sexta-feira, 29 de julho de 2022

CD Nordic Dream/Antonio Celso Barbieri - Por Luiz Domingues

Nordic Dream” é o mais recente álbum do músico, compositor, produtor musical, webmaster, escritor e ativista cultural, Antonio Celso Barbieri. Criador inquieto, ele usou bem o tempo gerado pela quarentena sanitária decorrente da pandemia ao lançar obras em profusão e este CD “Nordic Dream”, é o seu mais recente fruto nascido de uma fase tão fértil e expressiva de sua parte.  

No release oficial do álbum, o artista explana com muita lucidez o que o inspirou e motivou a criar a obra em si, e neste caso, o seu mergulho criativo foi direcionado às tradições nórdicas seculares, de onde buscou a fonte para compor.

Ante as geleiras e as tradições Vikings, principalmente a privilegiar na sua visão o paganismo que cultua a força da natureza, Barbieri se deixou levar por tal vibração ancestral e perpetrou uma obra multifacetada a expressar toda essa riqueza.

Ainda a recorrer ao release oficial da obra, acrescento que Barbieri destacou que especificamente para essa obra, ele fez uso de instrumentos virtuais, no caso, “Nordic Cello" e outro chamado “Nores”', para buscar mais proximidade com a essência nórdica, e neste caso eu acrescento que também pelo fato de que o artista sempre gostou de usar os recursos da tecnologia em torno das experimentações da música eletrônica em sua obra (“Nordic Dreams” é o seu 15º título de sua numerosa discografia).

Sobre a arte gráfica a denotar mais uma de suas habilidades, haja vista a sua atuação destacada como artista gráfico e webmaster, tenho a dizer que apreciei bastante a sua concepção. Na minha concepção, a geleira personificada na figura imponente da estilização de um Viking e respectivo elmo como sua base, mergulhado no mar gelado e sob o céu noturno, todo estrelado da Escandinávia a ilustrar tanta beleza, realmente impressiona.

Cabe, no entanto, acrescentar que na visão do próprio artista, opinião essa relatada-me diretamente, Barbieri explica que na arte de sua capa, ele está querendo dizer que, para ele, em termos de cultura nórdica, o viking é apenas a ponta do iceberg.

Agora a refletir a minha percepção sobre o aspecto musical desse álbum, devo salientar que Barbieri seguiu a sua linha mestra a usar instrumentos tradicionais e eletrônicos em perfeita sintonia. Ao mesclar docilidade e contundência, se mostrar épico e solene e igualmente profundamente respeitoso com a força das tradições místicas nórdicas, ele montou um belo mosaico representativo sobre a alma nórdica, sem, no entanto, deixar que o disco fosse confundido como algo pertencente ao campo da música Folk-Étnica e que tampouco possa ser rotulado como “World Music”, pois a abordagem é muito fora dessas nomeações genéricas, não tenho dúvida.

Acho conveniente acrescentar algumas impressões pontuais de minha parte sobre cada faixa:

Ouça "Always Alone", através do bonito clip concebido por Antonio Celso Barbieri

Escute diretamente no YouTube através do seguinte link:

https://www.youtube.com/watch?v=T09EQd7MWPQ

Always Alone” – Peça delicada, mostra beleza em sua melancolia reflexiva e implícita, sob o ponto de vista emocional. Gostei da influência do Rock Progressivo setentista expresso através dos sintetizadores de uma forma recôndita.

Ceres, Vesta and Juno” - Bem rítmica, inclusive no uso inteligente da divisão e pausa como um belo recurso, passou-me uma ideia ritualística bem interessante.

The Three Scandinavian Kingdoms” - gostei da incidência da percussão e do elemento Rock na sua composição, sutil, mas perceptível.

The Easter Celebration” - Esta faixa tem um aspecto bastante salutar no sentido de se mostrar muito adequada para servir como trilha sonora de um filme com motivação militar.

