Vivemos um momento auspicioso na literatura voltada ao campo musical, com um grande número de livros sendo lançados, a abordar inúmeros aspectos dessa forma de arte. A maioria centrada em biografias ou autobiografias de artistas de várias vertentes musicais e quase todos são leituras permeadas por curiosidades muito interessantes da carreira desses grandes artistas, a tornar a sua leitura, algo muito estimulante aos seus fãs. Especificamente a citar o universo do Rock, o fenômeno repete-se, e claro que é muito bem-vinda essa safra de lançamentos a rechear as prateleiras das livrarias brasileiras.
Para ir de
encontro à essa premissa, eis que tomo conhecimento que um amigo pessoal meu,
que reputo ser um dos maiores agitadores culturais na cena Rocker da cidade de
São Paulo, anunciou o lançamento de um livro de sua autoria.
Walter LP Possibom é músico e um blogueiro da pesada, super atuante nas redes sociais da Internet. Fora o fato de ser médico e perito judicial, portanto já ter experiência pregressa como autor de livros técnicos publicados, e assim, claro que de antemão a minha expectativa sobre este livro anunciado, foi a melhor possível, visto que não foi uma novidade que haveria de ser bem redigido.
A grande
questão foi: qual seria o teor de seu livro? Seria um compêndio sobre o Rock? Ensaio; tratado, biografia de algum artista que ele admira, ou a sua própria
autobiografia? Nada disso,
Walter anunciou o lançamento de um romance chamado: “Um Brilho nas Sombras”,
que segundo o próprio autor, trata-se de uma história fictícia, ou como usou como
subtítulo: “Uma Fábula de Rock and Roll”.
Ótimo, que maravilha, eu pensei... uma abordagem diferente, para fugir do padrão normal dos livros que temos visto a falar sobre o Rock. E naturalmente que a minha curiosidade foi despertada para descobrir o que Walter desenvolvera como um romance ambientado pela atmosfera do Rock and Roll.
“Um Brilho
nas Sombras” conta a história de um jovem que descobre no Rock, um sentido para
a sua vida e justamente por tornar-se Rocker, descobre o sentido do amor. A grande teia
de acontecimentos encadeados nessa saga, sustenta a história com desenvoltura, e Walter soube construí-la muito bem. A atenção do leitor é fisgada sem
parcimônia desde o seu início de narrativa e isso é um mérito que nem todo romancista consegue realizar a
contento. Portanto, já é um ponto no placar, mas que vale por muitos. Para falar da
história em si, mas sem contá-la inteiramente para não estragar a expectativa dos
leitores que ainda irão degustá-la , “Um Brilho nas Sombras” conta a trajetória
de um casal formado pelos jovens apaixonados, chamados Andy e Lady Jane.
O foco maior é centrado em Andy, um rapaz jovem, que teve uma vida difícil ao ser entregue a um orfanato, ainda bebê, apesar de ter uma tia consanguínea, que poderia tê-lo criado, mas isso não ocorreu. Na iminência de completar a maioridade, Andy rebela-se e foge do orfanato, ao ir procurar tal tia que o abriga, mas meio a contragosto. Acostumado a ter que se prover sem ajuda, ele arruma emprego em uma loja de discos, a mais incrível da cidade e o seu dono chama-se, Eddie, um músico que alcançou relativa fama no patamar underground da cena Rocker dessa localidade, e como todo bom dono de loja de discos especializados em Rock, é uma enciclopédia humana sobre o assunto. Nesse ambiente promissor, rodeado dos melhores discos da história e com um expert a lhe dar todo o suporte técnico e teórico sobre o assunto, Andy mostra-se arrebatado pelo Rock, ao estabelecer muitas amizades.
Surge o ímpeto de envolver-se na música mais diretamente e Eddie dá todo apoio para que Andy estude guitarra e abre as portas da sua loja para que ele ensaie com a sua futura banda. Andy conhece então, Doug e Allan, jovens como ele e com o mesmo sonho em mente para formar-se uma banda, eis que surge então, “Wild Side Band”.
Todavia, o melhor ainda estava por lhe acontecer. A garota mais linda que conhecera em sua vida, demonstra que também afeiçoara-se à ele. Tal musa inspiradora chama-se, ou melhor usa o apelido: Lady Jane.
Walter
Possibom acertou o ponto doravante, porque
construiu uma trama plena de delicadeza para contar a aproximação do
casal, portanto a extrair o máximo em termos de dramaticidade e poesia, para
explorar tal tema.
Tudo parece bem demais, Andy e Lady Jane apaixonam-se intensamente, a banda vai de vento em popa e o Rock a embalar tudo, com direito a muitas citações Rockers muito pontuais para quem conhece esse universo, e onde duas menções em específico, são chaves da história e eu posso revelá-las antecipadamente sem prejuízo de cometer “spoiler”: a música “Wonderful Tonight”, do guitarrista, Eric Clapton, e um show de David Bowie que o casal assiste com entusiasmo.
