A primeira
fase da carreira dos Beatles, foi marcada pela explosão da Beatlemania, e
certamente que é muito efusiva, embora sob uma análise fria, não pode ser
considerada revolucionária pela música; conteúdo das letras, tampouco arranjos
musicais inovadores ou performance instrumental e vocal deslumbrante. Calma,
leitor, pois com isso não estou a afirmar que não gosto dos álbuns iniciais dos Beatles, e
da sua fase a fazer uso dos terninhos e cabelos considerados longos para os padrões da época,
mas bem curtos pelo que veio depois no cenário do Rock. Pelo
contrário, gosto bastante desses álbuns iniciais, a conter Rock’n Roll in
natura; doses maciças de R’n’B; Soul music; baladas; pop bubblegum, e que tais.
Todavia,
inegavelmente, foi a partir da segunda fase da banda, no pós-1966 que a
excelência musical tornou os Beatles, a mais revolucionária banda do mundo,
a justificar plenamente o posto que já havia alcançado como a mais famosa e a considerar
que a fama nem sempre é argumento irrefutável em termos de qualidade artística. Nessa
metamorfose criativa que alcançara após o lançamento dos álbuns Rubber Soul e
Revolver, a loucura ganhou carta branca nos estúdios Abbey Road e sabiamente, o
produtor, George Martin abriu a sua mente e embarcou junto nesse conceito de
experimentação artística total, ao dar vazão para que a banda lançasse os seus
melhores álbuns doravante, e propiciar daí em diante que entrasse na história.
Dentro desse
contexto, John Lennon mergulhou de cabeça no processo criativo total e mais que
isso, tomou consciência de seu poder influenciador como ídolo em alcance
mundial.
Influenciado
por Yoko Ono, uma artista plástica avantgarde, e pouco interessada na
efemeridade da fama pop, Lennon deu vazão ao seu lado sociopolítico e tornou-se
um ativista, quando tornou-se incisivo a expressar a sua opinião, e usando sua fama para defender a
causa da paz; pelo fim das guerras; da exploração e da fome no mundo. A sua voz dentro do trabalho dos
Beatles já enveredara para esse caminho do ativismo antistablishment, mas foi
em sua carreira solo que ele deu foi mais contundente a respeito do mundo dominado
pelos interesses escusos; da mesquinharia e da truculência da geopolítica
bélica, em favor de corporações e massacrar as pessoas, a visar o dinheiro,
pura e simplesmente.
Claro que
ele comprou uma briga e tanto com os poderosos de plantão. Tornou-se o inimigo
público número um dos Estados Unidos, a incomodar pelo simples fato em pregar a
paz e criticar a estupidez da Guerra do Vietnã.
O governo
Nixon não mediu esforços para deportá-lo, ao usar todo o tipo de esforço
jurídico para negar-lhe o Green Card, que garantir-lhe-ia a residência naquele
país, ao usar como argumento um fichamento ocorrido na Inglaterra por posse de
maconha, ainda nos anos sessenta.
Não sou apologista das drogas, contudo,
contesto veementemente um julgamento moral pífio dessa natureza, no sentido de
que consumir marijuana seria execrável sob o padrão de moralidade dessa gente, mas
arremessar bombas Napalm sobre crianças e idosos indefesos, algo válido... enfim, nem quero continuar essa discussão sob valores e hipocrisia. O FBI e a
CIA grampeou e o perseguiu de todas as formas. Claro que outras agências
internacionais coalizadas com o serviço secreto norteamericano permaneceu com a atenção voltada aos seus movimentos,
também.
Destemidamente,
Lennon seguiu em frente, ao lançar os seus álbuns solo, plenos de canções com forte teor pacifista. A canção,
“Imagine”, por exemplo, soa piegas para alguns, mas contém em seus versos, uma
aula de supraconsciência.
Um mundo sem
fronteiras, sem diferenciações, onde todos são iguais, aponta para uma
sociedade livre do egoísmo e das mesquinharias materialistas. É um sentido igualitário que nada tem a ver com o pensamento marxista e totalitário, pois pelo contrário, em nada combina com o sentido libertário que ele defendeu. No entanto, o ideal
hippie da fraternidade total entre os homens incomodava / incomoda as
corporações. Para essas pessoas que só pensam no dinheiro, e pouco incomodam-se em relação ao estrago que causa por conta de sua sanha, Lennon e os seus sonhos em torno da
fraternidade & paz, tornou-se um empecilho aos seus planos.
