quinta-feira, 31 de maio de 2012

Painéis da São Paulo Antiga - Por Luiz Domingues



Espalhados por vários pontos da capital paulista, grandes painéis chamam a atenção pela beleza artística e sobretudo pelo caráter nostálgico a retratar a cidade de São Paulo, sob imagens a trazer a nostalgia em torno da vida paulistana, décadas atrás. São paisagens urbanas, com cenas do cotidiano das décadas de 1910 a 1960, principalmente, do século passado.
Trata-se de um conjunto formado por painéis a conter grandes dimensões, com a mescla da arte tradicional e o grafite urbano. Geralmente inspiradas em fotos antigas e em preto e branco, e a respeitar a impressão causada pela foto, mas em alguns casos coloridas, a usar a livre e fértil imaginação do artista. E sobre quem estou a descrever, afinal ?

Trata-se de, Eduardo Kobra, paulistano com 36 anos de idade, fortemente influenciado pela arte urbana do grafite e admirador confesso do artista novaiorquino, Eric Grohe.
A obra de Kobra encanta pelo detalhismo; beleza estética e certamente pelo fator do resgate, ao buscar uma rara memória paulistana, pois é mesmo difícil a preservação do ambiente urbano em uma megalópole como São Paulo, onde a especulação imobiliária, invariavelmente, é desumana. Um dos mais lindos painéis, ao meu ver, está na Av. 23 de maio, na altura do Viaduto Tutóia, onde uma São Paulo dos anos vinte, perpetua-se a observar o caos gerado pelo gigantesco fluxo de automóveis da São Paulo atual, que ali trafega diuturnamente.
Eduardo Kobra, tem o seu estúdio próprio (Studio Kobra) e a este projeto em específico, dá o nome de : "Muro das Memórias".

Eis aí um exemplo de como o grafite pode ser artístico; belo e promotor de uma memória raramente evocada ao paulistano por sua própria cidade.
Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu, e republicada no Blog Pedro da Veiga, ambas em 2012.

Filme: The Rutles, All You Need is Cash (The Rutles, Tudo o que Você Precisa é Dinheiro) - Por Luiz Domingues



O típico beatlemaníaco, sabe de cor todas as passagens da carreira dos Beatles. Todas as fases, fatos polêmicos, fatos que chocaram a mídia e claro, a melhor parte: as músicas, os álbuns, fotos e filmes.
E por brincar com toda essa memória, foi que Eric Idle, componente do grupo teatral de humor, Monty Phyton e Neil Innes, ex-membro da banda satírica, "Bonzo Dog Doo Dah Band", egressa dos anos sessenta, criaram o grosso dos Sketches, que transformou-se em um filme a posteriori, lançado na BBC de Londres, em 1978.
Acompanhados dos atores/músicos, Ricky Fataar e John Halsey, formaram uma banda paródia dos Beatles, ao criar canções muito parecidas, mas ligeiramente diferentes das músicas originais do Fab Four, o suficiente para lembrar de pronto a sua fonte primordial e causar uma estranheza sutil em suas diferenciações, portanto a torná-las, hilárias. E os personagens também adotam essa dualidade entre o real e o irreal, pois os quatro personificam os quatro Beatles, mas ostentam na trama, nomes e personalidades levemente adulterados. 
O espectador observa e sabe que os estão a parodiar, mas a sutil diferença causa um efeito ainda mais engraçado do que se, simplesmente os imitassem, ipsis litteris. Neste caso, trata-se de um "mockumentary", que vem a ser aquele conceito já explicado em outras resenhas anteriores, a designar documentários falsos a dar entender que se retrata algo verdadeiro, mas que na realidade é uma premissa falsa. Neste caso em específico, o conceito é extrapolado, pois além do "The Rutles", ser uma banda falsa, a questão é que ela foi concebida para ser uma versão bizarra e aproximada, mas não igual, dos Beatles. Isso torna, portanto, tudo mais engraçado ainda, pois o fator da estranheza que gera ao espectador em tudo, sob o ponto de vista musical e também nos detalhes, todos , aliás, é algo absolutamente sarcástico.
Considerada uma comédia tão hilária e demolidora quanto a que seria produzida em "This is Spinal Tap", anos depois, "The Rutles" tem um diferencial básico em relação ao outro filme citado, no que tange ser uma paródia implícita dos Beatles. Neste filme, a ideia foi satirizar ao máximo a vida e obra da banda de Liverpool, como um alvo único. E por tal caminho desenvolve-se então as gags absurdas ao longo de pouco mais de uma hora de exibição. 