The Emotional Wheel” – Há um suspiro que soa como algo fantasmagórico que me chamou a atenção no arranjo desse tema, justamente por abrir campo para diversas interpretações.

Se produzido por um Ser humano, denota representar uma série de introspecções profundas, do âmago do Ser e isso por si só já me impressionou. Se por outro lado for a repetição mecânica do ruído de uma máquina industrial, ele (Barbieri) foi além, pois estabeleceu a simbiose entre a máquina e os humanos sob diversos aspectos. Impressionante metáfora, portanto.

The Aurora Borealis” – Bastante rica, ritmicamente a falar, esse tema me lembrou o estilo do saudoso tecladista e compositor grego, Vangelis, de certa forma.

From Nothern Ancient Times” – Gostei muito do uso de sinos grandiosos para se emular um clima grandiloquente e também do ar orquestral do arranjo como um todo.

The Viking Pagan Mind” – Destaque para a boa interpretação ao piano da parte do artista.

Assista o clip da música "It's Good to Be Alive", sob a criação e edição de Antonio Celso Barbieri. 

Eis o link para assistir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=rtwEGQIiMqY

It’s Good to Be Alive” – Tema extremamente vibrante, passou-me a ideia de uma celebração da vida e não por acaso o seu título sinaliza nessa direção.

Just a Friendly Clan Meeting” – Faixa de curta duração, mostra em sua melodia, um trunfo vigoroso.

Assista o clip da música: "Nordic Dream", sob a criação e edição de Antonio Celso Barbieri.

Eis o link para assistir no YouTube:

https://www.youtube.com/watch?v=oqUUceBShAI

Nordic Dream” – A faixa que dá nome ao álbum é bela pelo seu caráter épico, por trazer uma abordagem complexa em sua constituição sonora. Pelo aspecto da imagem proposta pelo artista, apesar do nome, não se trata de uma ode à cultura nórdica como um todo, mas sim à força da liderança viking em meio às suas planificações pela construção de uma civilização que suprisse os seus anseios, conforme Barbieri assinalou no release oficial do álbum.

Running Down Hill” – Essa música soou-me enigmática e soturna (no bom sentido, logicamente), ao denotar, na minha visão (bem-entendido), uma abordagem impressionista em essência.

The Soft and the Hard Feelings” – Tema bastante percussivo, muito interessante.

The Viking Prophecy” – Tema executado ao piano, se mostra introspectivo e expressivo.

The Secrets of the Golden Crown” – Gostei da construção dessa linha ao piano, a privilegiar notas longas que ressoam e assim valorizaram a introdução de percussão com farta influência oriental.

Em suma, o novo álbum de Antonio Celso Barbieri, “Nordic Dream”, é rico em diversificação sonora, também pela mescla de instrumentos tradicionais com recursos eletrônicos e até virtuais, propõe reflexão sobre o papel da cultura pagã nórdica como elemento fundamental para a formação da cultura geral Anglo-Saxã, mas com clara importância para a todas as culturas europeias e a abranger o mundo, por conseguinte.

Mais um dado importante: é preciso salientar que a se mostrar coerente, como em todos os seus discos anteriores, Barbieri usa o recurso de buscar o acesso profundo em seu “Eu” interior e nesse esforço, a sua autoanálise empreendida através do seu encontro com o próprio micro-cosmo, há sempre uma amálgama perfeita também com o macro-cosmo da realidade externa a abordar a sua visão sociopolítica do mundo.

Antes de encerrar a resenha, faço o convite ao leitor para que conheça a matéria longa que eu escrevi e publiquei no meu Blog 2, para repercutir a persona de Antonio Celso Barbieri, como um empreendedor cultural eclético e dinâmico. Eis abaixo o link para acessar a matéria:

http://blogdoluizdomingues2.blogspot.com/2022/03/antonio-celso-barbieri-um-visionario.html

Para escutar o CD “Nordic Dream” na íntegra, acesse o site de Antonio Celso Barbieri, através do link descrito abaixo:

www.2bstar.com

Nordic Dream” foi inteiramente gravado no estúdio Raw Vibe de Londres, UK. Lançado em 2022.

