Existe
uma boa quantidade de comédias a envolver o Rock, diretamente, entre as quais, algumas são
excelentes e já foram objeto de minha análise. Há uma segunda categoria, a usar
o Rock como mote, mas sob outros aspectos, mais indiretos, digamos e também
se arrola algumas que são boas. Igualmente existe uma quantidade de filmes, a
caracterizar uma terceira via, em tom de comédia a usar o Rock apenas como um pano
de fundo e a despeito desse tipo de peça poder ser considerada menor no universo
dos Rock Movies, algumas merecem uma menção, nem que seja pelo fato da boa
trilha sonora utilizada como apoio ou por conter algumas menções interessantes,
e é justamente o caso deste filme, “The Stoned Age”, que em português recebeu o
nome: “Dois Loucos na Noite”.
Aliás, tal título em português, apesar de haver
colocado-se totalmente fora do contexto da intenção original da produção
norte-americana, por incrível que pareça foi muito mais condizente com o seu
teor, e ao longo da resenha o leitor vai entender bem qual foi a razão que eu
fiz uso para defender tal tese, visto que a tradução livre a designar algo como: “A Era dos Drogados”, soaria pesado em demasia perante a nossa compreensão
cultural luso-brasileira.
Neste caso,
os pontos que precisam ser salientados como positivos, na realidade são poucos.
Em linha geral, trata-se de uma comédia popularesca, com forte conotação
sexista e mostra-se reducionista, se levar-se em consideração que o machismo
apresentado, apesar de supostamente retratar a mentalidade de uma época mais
remota e a justificar-se como uma marca de um outro estrato cultural e ultrapassado em tese, é
abominável, na prática.
E reduz igualmente o conceito sobre o que representa
realmente ser um Rocker, visto que a exemplificação aqui é superficial, no
sentido em mostrar um bando de garotos incautos e imaturos que não são Rockers
verdadeiramente, mas que seguramente apenas seguiram um modismo de ocasião, ao
adotar o Rock como uma predileção musical por osmose e por conseguinte, usar
longas cabeleiras e figurino condizente com o padrão setentista, mas sem nenhum
ideal a justificar tal identidade, verdadeiramente.
Ora, se a
comédia é fraca e os clichês abundam-na, por quê eu perdi o meu tempo em
escrever uma resenha para esta peça cinematográfica que mostra-se seguramente
subalterna dentro do universo dos Rock Movies?Justamente por que existe algo interessante
a ser ressaltado, mesmo que tal fatores positivos estejam representados por
apenas alguns detalhes ínfimos.
Antes de
comentar sobre a história retratada neste filme, eu preciso mencionar que a
produção é bastante falha. Ao tratar-se de uma produção norte-americana e mesmo
que tenha sido sob um padrão mediante baixo orçamento, é bastante precária a
direção de arte (a fotografia também é muito ruim), algo surpreendente, aliás,
pois o cinema norte-americano nunca deixa de caprichar, mesmo que a verba seja
curta, nesse específico detalhe. Costuma ser impecável a retratação em um filme
de época, um ponto de honra para o cinema estadunidense, no entanto, se a
proposta deste filme foi ambientá-lo nos anos setenta, acredito que deixou
muito a desejar, pois um espectador desavisado vai assistir e acreditar
piamente tratar-se de um filme dos anos noventa, aliás, a data real quando ele foi
realizado.
Nesses termos, abundam pequenos detalhes, inclusive tecnológicos a
denunciar objetos e outras questões ali mostradas que simplesmente nem existiam
nos anos setenta. A começar pelo figurino, onde vê-se jovens, inclusive um dos
protagonistas, a usar uma indumentária bem típica dos seguidores da moda
“Grunge”, tipicamente noventista e talvez os responsáveis pelo figurino
aprovaram tal indumentária, ao imaginar que lembrava a vestimenta usual de um Rocker setentista, no entanto, isso é
algo tão gritantemente anacrônico, que decididamente depõe contra a obra.
É o
tal negócio: o ator encena “Cyrano de Bergerac” no teatro, no período noturno e resolve
aproveitar a mesma peruca para gravar as cenas de um filme ambientado entre os
anos sessenta e setenta do século vinte, a interpretar um hippie, no dia
seguinte pela manhã, ao imaginar que basta aparentar usar um cabelo longo para caracterizar
bem tais épocas culturais tão distintas entre si, mas simplesmente não é assim
que funciona. Por isso o departamento de arte, figurinos e cenários, tem que estabelecer
um trabalho de pesquisa a mostrar-se minuciosamente estudado para fazer-se um
filme de época, pois não é pela observação superficial que consegue-se o
resultado ideal. E falhas assim, extraem a credibilidade do texto, mesmo que
ele seja bom, pois fica a impressão amadorística a obscurecer o bojo da obra.
Imagine então tal demérito em uma comédia rasa, sem substância no texto.