Ridicularizá-lo
teria sido um caminho, mas ídolo mundial que era, certamente que uma campanha,
ainda que velada, poderia surtir efeito contrário, a martirizá-lo e assim os
marqueteiros do mal evitaram tal procedimento, pelo menos em um primeiro instante. Foi quando
Lennon teve uma sacada genial, e para ironizar o imbróglio que o governo
norteamericano havia criado para negar-lhe o Green Card, e ter assim elementos para
expulsá-lo dos Estados Unidos, eis que ele anunciou um manifesto, ao criar um país fictício
chamado : “Nutopia”.
Esse
neologismo por ele criado, tratou-se da junção das palavras : “New” (novo / nova), com
“Utopia”.
Esse estado
fora assumidamente fictício em termos territoriais, mas apresentava-se como um estado a requerer reconhecimento internacional e nesses
termos, seriam considerados cidadãos de “Nutopia” , todas as pessoas que
compactuassem com os seus ideais de liberdade; paz & fraternidade total. Ao bastar apenas estar em acordo com tais preceitos, qualquer pessoa poderia ser considerada uma
cidadã de “Nutopia” , e mais que isso, “embaixador(a)” daquele país. Ao seguir
esse raciocínio, Lennon apelou para o governo norteamericano, a “imunidade
diplomática”, em um ato de rebeldia e a configurar um autêntico tapa de luva de pelica aos que o
perseguiam.
Lançado o
manifesto em 1° de abril de 1973, para ironizar o dia da mentira, continha em seu
texto original os seguintes dizeres :
“We announce the birth of a
conceptual country, NUTOPIA. Citizenship of the
country can be obtained by declaration of your awareness of NUTOPIA. NUTOPIA has no land, no boundaries, no passports, only
people. NUTOPIA has no laws other than cosmic.
All people of NUTOPIA are ambassadors of the country.
As two ambassadors of NUTOPIA, we ask for diplomatic
immunity and recognition in the United Nations of our country and its people”.
Na tradução livre :
“Nós
anunciamos o surgimento de um país conceitual, chamado Nutopia. A cidadania
deste país pode ser obtida pela declaração de sua consciência (quanto à
existência) de Nutopia. Nutopia não possui território, não tem fronteiras, não
emite passaportes; possui apenas gente. Nutopia não dispõe de nenhuma lei além
das leis cósmicas. Todas as pessoas de Nutopia são embaixadoras do país. Na
condição de embaixadores de Nutopia, nós pedimos imunidade diplomática e
reconhecimento, pela ONU, de nosso país e de seu povo”.
Eis o vídeo
da declaração de Nutopia, disponível no You Tube :
Outro vídeo
a explicar os propósitos desse país fictício :
O estandarte
de Nutopia, era / é uma bandeira inteiramente branca, e a sua simbologia dispensa
maiores explicações, acredito. Todavia,
“Nutopia” foi além da provocação e ironia fina. A visão do
país sem fronteiras, onde as pessoas seriam aceitas pela afinidade com os ideais
fraternais, revelara por trás de um simples manifesto / statement com efeito
artístico / estético / mercadológico, algo muito mais profundo.
A
supraconsciência por trás dessa suposta utopia, era / é uma realidade a insinuar uma lógica muito avançada. Acima de
qualquer conspurcação torpe, perpetrada pela pequenez de detratores incautos,
supraconsciência responde à parâmetros de cosmoética.
Um mundo sem
mesquinharias, é sobretudo um triunfo do homem sobre o seu próprio Ego. Lennon deixou-nos em 1980, assassinado por um psicopata. Perdemos muito com a falta de sua
inteligência, milhas acima da média, e sobretudo sobre a sua determinação para sonhar com um mundo
melhor, e inevitavelmente a incentivar-nos a embarcar dentro desse sonho, também.
Os
detratores adoram usar a expressão : “O sonho acabou”, extraída da música “God”(de
1970, contida no álbum “Plastic Ono Band”), e fora de contexto, para ironizar o
fim do sonho Hippie. Contudo, não vejo graça alguma em uma colocação desse tipo, no
sentido de que só perdemos com essa inversão de valores, pois sem sonho, não
andamos para a frente e viver no pesadelo dos escombros niilistas, não leva-nos
à parte alguma, além da desolação e decorrente subserviência ao materialismo. Yoko Ono
mantém os ideais do casal vivos em ações midiáticas nos dias atuais, mas sem a mesma força que
teriam se Lennon estivesse conosco, fisicamente, até hoje.
