sábado, 28 de dezembro de 2013

Roger Dean e a sua Pintura Intergalática - Por Luiz Domingues


No mundo da música em geral, após o advento do CD e a inevitável derrocada dos velhos discos de vinil, um conceito tornou-se uma máxima : tudo bem, a tecnologia de áudio avançou, mas a redução em termos gráficos, das capas para o padrão do compact disc, destruiu um ícone visual que fora inerente aos velhos LP's. Fato consumado, esse chavão foi ouvido com frequência entre os consumidores de discos no pós-1983, quando pareceu que o vinil esteve irremediavelmente condenado à extinção sumária. Abnegados colecionadores relevaram tal perspectiva, todavia, e continuaram a colecionar vinis, sem importar-se com o modismo imposto pela novidade advinda da modernidade tecnológica.

Nos tempos modernos (2013), os vinis voltaram a ser produzidos, e pick-ups são vendidas novamente em profusão nas lojas, inclusive as populares e especializadas em eletrodomésticos. E e o CD é que parece estar condenado ao limbo, atualmente, o que é irônico e prova cabal de que as pessoas agem por impulso e sob as ondas de modismos virais, criados pelos famigerados "formadores de opinião"...

Para falar especificamente das capas, no início, elas mosravam-se  simples, ao limitar-se a descrever o nome dos artistas e das canções, e com o tempo, puseram-se a sofisticar-se.


Com o passar dessa fase inicial, ideias mais criativas iniciaram a ser empregadas, para fugir da simplicidade burocrática anteriormente adotada pela indústria ao apresentar uma foto promocional do artista, ou de uma paisagem bucólica qualquer.

Capas concebidas com extrema originalidade marcaram tanto, que a inerente valorização da obra musical com tal advento foi inevitável e a sua repercussão animou artistas; produtores fonográficos, e todos os envolvidos nessa cadeia comercial, ao abrir caminho para que essa prática difundisse-se de uma forma irreversível. Enfim, isso é assunto para outra matéria, pois aqui o preâmbulo serveapenas  para marcar a ideia de que as capas dos discos de vinil, marcaram época por vários aspectos.

E se o assunto é capa de disco, logo surge em nossa imaginação a produtora, Hypignosis, responsável por capas geniais do Pink Floyd, e também na pessoa de Roger Dean, um artista plástico e designer, cujo currículo a contribuir para a história do Rock, é gigantesco. Nascido em Ashford / Kent, Inglaterra em 1944, Roger formou-se na Canterbury College of Art em 1968, e posteriormente fez mestrado no Royal College of Art, de Londres. Envolvido com diversos músicos da cena londrina, ele criou a sua primeira capa para o "The Gun", uma interessante banda, mas não muito difundida na época. Todavia, a sua ilustração chamou a atenção e outros convites abundaram em seu atelier. De 1968 até 1980, inúmeras capas de discos para bandas importantes do Rock britânico, tiveram a sua prestigiada assinatura.




A lista é grande : "Nucleous"; "Lighthouse"; "Dr. Strangely Strange"; "Osibisa"; "Ramases"; "Clear Blue Sky"; "Keith Tippit Group"; "Budgie"; "Greenslade"; "Gentle Giant";"Babe Ruth"; "Atomic Rooster"; "Badger"; "Gravy Train"; "Uriah Heep"; além de artistas solo como Steve Howe; Alan White; Rick Wakeman, e da própria Orquestra Sinfônica de Londres.

Mas sem dúvida que a banda que mais identificou-se com o trabalho de Dean e vice-versa, foi o "Yes". A música sofisticada do quinteto britânico caiu como uma luva à ambientação intergalática com que Dean gostava de pintar.

Ao retratar planetas exóticos, habitados por alienígenas híbridos, Dean propôs com as suas ilustrações, um verdadeiro mergulho na música cerebral dessa banda inglesa.

Qual fã do Yes (incluso este que vos escreve), não passou o tempo de execução dos respectivos álbuns onde ele desenhou as capas, a divagar, literalmente, em suas ilustrações ? A visão de Dean, sempre a intercalar o fantástico mundo de civilizações alienígenas e tecnológicas, com elementos orgânicos, deixa nas entrelinhas, a questão ambientalista como mote.

O elemento onírico também é forte na obra de Roger Dean. O Rock progressivo do Yes, muitas vezes a flertar em suas temáticas com aspectos esotéricos, transcendentais & afins, revelou-se perfeito para a criação do artista plástico.