Bem, se esta
comédia é fraca, contém falhas estruturais no tocante à sua produção e traz uma
tonelada de clichês, alguns desagradáveis, inclusive, o que realmente salva-se nesta
obra a justificar esta resenha? São dois pontos, e o primeiro deles é sobre a
questão da trilha sonora. Ao ambientar a ação nos anos setenta, ao menos houve a
preocupação em escolher canções de artistas dessa ocasião. Mesmo assim, ainda a
ressaltar as falhas, há lapsos, pois houve por exemplo o caso de uma canção que
somente fora lançada no início dos anos oitenta, mesmo que fosse pertencente a
uma banda setentista (Blue Öyster Cult).
Não sei nem o que dizer, pois o baixo
orçamento disponibilizado não pode justificar a falta de uma pesquisa básica. Tirante
esse erro lastimável, a trilha sonora é muito boa ao contar com músicas de
artistas do calibre de: Deep Purple, Montrose, T.Rex, Black Sabbath, Foghat,
Ted Nugent, Focus e outros, além de artistas da seara da Soul Music/Funk
& Disco Music, casos do KC and The Sunshine Band, The Trammps e B.T. Express entre outras.
E o segundo
ponto positivo na película, é algo inusitado eu diria, pois parece muito pouco
para justificar ser destacado, todavia, é uma menção curiosa. Trata-se da
participação da atriz, China Kantner, como uma das protagonistas. O que tem
demais essa moça, além de ser muito bonita (e à época dessa produção, bem nova),
e por contar com o seu exótico nome, “China”, que é o seu nome de batismo de
fato e não um apelido? Pois tal notoriedade não reside tampouco no fato dela
ser uma norte-americana caucasiana e não oriental (e nem mesmo descendente de
chineses), mas simplesmente por ser filha dos famosos, Paul Kantner & Grace
Slick, respectivamente guitarrista e vocalista do grupo de Rock, Jefferson
Airplane (e posteriormente da banda dissidente, Jefferson Starship), um dos
mais famosos da cena psicodélica de San Francisco, nos anos sessenta.
Se há
algo verdadeiramente Rocker nesse filme, certamente que é a presença de China
Kantner, embora o papel que ela tenha interpretado não tenha sido o de uma Rock
Star ou coisa que o valha, mas ao contrário, a designá-la como a uma moça
comum, e Rocker por conveniência, tal qual todas as outras personagens dessa
trama.
Sobre a
história, creio que não valha a pena narrar-se com um maior detalhamento, como eu
costumo proceder em uma resenha de filme, pois realmente a sua trama é muito
fraca, mas sobretudo, por considerar que descrever esse roteiro não acrescenta
nada. Traçarei um resumo breve e destacarei algumas piadas um pouco mais sutis,
algo raro em um filme que optou pelo humor mais rústico.
Muito bem,
dois jovens adolescentes, Joe Connoly (interpretado por Michael Kopelow) e
Michael Hubs (interpretado por Bradford Tatum), são hedonistas despreocupados
com outras ocupações a não ser a busca incessante por noitadas regadas a
bebedeiras e consumo de drogas, diversão barata mediante interesses em comum
com outros garotos de sua idade, e sobretudo, a procurar pela companhia
feminina em busca do sexo livre. Eles andam com um carro todo decorado mediante
o uso de decalques auto adesivos a exibir logotipo de bandas de Rock setentistas
e dirigem a ouvir cartuchos a conter os discos de seus grupos prediletos. Eis
que eles são informados que haverá uma festa em algum lugar da cidade (Torrance, Califórnia) e que duas garotas muito bonitas, participarão.
Nesse ínterim, a
informação é vazada e outros rapazes também interessam-se em participar. A
ideia inicial é invadir uma residência desocupada, algo bem trivial na cultura
jovem norte-americana e neste caso, para reforçar a piada, a casa em questão
pertence ao ator e cantor, Frankie Avalon, que fora muito famoso nos anos
sessenta, na vida real, ao protagonizar inúmeros filmes juvenis ambientados na
praia, ao ponto em ter sido adjetivado como um membro da “turma da praia”, na
ocasião. Bem, confusões ocorrem entre os adolescentes, com brigas concretizadas
pelas vias de fato e a polícia a acionada, com mais confusão a ser gerada.
Eis que as
garotas em questão entram em cena. Lanie (interpretada por Renee Griffin) e
Jill (interpretada por China Kantner), são duas meninas dotadas de uma beleza
estonteante e as rapazes ficam desnorteados. O sexismo e o machismo inseridos
no mote desse filme, reverbera em torno das expectativas geradas portanto entre
os dois casais, visto que na mentalidade juvenil dos meninos, as garotas são
meros objetos sexuais. Eles as consideram como: “chicks”, uma gíria
tipicamente norte-americana que tem uma conotação mais pesada do que pensamos,
pois denota exatamente a expectativa masculina padrão em torno da mulher
objeto.
A contrapartida é que as meninas também nutrem uma mentalidade
semelhante, mas não em termos de submissão ou resignação em assumir um papel de
inferioridade nas relações humanas, mas por usar tal predisposição machista
como um ardil para obter o que desejam. A trocar em miúdos, é a atitude daquele
tipo de garota que usa a sedução para manipular os rapazes e obter o que deseja
deles, nem que seja o simples prazer em torturá-los psicologicamente, ao
excitá-los com o uso da sensualidade insinuada e não a satisfazê-los a posteriori.
