terça-feira, 15 de abril de 2025

Filme: Rock'n' Roll High School - Por Luiz Domingues

O diretor, Allan Arkush, mostrava-se afeito ao Rock em sua formação pessoal, por conta de ter sido um funcionário do míticos auditórios, Fillmore East e West, ou seja, um dos principais templos norte-americanos para o Rock nos anos sessenta e setenta (tanto foi assim, que nos anos 1980, ele lançaria o filme : “Get Crazy”, em 1983, para ser preciso, para tentar prestar um tributo ao Fillmore East, cuja resenha desse citado filme, eu também já elaborei e portanto, falo sobre como essa suposta homenagem não configurou-se a contento). 
 
Entretanto, a sua veia natural a pender para o humor mais próximo do pastelão, mostrou-se proeminente. Daí, o diretor, Roger Corman, apareceu com a proposta de produzir uma película a buscar esse caminho e com o enfoque atualizado, moderno, a retratar a conjuntura da música que a juventude de final de década de setenta estava a consumir e pela qual refletisse a época.
Corman foi um diretor especializado em filmes de terror e ficção científica (mais terror), que vinha desde os anos cinquenta a construir a sua filmografia nesse sentido, mas especificamente nos anos sessenta, houvera experimentado (com o perdão pelo trocadilho), uma incursão à realidade paralela construída pelo conceito da contracultura e nesses termos, mantivera uma boa aproximação com o Rock, por extensão. 
 
Tal esforço de sua parte houvera ocorrido principalmente por conta de seu contato direto com um grupo de atores hollywwodianos e que formavam uma confraria de entusiastas pela contracultura & afins, entre os quais, Jack Nicholson, Peter Fonda, Bruce Dern, Karen Black e Dennis Hopper, para citar os principais artífices e por conta disso, Corman lançara filmes tais como: The Wild Angels, The Trip e outros filmes a abordar a juventude sessentista. 
 
Todavia, Corman perdera o fio da meada e ao final dos anos setenta, não continha mais uma referência do que ocorria em termos socio-comportamentais no seio da juventude e por conta disso, buscou em Allan Arkush e outras pessoas associadas, uma fonte para atualizar-se.
Bem, Arkush foi em tese uma boa pessoa a ser consultada se a intenção foi buscar uma retomada cinematográfica para abordar o assunto contracultural. Todavia, para o seu azar em 1979 o que Corman encontraria como sentimento legítimo de uma estratificação cultural natural pelas ruas, seria apenas um mero fruto da formação de opinião detratora, contudo, a veia humorística de Arkush não deixaria a produção tomar um rumo em torno da seriedade, mesmo que a situação assim delineasse-se. 
 
Portanto, se o leitor quiser assistir o filme, “Rock’n’ Roll High School”, a esperar uma continuidade do que Roger Corman expressara em películas que dirigiu ou coproduziu nos anos sessenta com tal teor, pode esquecer. No entanto, se tiver consciência que esta obra em si, trata-se apenas de uma peça sem maiores pretensões a não ser o humor escrachado, constituído pelo "pastelão" clássico do humor popularesco, então, sem problema, estará diante de um típico filme para ser assistido sob soslaio, na sala de estar de sua casa, enquanto a tarde passa lentamente ao seu redor.
Sob um roteiro absolutamente infantilizado, a história é baseada em um argumento remotamente inspirado em uma história verídica ocorrida em uma escola localizada em Milwaukee, Wisconsin, nos anos 1920, em torno de uma greve organizada por alunos, algo impensável para ter ocorrido entre jovens geralmente subservientes e nada contestadores, naquela década. No entanto, foi o mote para construir-se a história desse filme. 
 
Ocorre que neste caso, a ideia de uma diretora que impõe uma disciplina militarizada e logicamente intransigente, incomoda os alunos que desejam a bagunça, pelo sentido amplo da gíria. Nesses termos, uma aluna que é uma fanática seguidora da banda Punk, Ramones, organiza-se, com o apoio de outros alunos Rockers da escola para combater a repressão desmesurada da parte da linha dura adotada pela inspetora, e em torno dessa premissa, todas as piadas são montadas para justificar tal mote e também a trilha sonora.
Bem, o ambiente é a Los Angeles de 1979, e as piadas são grotescas, nada sutis e em alguns casos, constrangedoras até mesmo para a época, portanto, o que dizer décadas depois, quando tornou-se ainda mais fragilizada tal abordagem? Tudo bem, filme infanto-juvenil e inofensivo, se está a milhões de milhas longe de ser considerado uma obra prima, ostenta algo de positivo ao ponto de não ser totalmente defenestrado ao lixo da história, por alguns motivos. Entre os quais, naturalmente em primeira instância a questão da sua trilha sonora.
 
A despeito do fato cabal de eu, particularmente, guardar inúmeras restrições ao trabalho dos Ramones, não é apenas por conta de seu som que a trilha alimenta-se (ainda bem), e é interessante observar a presença de nomes mais significativos em termos musicais, tais como Alice Cooper, Todd Rundgreen; Chuck Berry; Wings; Fleetwood Mac; MC5 e outros. Nesse bojo contém o “Devo”, também nessa trilha sonora, mas tudo bem, isso foi produzido em 1979, fazer o quê, não é verdade? 
 
