domingo, 3 de junho de 2012

Chico e Suas Múltiplas Faces - Por Luiz Domingues



Enaltecer a obra genial de um artista ultra talentoso e multimídia como foi Chico Anysio, é incorrer no óbvio ululante. Em meio a inúmeras manifestações de pesar e retrospectivas que inundaram a mídia por ocasião de seu falecimento, muito já foi dito nesse sentido.
Impressionou-me sobretudo uma declaração em meio às diversas que assisti. A atriz, Marília Pera, foi feliz ao dizer que ele poderia ser comparado ao grande, Charles Chaplin, pois como o britânico, também escrevia; dirigia; produzia, atuava e muitas vezes foi responsável também pela trilha sonora de seus programas humorísticos.
Essa é uma verdade da qual ninguém pode discordar, é claro. Talvez o humor de Chico não fosse uma unanimidade, embora quase possa dizer-se que chegou bem perto dessa marca. Por alcançar as camadas mais simples da população, com um humor coloquial, mas não exatamente popularesco, como o praticado por Renato Aragão, por exemplo.
Chico criou personagens profundamente críticos dos maneirismos da sociedade brasileira. Entre os seus mais de duzentos personagens criados, muitos destacaram-se sob tal olhar crítico que ele possuía. E de fato, ele tinha o dom da observação arguta, ao reproduzir vozes; trejeitos; sotaques, e sobretudo por criar dúzias de bordões que influenciaram gerações de telespectadores.
Como fala-se geralmente, os seus bordões "pegavam" e as pessoas os repetiam aos borbotões pelas ruas, do Oiapoque ao Chuí.
O seu primeiro personagem criado ainda para o formato radiofônico, foi o do Professor Raimundo.
Levado posteriormente à TV, tornou-se um dos seus maiores êxitos, não só por ele em si, mas também por proporcionar a criação de outros tantos personagens curiosos, a o fornecer a reboque outros grandes comediantes. Sem dúvida que o Professor Raimundo foi uma crítica dura à falta de empenho (algo crônico) do governo com a educação de qualidade. Ao lidar com uma classe de alunos, formada por perfeitos idiotas mal formados, o Professor sofria para dar-lhes uma melhor condição educacional, ao desmascarar a falta de apoio governamental e ainda por cima, a denunciar os salários de fome que costumeiramente são oferecidos aos professores.
Outro personagem muito interessante é o político corrupto, Justo Veríssimo. Não é preciso alongar-se muito para explicar a sua razão de ser, a não ser para revelar o seu clássico bordão : -"eu quero que pobre se exploda". Alguma semelhança com a vida real em Brasília ?
E o "Coalhada" ? Não é o típico deslumbrado e super mal preparado jogador de futebol que entra em evidência e só diz asneiras aos repórteres ?
Lembra-se do "Nazareno" ? O mal ajambrado funcionário público, desmotivado e mal remunerado, que empurra a vida com a barriga, para acomodar-se na mediocridade.
Outro exemplo de um típico cidadão emergente e despreparado é o galã de novelas, "Alberto Roberto". Um pedante forjado pela fama, mas que não passa de um canastrão iletrado.
Ainda a satirizar esse mundo de vaidades dentro do universo da própria TV, Chico foi muito crítico, pois além de "Alberto Roberto", criou também o personagem, "Bozó", um arrogante funcionário da Rede Globo, que para toda a situação em que envolvia-se, dava a sua "carteirada", ao exibir o crachá daquela instituição, como se trabalhar nessa emissora fosse um salvo conduto. Chico sabia que muitos que trabalham lá, pensam de fato dessa forma...

Lembra-se de "Al Cafone" ? Um mafioso brasileiro, extremamente boçal e inspirado no Al Capone de Chicago ?


"Canavieira" é outro político populista e corrupto. Vivia a inaugurar obras inacabadas e inúteis, para embolsar o dinheiro superfaturado das licitações fraudulentas. "Paulo Jeton", era outro político que amava a mordomia brasiliense...

"Capitão Trovão" era um ex-torturador a serviço de um governo autoritário e que vivia a encontrar as suas vítimas.

Entre os ditos, "coronéis" nordestinos, verdadeiros senhores feudais em seu comportamento opressor, ele criou vários: "Coronel Limoeiro"; "Coronel Bezerra"; "Coronel Candinho"; "Coronel Lidu", "Coronel Lindomar"...
Nos motes místicos ou religiosos, também buscou inspiração para provocar os falsos Gurus; profetas; líderes religiosos e videntes.
Nesse mote, como não lembrar-se de personagens sensacionais tais como : "Tim Tones"; Profeta"; "Divino", "Painho", "Velho Zuza"; Padre Miguel...?
"Lingote"; "Baiano e Os Novos Caetanos", "Jovem", "Zelberto Zel" e tantos outros que satirizaram a juventude e suas gírias; manias e maneirismos.

Malandros tipicamente cariocas como "Tavares", "Lord Black" e "Azambuja", devem ter sido criados com o Chico a caminhar pelas ruas do Rio de Janeiro, a observar o movimento no Largo da Carioca; Cinelândia e Praça Tiradentes.
Um de seus personagens mais adorados, chegou a motivar a criação de um livro. Foi o caso do personagem mitômano, "Pantaleão", que mentia compulsivamente e cujo bordão clássico : -"é mentira, Terta " (?) foi objeto de um livro lançado nos anos setenta.
"Santelmo" foi um personagem que brincava com a utopia. Seu mote era ser tão honesto, que jamais mentia. Uma ironia fina que o cinema norteamericano abordou também no filme, "Liar", protagonizado por Jim Carrey, cujo personagem era um advogado que ao ser enfeitiçado, ficou impossibilitado em mentir, para gerar diversos embaraços aos seus clientes, nos tribunais.

Enfim, arrolei alguns, mas não todos e em cada um, a ironia fina e crítica esteve muito bem delineada e o humor de Chico fez com que o povo brasileiro risse muitas vezes, dele mesmo.
Tenho certeza de que ele chegou ao céu com o seu bloquinho de notas; uma canetinha esferográfica e já está a observar aquelas pessoas trajadas com camisolões brancos, a pisar em nuvens. Logo mais, lança mais personagens geniais...
Matéria publicada inicialmente no Blog Pedro da Veiga, em 2012.

4 comentários:

  1. Inesquecível Chico Anísio, jamais terá um outro igual. Deus não fez duplicata de Chico Anísio.

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    1. Olá, Vilma !

      Sim, tem toda a razão, um artista com a genialidade de Chico é inimitável. De fato, trata-se de uma personalidade única.

      Muito grato pela visita e comentário !!

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  2. Saudoso Chico Anísio, que Deus lhe dê o merecido descanso. Descanse em Paz!

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    1. Certamente que sim, e mais do que merecido descanso após ter trabalhado tanto e deixado-nos esse enorme legado.

      Vilma Gueiros : estou feliz por sua visita, volte sempre ao meu Blog, e saiba que tenho outras matérias sobre rádio e TV, disponíveis para leitura.

      Grande abraço !!

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