O diretor,
Allan Arkush, mostrava-se afeito ao Rock em sua formação pessoal, por conta de
ter sido um funcionário do míticos auditórios, Fillmore East e West, ou seja, um dos
principais templos norte-americanos para o Rock nos anos sessenta e setenta
(tanto foi assim, que nos anos 1980, ele lançaria o filme : “Get Crazy”, em
1983, para ser preciso, para tentar prestar um tributo ao Fillmore East, cuja
resenha desse citado filme, eu também já elaborei e portanto, falo sobre como
essa suposta homenagem não configurou-se a contento).
Entretanto, a sua veia
natural a pender para o humor mais próximo do pastelão, mostrou-se proeminente.
Daí, o diretor, Roger Corman, apareceu com a proposta de produzir uma película
a buscar esse caminho e com o enfoque atualizado, moderno, a retratar a conjuntura
da música que a juventude de final de década de setenta estava a consumir e
pela qual refletisse a época.
Corman foi um diretor especializado em filmes de
terror e ficção científica (mais terror), que vinha desde os anos cinquenta a construir
a sua filmografia nesse sentido, mas especificamente nos anos sessenta, houvera
experimentado (com o perdão pelo trocadilho), uma incursão à realidade paralela
construída pelo conceito da contracultura e nesses termos, mantivera uma boa
aproximação com o Rock, por extensão.
Tal esforço de sua parte houvera ocorrido
principalmente por conta de seu contato direto com um grupo de atores hollywwodianos
e que formavam uma confraria de entusiastas pela contracultura & afins,
entre os quais, Jack Nicholson, Peter Fonda, Bruce Dern, Karen Black e Dennis
Hopper, para citar os principais artífices e por conta disso, Corman lançara
filmes tais como: The Wild Angels, The Trip e outros filmes a abordar a
juventude sessentista.
Todavia, Corman perdera o fio da meada e ao final dos
anos setenta, não continha mais uma referência do que ocorria em termos socio-comportamentais no seio da juventude e por conta disso, buscou em Allan Arkush
e outras pessoas associadas, uma fonte para atualizar-se.
Bem, Arkush foi
em tese uma boa pessoa a ser consultada se a intenção foi buscar uma retomada
cinematográfica para abordar o assunto contracultural. Todavia, para o seu azar
em 1979 o que Corman encontraria como sentimento legítimo de uma estratificação
cultural natural pelas ruas, seria apenas um mero fruto da formação de opinião
detratora, contudo, a veia humorística de Arkush não deixaria a produção tomar
um rumo em torno da seriedade, mesmo que a situação assim delineasse-se.
Portanto, se o leitor quiser assistir o filme, “Rock’n’ Roll High School”, a
esperar uma continuidade do que Roger Corman expressara em películas que
dirigiu ou coproduziu nos anos sessenta com tal teor, pode esquecer. No
entanto, se tiver consciência que esta obra em si, trata-se apenas de uma peça
sem maiores pretensões a não ser o humor escrachado, constituído pelo "pastelão"
clássico do humor popularesco, então, sem problema, estará diante de um típico
filme para ser assistido sob soslaio, na sala de estar de sua casa, enquanto a tarde passa lentamente ao seu redor.
Sob um
roteiro absolutamente infantilizado, a história é baseada em um argumento
remotamente inspirado em uma história verídica ocorrida em uma escola
localizada em Milwaukee, Wisconsin, nos anos 1920, em torno de uma greve
organizada por alunos, algo impensável para ter ocorrido entre jovens
geralmente subservientes e nada contestadores, naquela década. No entanto, foi
o mote para construir-se a história desse filme.
Ocorre que neste caso, a ideia
de uma diretora que impõe uma disciplina militarizada e logicamente intransigente,
incomoda os alunos que desejam a bagunça, pelo sentido amplo da gíria. Nesses
termos, uma aluna que é uma fanática seguidora da banda Punk, Ramones, organiza-se,
com o apoio de outros alunos Rockers da escola para combater a repressão
desmesurada da parte da linha dura adotada pela inspetora, e em torno dessa
premissa, todas as piadas são montadas para justificar tal mote e também a
trilha sonora.
Bem, o
ambiente é a Los Angeles de 1979, e as piadas são grotescas, nada sutis e em
alguns casos, constrangedoras até mesmo para a época, portanto, o que dizer
décadas depois, quando tornou-se ainda mais fragilizada tal abordagem? Tudo
bem, filme infanto-juvenil e inofensivo, se está a milhões de milhas longe de
ser considerado uma obra prima, ostenta algo de positivo ao ponto de não ser
totalmente defenestrado ao lixo da história, por alguns motivos. Entre os
quais, naturalmente em primeira instância a questão da sua trilha sonora.
A despeito
do fato cabal de eu, particularmente, guardar inúmeras restrições ao trabalho dos Ramones,
não é apenas por conta de seu som que a trilha alimenta-se (ainda bem), e é interessante observar
a presença de nomes mais significativos em termos musicais, tais como Alice
Cooper, Todd Rundgreen; Chuck Berry; Wings; Fleetwood Mac; MC5 e outros. Nesse
bojo contém o “Devo”, também nessa trilha sonora, mas tudo bem, isso foi
produzido em 1979, fazer o quê, não é verdade?
