sábado, 29 de março de 2014

TV 2 Pop Show / Som Pop - Por Luiz Domingues

Em 1974, a Rede Globo lançou o programa : "Sábado Som", ao causar um grande furor, por este oferecer a farta exibição de tapes a conter apresentações ao vivo dos melhores nomes do Rock internacional dos anos sessenta e setenta, no frescor de sua contemporaneidade. Por conter uma audiência esmagadora em rede nacional, este tratou por obscurecer um outro programa que tivera os mesmos moldes, contudo, por ter sido uma produção bem mais modesta, da TV Cultura de São Paulo, e que na verdade, já estava no ar, bem antes. Dessa forma, estrutura & hype à parte, teve o mesmo valor, artística e culturalmente a falar. Refiro-me ao programa : "TV 2 Pop Show", que foi exibido pela TV Cultura de São Paulo, com retransmissão para diversas as TV's Educativas da maioria dos estados brasileiros.

O começo dessa produção, foi bastante ocasional e reforça assim, o conceito de que se por um lado houve um caráter prosaico na TV brasileira (apesar de que este veículo já existisse há mais de vinte anos nessa ocasião, início dos anos setenta), por outro, há por destacar-se a criatividade e a obstinação de profissionais muito dedicados, que pode proporcionar a sua existência. Foi o caso de um funcionário da TV Cultura, que fortuitamente interessou-se em usar trechos de apresentações ao vivo de tapes a conter apresentações com artistas internacionais, mediante um tipo de  edição a conter animações muito simples, mas eficazes para a época, e visar assim, ocupar uma lacuna na programação.

O funcionário, em questão, chamava-se Luiz Fernando Maglioca, que ingressara naquela estação estatal, em 1969, como estagiário e recém formado da ECA (escola de Comunicações e artes, da Universidade de São Paulo, USP). A TV Cultura mantivera em seus primórdios, uma imagem sisuda na área da música, ao passar a imagem de apenas preocupar-se em difundir a música erudita.

Uma única aproximação com o público mais jovem, havia ocorrido em 1969, através do programa : "Jovem Urgente", que arregimentara alguns artistas ligados ao Rock Brasileiro de então, entre os quais, Os Mutantes e Novos Baianos, por exemplo, e que foi conduzido pelo psiquiatra, Paulo Gaudêncio, sob um formato parecido com o que Serginho Groismann promove há anos, atualmente, no entanto, sem a mesma estrutura, e muito mais contido, certamente.

Nele, o psiquiatra propunha discussões sobre temas ousados para a época, tais como a gravidez na adolescência; virgindade; homossexualismo; música e rebeldia etc. Claro, este durou muito pouco, pois irritara profundamente os agentes governamentais, e ainda mais em uma TV estatal com o governador daquele ocasião a compactuar com o regime de então no país.

Somente no avançar dos anos setenta, surgiu essa nova oportunidade, enfim, todavia como já salientei, de uma forma ocasional. Portanto, esse tapa-buraco dentro da programação regular da TV Cultura, sem nome definido ainda, causou espanto, mas simultaneamente, gerou uma reação inesperada para a diretoria da emissora, pois uma semana depois, naquele horário em que passara as inesperadas performances musicais com artistas como Joe Cocker; Rita Coolidge, e Carole King, entre outros, telefonemas bombardearam a TV Cultura, com telespectadores a desejar saber por quê o "programa" não fora ao ar, novamente.

Então, ficou claro que um interessante caminho novo estava a abrir-se, ao fazer com que nascesse então, a ideia de aquela iniciativa tornar-se-ia de fato, um programa oficial na grade daquela emissora. Essa primeira exibição fortuita foi ao ar no sábado, dia 14 de abril de 1972, portanto, dois anos antes da TV Globo lançar o seu, "Sábado Som". Ao receber o nome de : "TV 2 Pop Show", mostrou basicamente músicas extraídas de documentários, recortadas, e alguns "promos" (a encarnação anterior dos chamados, vídeoclips).