Uma dessas
ações pró-Paz, dá-se em manter um site aonde em alguns segundos, é possível qualquer pessoa cadastrar-se e tornar-se um cidadão de Nutopia, e assim adquirir o status de embaixador
desse país dos sonhos. Eu, Luiz
Domingues, sou um embaixador de Nutopia, e acredito em um mundo fraternal, sem
guerras e sem egoísmo.
Se você
quiser tornar-se um cidadão desse belo país, acesse o link :
Matéria publicada inicialmente na Revista Gatos & Alfaces, em 2014.
Até coloquei "Rubber Soul" para escutar. Eu leio TUDO até hoje que me aparece pela frente e escuto TUDO a respeito dos Beatles. Confesso que sou um doente beatlemaníaco. Mas, sem dúvida a partir de 1966 eles deram um salto, quando, estranhamente, começaram a sofrer mais, em função da percepção de estarem sendo usados pelo sistema. Daí o sofrimento e depois a revolta. Grande matéria, Dominguez.
Grande Elmo !
ResponderExcluirImpressionante como pensamos de forma igual. Também sou um admirador sem reservas do Fab Four, e sempre enxerguei na sua obra, algo muito além da música, simplesmente.
E gosto muito da segunda fase da banda, onde acredito, a criatividade chegou no ponto máximo, abrindo cabeças, e promovendo mudanças na sociedade.
No meu caso, tenho a percepção que Lennon tomou consciência de seu poder de fogo criativo como artista, e como líder sociopolítico, quando encontrou Yoko.
Sei que é uma opinião polêmica, pois a lenda urbana fez de Yoko uma figura odiada por quase todos os fãs dos Beatles, mas eu nunca embarquei nessa ideia, e pelo contrário, acho que ela fez muito bem para ele, pois o fez acreditar que era mais que um Rock Star, mas um tremendo artista.
E no caso de todas as ações que perpetrou em causas sociopolíticas, sou muito fã de sua militância em prol da paz, sobretudo, mas também com respingos em tantas coisas importantes, tais como a fraternidade; compartilhamento; respeito; tolerância etc etc.
Muito grato por ter lido, comentado e compartilhado comigo a sua experiência pessoal com a música mágica do Fab Four, da qual também sou grande fã !!
Luiz, acabei de ler....Putz...Seu texto é importantíssimo! Principalmente neste momento crítico que o mundo está atravessando e também o nosso país (ainda com cinquenta milhões em miséria absoluta?..). Eu li e nem acredito na alegria que estou sentindo!...
ResponderExcluirEspetacular explicação sobre a Nutopia e tudo o que Ela significa! Parabéns!!!
Muito obrigado por esta Grande Obra que com certeza servirá de Norte para muitos "navegadores" do Brasil que desejam saber mais sobre o movimento libertador conduzido/ criado por John Lennon e se engajar mais "ativamente" Nele!
Vlw!
Rock On!
Franklin :
ExcluirQue prazer para mim ler um comentário tão entusiasmado de sua parte !!
Espero mesmo ter dado essa contribuição, ainda que modesta, para manter vivo o ideal de Lennon & Yoko, por Nutopia, e tudo o que representa esse conceito fantástico de fraternidade sem fronteiras; sem diferenças, com todos realmente se reconhecendo como irmãos.
Que possamos despertar nos jovens atuais, esse entusiasmo que demonstrou aqui pelo tema.
Que a Fraternidade Rock'n Roll, espalhada em várias Redes Sociais, mantenha a chama de Nutopia, viva !
Rock on !!
Parabéns pela Obra magnífica que vc postou, Luiz! Já esperava isso há muito tempo, só aguardava o momento certo de vc fazer isso! Muitíssimo obrigado em nome de toda nossa Fraternidade Rock'n'Roll que também é um "pedacinho" desta Sociedade Alternativa fundada por John Lennon! Vlw Fera!!
ResponderExcluirExato, Professor !!
ExcluirJá tinha te avisado tempos atrás, que a matéria estava pronta, mas precisava cumprir um tempo útil em sua primeira aparição, nas páginas da Revista Gatos & Alfaces, onde teve uma boa repercussão.