Satiriza-se todas as passagens da carreira da banda, com um humor sarcástico, típico britânico, a beirar o humor negro. 
As músicas são hilárias e as capas de discos, recriações perfeitas e debochadas do material dos Beatles. Nada escapa... "All You Need is Cash", torna-se "All You Need is Cash" em português: "Tudo o que você Precisa é Amor", torna-se, "Tudo o que você Precisa pé Dinheiro"); a fase inicial dos Beatles com os seus componentes a usar terninhos de tweed e a viver entre as turnês completamente estafantes, a fase Hippie, com direito à aproximação com a espiritualidade sob viés indiano e a conter um guru a tiracolo, por sinal, a morte de Brian Epstein (o empresário real dos Beatles, que morreu em 1967), o dia em que Lennon encontrou Yoko Ono (no filme, retratada como uma nazista europeia e não nipônica, a usar uniforme da Divisão SS), e até a parte pregressa da história, na década de cinquenta etc. 

Tal ideia não surgiu repentinamente, no entanto, pois Eric e Innes já haviam escrito um bom material usado como sketchs em um programa novo que a BBC de Londres testou em 1975, chamado: "Rutland Weekend Television", portanto, a revelar-se como um embrião para que um especial em forma de 'mockumentary" fosse produzido, algum tempo depois. 

Em 1976, Eric Idle foi convidado a participar do programa humorístico norte-americano, "Saturday Night Live", e assim, ao aproveitar a recente piada em forma de provocação que ali fora narrada para ironizar a proposta que o produtor musical, Sid Bernstein houvera feito na ocasião, ao propor produzir um show reunião dos Beatles em prol da caridade (essa movimentação foi bastante comentada no filme: "Two of Us", cuja resenha encontra-se disponível também neste Blog), a presença de Idle nessa atração televisiva norte-americana, com sketches a brincar com os Beatles, já como um embrião do projeto do "The Rutles", foram encenadas e dessa forma reforçou-se ainda mais o sentido da piada, a revelar-se muito promissora a ideia dessas sketches cresceram em proporção ainda maior. E foi o que se concretizou em 1978, enfim, quando  o mockumentary completo foi lançado.
E como os quatro Beatles reagiram à essa simulação demolidora? Bem, George Harrison não só aprovou, como ajudou financeiramente, e atuou no filme (pouco tempo depois, Harrison criaria uma produtora de cinema, que trabalharia formalmente com o grupo de teatro e humor, Monty Phyton, e outros artistas britânicos, a "Handmade Films"). 
Harrison fez o papel de um jornalista que fazia uma reportagem televisiva para explicar os motivos pelos quais a "The Rutles Corporation" (uma paródia da "Apple", a empresa criada pelos Beatles), entrara em decadência , graças à roubalheira dos quatro Betales, apesar de serem os donos da empresa, mal sabiam o que acontecia com contabilidade do negócio e sobretudo, sobre o que acontecia com contabilidade do negócio e sobretudo, sobre o comportamento e desempenho dos seus subordinados.

Portanto, essa cena a satirizar a derrocada da Apple, tão mal administrada que foi, é uma das particularidades mais engraçadas da película, onde o repórter (interpretado por George Harrison), entrevista o assessor de imprensa dos "Rutles" (interpretado por Michael Palin, também membro do grupo humorístico, Monty Phyton e aqui a encarnar, por dedução, Derek Taylor, o verdadeiro porta-voz dos Beatles).  

