Durante décadas, o cinema de rua fez a alegria dos paulistanos, quando sob uma enorme profusão, esteve espalhado por todos os bairros da cidade.
Salas de todos os tamanhos, simples ou luxuosas, atraíam famílias inteiras, jovens e pessoas maduras, a criançada nas matinês, os casais de namorados e sobretudo, cinéfilos inebriados pela sétima arte e os seus múltiplos encantos.
Santana, Cambuci, Ipiranga, Butantã, Lapa, Perdizes, Mooca, Belenzinho, Vila Maria, Casa Verde, Tatuapé, Vila Formosa, Brooklin, Freguesia do Ó... a lista foi enorme de bairros bem servidos por salas de cinema.
E haviam também em profusão, os cinemas étnicos! Os grandes cineastas, Carlos Reinchenbach e Rogério Sganzerla, entre outros cinéfilos, foram inveterados frequentadores dos Cine Niteroi e Joia, no bairro da Liberdade, que exibia filmes japoneses e sem legendas!
De Griffith a Chaplin, Greta Garbo & Rodolfo Valentino, aqueles "Westerns" sensacionais do John Ford (incluso Howard Hawks, até Sergio Leone), épicos bíblicos (Ben-Hur a disputar corridas com bigas, Moisés a abrir o Mar Vermelho), os grandes musicais, filmões de guerra, Errol Flynn a lutar com capa & espada, Basil Rathbone a resolver casos impossíveis em sua interpretação do detetive, Sherlock Holmes...
As chanchadas brasileiras da Atlântida (Oscarito e Grande Othelo a provocar filas nas bilheterias, no sábado à tarde). As comédias malucas de Jerry Lewis, 007, o espião britânico com licença para matar, Elvis, the Pelvis e seus filmes de roteiro único (Elvis canta, encanta as mocinhas e briga com os rapazes encrenqueiros, não nessa ordem, necessariamente!)...
As matinês da criançada, com desenhos clássicos das décadas de trinta e quarenta... filmes de terror da Universal ou da Hammer, os maravilhosos filmes Sci-Fi, toscos da década de cinquenta...
Já pensou em sair de casa e caminhar por poucos quarteirões para passar uma noite a assistir Fellini 8 & 1/2? Como podem ter desaparecido de uma forma desoladora, se a paixão pelo cinema não arrefeceu-se e as salas insossas instaladas em Shopping Centers continuam a lotar, a todo vapor?
São muitas as razões e somadas, talvez desemboquem mediante um funil, chamado: "especulação imobiliária".
Culpar a popularidade da TV (e mais recentemente a explosão da internet), como diversão de massa, certamente não convence ninguém, em princípio.
Apontada logo que surgiu como vilã, a TV pode ter feito uma certa concorrência inicial, mas jamais poderia ser apontada como principal causadora do fenômeno, porque o prazer de ver cinema na tela grande, não modificou-se com o seu advento, ao final dos anos quarenta (no Brasil, no início dos anos 1950). Na verdade, a decadência dos cinemas de bairro, começou para valer só na segunda metade da década de setenta.
A deterioração social e urbana do entorno das salas, só pode ser creditada à região do centro velho e talvez do bairro do Brás e aí, o prejuízo não foi só para os cinemas, mas para todos os estabelecimentos.
Além do mais, ao seguir a decadência, muitas salas só adequaram-se à esse padrão ainda nos anos setenta e passaram a exibir filmes de sexo explícito ou produções classe "Z", mediante a projeção de filmes com o mote das artes marciais, produzidos por obscuros cineastas asiáticos.
Avanços tecnológicos são também apontados como possíveis fatores em correlato. A explosão popular do videocassete, no início dos anos oitenta, com a consequente profusão da "febre" observada em torno das videolocadoras, a chegada da tecnologia do "Laser Disc" (que instantaneamente se mostrou um fracasso comercial, de forma inexplicável), a chegada da TV a cabo, uma nova explosão com o DVD, as TV's de Plasma e LCD; Blue Ray a desbancar tudo, 3-D a prometer maravilhas esfuziantes e por fim o vasto mundo da Internet via YouTube e outros tantos portais... mas os cinemas de shopping continuaram a produzir filas e as salas de cine-clubes, idem, com o seu público mais seleto e cativo, em busca de cinema alternativo.
Dessa maneira, só podemos concluir que os fatores da segurança e falta de estacionamento, foram mais determinantes para essa derrocada das antigas salas de rua, para afastar os espectadores, que passaram a se sentir mais seguros dentro de Shoppings (e quando lembro do caso do massacre ocorrido em uma sala de cinema do Shopping Morumbi em 1999, penso: "pero no mucho"...).
Um a um, os cinemas de bairro fecharam as suas portas e com isso, para deixar um vazio enorme, em que somente sobrou a saudade. A maioria dos espaços físicos que os abrigou, tornaram-se estacionamentos ou igrejas de orientação evangélica e alguns chegaram a passar por um estágio como bingo, quando da explosão desses estabelecimentos de jogatina desenfreada, nos anos noventa.
Cinéfilos promoveram diversas ações, apelaram ao poder público, especularam sobre o possível tombamento do imóvel, mas por enquanto o imóvel está fechado, a deteriorar-se de forma triste. Particularmente, eu não sou contra os cinemas de Shopping Centers.
Claro que a programação dessas salas ao estilo "multiplex" atendem uma demanda em torno dos interesses do cinema comercial, o dito: "blockbuster" e sendo assim, há pouco espaço, para não dizer nenhum, destinado à exibição de filmes não coadunados com essas produções mais populares. Todavia, existem boas salas de cinemas alternativos, nas quais essa produção mais diferenciada, tem guarida.
Aqui no Rio tb não é diferente Luiz! A famosa praça do centro, chamada Cinelândia, tem no nome seu passado glorioso e glamouroso, mas hoje só restou um, graças a Deus que restou!
ResponderExcluirAchei o máximo as descrições dos filmes e as fotos que você colocou, especialmente a do filme "O mentiroso", com um banner enorme, e o antigo letreiro do belas artes, também é incrível! Devia ser maravilhoso ir ao cinema em São Paulo nesses tempos!
Eu sei que no Rio é igual, Fernanda. Fui muitas vezes ao Bruni Copacabana, entre outros cinemas de bairro por aí. Aqui em São Paulo era a mesma coisa, com cinemas aos montes espalhados por todos os bairros.
ResponderExcluirQue legal que curtiu a matéria !! De fato, tenho muita saudade desse tempo, onde assisti filmes maravilhosos. Realmente, o Belas Artes era um espaço incrível não só pela programação escolhida a dedo, mas pela localização estratégica, na esquina da Rua da Consolação com a Av. Paulista.