A Fraternidade Rock'n Roll presa tanto o conceito, que tem até uma sessão especial no Google+, com um destaque muito importante.
É por aí, mesmo. O sonho de Lennon ,imaginando um mundo sem fronteiras; sem preconceitos e sobretudo, sem guerras, é o mesmo de Gandhi. O "Ahimsa" do Mahatma foi a base da militância dele, Lennon, também.
E vamos nessa, fazendo a nossa parte para transformar este planeta !
Sem palavras Luiz, texto magnífico!
ResponderExcluirFantástico apoio e elogio, amigo Michel Custódio !
ExcluirMuito grato por ler e participar com comentário !
Que matéria linda,amigo!
ResponderExcluirBRAVO!!!!!
Saudade dessa época de paz e amor!
Bjus
http://www.elianedelacerda.com
Mas que legal que gostou !!
ExcluirO desafio é fazer desses ideais do casal John & Yoko , o padrão de normalidade para este planeta. Esse é o ideal de Nutopia !
Beijo e obrigado pela visita e manifestação sempre positiva, amiga Elyane !
Sensacional!! Conteúdo extremamente pertinente! Seu texto contribui para fortalecer esses ideais maravilhosos que foram sustentados por esse grande ícone da música, da arte, do amor e da paz.
ResponderExcluirParabéns Luiz! E muito obrigada por nos presentear com essa obra linda! Grande beijo, querido.
Vanessa :
ExcluirMuito legal que tenha curtido. Particularmente, tenho um apreço muito grande pelas ações do casal Lennon & Yoko, pelas sua militância positiva em torno da igualdade, fraternidade e sobretudo a paz.
Em tempos anti-Hippies, que negam tais ideais e justamente fomenta ideias antagônicas de truculência; ódio e desunião, relembrar tais passagens do casal, principalmente perpetradas entre o final da década de sessenta e início da de setenta.
Grato por ler, comentar e entusiasmar-se pela causa !!
Beijo, amiga !!
Bem legal sua reportagem! Eu vi uma entrevista da Yoko comentando que em todos os shows havia gente da CIA e o FBI. Pra nós brasileiros, falar em Nutopia, daria para pensar em "false friends", como é chamado no inglês, ou seja, pares de palavras que apresentam sentidos totalmente diferentes.
ResponderExcluirMuito legal que tenha curtido, amiga Lourdes !
ExcluirA perseguição da CIA e do FBI sobre o casal foi implacável, como questão de honra para Nixon. Está na pauta comentar tais ações, que inclusive são objeto de um documentário chamado : "Lennon X Nixon", famoso na grade de canais a cabo, tipo History; Discovery e similares.
No caso da confusão com o neologismo que citou, nunca havia pensado nisso, tampouco lido a respeito. Portanto, ótimo adendo de sua parte.
Grato pela participação sempre bem vinda !!
Muito interessante essa reportagem Luiz! Que bom seria se esse mundo na qual Lennon, queria transformar, fosse real. Vivermos em uma piramides de hierarquia, que sempre o mais alto , nesse caso a CIA e o FBI, para não deixar acontecer! Vou entrar no site e viver virtualmente um pouco dessa liberdade e igualdade. Quem sabe, um dia possa ser realizado esse sonho né???
ResponderExcluirObrigada por compartilhar.
Abraço!
Mas que bacana que apreciou, amiga Bete !
ExcluirO sonho de um mundo sem guerra; miséria e egoísmo, é um ideal que todos devemos seguir com orgulho, pois representa uma passo além para a humanidade carcomida de mesquinharias.
Visite sim o Site de Nutopia, pois vale a pena se engajar nesse sonho.
Grato por participar !!
Emocionante seu texto Luiz, como é bom imaginar uma sociedade praticando um pouco dessa ideologia, saindo do "umbiguismo"!! Obrigada por reavivar esse sonho dentro de nós!
ResponderExcluirMuito legal que tenha gostado, amiga Jani !!
ExcluirO sonho não pode acabar, como muitos opositores tanto se esforçaram para destrui-lo...
Abração !
Peace & Love !!
Excelente leitura, eu como sempre aprendendo mais sobre a história do rock e boa musica com seus textos, abraço e obrigado!☮ ✌
ResponderExcluirMas que maravilha trazer sua consideração aqui, amigo Kim !
ExcluirSeu elogio tem um peso extraordinário a incentivar-me mais e mais.
Peace and Love !!
Viva Nutopia !!