Com o tempo, o programa ganhou mais sofisticação. Sem um apresentador formal, usava locução em "off" e foi montado a instituir diversos quadros, para dissertar sobre álbuns recém lançados, mediante a exibição de suas respectivas capas. O "Sábado Som" atropelou-o, literalmente, a partir de 1974, mas sem abalar-se, o "TV 2 Pop Show" prosseguiu e pôs-se a a melhorar sempre em uma escalada contínua.

Já na metade dos anos setenta, mantinha uma audiência significativa, que outorgou-lhe a resistência que o "Sábado Som" da Globo não teve; sobreviveu ao "Rock Concert", que a própria Globo lançou em 1977, e aos similares da TV Bandeirantes, como "Balanço" e "In Concert".

Ainda nos anos setenta, passou a exibir quadros ditos "especiais", onde apresentava blocos dedicados à uma banda em específico, quando intercalava as performances musicais de tais artistas, com as suas respectivas informações biográficas; curiosidades e discografia.

Sob uma mudança de título, ao buscar uma repaginação, passou a ser conhecido como : "Som Pop", e com esse nome, atravessou os anos oitenta, pra vir a ser uma das principais, senão a maior referência de Rock e música Pop em geral, na TV brasileira.


Especiais produzidos pelo próprio programa, foi uma grande novidade no início da década de oitenta. Lembro-me bem em ver bandas setentistas brasileiras como o Made in Brazil e a Patrulha do Espaço, a tocar ao vivo no teatro Franco Zampari, de propriedade da TV Cultura, em especiais que ocuparam o espaço integral daquela atração, fator esse que em meu caso como músico, particularmente, eu considerava uma oportunidade incrível para o fomento do Rock nacional. Na metade dos anos oitenta, um novo apresentador ocupou a ancoragem do programa. Com Paulinho "Heavy" Toledo (vocalista da banda Inox, na ocasião), no comando, a programação pendeu mais para o som pesado, ao mudar um pouco o direcionamento observado imediatamente anterior, quando o Pop oitentista dominava as atenções.

Uma nova troca de apresentadores e Kid Vinil puxou de novo a corda para o Pop, e com o verniz do Pós-Punk e derivados, na sua na orientação estética. Com a chegada dos anos noventa, o velho Som Pop mostrava-se cansado e não suportou a concorrência da MTV, uma estação inteiramente dedicada à música e dessa forma, pôs-se a perder a sua energia, até sair de cena. Particularmente, acho que o TV 2 Pop Show / Som Pop, foi muito importante, em vários aspectos.

Em uma época onde a informação foi cerceada por motivações políticas, e os meios mostraram-se escassos pelas dificuldades tecnológicas inerentes da ocasião, é claro que um programa dessa natureza foi um oásis para os Rockers locais. Outro aspecto importante, dá margem à curiosa constatação de que existiu sobre um paradoxo, pois ao mesmo tempo que fora produzido por uma rede estatal, podemos analisar que o fato de não ter havido a mesma pressão por audiência e inerente captura de recursos publicitários que existem nas Redes de TV sob apelo comercial, também esteve sob o fogo cruzado dos interesses políticos, visto que principalmente nos anos setenta, um programa deliberadamente "jovem", incomodava os setores retrógrados do então regime autoritário. Nesse caso, mais um ponto para tal atração, pois teve uma longevidade impressionante (dezesseis anos no ar !), e marcou história na TV e no mundo musical.
Matéria publicada inicialmente no Blog Limonada Hippie, em 2014

terça-feira, 25 de março de 2014

Plínio Marcos, o Teatro Nu e Cru de um Funileiro... - Por Luiz Domingues

Nascido em Santos, no ano de 1935, Plínio Marcos foi um menino simples, filho de uma família humilde, formada por trabalhadores. Canhoto, foi obrigado a desenvolver a habilidade da escrita como destro, sob uma típica arbitrariedade do sistema educacional antigo, em torno da sua pedagogia marcada pela total insensibilidade. Acuado com isso, apresentou um profundo desinteresse pela vida escolar e postergou ao máximo a conclusão do curso primário de então, o que equivale hoje em dia a menos da metade do ensino fundamental.