Aliás, a expectativa inicial seria contar com Todd Rundgreen ou mesmo o grupo, Cheap Trick, para figurar como personagem central e tais artistas não tiveram possibilidade para aceitar por conta de um choque de agenda momentâneo, daí ter sido acionado o plano C, com os Ramones a assumir tal posto.
Sobre as ditas “gags”, são muitos os clichês típicos usados em filme ambientados no espectro estudantil norte-americano, em torno das chamadas :“High School”. Um deles, super surrado, dá-se na figura da aula de música tradicional, com um professor completamente afastado da realidade social a ministrar a sua aula a enaltecer a figura de Ludwig Van Beethoven. 
 
Nesse aspecto, a percepção de que Beethoven é usado como um ícone de algo ultrapassado, revela o viés equivocado do humor popularesco, ao insistir no estereótipo da cultura oficial erudita ser usada como exemplo de algo obsoleto. Isso por si só já revela uma visão preconceituosa e obtusa, portanto, como é possível rir de uma piada construída em torno de tal premissa? 
As cenas das meninas a praticar educação física sob um som tradicional e isso provocar tédio, para em seguida animar-se ao som do Rock tosco dos Ramones, reforça o conceito preconceituoso e fomentado pela tola visão de uma guerra cultural entre o Rock e a cultura tradicional. 
 
Isso recorda-me de alguns debates promovidos pelos meios de comunicação brasileiros nos anos setenta, mediante uma discussão proposta em torno de um conceito, sobre supostamente ter instaurado-se um embate entre o Rock e o samba naquela época, ou seja, uma asneira sem nenhum cabimento sob o ponto de vista do estudo da evolução da cultura, musicologia e nem mesmo sob outras tantas cátedras.
Uma vez assumida a presença dos Ramones como farol a guiar tal produção, o favorecimento ao seu enaltecimento, ficou óbvio. Uma cena, por exemplo, mostra uma escala de valores com o nome de bandas de Rock dos anos sessenta e setenta, e os Ramones a ocupar o patamar máximo. 
 
Foi como se uma lanchonete de bairro colocasse uma placa na sua fachada, ao arvorar-se em vender o melhor sanduíche da cidade, ou seja, uma informação sem valor real algum, além da bravata. Outra cena em favorecimento dá-se no episódio da super fã que acampa na porta de um teatro onde tal banda anunciara um espetáculo e após vacilar por ter dormido, acorda com outra fá colocada à sua frente, à boca da bilheteria. 
 
O diálogo que ambas travam em tom de disputa particular para definir quem é mais fã da banda em questão e assim obter o “direito” de comprar o primeiro ingresso, mostra bem essa predisposição.
Todavia não para por aí. Observa-se aquele clichê em torno dos “experimentos” científicos sobre animais e plantas submetidas à audição de música erudita versus Rock e um rato que assume postura humana e torna-se fã dos Ramones, o professor de música que “converte-se” e também passa a seguir os Ramones, uma infame queima de LP’s de bandas de Rock promovida pela diretora da escola com tendência nazista e a colagem em suas costas de um cartaz com os dizeres: “chute o meu traseiro com força”, bem ao estilo da mentalidade de 5ª série etc... 
Bem, o filme encerra-se com uma rebelião na escola, com direito a um show dos Ramones a realizar-se no pátio da  instituição de ensino e a completa destruição de seu patrimônio (trata-se de cenas verdadeiras da demolição do colégio, e que de fato foi para o chão, mas não fruto de alguma rebelião da vida real, mas por conta de uma ação de engenharia civil), foram usadas para reforçar a dramaticidade.
Sobre os atores, destaque para: PJ Soles, como Riff Randall, Dey Young, como Kate Rambleau, Vince Van Patten como Tom Roberts, Clint Howard, como Eaglebauer (este ator, Clint, apesar de jovem na ocasião, já mostrava-se muito experiente por haver trabalhado desde criança em seriados de TV), Mary Woronov, como a temível diretora, Miss Evelyn Togar, Paul Bartel como Mr. Mcgree e outros atores de apoio, além da presença dos quatro componentes dos Ramones, logicamente e com participação também de Darby “Crash” e Lorna “Doom”, membros da banda Punk, The Germs.
Produção de Roger Corman (errou desta vez, uma pena) e direção de Allan Arkush (que tentaria enfim fazer um filme de Rock a honrar a sua experiência em ter sido um funcionário do auditório Fillmore East, em “Get Crazy”, de 1983, mas a falhar, infeliz e igualmente), “Rock’n Roll High School” foi lançado em agosto de 1979. 
 
Uma sequência foi produzida muitos anos depois, em 1991, com o título : “Rock’n’ Roll High School Forever”. E há boatos sobre uma refilmagem para breve (2019)
O filme foi disponibilizado em versão VHS, logo a seguir; passou bastante nos canais de TV a cabo, foi exibido no Brasil, na famosa: “sessão coruja” das madrugadas ao longo dos anos oitenta. Foi lançado no formato DVD, inclusive várias vezes, para oferecer extras diferentes, e é encontrado com facilidade no YouTube. 
 
Esta resenha faz parte do livro: "Luz, Câmera & Rock'n' Roll" em seu volume II, e está disponível a a partir da página 204

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