Enquanto o assessor fala naquele empolado sotaque britânico (o dito "posh", que vem a ser como é conhecido o sotaque da aristocracia, ou seja, como a Rainha e sua turma falam entre si e nos pronunciamentos públicos, sobretudo), que: -"nada de errado está a acontecer na empresa", vários funcionários passam por trás, a carregar móveis, utensílios e até um vaso sanitário sai nas mãos de um gatuno. Como reação ao filme, John Lennon recebeu uma cópia antes do lançamento e recusou-se a devolvê-la, de tanto que a apreciou.
Ringo Starr, por sua vez, declarou que gostou das cenas alegres, mas sentiu tristeza em alguns momentos. E finalmente Paul McCartney, foi o que mais mostrou-se arredio à paródia demolidora. Paul estava a lançar o álbum: "London Town", da sua então segunda banda de carreira, "Wings", e nessa fase, esforçava-se para não citar, nem mesmo tocar músicas dos Beatles, nos shows, por visar que o público e a crítica encarassem o Wings, com atenção. Segundo Eric Idle, que o encontrou em um jantar, Paul mostrou-se bastante frio e evitou tocar no assunto. 

O último empresário dos Beatles na vida real, o norte-americano, Allen Klein, é retratado como um tirano (e o foi mesmo...), de forma hilária pelo ator/comediante, John Belushi. 

Mick Jagger e Ron Wood fazem pontas muito engraçadas no filme e a ex-esposa de Mick Jagger, Bianca Jagger, interpreta a esposa de "Dirk" (logicamente a parodiar a figura de Linda McCartney), interpretado por Eric Idle, o Paul McCartney parodiado. 
E o que dizer de Ricky Fataar ? O ator que interpretou o falso, Harrison, tem as feições de um indiano e nada poderia retratar a personalidade de Harrison de uma melhor forma. 
Fataar, é na verdade sulafricano, porém descendente de malaios. Músico profissional, ele tocou muitos anos em uma banda local chamada: "The Flames", e em certa ocasião onde a sua banda abriu alguns shows do The Beach Boys, eis que Carl Wilson, encantou-se, e os levou para a América do Norte, para intermediar um contato entre tais artistas, então desconhecidos, e uma grande gravadora. 

Com o grande, Carl Wilson, como o seu padrinho artístico, "The Flames" fez relativo sucesso e muito bom guitarrista que era/é, Ricky Fataar tocou várias vezes ao vivo com o próprio, Beach Boys, ao substituir, Carl Wilson, sempre que este adoecia. 

E John Halsey, que interpretou, "Barry", o falso Ringo Starr, é músico também. Ele tocou em uma banda chamada: "Felder's Orioles", nos anos sessenta e chegou a excursionar como baterista da banda de Joe Cocker, nos anos setenta, por um breve período.
É claro, alguns beatlemaníacos mais radicais, não gostaram muito, e entre esses, houve a parcela que odiou mortalmente, ao ponto em declarar guerra ao filme. É evidente que eu discordo desse ponto-de-vista da parte de radicais que acham o filme ofensivo, e muito pelo contrário, creio ser uma prova de afeto aos Beatles. A despeito dessa opinião em contrário de alguns poucos radicais mau humorados, todavia, eu recomendo com louvor este mockumentary, pois é uma sátira hilária e não fere os meus sentimentos em relação aos Beatles (e de ninguém, quero crer), como uma banda permanente em minha cabeceira.
A trilha sonora é muito boa, a parodiar as canções dos Beatles com bastante fidedignidade em relação ao estilo de arranjos e produção de áudio que os Beatles usaram ao longo da sua discografia e nesse quesito, anote-se a passagem temporal a demarcar bem estilos musicais distintos experimentados, opções em termos de arranjos e sobretudo em torno da produção de áudio a observar as marcantes mudanças que os Beatles apresentaram por conta das novidades tecnológicas, que na medida em que surgiam, eram rapidamente usadas por eles em estúdio. 

Logicamente a observar o sentido das piadas e assim, a estabelecer aquela diferenciação para gerar a estranheza e consequente efeito humorístico. E se na composição as mudanças geram tal sensação de estranheza, há por destacar-se que nas letras e títulos das canções, as piadas intensificam-se.

A explosão das letras a apresentar verdadeiros absurdos em seus versos, gera uma epidemia de risadas, certamente. Neste caso, "Help" tornou-se "Ouch", "Get it Back" é parodiada como "Get Up and Go", "I Wanna Hold Your Hand", transforma-se em "Hold my Hand" e assim por diante, todo o repertório foi criado nesses termos.
Outras canções a ser mencionadas: "I Must Be in Love", "Blue Suede Shubert" (essa foi longe demais...), "Lonely Phobia", "Eine Kleine, Middle Klass" (escárnio puro!), "Back in 64", "Now, She's Left You" e por aí vai a demarcar um set list recheado com paródias inacreditáveis, a gerar gargalhadas intermináveis.