Composições, arranjo, arte de capa e produção geral de Antonio Celso Barbieri.

Antonio Celso Barbieri toca todos instrumentos, além da programação de sons eletrônicos e virtuais.

Para conhecer também o seu site “Memórias do Rock Brasileiro”, acesse:

https://www.celsobarbieri.co.uk/

quarta-feira, 20 de julho de 2022

Filme: The Perfect Age of Rock'n' Roll (A Era Perfeita do Rock) - Por Luiz Domingues

Obscuro, de certa forma subestimado, todavia bastante interessante em sua apresentação, o filme, “The Perfect Age of Rock’n’Roll (“A Era Perfeita do Rock”), trata sobre uma história a respeito de frustrações em torno de erros cometidos por traições, basicamente. São pequenos deslizes que se cometem o tempo todo, mas quando um desses enganos é descoberto, o estrago é enorme o suficiente para arruinar todo um esforço conseguido a duras penas.
 
Filme com baixo orçamento, é bem verdade, no entanto, não desponta por conta de sua simplicidade em termos de recursos, pois investe bastante na trama em si e tanto pela sua direção, quanto pelo desempenho dos atores, envolvidos, não desaponta e pelo contrário, mostra um surpreendente resultado em termos dramáticos. É permeado por uma boa trilha, igualmente e claro que ao tratar-se de Rock Movie, esse item em específico reveste-se de uma quase obrigação, certamente, mas nem todo Rock Movie prima por observar o capricho na questão musical, por incrível que pareça e sendo assim, mais um ponto positivo para esta produção.
 
Sobre a história, apesar dos inevitáveis clichês arquitetados pelo roteiro, constrói uma teia dramática interessante com personagens a mostrar características em termos de personalidade, muito fortes e com o devido antagonismo para gerar os inevitáveis conflitos.
Um repórter de uma famosa revista musical (revista Revolver), está a caçar o depoimento do vocalista de uma banda de Rock (The Lost Soulz), que interrompera as suas atividades abruptamente por conta de brigas internas entre os seus integrantes, há muitos anos atrás, após ter lançado dois discos de sucesso e por conta dessa ruptura, ter abandonado a gravação do terceiro disco, pela metade. Esse sujeito (conhecido como Spyder, interpretado por Kevin Zegers), está agora mais envelhecido e bem decadente, mas não por isso apenas, bastante amargurado e recluso socialmente. 
 
Ele recebe o repórter, Clifton Hangar (interpretado por Lukas Haas), tem uma linha de atuação investigativa, bem incisiva e não impressiona-se com o mau humor e relutância amargurada de Spyder em conceder uma entrevista no limite, o tempo todo a ameaçar encerrar a conversa e dar por encerrada a conversa. Nesses termos, em meio a uma casa muito mal tratada, o veterano Rocker parece um maltrapilho a viver de migalhas e ressentimentos, e mesmo sob enorme desconfiança, passa a responder. Quando o repórter toca no assunto do terceiro álbum perdido, Spyder enlouquece e quase parte para a s vias de fato, mas logo supera a sua crise de fúria e o repórter, muito perspicaz, sabe bem que a sua estratégia em tocar diretamente no ponto da discórdia que gerou toda essa raiva, haveria de provocar no seu entrevistado a vontade em desabafar. E assim, como risco calculado, o repórter obtém o que quis extrair mediante a sua tática e o Rocker passa a falar do passado. Bem, o inevitável “Flashback” ocorre.
Volta-se vinte anos no tempo e a época é o início dos anos noventa, 1991 para ser preciso. Vemos um outro personagem, Eric Genson (interpretado por Jason Ritter), um adulto jovem, a ministrar aula de música para crianças em uma escola. Spyder aborda Eric que o trata com uma certa frieza, a denotar desconfiança. Ambos haviam sido amigos de infância, quando sonharam juntos com o Rock e formaram bandas de garagem. Eric escrevia as canções e eles haviam gravado uma demo tape. A ideia de Eric seria a de viajar de carro pela “Rota 66” a sair de sua remota cidade interior localizada no interior do estado de Ohio, até Los Angeles, Califórnia onde pretendia entregar o material para ser avaliado por uma gravadora grande. Mas Spyder agiu mal, e foi sozinho com tal material e formou uma banda chamada: “The Lost Soulz”, que atuara ao final dos anos oitenta com bastante sucesso e gravara dois discos. 
 