Entretanto, como
todo bom romance, há uma virada súbita na história. Entra em cena o rival de
Andy, Harold, também músico e igualmente encantado com a beleza e doçura de
Lady Jane, e aí, a disputa na música e no amor gera a maledicência. A corrosiva
força que a inveja causa não tem precedentes, e sempre traz a reboque a estupidez
da destruição do que é belo. É assim o sentido da guerra, seja no macro, ou no
micro cosmo da sociedade.
E no meio
desse turbilhão de acontecimentos inesperados e terríveis, há brecha para
uma tragédia paralela, onde os personagens da Tia Anita e o bondoso Sr. Robert, um
homem mais velho que aparece na história, ganham importância vital para a
trama. Sobre o teor
maior dessa virada na história, não revelarei os fatos, e assim convido o leitor a
descortiná-lo nas páginas do livro. Só antecipo que gera angústia e torcida,
portanto, mais méritos para o autor.
O capítulo final traz uma resolução para tirar o fôlego do leitor. Ao misturar romantismo, com a força seminal do Rock, gera a sensação de “alma lavada”, e tal desenvolvimento apresenta-se sob um efeito emocional em forma crescente impressionante e se permitem-me, já que o romance tem motivação Rocker, deu-me a sensação do trecho final da música, “A Day in the Life”, dos Beatles, com aquela progressão cromática que conduz o ouvinte ao infinito.
Em suma, trata-se de um
romance muito bem construído, com todos os elementos clássicos do gênero e
ricas alusões ao universo do Rock, como adendo. Aliás, são
tantas as citações ao Rock das décadas de sessenta e setenta, que tal dado deve
ser ressaltado para todo entusiasta dessa escola de Rock clássico. Da loja, “Tye
Die” à banda “Glass House” de seu proprietário; o bar Blue Oyster Pub, cenário
de muitas reuniões dos personagens e a própria banda de Andy, “Wild Side Band”,
são todas elas, referências explícitas ao Rock.
Tirante isso, muitas bandas e músicas reais são citadas diretamente, para reforçar o conceito desse cenário por onde transitam os seus personagens. Outro aspecto, os personagens ostentam nomes britânicos e toda a ambientação sugere que a história se passa em uma cidade inglesa na década de setenta, mas em momento algum isso é explicitado. O autor optou por deixar tais dados em aberto, e assim oferecer assim a oportunidade da imaginação dos leitores determinar qual cenário e época em que transcorre a trama.
Gostei bastante da arte da capa, com uma ilustração em tom pastel, a conter o casal protagonista a caminhar sob o belo entardecer de uma rua, que lembra bastante a arquitetura de Londres. Arte de Vasco Lopes sobre uma foto do acervo de Jeremy Segrott, obtida através do Flickr e Hrynevich Yury/Shutterstock. Parte gráfica a cargo de Marco Martins e edição de Mayara Facchini. Lançado pela editora Chiado de Portugal, que vem a mostrar-se muito ativa, ao abrir portas para autores brasileiros novos, o que é ótimo.
Tive o prazer de buscar o meu exemplar do livro na tarde de autógrafos de seu autor. Da esquerda para a direita, Walter LP Possibom e Luiz Domingues, na livraria Martins Fontes em São Paulo, em uma tarde de julho de 2016. Foto de Érica Possibom
Acima de tudo, “Um Brilho nas Sombras” fala mesmo é sobre o amor e devo dizer, o Rock sabe tratar desse aspecto da vida, também, e Walter Possibom soube explorá-lo com maestria em seu romance. Que venham outros!
Acima de tudo, “Um Brilho nas Sombras” fala mesmo é sobre o amor e devo dizer, o Rock sabe tratar desse aspecto da vida, também, e Walter Possibom soube explorá-lo com maestria em seu romance. Que venham outros!
Sensacional sua resenha. Estou com o meu exemplar aqui em casa e ansiosa para dar a devida atenção à leitura. Como o Walter já colocou, vamos colocar o Rock em seu devido lugar, pois não é apenas um estilo musical, e um estilo de vida. Sua resenha nos mostra claramente a intenção do amigo Possibom, em sua escrita, com o todo o conhecimento de causa e sensibilidade de sua pessoa. Desejo sucesso ao amigo Possibom e como seria bom se seu livro virasse filme e a você parabéns pela resenha, tão bem escrita.
ResponderExcluirMas que legal que apreciou a resenha, e que isso tenha estimulado ainda mais a sua expectativa em ler o livro em questão. Essa é a intenção, naturalmente.
ResponderExcluirSobre o livro em si, Possibom foi muito habilidoso em roteirizar e desenvolver seu romance, acrescentando nele todos os bons ingredientes para um romance criar emoções e com o adendo de possuir o Rock como cenário, e assim, tem um valor extra para Rockers como nós.
Acredito, como você que esse romance tem o poder de ser quase que um roteiro pré adaptado para o cinema e assim tornar-se um bom filme. Se Possibom fosse americano, certamente que já estaria sendo assediado pelas companhias cinematográficas visando comprar os direitos da obra para tal finalidade. Aqui no Brasil não temos essa cultura tão forte e enraizada por conseguinte, mas nada impede que no futuro isso ocorra de fato.
Grato pela visita, leitura e manifestação positiva, com comentário muito pertinente.