O esmero com a sátira às capas dos álbuns, revelou-se igualmente. A reprodução quase idêntica de ilustrações e fotos de todos dos Beatles, mas a conter adulterações satíricas de todos os discos dos Beatles, mas a conter adulterações satíricas a começar pelos trocadilhos usados para brincar-se com os títulos originais, são sensacionais, Pérolas como "Tragical Mystery Tour" (ao invés de "Magival Mystery Tour", "A Hard Day's Rut" (no caso dos Beatles, seria "A Hard Day's Night"), "Ouch" (no lugar de "Help"), "Let it Rot" (logicamente a parodiar, "Let it Be"), "Rutle Soul" (a imitar: ""Rubber Soul"), "Semi-Automatic" ironizou o LP "Revolver", "Sergent Rutter's Only Hearts Club Band" a satirirar o LP "Sgtº Pepper's Lonely Hearts Club Band", "Shabby Road" a ironizar o LP "Abbey Road", e assim por diante.
E todos os fatos midiáticos gerados na trajetória real na biografia dos Beatles, não foram esquecidos, como por exemplo a declaração de John Lennon que foi distorcida pela mídia a dar entender que ele considerava que os Beatles seriam mais importantes que Jesus Cristo, quando na verdade, ele dissera apenas que naquela momento (1966), eles estariam mais populares que o mencionado avatar. Bem, no caso do The Rutles, a reportagem escandalosa na capa dos jornais, traz a manchete em letras garrafais: "A sensação The Rutles: Agora nós somos maiores que Deus".

Outra piada muito boa, é apresentada quando criam a empresa da banda ("Rutle Corps"), e o símbolo a designar o logotipo, é uma banana descascada, ao invés da maçã que simbolizava a "Apple"
É claro que o fenômeno da "Rutlemania" é destacado a satirizar a "Beatlemania" observada no Reino Unido e no mundo. Assim como é muito engraçada a intervenção de Mick Jagger a comentar sobre o final das atividades do "The Rutles" a sugerir a rivalidade que tal banda teria com os Rolling Stones, quando na verdade isso seria um boato fomentado sobre os Beatles manter rivalidade com os Rolling Stones e vice-versa.

Ao final, quando o personagem defendido por Eric Idle, Dirk McQuickly, ou seja a paródia de paul McCartney, mostra-se no ambiente de 1978, vestido como um Punk, é muito engraçado ao vê-lo a agir como um típico punk da safra de 1977, a manter a postura agressiva contra os ídolos do passado, quando é anunciado que após o término das atividades do The Rutles, ele montara uma nova banda que chamou-se: punk Floyd", e cospe no chão a denotar o seu desdém, ao terminar a entrevista, logicamente.
A militância pacifista de John Lennon é bastante ironizada através da personagem de Ron Nasty, quando é sugerido que ele lançara a campanha política: "Save Great Britain", diretamente de Nova York, ou seja, uma fina ironia. Enfim, o filme é uma oportunidade para desopilar o fígado, pois as risadas são inevitáveis, da primeira à última cena.

Produzido como um telemovie, não teve lançamento em salas de cinema, mas sim diretamente na TV. Inicialmente, isso ocorreu na TV norte-americana e o resultado não foi muito bom e explica-se tal fenômeno pelo fato de o humor britânico não ser muito bem absorvido pelos yankees.

Isso, mesmo a considerar-se que os Beatles tinham alcance mundial e eram adorados na América do Norte e como mais uma atenuante, a contar-se o fato em haver nesta produção, muitos comediantes norte-americanos a atuar, muitos deles bastante populares por fazer parte do elenco do programa humorístico, "Saturday Night Live", na ocasião, e portanto a gozar de uma grande popularidade. Uma semana depois, o filme estreou enfim na BBC de Londres e aí sim, o sucesso foi estrondoso por todos os fatores previsíveis: The Beatles, sotaque britânico, humor britânico para os britânicos, membros do Monty Phyton em ação etc.
E a crítica na época, como reagiu? Em linha geral, foi bem positiva a recepção da crítica, ao entender a proposta satírica e nesse sentido, enaltecer o trabalho minucioso que foi feito em termos de pesquisa e sobretudo em adaptações múltiplas, a envolver músicas, vídeos, figurino, capas de discos forjadas, fotos históricas tudo reproduzido em tom satírico, enfim um trabalho impressionante de produção e ainda mais valorizado por tal esmero. Uma jornalista escreveu: -"o efeito geral é tão próximo da realidade dos Beatles, que chega a ser assustador". Em suma, creio que essa frase resumiu tudo a ser dito sobre esse filme.