Tal sucesso fora construído portanto com as músicas de autoria de Eric. Porém, agora, Spyder estava em um processo decadente e resolvera procurar o seu velho guitarrista, para fazer as pazes e convidá-lo a entrar na banda e gravar enfim o terceiro álbum, para colocar a banda na estrada e retomar a sua escalada de sucesso. Só existe um problema nessa equação: Eric nunca aceitara a traição, mas estava conformado com a vida pacata, longe dos holofotes e apenas a ministrar aulas de música para crianças.
Dessa forma, Eric guardava muita mágoa e com toda a razão e sobretudo, alimentara uma enorme desconfiança sobre Spyke. Tudo bem, foram muito amigos na infância e adolescência, construíram juntos um início de carreira vitoriosa até certo ponto, entretanto, as atitudes tresloucadas de Spyke, pôs tudo a perder, com  tal usurpação do material, indevidamente. Através desse contexto a confrontar as respectivas personalidades de ambos, tudo fica claro para o espectador: Eric é focado, prudente e comedido e Spyder é carismático, intenso e muito inconsequente, para não dizer, inescrupuloso. Há portanto um lado bom e outro mau para ambos, e isso é interessante na construção dos personagens.
 
Por ser bastante impetuoso, Spyder abordara Eric de uma forma obstinada e não aceitaria uma simples resposta negativa, para desistir. Portanto, ele força a barra e auto convida-se para jantar e talvez até a pernoitar na residência de Eric, que conhece bem o temperamento do ex-amigo. Bem, constrangimento à parte, Spyder abre o jogo a diz para Eric que quer retomar a gravação do terceiro álbum. E a verdade é que Spyder mostra-se um cantor bom e dotado de um carisma, como marca pessoal sua, mas não é compositor e toda a usina de ideias que alimentara a sua carreira até ali, simplesmente fora devidamente amealhada por Eric. Portanto, não foi apenas pela motivação de reconciliar-se com ele, que Spyder fizera a abordagem, mas sobretudo por precisar dele como o principal responsável pela criação de novas canções e nesses termos, sem Eric, seria inviável projetar uma volta à cena do “The Lost Soulz”. 
A empresária de Spyder, Rose Atropos (interpretada por Taryn Manning), chega e porta-se como se já estivesse tudo combinado para a banda voltar à ativa com um novo guitarrista. Estava tudo armado por Spyder, ao projetar que Eric aceitaria de pronto a proposta e embarcaria com ambos no primeiro avião para entrar em estúdio e compor, arranjar e gravar um disco em pouco menos de um mês. No entanto, Eric reluta e a inevitável conversa tensa sobre o passado ocorre, a relembrar as brigas, o caráter incompatível de ambos e o pior de tudo, a usurpação das músicas que tornou Spyder famoso e Eric, o autor das canções, na obscuridade. 
Em meio a uma conversa ríspida, com troca de acusações e revelações sobre o que realmente um pensa do outro, eis que Eric pondera e aceita a missão, contudo, ele impõe uma condição: que a viagem seja feita através de um “Motor Home” (o popular, “Trailer”, como é conhecido no Brasil), ao invés de avião, para realizar enfim o seu sonho. A empresária desespera-se, pois além da urgência para gravar-se esse disco, ela não está acostumada a viajar assim, portanto mostra-se indignada em ter que rodar milhares de milhas em meio ao deserto, a sofrer com calor e outros desconfortos típicos. Além de tudo, ela está a ser pressionada pelo executivo de gravadora, que não para de ligar e atormentá-la (Ace Millstone, interpretado pelo veterano ator, Billy Dee Williams). No entanto, trata-se de uma condição sine qua non para Eric que tirante o seu sonho, alega também precisar de tempo e inspiração para compor e dessa forma, a viajar pela via rodoviária, seria o ideal para ele buscar a sua inspiração.
