quinta-feira, 6 de setembro de 2012

O Mecenato de Ciccillo - Por Luiz Domingues



Tendemos sempre a valorizar a obra artística pelo viés do seu realizador. Ao artista, entrega-se os louros da vitória e consequentemente, da imortalidade. Contudo, não é apenas pela genialidade criativa do artista que nós dependemos para dar vazão à difusão cultural.
Uma séria de fatores e pessoas são importantes nesse processo e entre elas, a figura do mecenas, é fundamental. A palavra "mecenas" designa pessoas dotadas de posses e que usam suas fortunas pessoais para patrocinar artistas, ao dar-lhes o suporte financeiro para que possam dedicar-se à sua criação, ao máximo e mais que isso, promove e difunde a sua arte para o mundo.
A etimologia da palavra deve-se à existência de um cidadão romano que viveu no século I antes de Cristo, chamado : Gaius Cilnius Mecenas, e que por ter sido um homem agraciado com muitas posses e apaixonado pela beleza artística, usou o seu dinheiro e prestígio político para bancar poetas e pensadores de sua época, tais como Virgílio; Horácio e Propertius. Contudo, foi a partir da Idade Média que a figura do mecenas ganhou força e a instituição "mecenato", tornou-se sinônimo de amor a arte.
Francisco Antonio Paulo Matarazzo Sobrinho, nasceu em São Paulo, em 20 de fevereiro de 1898. Filho de Andrea Matarazzo, irmão do Conde Francesco Matarazzo. Desde a tenra idade, ganhou o apelido de "Ciccillo". Herdeiro de um império industrial, passou boa parte da infância e adolescência a estudar em bons colégios italianos e belgas.
De volta ao Brasil, assumiu parte das indústrias da família, mas independente de seu lado empresarial, era apaixonado por artes plásticas.  Sempre inserido nas rodas intelectuais formadas por professores da USP, traçou uma meta ousada junto ao crítico de arte, Sergio Milliet e o arquiteto, Eduardo Kneese de Mello : a criação de um museu de arte moderna na cidade de São Paulo.
Em contato com o empresário norteamericano, Nelson Rockfeller, estabeleceu um acordo de cooperação com o MoMa, o Museu de Arte Moderna de Nova York e lança assim as bases para a criação do MAM, o Museu de Arte Moderna de São Paulo. Em 1948, lançou portanto, o estatuto oficial da instituição, em consonância com o museu novaiorquino e em 1949, ele foi inaugurado oficialmente, ao utilizar inicialmente, as instalações localizadas em um espaço na Rua 7 de abril, número 230, no centro de São Paulo, ao dividir o seu espaço com o também embrionário, MASP, Museu de Arte de São Paulo, que utilizava o mesmo endereço nessa época.
O MAM mudou-se enfim para um espaço exclusivo, em 1958, em um pavilhão dentro do Parque do Ibirapuera. Ainda ao final dos anos quarenta, ao lado de seu amigo de infância, Franco Zampari, criou o TBC, o Teatro Brasileiro de Comédia, importantíssimo espaço no coração do bairro do Bexiga, onde revoluciona o teatro paulista e brasileiro. E dentro do TBC, ajudou decisivamente Franco Zampari a criar a Vera Cruz, uma companhia de cinema com planos ambiciosos, no sentido de seguir o padrão hollywoodiano de produção cinematográfica.Pois então, construiram estúdios em São Bernardo do Campo / SP, adquiriu-se equipamento norteamericano de ponta e contrataram técnicos europeus experientes, além da nata dos atores do teatro brasileiro para o seu elenco.



Simultaneamente, Ciccillo não mediu esforços para realizar em São Paulo, a Bienal de Arte, nos moldes da Bienal de Veneza. Realizou a primeira Bienal em 1951, ainda a utilizar o MAM como fomentador, mas logo a seguir criou a Fundação Bienal, que passou a ser a gestora da Bienal, aliás, até hoje. Por ocasião dos festejos do IV Centenário da Cidade de São Paulo, em 1954, Ciccilo foi o presidente da Comissão Organizadora dos festejos e participou ativamente da criação do Parque do Ibirapuera e para tanto, na contratação do arquiteto, Oscar Niemeyer, que fez todo o projeto das edificações.


Em 1963, o MAM é doado à USP, e recentemente, 2011, voltou ao Parque, agora a utilizar as amplas instalações que foram usadas pelo Detran, por décadas.  Ciccillo deixou a presidência da Fundação Bienal em 1975 e faleceu dois anos depois, em 1977.


Seu dinheiro e seu tempo foram muito bem gastos e certamente o prazer que teve em fazer tanto pela arte e cultura, foi o seu retorno, com lucro incalculável.
Foi um mecenas exemplar, desses que lamentamos a falta.



Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu e republicada no Blog Pedro da Veiga, ambas em 2012

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