bons músicos para formar tal nova banda e nesses termos, a participação dela não seria cobrada pela excelência musical, pelo menos em princípio. 
 
O famoso primeiro show do Wings feito de surpresa no Campus da Universidade de Leeds, na região norte da Inglaterra é retratado e a mostrar Linda nervosa em iniciar a apresentação e errar logo o primeiro acorde que tocou e Paul releva, ao demonstrar o pacto   de tolerância e paciência que estabeleceu com a sua esposa, ao esperar pelo seu desenvolvimento musical em plena atividade da banda na estrada, ou a trocar em miúdos, seria como ensiná-la a pilotar um avião, com o aeroplano em pleno ar. A despeito disso, é boa a cena da banda a tocar com energia o clássico cinquentista, “Kansas City” e a retratar a felicidade de Paul em estar novamente na estrada a tocar e também por ter bancado uma ideia aparentemente não muito boa, em ter sugerido a inclusão de sua esposa, uma pessoa sem técnica musical mínima, para tocar profissionalmente em uma banda de Rock cercada por músicos bons. 
 
Essa fase do casal à frente do Wings é mencionada rapidamente no filme, e eu entendo a questão do roteiro ter optado por não dar muita ênfase, mas lamento por outro lado, por ter representado na realidade, praticamente uma década inteira com uma intensa produção de fatos gerados e sim, muito boa música, pois o Wings jamais pode ser comparado aos Beatles pelo conjunto da obra ou pela sua significância histórica, no entanto, produziu bons álbuns e teve vários sucessos memoráveis, como por exemplo quando a canção, “Live and Let Die”, foi lançada para ser tema principal de um filme de James Bond em 1973, e ouso dizer, entre tantas canções-tema importantes que tal franquia cinematográfica colecionou por décadas, essa provavelmente foi a mais famosa de todos os tempos. Bem, o famoso show no Madison Square Garden de Nova York em 1976, é mostrado e a visita cordial do Paul & Linda ao apartamento do casal Lennon & McCartney, é mostrada, porém de uma forma bem tímida, embora mais realista de como fora retratada no filme “Two of Us”, anos mais tarde, mediante uma gigantesca licença poética para dramatizar tal situação.
Em janeiro de 1980, o grupo Wings já havia mudado de formação inúmeras vezes, ao manter apenas o casal McCartney e o guitarrista/baixista e cantor, Denny Laine no grupo. Eles chegam ao Japão para uma nova turnê, e mediante uma revista da polícia alfandegária nipônica, foi achado uma porção de maconha na bagagem de Paul. Ele vai preso imediatamente e a notícia corre o mundo. Ele é ameaçado em ficar preso por até sete anos se condenado, mas após alguns dias encarcerado e a conter muita conversa mediada por seus advogados, a prisão foi relaxada e ele libertado sem processo. Essa foi a gota d´água para ele dar por encerrada a atividade da banda, assim que voltou à Inglaterra. Ainda em 1980, mostra-se a reação de Paul e Linda em face do anúncio sobre o assassinato de John Lennon.
 
Um novo avanço para a frente e em 1997, a família McCartney está em Sussex, na Inglaterra e comemora a palavra do médico oncologista a esclarecer que houvera ocorrido uma pequena melhora no quadro de saúde de Linda, graças à nova medicação. Mas infelizmente isso fora um sinal não definitivo e a seguir, ela sente-se mal. Mesmo assim, ainda houve tempo para Linda obter uma última alegria em vida, pois é mostrada a ascensão profissional de sua filha, Stella McCartney, como estilista de moda.
Linda piora muito e vem a falecer em 1998. As suas cinzas são espalhadas pelas mãos de seus filhos, na Inglaterra e assim, como uma homenagem final, o filme tem o seu término.
 