Entra em cena então um personagem essencial, August West (interpretado pelo veterano e aclamado ator, Peter Fonda). August fora empresário do pai de Eric quando este fora um famoso guitarrista de uma banda de Rock dos anos setenta (Chip Genson, interpretado por James Ransone), e conhecia não apenas os meandros da indústria do show business, como a estrada em si, figurada e literalmente a dizer-se. Ele era o dono do carro e levaria a trupe nessa aventura pela rodovia. Bem, que luxo incrível ter no filme um ator do gabarito de Peter Fonda, visto ser ele um egresso do tipo de filmes mais contraculturais que o cinema comercial chegou perto, nos anos sessenta. Freak contumaz na vida real, participante da famosa fraternidade formada por atores simpatizantes da contracultura nos anos sessenta, amigo pessoal de inúmeros astros do Rock; protagonista de filmes seminais, tais como: “Easy Rider, “The Trip” e “The Wild Angels” entre inúmeros outros, Fonda é considerado um ícone no segmento dos ditos, “Road Movies”, portanto, foi o ator perfeito para interpretar esse personagem.
A viagem inicia-se finalmente e são muitos os momentos interessantes nesse trecho do filme. Eric a compor com uma guitarra Gibson Les Paul ou um violão vez por outra (que aliás, o emociona, pois este instrumento pertencera ao seu pai), dentro do carro ou em paradas pelos postos de gasolina, Spyder a destilar o seu mau humor crônico e reclamar de tudo, a altiva, mas bastante decidida, Rose, também a reclamar da viagem, mas secretamente a perceber que ele estava a funcionar aos propósitos, justamente por conta dessa ambientação para compor um bom material e a figura de August, a mostrar-se um sujeito bem humorado na maior parte do tempo e sobretudo, muito experiente para lidar com Rockers em todas as  circunstâncias. 
 
August logo percebe que Spyder faz o gênero temperamental, mas em seu âmago, tal atitude irascível é apenas uma proteção para disfarçar um sujeito atormentado pelo sentimento de baixa autoestima. E também logo percebe que a tensão sexual entre Eric e Rose vai produzir uma faísca inevitável, a qualquer momento, mesmo a saber que a moça já formou um casal no passado, com Spyder. Além do mais, Rose é muito bonita, é jovem e veste-se de uma forma Rocker sensual, portanto, seria apenas uma questão de tempo.
Outro ponto interessante, por ser filho de um guitarrista que fora um Rock Star nos anos setenta, Eric herdara o talento para tocar e compor, mas mantinha um trauma gerado por causa das atitudes do seu pai, a culminar em sua destruição gerada pelo abuso com drogas. Portanto, recondidamente, nutria desde sempre o receio por destruir a sua vida, igual ao seu pai. Através de August, cenas do passado do pai são mostradas, com a figura de Chip Genson em situação deplorável, em camarins de shows com grande proporção em arenas lotadas, por exemplo.
 