Preocupado, seu pai esforçou-se para encaminhar o adolescente Plínio na vida, à uma profissão cabível, mesmo com esse baixo nível educacional e dessa forma, muitos empregos sucederam-se na vida dele. De vendedor de livros espíritas a aprendiz de encanador, Plínio enfrentou várias tarefas díspares entre si, mas pareceu  haver adaptado-se mesmo, na profissão de funileiro.

Cabe explicar que essa expressão tem nomes diferentes em certas regiões do Brasil, e aqui em São Paulo, falamos "funileiro", ao designar o profissional que faz reparos na lataria de veículos, portanto alguém a trabalhar em uma "funilaria". No Rio de Janeiro, por exemplo, a mesma função recebe o nome :"lanterneiro", ou seja, o profissional que trabalha na "lanternagem". O jovem Plínio realmente empolgou-se com a profissão que dava-lhe prazer, mas concomitantemente, duas outras atividades lúdicas despertavam-lhe a atenção. A primeira, o futebol. Por jogar na várzea de Santos, foi incentivado por colegas a fazer testes na base da Portuguesa Santista e do Jabaquara, dois clubes tradicionais na cidade de Santos, mas muito aquém da fama do Santos FC, o clube mais popular do município e dessa forma, ele julgou ter mais chances de passar nas peneiras, em clubes de menor porte.

E de fato, Plínio foi aprovado e jogou nas categorias de base da Portuguesa Santista, e diziam algumas pessoas que o viram jogar, que ele fora um bom jogador, com condições para vir a tornar-se um jogador profissional, porém, a outra atividade que mencionei acima, pareceu oferecer-lhe outras oportunidades. Ocorre que Plínio interessara-se pelo Circo. Em princípio, por motivação não artística, pois pleiteara namorar uma menina cuja família era oriunda de artistas circenses.

Uma vez inserido nesse seio familiar, ofereceu-se para atuar como palhaço e demonstrou traquejo nas apresentações. Dali em diante, criou o personagem : "Frajola" e atuou em vários outros circos de Santos, ao viajar a seguir, para todo o estado de São Paulo. Ainda nos anos cinquenta, tal palhaço foi atuar na TV 5, emissora de Santos, ao angariar grande sucesso entre o público infantil e teve e a sorte em deparar-se com Patrícia Galvão, famosa "Pagú", tremenda personalidade mítica da cultura paulista, que encantou-se com o talento do rapaz e o convidou para atuar na peça :"Pluft, o Fantasminha", em 1958.
Dali em diante, o mosquito do teatro o mordera, e ao apaixonar-se, passou a ler os grandes textos clássicos do gênero, para enriquecer a sua cultura pessoal de uma forma contundente, com Pagú ao seu lado a incentivar-lhe como uma autêntica, madrinha. Atuou posteriormente em várias montagens teatrais, e assim refinou a sua veia como ator, e arguto, toda a sua pesquisa bibliográfica começou a render-lhe frutos, quando aventurou-se a escrever, e preparar assim o despertar do dramaturgo que viria a tornar-se.

Bem no final dos anos cinquenta, Plínio ficou escandalizado com um caso policial que repercutira fortemente na imprensa santista. Tratou-se do caso de um menino que fora preso por uma acusação injusta e encarcerado em meio à bandidos perigosos, fora abusado sexualmente de forma violenta e quando finalmente foi libertado, arquitetou um plano de vingança para assassinar o seus estupradores.