Aliás, a expectativa inicial
seria contar com Todd Rundgreen ou mesmo o grupo, Cheap Trick, para figurar como
personagem central e tais artistas não tiveram possibilidade para aceitar por
conta de um choque de agenda momentâneo, daí ter sido acionado o plano C, com
os Ramones a assumir tal posto.
Sobre as
ditas “gags”, são muitos os clichês típicos usados em filme ambientados no espectro
estudantil norte-americano, em torno das chamadas :“High School”. Um deles,
super surrado, dá-se na figura da aula de música tradicional, com um professor
completamente afastado da realidade social a ministrar a sua aula a enaltecer a
figura de Ludwig Van Beethoven.
Nesse aspecto, a percepção de que Beethoven é
usado como um ícone de algo ultrapassado, revela o viés equivocado do humor
popularesco, ao insistir no estereótipo da cultura oficial erudita ser usada
como exemplo de algo obsoleto. Isso por si só já revela uma visão
preconceituosa e obtusa, portanto, como é possível rir de uma piada construída
em torno de tal premissa?
As cenas das meninas a praticar educação física sob
um som tradicional e isso provocar tédio, para em seguida animar-se ao som do
Rock tosco dos Ramones, reforça o conceito preconceituoso e fomentado pela tola
visão de uma guerra cultural entre o Rock e a cultura tradicional.
Isso
recorda-me de alguns debates promovidos pelos meios de comunicação brasileiros
nos anos setenta, mediante uma discussão proposta em torno de um conceito,
sobre supostamente ter instaurado-se um embate entre o Rock e o samba naquela
época, ou seja, uma asneira sem nenhum cabimento sob o ponto de vista do estudo da evolução da cultura, musicologia e nem mesmo sob outras tantas cátedras.
Uma vez
assumida a presença dos Ramones como farol a guiar tal produção, o
favorecimento ao seu enaltecimento, ficou óbvio. Uma cena, por exemplo, mostra
uma escala de valores com o nome de bandas de Rock dos anos sessenta e setenta,
e os Ramones a ocupar o patamar máximo.
Foi como se uma lanchonete de bairro
colocasse uma placa na sua fachada, ao arvorar-se em vender o melhor sanduíche da
cidade, ou seja, uma informação sem valor real algum, além da bravata. Outra cena em
favorecimento dá-se no episódio da super fã que acampa na porta de um teatro
onde tal banda anunciara um espetáculo e após vacilar por ter dormido, acorda
com outra fá colocada à sua frente, à boca da bilheteria.
O diálogo que ambas
travam em tom de disputa particular para definir quem é mais fã da banda em
questão e assim obter o “direito” de comprar o primeiro ingresso, mostra bem essa predisposição.
Todavia não
para por aí. Observa-se aquele clichê em torno dos “experimentos” científicos sobre
animais e plantas submetidas à audição de música erudita versus Rock e um rato
que assume postura humana e torna-se fã dos Ramones, o professor de música que “converte-se”
e também passa a seguir os Ramones, uma infame queima de LP’s de bandas de Rock
promovida pela diretora da escola com tendência nazista e a colagem em suas costas de um
cartaz com os dizeres: “chute o meu traseiro com força”, bem ao estilo da
mentalidade de 5ª série etc...
Bem, o filme
encerra-se com uma rebelião na escola, com direito a um show dos Ramones a realizar-se no
pátio da instituição de ensino e a completa destruição de seu patrimônio (trata-se de cenas verdadeiras da demolição do
colégio, e que de fato foi para o chão, mas não fruto de alguma rebelião da vida
real, mas por conta de uma ação de engenharia civil), foram usadas para
reforçar a dramaticidade.
Sobre os
atores, destaque para: PJ Soles, como Riff Randall, Dey Young, como Kate
Rambleau, Vince Van Patten como Tom Roberts, Clint Howard, como Eaglebauer (este
ator, Clint, apesar de jovem na ocasião, já mostrava-se muito experiente por haver
trabalhado desde criança em seriados de TV), Mary Woronov, como a temível
diretora, Miss Evelyn Togar, Paul Bartel como Mr. Mcgree e outros atores de
apoio, além da presença dos quatro componentes dos Ramones, logicamente e com participação
também de Darby “Crash” e Lorna “Doom”, membros da banda Punk, The Germs.
Produção de
Roger Corman (errou desta vez, uma pena) e direção de Allan Arkush (que tentaria
enfim fazer um filme de Rock a honrar a sua experiência em ter sido um
funcionário do auditório Fillmore East, em “Get Crazy”, de 1983, mas a falhar,
infeliz e igualmente), “Rock’n Roll High School” foi lançado em agosto de 1979.
Uma sequência foi produzida muitos anos depois, em 1991, com o título : “Rock’n’
Roll High School Forever”. E há boatos sobre uma refilmagem para breve (2019)
O filme foi disponibilizado
em versão VHS, logo a seguir; passou bastante nos canais de TV a cabo, foi
exibido no Brasil, na famosa: “sessão coruja” das madrugadas ao longo dos anos
oitenta. Foi lançado no formato DVD, inclusive várias vezes, para oferecer
extras diferentes, e é encontrado com facilidade no YouTube.
Esta resenha faz parte do livro: "Luz, Câmera & Rock'n' Roll" em seu volume II, e está disponível a a partir da página 204
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