Um momento lúdico ocorre, quando August, enquanto dirige, comanda uma trilha sonora muito boa, regada com sons vintage das décadas de sessenta e setenta e propõe brincadeiras, em ritmo de “quiz”, com perguntas e respostas sobre tais artistas do passado. Rose e Spyder rapidamente ficam entediados por não dominarem o assunto, mas Eric conhece tudo, ao denotar ter um domínio sobre a história do Rock. É um momento bom para o espectador também testar os seus conhecimentos e eu só posso dizer que pela minha idade, quando assisti esse filme, acertei tudo, ao confirmar que tais décadas citadas não estão apenas guardadas com carinho em minha vivência natural, como também pela minha predileção óbvia em torno da sua produção artística.
Eis que August resolve parar em um pequeno rancho que pertence a uma ex-namorada sua, uma mulher chamada, Maggie (interpretada por Kelly Lynch), e a recepção por parte dessa senhora com espírito jovem/hippie, não é das melhores, por conta de problemas pessoais que ambos tiveram no passado, mas logo ela aceita o pernoite da trupe e fica tudo bem. Eric já compôs muitas canções nesse ínterim, mas a velha rusga com Spyder volta à tona e não seria para menos, pois o vocalista é um sujeito bastante inconveniente. 
Tudo piora quando o inevitável ocorre, ao confirmar as suspeitas de August e também de Spyder, pois Eric e Rose ficam juntos. Spyder tem uma crise de ciúmes, bebe e sai na chuva ao vociferar estar a abandonar o projeto etc. e tal. Eric vai atrás e após uma briga literal, através das vias de fato, eles acalmam-se e vão beber em um bar frequentado por pessoas negras, exclusivamente. Não são maltratados por serem brancos e cabeludos, mas percebe-se um clima de estranheza no ar. Essa parte do filme é sensacional, pois uma banda de blues formada por músicos veteranos da vida real, está a tocar. Vê-se a presença de: Pinetop Perkins, Sugar Blue, Hubert Sumlin, Bob Stroger e Willie “Big Eyes” Smith. E ali produz-se um blues genuíno, da melhor qualidade. Os dois Rockers brancos são provocados, quando descobre-se que são músicos e assim, são desafiados para subir ao palco e tocar com os velhos bluesman. E o som flui sensacional, com todos a divertirem-se muito, com a execução do clássico: “Train Kept a Rollin’. E ainda com direito a uma provocação, pois insinua-se que os brancos devam pensar que a música é de autoria do Aerosmith (O grupo inglês, The Yardbirds também a gravara nos anos sessenta), quando na verdade, a canção é uma criação de Tiny Bradshaw.
Dessa improvisada experiência, surge a ideia de aproveitar-se a viagem para a banda atuar ao vivo em espeluncas de estrada e assim, ser possível testar as músicas novas. A banda então faz shows em pequenas casas de beira de estrada e afinal de contas, estão na famosa “Route 66”, portanto, melhor inspiração não poderia existir. O baixista e o baterista tem pouca menção no filme. O baixista aliás, é interpretado por um ator que é músico de fato e já teve destaque como guitarrista de Billy Idol e por ter tocado em outras bandas entre as quais o The Cult. Trata-se de Billy Morrison, que interpretou, Fashion Jones.
Enfim a banda chega em Los Angeles e toda a apreensão da parte dos produtores da gravadora, dissipa-se, visto que a banda tinha um novo material muito bom para dispor e assim, o álbum é gravado. No entanto o disco não é lançado, visto que nesse ínterim, o tal fato imponderável ocorre, para destruir tudo. A gravadora paga um bom dinheiro adiantado e organiza uma festa bastante glamorosa. Eric fica encantado com um carro novo conversível que recebe como presente e sai para dar uma volta. No quarto do hotel onde a banda está hospedada, Rose arruma-se em seu quarto, quando recebe a visita de Spyder e com ambos bem alterados pelos excessos cometidos com bebidas, eis que entregam-se ao sexo e tal qual enredo de novela brasileira, é claro que Eric entra no recinto nesse mesmo instante e flagra ambos em situação indisfarçável. 
 