Em "Tales From Topographic Oceans", por exemplo, a fantástica concepção de sua capa realçou a mensagem da banda, expressa em quatro canções, inspiradas no pensamento de Paramahansa Yogananda.

Além de ter sido o ilustrador de tantas capas, Dean é também um designer de interiores, além de criador de logotipos, não só para alimentar o mundo artístico, mas no corporativo em geral. Como designer de interiores, a sua criação de uma poltrona chamada : "ouriço-do-mar", abriu-lhe a oportunidade de chegar em uma outra criação, chamada "Retreat Pod", que chegou a ser usada como objeto de cena no filme "A Clockwork Orange", de Stanley Kubrick. Uma outra criação sua, e muito chamativa é a "Curvilinear House", um protótipo de habitação que muito assemelha-se com as ilustrações que criou para as capas dos discos que assinou. Morar em uma residência assim, seria como "entrar" dentro de suas famosas capas, literalmente.


Alguns shows do Yes obtiveram a sua cenografia toda desenhada por Dean, em pessoa, ao recriaro a atmosfera das capas, também.
A partir da metade dos anos oitenta, Dean foi requisitado para um outro mundo novo que surgira e rapidamente alastrou-se : o dos video-games. Desde então, são inúmeros os jogos com a sua assinatura na concepção  artística. 

Ele ainda produziu algumas capas para o Yes; Uriah Heep, e discos solo de ex-membros do Yes, inclusive nos dias atuais, mas absteve-se em trabalhar para outras bandas na mesma profusão com a qual trabalhara nos anos setenta. Dean também lançou livros muito lindos com suas criações. "The Flights of Icarus"; "Views"; "Magnetic Storm"; "Dragon's Dream"; são obras que merecem fazer parte da biblioteca de quem aprecia arte; ilustrações; lisergia; cultura Sci-Fi, ou apreciadores de Rock Progressivo, que associam tais imagens à musica.


Muitas de suas ilustrações também estão disponíveis no formato poster, com boa impressão gráfica e portanto dignas de ser enquadradas. Nos anos setenta, tornou-se comum a prática observada por Rockers mais abonados ao ter o privilégio de possuir uma reprodução de Dean em suas respectivas residências como item de decoração. Nesse caso, é claro que as ilustrações para as capas mais famosas do Yes, foram as mais solicitadas. 

Quem tem familiaridade com o trabalho de Roger Dean, desde o final dos anos sessenta, tomou um susto quando o filme, "Avatar" foi lançado, pois todo aquele universo alienígena retratado, mostrara-se como uma concepção genuinamente ao estilo de Roger Dean...

Bem, não foi à toa que o diretor, James Cameron e toda a produção do filme estão a responder a um processo movido pelo Roger Dean, pois de onde teriam vindo as ideias para a criação das criaturas; ambientações e civilização mostrados em tal filme ?

Roger Dean é um tremendo artista criativo e foi um dos que mais compreendeu o espírito do Rock setentista, ao expressar com imagens o caráter transcendental da música que tais artistas propunham. Recomendo com muito entusiasmo a sua obra e deixo aqui o link de seu site oficial : 

http://www.rogerdean.com/


quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Entrevista de Luiz Domingues para o Site Linkself

http://www.revolinkself.com.br/index.php/edicao/coluna-musica-para-viver/45-especial-entrevista-com-o-baixista-luiz-domingues

Concedi entrevista para o Site Linkself !

Leia e comente !!

Foto : Grace Lagôa

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Mobilidade Urbana - Por Luiz Domingues

Muito tem sido comentado sobre o estrangulamento do trânsito nas megacidades, mas a verdade é que esse problema já espalha-se também por cidades de menor porte. A falta de investimentos maciços em transporte público, por parte dos governantes, aliado aos interesses da indústria automobilística, sem dúvida que são fatores que impulsionam esse colapso.

Em diversas outras matérias que escrevi, para abordar algumas nuances dessa problemática, sempre deixei cravada a opinião de que uma ação isolada não resolve um problema complexo dessa magnitude. O investimento maciço no metrô, parece ser a medida número um nessa equação, mas como eu já salientei, não é a única.

O apoio de uma integração com os trens de subúrbio, é necessário e não descarto a existência dos aerotrens, ao cumprir interligações inteligentes inter / bairros. Nada disso basta, pois não podemos abrir mão dos ônibus tradicionais e para tanto, a experiência da abertura de corredores exclusivos, com a possibilidade de tais veículos poder circular mais rapidamente, é fundamental.