No elenco, há a presença de muitos comediante britânicos e norte-americanos em predomínio, alguns deles, reconhecidamente, sensacionais. A começar pelos quatro componentes do "The Rutles", a designar-se: Eric Idle (como Dirk McQuickly), a paródia de Paul McCartney e que também foi o narrador da história e o personagem, Stanley, um professor), Neil Innes (como Ron Nasty, a personificação de John Lennon), John Halsey (como Barry Won, o Ringo Starr satirizado) e Ricky Fataar (como Stig O'Hara, o ator a retratar  em sua própria aparência, a alma indiana que George Harrison desenvolveu ante o seu entusiasmo pela espiritualidade sob tal viés).
Apresentado o quarteto principal, eis os demais atores: Michael Palin (como Eric Manchester, o assessor de imprensa da Rutles Corporation ou seja, uma paródia do assessor de imprensa dos Beatles, Derek Taylor). Michael Palin, aliás, este era igualmente um membro do grupo humorístico, Monty Phyton, como Eric Idle), o comediante norte-americano, John Belushi (como Ron Decline, paródia do empresário, Allen Klein), Dan Akroyd (como o executivo de uma gravadora que recusou os Rutles em início de carreira, a parodiar o executivo da Decca Records que recusara os Beatles na mesma condição, na vida real), Bill Murray (como Bill "Murray the K"), Gwen Taylor (como Iris Mountbatten/Chastity, a paródia de Yoko Ono), Terence Bayler (como Leggy Mountbatten, a paródia do empresário dos Beatles, Brian Epstein), Henry Woolf (como Arthur Sultan "Surrey Mystic", a paródia do guru indiano, Maharishi Mahesh Yogi), a saudosa comediante, Gilda Radner (como Mrs. Emily Pules), Ollie Halsall (como Leppo, a significar uma paródia dupla neste caso, pois este ator representou o baixista, Stuart "Stu" Sutcliffle que deixou os Beatles bem antes da fama alcançar a banda e ao mesmo tempo, o nome fictício, "Leppo" foi uma menção à "Zeppo", um dos irmãos Marx, comediantes famosos no cinema trintista), Barry Cryer (como Dick "Jaws", paródia do editor musical, Dick James), Frankie Williams (como Archie Macaw, paródia do produtor musical dos Beatles, George Martin), Jeanette Charles (como a Rainha Elizabeth II), e outros em figurações não creditadas.

Entre as personalidades que participaram, além de Mick Jagger e Ron Wood, dos Rolling Stones, já citados, acrescenta-se a socialite, Bianca Jagger (que foi a primeira esposa de Mick Jagger na vida real e interpretou, Martin McQuickly, esposa de Dirk McQuickly, ou seja, uma paródia de Linda McCartney), o grande cantor e compositor, Paul Simon, também participou, a prestar um falso depoimento. E também o famoso poeta e radialista britânico, Roger McGough, que fez uma participação, igualmente.
Escrito por Eric Idle e Neil Innes. Dirigido por eric Idle e Gary Weiss. Foi lançado em março de 1978. Tal filme teve uma carreira televisiva forte ao redor do mundo, por ter sido exibido com bastante reprises na TV aberta e fechada. O lançamento em formato VHS foi o seu maior trunfo comercial imediato, seguido do LP com a sua trilha sonora abastecida pelas músicas absurdas do The Rutles.