Ele não briga, mas apenas dá as costas e sai. Spyder e Rose revelam-se desesperados, pois aquilo fora uma atração efêmera e que não significara uma traição propriamente dita, mas é óbvio que seria difícil para o Eric encarar dessa forma. Bem, Spyder vai atrás de Eric, que entra no carro e some do local. August fica muito contrariado ao saber, pois logo percebeu que tudo fora jogado fora, com a banda arruinada, e desta vez, para sempre. Não é mostrada a morte de Eric, mas isso é insinuado subliminarmente.
O filme encerra-se com o “Flashforward” a mostrar o repórter da revista Revolver muito impactado pela história que acabara de escutar da parte de Spyder. Então, o rancoroso ex-vocalista abre um armário e joga nas mãos do repórter, as fitas que continham a gravação do álbum não finalizado pela banda. O tesouro perdido está em suas mãos e ele mal acredita nesse desfecho. Bem, é publicada a seguir a reportagem na revista, a repercutir a bomba gerada pela descoberta das fitas originais.
 
O filme foi baseado na premissa da maldição construída em torno da morte de um Rock Star aos vinte e sete anos de idade, para seguir a tradição da lenda sessentista que iniciou-se com as mortes de Brian Jones, Jimi Hendrix, Janis Joplin e Jim Morrison, a contar com um curto espaço entre um e outro e todos a falecer ao ostentar essa idade tão precoce. O lendário bluesman, igualmente falecido com essa tenra idade, Robert Johnson, é incluso nesse seleto rol e com direito a uma bonita menção logo no início do filme e também ao final.
Outras duas referências sutis precisam ser registradas. O nome escolhido para o personagem do repórter, “Clifton Hanger”, é o nome que o falecido tecladista do grupo Grateful Dead, Brent Midland, usava para registrar-se em hotéis. E o nome do empresário, “August West” é um personagem citado na música, “Wharf Rat”, também do Grateful Dead.
 
Bem, por ser um telemovie, ou seja, uma produção feita especialmente para a TV, portanto com um padrão de baixo orçamento, o filme surpreende por trazer tantas referências interessantes, que normalmente não  seriam observadas por tal circunstância operacional realizada a toque de caixa e pouca verba. 
Sobra a parte musical, isso também é positivo ao meu ver, tanto pela trilha muito boa a apresentar clássicos das décadas de sessenta, setenta, oitenta e noventa, quanto pela construção do som do “The Lost Soulz”, quanto nas partes mais amenas a mostrar o processo de composição em violão ou guitarra desligada e sem esquecer a jam de Blues que foi muito boa. O som da banda fictícia mostra uma amálgama dessas influências citadas ainda que penda mais para o Hard-Rock oitentista em transição rumo ao Grunge noventista, a grosso modo.
Ouve-se ao longo da trilha sonora o som de Bob Dylan, Aerosmith, Muddy Waters, Canned Heat, Howlin’ Wolf, Guess Who, Willie Dixon, Donovan e também artistas mais modernos, dos anos noventa, tais como Violent Femmes, Nirvana, Jane’s Addiction e outros.
 
Scott Rosenbaum dirigiu e escreveu a história. Ele também dividiu o roteiro com Jasin Cadic. O filme foi lançado em agosto de 2011, e sofreu uma enxurrada de críticas ruins. Reclamou-se muitos dos clichês, mas convenhamos, com um baixo orçamento eu penso que pelo contrário, o filme tem méritos. E também foi mencionado o fato de que fora uma tentativa de imitação do filme: ”Eddie and the Cruisers”, de 1983, no entanto, apesar da questão da morte do guitarrista, há diferenças bem acentuadas, pois não há o mote policialesco demonstrado pelo filme em comparação.
Existe sim em versão DVD, passou bastante pelos canais da TV a cabo e encontra-se com dublagem em português, inclusive, disponível no YouTube.

Como veredicto final, eu acho que vale a pena certamente assisti-lo e reafirmo, apesar das críticas recebidas, eu penso que esta obra tem os seus atrativos, conforme eu comentei ao longo da resenha.

Esta resenha faz parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll" e está disponível para a leitura em seu Volume II, a partir da página 265.