Nesse quesito, a prefeitura de São Paulo tem agido corretamente em forjar tal prática, ainda que tenha gerado alguns transtornos inevitáveis no processo de implantação. Em uma cidade gigantesca como São Paulo, parece inevitável que qualquer medida que seja adotada, pode desagradar um grupo de pessoas, mas não tenho dúvida que a existência de um corredor exclusivo, é imprescindível. A experiência de cidades como Bogotá, na Colômbia e a Cidade do México, capital do país asteca, tem que ser usada como exemplo, onde os corredores contém centenas de Kms, em apoio ao Metrô.

Sobre a questão das ciclovias, também já citei bastante tal recurso e tem muito ciclista que não entende certas colocações de minha parte. Eu já deixei muito bem explicado, mas reitero : acho que o incentivo à prática do ciclismo urbano, tem que ser total por parte do poder público, desde que sejam criadas ciclovias seguras e muito bem sinalizadas. No entanto, deixo a ressalva de que os ciclistas precisam urgentemente conhecer a regulamentação que  cabe-lhes dentro do Código Brasileiro de Trânsito. Não respeitar os sinais básicos de trânsito, como o semáforo; indicação de faixa de segurança para pedestres e circular sobre calçadas, é abominável como conduta a revelar a prática de civilidade; cidadania e respeito ao próximo.

Outra questão que defendo com ênfase, é o incentivo ao uso dos táxis. Se a tarifa do táxi fosse mais convidativa, quantos carros particulares não sairiam das ruas ?  Em conversa com taxistas amigos, sei que a reivindicação deles por melhores condições de trabalho, passa além da redução do preço dos combustíveis para a categoria, e dos impostos na hora da aquisição de um carro novo. Para poder abaixar a tarifa, esses profissionais defendem um programa de auxílio à manutenção do carro.

Convenhamos, o desgaste de um táxi vai muito além do carro particular de passeio e não acho absurda a reivindicação deles, pelo contrário. O governo que mais preocupa-se em arrecadar com a obrigação da inspeção veicular, poderia bem usar essa estrutura montada que na prática somente foi montada para arrancar dinheiro extra dos proprietários de veículos (é bem sabido que o IPVA já deveria garantir essa inspeção, não é mesmo ?), para garantir o suporte mecânico, mais em conta para os taxistas. Outra medida que poderia funcionar, é a da proibição sumária de tráfego de veículos particulares pelas ruas do centro da cidade, e sobretudo com a volta dos bondes urbanos a circular em trajetos curtos.

Se os bondes nunca deixaram de funcionar, e pelo contrário, são funcionais e charmosos em cidades europeias, não vejo por que não poderiam voltar a operar em percursos sob pequeno porte e assim a desafogar as entupidas ruas do centro, de cidades como Rio e São Paulo, só para citar duas que estão caóticas pelo acúmulo de carros nas ruas. A verdade é uma só : se o transporte público fosse abundante e com qualidade, muita gente deixaria o carro particular na garagem e só o usaria para um passeio no final de semana.

Se não o fazem, é por que desejam evitar o sufoco em submeter-se a ser espremidos como sardinhas dentro da lata. Se conseguem sentar-se decentemente; com limpeza e iluminação adequada, sinalização e sobretudo com abundância de opções e tudo sem período de espera descomunal, as pessoas perderiam o receio em usar o transporte público.

Entretanto... a indústria automobilística não iria gostar muito de vender menos carros, e como um efeito dominó, ameaçariam demitir funcionários das montadoras. O governo sempre corre para socorrer a indústria e não vai querer ser responsável pela queda da taxa de empregos e consumo. Políticos não vão gostar de observar corte de verbas para as suas campanhas eleitorais...

Ou seja, é como a velha propaganda daquele biscoito / bolacha : "Vende mais por que é mais fresquinho, ou é mais fresquinho justamente por vender mais" ?


Publicado inicialmente no Blog Planet Polêmica, em 2013

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Kim Kehl & Os Kurandeiros - 18/12/2013 - Quarta-Feira - 21:30 h. - Magnólia Villa Bar - Lapa - São Paulo - SP


Kim Kehl & Os Kurandeiros

Dia 18 de dezembro de 2013

Quarta-Feira - 21:30 h.