Saiu muitos anos depois a versão em DVD e outra edição em DVD com mais extras, sobreveio, além da versão mais moderna em Blu-ray. Por volta de 1996, os atores reuniram-se para gravar o LP "Archaelogy", a paródia imediata em resposta à série de discos e DVD's com a série "Anthology', que os três componentes dos Beatles, vivos então, haviam acabado de lançar e na mesma proposta do The Rutles, ou seja, a conter paródias das músicas e da capa do super Kit que os Beatles lançaram na ocasião.
Se os Beatles tiveram o desfalque de John Lennon, falecido desde 1980, o The Rutles não teve Eric Idle nesse esforço mas por outro motivo bem menos dramático, visto que o ator simplesmente não quis participar, desta vez. Em 2002, Eric Idle deu o troco (mas parcialmente), ao lançar sozinho outro rockumentary, chamado como: "The Rutles 2/Can't By my Lunch" (paródia da canção, "Can't Buy my Love", dos Beatles).  

Porém, na prática, foi apenas uma colagem de material requentado do mockumentary original de 1978, com a inserção de mais algumas simulações de entrevistas com personalidades da música e docinema, principalmente (David Bowie, James Taylor, Tom Hawks, Carrie Fischer e outros tantos, inclusive até o poeta indiano, Salmon Rushdie, famoso por viver recluso há décadas na Inglaterra, por estar ameaçado de morte por questões religiosas), e ele, Eric, a interpretar o mesmo repórter como também o fizera no primeiro trabalho, como narrador do Rockumentary original.

Na internet, o filme está disponível em diversas plataformas na atualidade (2019), inclusive no Youtube, com a sua versão na íntegra e gratuita.
Resenha publicada inicialmente no Blog do Juma, em 2012. Esta resenha foi revista e ampliada para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll, alojada em seu volume I, a partir da página 223.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Filme: Seconds (O Segundo Rosto) - Uma Nova Vida - Por Luiz Domingues

E se pudéssemos adquirir uma nova identidade no decorrer da vida, com fisionomia, documentos, atividade profissional e relacionamentos sociais completamente diferentes dos nossos? 

Pois foi nessa fantasia que o diretor John Frankenheimer baseou-se para criar: "Seconds", seu longa-metragem lançado em 1966.

A história começa com o personagem, Arthur Hamilton (interpretado pelo ator, John Randolph), um homem de meia-idade, rico, porém completamente insatisfeito com a sua vida. Tudo muda quando ele é abordado por um amigo que julgava falecido há tempos e que não obstante tal fato inusitado por si só, lhe propõe uma mudança radical de vida. Arthur é levado então a uma instalação secreta, laconicamente denominada como: "a empresa" .
Em meio a diversas pessoas com a mesma expectativa, Arthur é confinado com o intuito de se em preparar para uma mudança radical de vida.

Através de uma entrevista realizada por um misterioso homem chamado,  "Sr. Ruby", Arthur aceita as regras dessa mudança radical de vida, ao assumir o compromisso de se esquecer sem reservas de sua família e identidade antiga.

Um incêndio é forjado para que um cadáver de uma outra pessoa dada como indigente, seja colocado no local, e assim, tal farsa sirva para que Arthur Hamilton fosse declarado morto, oficialmente, ao se emitir um atestado de óbito e sua família aceitar a ideia. 

Enquanto isso, ele submete-se a uma radical cirurgia, na qual  é completamente rejuvenescido e com nova fisionomia, surge a sua nova personalidade, doravante como: Tony Wilson (personagem interpretado pelo ator, Rock Hudson). 

Tony Wilson tem uma nova vida. Agora ele vive como um artista plástico que mora em Malibu, Califórnia. Leva uma vida excitante como artista celebrado e namora, Salome Jens (Nora Marcus), uma mulher jovem e muito bonita.

Entretanto, aos poucos, o remorso por ter abandonado a sua vida verdadeira, começa a ecoar dentro de si. 

Em uma determinada festa em que está presente, ele se excede na bebida e fala sem reservas sobre a sua vida pregressa com estranhos, o que causa espécie e naturalmente as pessoas interpretem tal história absurda como parte do seu delírio alcoólico. 

Por conta de tal deslize, ele é advertido por agentes da "Empresa" e fica sob suspeita ante os rígidos protocolos exigidos. 

No entanto, por não suportar viver mais em meio à tal mentira, vai visitar a sua ex-esposa, ao alegar ser um amigo do falecido marido (ele mesmo), e após quebrar essa norma de sigilo, é recolhido às instalações da misteriosa organização, à força pelos seguranças de tal organização secreta.