Como eu já observei, até pelo menos este instante de 2019, quando escrevi esta resenha, esse é um dos poucos filmes a mostrar mais detidamente, Paul McCartney, ainda que a cinebiografada em tese tenha sido a sua falecida esposa, Linda McCartney. O filme cumpre a sua missão, posso afirmar, ao homenagear a pessoa de Linda, certamente uma boa pessoa e portadora de seus méritos pessoais. Por extensão, mostra momentos cruciais, embora melancólicos do momento em que os Beatles estiveram em crise e sob inevitável ação de encerramento de sua carreira; a trajetória do grupo Wings, ainda que estabelecida mediante uma decepcionante parcimônia e também a sua ação como fotógrafa, que foi importante no meio.
 
Aliás, cabe registrar que como fotógrafa, ela trabalhou em algumas revistas antes de prestar serviços para a Rolling Stone, o seu trabalho mais significativo nessa área. Há um dado que é memorável em sua trajetória como fotógrafa nessa importante revista: ela foi a primeira fotógrafa, como mulher, a ter uma foto sua a ilustrar a capa da revista (Eric Clapton, nesta ocasião), e anos depois, a primeira a ser retratada como musicista na capa, após ter sido fotógrafa da própria revista, quando foi exposta como componente do Wings. Ela fotografou além dos Beatles, Rolling Stones e The Doors, já citados, muitos outros artistas importantes. Jefferson Airplane, Bob Dylan, The Animals, The Who, Simon & Garfunkel e muitos outros. 
E sobre Jimi Hendrix, que foi seu amigo, Linda fotografou as sessões de gravação do LP Electric Ladyland, desse astro da guitarra. Uma foto que ela clicou de Neil Young, em 1968, foi usada muitos anos depois (2008), para compor a capa de um álbum desse grande artista, chamado, “Sugar Mountain”.
 
Outros atores não citados anteriormente: Tim Piper (John Lennon), David Lewis (como David Field, o seu biógrafo), Alexander Ruus (como James McCartney, filho de Linda), Chris Cound (como George Harrison), Michael Murtry (como Ringo Starr), Rafe McDonald (como Brian Jones), Jenafor Ryane (como a sua filha, Mary McCartney), Moya O’Connell (como a sua filha, Heather McCartney, em idade adulta), Linda Ko (como Yoko Ono), Michelle Skallinick (como a sua filha, Stella McCartney), Mitchell Parsons (como Bill Wyman), Vincent Flueck (como Charlie Watts) e outros, de apoio. 
 
O filme foi uma produção britânica e norte-americana em conjunto e teve a atuação de uma banda cover dos Beatles para suprir a trilha sonora, chamada “Fab Four”, além de outros artistas modernos para colaborar em reproduções. 
Foi baseado no livro: “Linda McCartney: A Portrait”, de Danny Fields, um jornalista que escreveu outras biografias e foi muito amigo de Linda e esteve representado no filme. Direção musical de J. Peter Robinson. Escrito por Christine Berardo e dirigido por Armand Mastroianni. 
 
Sobre o diretor, antes que alguém especule, aviso que ele não é filho, neto ou sobrinho do ator italiano, Marcello Mastroianni, como muitas pessoas costumam pensar, mas somente alguém a ostentar um sobrenome homônimo.
 
Foi lançado em maio de 2000, com uma repercussão razoável. A crítica realçou a abordagem amena, mesmo em pontos polêmicos, o que eu tendo a concordar em linhas gerais. Considero um bom filme, mesmo porque vem a tratar-se de um telemovie, onde a produção é sempre muito mais modesta do que um longa metragem para o cinema. Foi bastante exibido em canais abertos e na TV a cabo. No Brasil foi exibido com muitas reprises em canais populares de uma forma surpreendente até. Está à venda em formato DVD, nas lojas e sites de vendas do ramo e na internet, ao menos até este instante, a versão integral é possível em ser assistida no portal: “Internet Archive”.
 
Esta resenha foi escrita para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll" através do seu volume II e está disponível para a leitura a partir da página 317.