Bem, não deixa de ser um tipo de machismo, igualmente.
Uma confusão
ocorre e os rapazes caem em uma armadilha com outros oponentes a expulsá-los e
prender as meninas, mas eis que eles conseguem fugir e resgatar as meninas, a
pular muros pela vizinhança e até a usar a piscina alheia em algum momento.
Uma
vez na residência de Jill, eles ficam bem alterados e uma alucinação de Joe
remete a uma visão do show do grupo, “Blue Öyster Cult e também visões com o
“Eye Ball”, um ícone psicodélico em termos gráficos.
Eis que Hubs & Lanie
sobem ao quarto e Joe & Jill ficam embaixo a conversar. Joe, apesar de
esforçar-se em ser desinibido, na verdade é tímido e demora muito para tomar
uma atitude em relação à Jill e quando Joe desce, este diz que encerrara o sexo
com Lanie e que esta aguardava por Joe no quarto, para praticar sexo com ele,
igualmente. Ele vai ao quarto, mas quando chega ao recinto, a vê adormecida.
Quando desce e bem desapontado por conta disso, flagra o amigo Hubs com Jill no sofá a
beijar-se, ou seja, o amigo lograra um êxito duplo com as meninas e ele, Joe,
não ficara com ninguém.
Eis que o
pai de Jill chega repentinamente em casa e sozinho, dá cabo dos adolescentes,
inclusive dos demais que rondavam a residência, talvez na cena mais engraçada
do filme, pelo inusitado em ver um homem de meia idade e sozinho, a abater
muitos garotos fortes com menos da metade da sua idade e sem ser portador de
nenhum super poder ou a carregar armas letais, no entanto imbuído apenas do seu
poder braçal e humano, mesmo.
Joe e Hubs
conseguem fugir, a polícia enquadra os demais adolescentes bagunceiros e o
filme encerra-se com a dupla a ouvir o som do Blue Öyster Cult no cartucho do
carro, ao dar a entender que a rotina será mantida por mais um bom tempo por
ambos, a cada nova noite em busca da diversão em meio aos anos setenta. E para
o consolo de Joe, Jill deixara-lhe um bilhete, para que ele a procurasse em
outro endereço, mais tarde. Destaca-se uma cena extra, onde os rapazes
protagonistas aparecem com camisetas dessa banda e ao descobrir que são pirateadas
e não oficiais, as recusam das mãos de Eric Bloom e Donald “Buck Dharma” Roeser,
dois membros verdadeiros de tal banda citada, que aparecem como cambistas de
seu próprio show. E o ator, Frankie Avalon, em pessoa, aparece para uma cena
rápida a interpretar a si mesmo, como o dono da residência invadida.
Nos
registros sobre a história desse filme, consta que a intenção inicial de seus
realizadores, fora utilizar muitas músicas do Led Zeppelin como parâmetro para
sedimentar a narrativa. No entanto, como é bem sabido, obter a permissão a usar os direitos autorais dos fonogramas e edição de uma banda desse porte, é muito
difícil, para não dizer impossível, mesmo caso dos Beatles e dos Rolling
Stones, portanto, optou-se por uma outra safra de artistas a compor a trilha e
nesse quesito, como já informei, muitos sons ótimos são escutados.
Uma pena por
outro lado, visto que pelo que eu entendi, a intenção da produção seria modificar
significativamente o roteiro, ao utilizar as músicas do Led Zeppelin como um parâmetro
ao estilo de um libreto de ópera, portanto, nesse caso o filme ganharia um
outro verniz mais sofisticado, eu acredito.
A
acrescentar outros atores que participaram, cito: Clifton Collins Jr. (como
Taks), Kevin Kilner (como o policial Dean), o comediante Taylor Negron (como
Clerk), David Groh (como o pai lutador de Jill), Michael Wiseman (como o irmão
de Crump), Art Chudabala (como Mike Dick), Daniel Collins (como Crump), e
outros.
Escrito por
James Melkonian e Rich Wilks, foi dirigido por James Melkonian. Lançado em
1994, é tratado como uma produção barata e consequentemente como uma atração
menor, feita para ser exibida no máximo na sessão da tarde, para ser assistida
sob soslaio enquanto cochila-se no sofá, após o almoço, mas pelo teor sexual e
a envolver cenas com drogas e bebidas, além do linguajar chulo, ao pensar bem, acredito
que seja mais adequado em assistir-se em meio a uma eventual sessão coruja, no
avançar da madrugada e com a certeza que os pais estejam a dormir, caso o
espectador seja um adolescente, tal qual os atores protagonistas deste filme.
Brincadeiras à parte, esse filme realmente
transitou em exibições desse teor, sem maior destaque. Ainda assim, foi lançado
em formato VHS na época e posteriormente ganhou versão em DVD. Está disponível
no YouTube, na versão integral e gratuita, na época em que escrevi a resenha (2019).
Esta resenha foi escrita para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll, em seu volume III, com a leitura disponível a partir da página 254.
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