Ele reencontra o amigo que o levara pela primeira vez a conhecer essa organização e ambos pleiteiam uma terceira identidade. O final, não é feliz, pois o destino de ambos, insubordinados, foi morrer para que seus cadáveres fossem usados como causa mortis de outros clientes que iriam "renascer". E certamente a caracterizar uma irônica metáfora sobre a sociedade que lhe impõe regras e não tolera insubordinação a punir severamente quem não a obedece.

O filme é sombrio, a evocar a aura de um pesadelo, certamente. Mediante esplêndida fotografia preto e branco, obra de James Wong Howe, e é reconhecido pelos críticos como uma película que usa o gênero "Sci-Fi" a se misturar ao "thriller" policial. Elementos dessas duas escolas, mesclam-se à psicodelia em voga na época, principalmente em cenas que evocam a lisergia e o hedonismo, além de uma certa dose de terror, via influência da produtora britânica Hammer e dos filmes do grande diretor norte-americano, Roger Corman, certamente.
A cena da cirurgia plástica de Arthur Hamilton/Tony Wilson (John Randolph/Rock Hudson) controu com tomadas de uma cirurgia de rinoplastia real, aproveitadas na edição final. John Frankenheimer realizou pessoalmente essas tomadas e segundo relatos, desmaiou na sala cirúrgica, ao não suportar presenciá-la. Outra curiosidade interessante, foi que "Seconds" trouxe em seu elenco, três atores que haviam sido banidos de Hollywood por conta da perseguição macarthista. Jeff Corey (Mr. Ruby); Will Geer (The Old Man) e John Randolph (Arthur Hamilton). Informalmente, Frankenheimer dizia que eles foram os "renascidos da vida real", ao justificar a metáfora do filme.

Em suma, se trata de um filme rico em metáforas e ao meu ver, se coloca muito além dos clichês habituais dos gêneros Sci-Fi, Thriller psicológico e os clássicos filmes a abordar a espionagem e organizações secretas, mediante o uso e abuso da teoria da conspiração. 
Buscar uma nova identidade, é na verdade, o sonho de muitas pessoas amarguradas e inconformadas com o rumo de sua existência pessoal, por inúmeros motivos e assim, objeto de uma profunda reflexão sobre quais medidas precisariam ser adotadas para promover as mudanças necessárias para se atingir um grau de satisfação.
 
Do ponto de vista cinematográfico, foi mais um filme com baixo orçamento, pelo qual John Frankenheimer teve que lidar em sua carreira e de novo, foi muito criativo. 
 
Por conta dessa sua característica, também, é que o admiro como diretor, pois ao preparar uma boa limonada com um bagaço de limão já anteriormente espremido, ele demonstrou mais uma vez o quanto foi criativo, portanto, sou um fã da sua filmografia, incluso este "Seconds" que eu considero um filme bastante instigante
Diz-se a boca pequena, que essa foi a melhor atuação da carreira de Rock Hudson, um ator muito contestado pelos críticos. De fato, acostumado a atuar em filmes românticos e comédias leves, ele se acostumara a interpretar personagens insossos, a usar apenas a sua boa aparência que lhe rendeu a fama como galã. Mas neste caso, ele imprimiu uma linha de interpretação muito densa e convenceu, principalmente nas cenas mais aterrorizantes.
Repensar sobre a vida que temos, as pessoas que nos cercam, as escolhas que fizemos e todas as consequências advindas desse enorme emaranhado de relações sociais é um convite que nos faz essa história, motivada através do mote do filme. Sonhar com uma mudança radical, o dito "começar de novo", uma nova oportunidade para fazer tudo diferente, "repaginar", enfim, chame como quiser a sua imersão, porém, o fato inexorável é que toda mudança tem que ser promovida de dentro para fora, portanto, não espere um agente da "empresa" te abordar com a proposta de uma mudança, mas mude, efetivamente, sem necessariamente deixar de ser o que é, se me permite este conselho. 
 
Creio que só por essa reflexão, o filme já merece ser visto, embora ele tenha seus atrativos cinematográficos, certamente, e convenhamos, nas mãos de John Frankenheimer, ele ganhou virtude sob esse ponto de vista, igualmente. 
                       O grande diretor, John Frankenheimer

Matéria publicada inicialmente na Revista Eletrônica Cinema Paradiso, em sua edição de n° 301, no ano de 2011.