Quarta Blues

Rua Marco Aurélio, 884

Lapa

São Paulo - SP

Kim Kehl & Os Kurandeiros :

Kim Kehl - Guitarra e Voz
Carlinhos Machado - Bateria e Voz
Luiz Domingues - Baixo

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Eugênio Kusnet, de Pupilo a Mestre - Por Luiz Domingues

Vivemos em plena Era do compartilhamento, graças à popularização em massa da internet, mas principalmente por conta das redes sociais, que estimulam as pessoas a postar fotos; vídeos; músicas e daí gerar-se os comentários inevitáveis. O lado bom disso, é o espírito quase messiânico de fraternidade que tal possibilidade gera, e o ruim, é pela possibilidade do mau gosto ser difundido a esmo, sob vários aspectos. Mas isso não vem ao caso agora, pois foge do mote desta matéria. Quis falar sobre o compartilhamento de ideias, pois antes do modismo da internet, a forma mais tradicional para passar qualquer tipo de conhecimento, foi através da relação mestre / pupilo. 

Foi exatamente esse o caso de um rapaz nascido na Criméia (na época, território russo, mas hoje pertencente à Ucrânia), chamado : Eugênio Shamansky  Kuznetsov. Ator; diretor e homem de teatro por excelência, foi um extraordinário professor para uma brilhante safra de atores brasileiros, além de participar ativamente dos movimentos teatrais no Brasil, ao emprestar todo o seu conhecimento. Conhecimento esse, que foi sólido, por ter sido o jovem Eugênio, um discípulo do grande Stanislavski, um grande mestre do teatro russo e responsável por iniciativas ousadas, como por exemplo, o chamado : "TAM" (Teatro de Arte de Moscou).
Além disso, Stanislavski foi inovador também na área pedagógica, ao criar um método revolucionário de preparação de atores, chamado : "Sistema Stanislavski". Kusnet absorveu tais ideias de uma forma contundente, e as trouxe ao Brasil, quando aqui chegou como imigrante, ao buscar melhores oportunidades, visto que no pós-1917, a Rússia viveu o início dos anos de ferro da União Soviética e o teatro, assim como todas os ramos artísticos,  passou por momentos marcados por inúmeras restrições; ferrenha vigilância e uma mordaça imposta aos artistas.
Todavia, no Brasil dos anos vinte, quando aqui aportou, este país também não era nenhum paraíso onde pudesse ele exercer a sua arte com a dignidade profissional que merecia. Dessa maneira, teve que improvisar, com diz-se popularmente e decorrente dessa premissa, ele sobreviveu alguns anos como comerciante, ao levar a atividade teatral como um diletante, antes de finalmente poder mergulhar em sua real vocação profissional.
Somente  em 1951, sob um convite de outro imigrante, o polonês Ziembisnki, Kusnet integrou o elenco do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia), em São Paulo e assim, mediante a sua bagagem extraordinária como ex-aluno de Stanislavski, pode ser usufruída pela classe teatral paulista e brasileira. Daí em diante, Kusnet trilhou o seu caminho, a atuar como ator e a ministrar as suas valiosas aulas, no TBC, mas logo a seguir também em outras companhias teatrais, como o Teatro de Arena; Teatro Maria Della Costa e Teatro Oficina.
Com sede de conhecimento, volta à Russia no início dos anos sessenta, onde participa de um curso ministrado na Escola Estúdio do Teatro de Arte e também na Escola Teatral de Stuchkin (ligada ao teatro Vakhtangov), onde novos desdobramentos do "Sistema Stanislavski", são apresentados para ele. De volta ao Brasil, atuou com muito sucesso de crítica e público, em duas montagens de textos de Máximo Gorki e também, em "Marat-Sade", de Peter Weiss, sob direção de Ruy Guerra. Ao final dos anos sessenta, lançou dois livros que são considerados fundamentais por estudantes de arte dramática : "Iniciação à Arte Dramática" e "Introdução ao Método da Ação Inconsciente". Algum tempo depois, ambos foram fundidos em um único livro, chamado : "Ator e Método".
Kusnet tinha horror aos exageros de atores que deixavam-se levar excessivamente pela emoção. Para ele, o ator deveria observar o ponto de equilíbrio, onde a emoção jamais suplantasse o lado racional, portanto, personagem e pessoa real deveriam conviver em igualdade de condições. "O ator deve ter consciência de seu real ser e saber que está no palco", foi uma de suas máximas.
No início dos anos setenta, ele ministrou aulas na USP e na Fundação das Artes de São Caetano do Sul, além de ter oferecido suporte à montagem da Ópera-Rock, Jesus Christ Superstar. Eugênio Kusnet faleceu em 1975, e deixou-nos um legado incrível de conhecimento no campo da dramaturgia.

Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu, em 2013