Nasceu então, "Barrela", um texto fortíssimo e que chocou profundamente pela extrema rudeza do tema, assim como o linguajar recheado por palavrões e gírias dos malandros das ruas, ao ponto de ser perseguida pela polícia, que buscou os trâmites jurídicos para proibí-la. Não fosse a intervenção da própria, Pagú, ao ter procurado a interferência de Paschoal Carlos Magno, uma iminência parda do governo JK e homem muito ligado à cultura e ao teatro em particular, a peça teria sido banida sumariamente. Liberada oficialmente, continuou a chocar a opinião pública e de certa forma, choca até hoje, apesar de tantas décadas decorridas de seu lançamento.

A repercussão foi enorme e subiu à cabeça do jovem Plínio. Com críticas a sair publicadas em jornais a compará-lo com Nelson Rodrigues e até alguns mais afoitos ao arriscar chamá-lo de : "gênio", ele sentiu-se impelido a escrever rapidamente um segundo espetáculo, porém sem nenhuma ideia forte em mente, escreveu uma peça insípida, chamada : "Os Fantoches" (Chapéu sobre Paralelepípedo para alguém chutar). Anos depois, ele a reescreveria sob o título : "Jornada de um imbecil até o entendimento" No dia seguinte à estreia dessa nova peça, uma crítica arrasadora foi publicada no jornal : "A Tribuna de Santos", assinada pela própria Pagú, que antes o incentivava, e a manchete foi : "Esse analfabeto esperava outro milagre de Circo"...

Por não intimidar-se com o revés, mudou-se para São Paulo em 1960, e continuou a escrever e a envolver-se no metier teatral, agora a buscar voos maiores, na capital.


Todavia, sob um primeiro instante, sem meios para sustentar-se com o teatro, encarou sem frescuras o trabalho de camelô nas ruas, ao vender bugigangas as mais diversas para sobreviver.
Finalmente ele enturmou-se com o meio teatral e emendou trabalhos como ator, ao ser dirigido por um artista do quilate de Ziembinski e a contracenar com uma Diva absoluta como, Cacilda Becker, que aliás, tornou-se muito amiga sua, doravante. E por ser absolutamente simples, Plínio cativara os colegas pela sua total ausência de estrelismo. Foi versátil ao extremo e mesmo por ser um ator que evoluía a cada dia e reconhecido como um autor de potencial enorme, não fazia-se de rogado e se a produção precisasse de alguém para trabalhar na bilheteria, ou como contra regra, o Plínio estava sempre pronto para ajudar.


Ele cresceu muito no meio, e por conseguinte, surgiu a oportunidade e ele aceitou o convite para atuar na produção da "TV de Vanguarda" da TV Tupi. Tudo sugeria mais uma progressão na carreira, mas Plínio viu-se em apuros novamente, quando a peça que reescrevera, sob o novo título : "Jornada de um imbecil até o entendimento", fora vetada pela censura imposta pelo governo autoritário da ocasião. Nesses termos, ao coincidir com a sua saída da TV Tupi, ele ficou sem meios para ganhar dinheiro e assim, sem nenhuma cerimônia, voltou às ruas para trabalhar como camelô. Até álbum de figurinhas vendia na sua barraquinha improvisada.

Aliás, a sua saída da TV Tupi foi bem suspeita. Rumores deram conta de que houvera sido descartado, por ser considerado um simpatizante da oposição ao governo e dessa forma, os que pensavam de forma conservadora dentro dessa emissora, então representada pelo simpático logotipo a exibir um índio, tratou por  marginalizar o suposto oponente desbocado...


Alheio às perseguições e a luta pela sobrevivência nas ruas, ele continuou a escrever e dirigir a sua metralhadora ácida, para retratar através da sua dramaturgia, a sociedade em suas mazelas mais abissais. "Dois Perdidos Numa Noite Suja"; "Navalha na Carne"; "Quando as Máquinas Param"; "Homens de Papel"... e sua fama cresceu avassaladoramente. E como a censura liberou-as ?

Provavelmente os senhores censores não perceberam nenhum conteúdo "subversivo" em tais textos e mesmo a ala retrógrada que prestava maior atenção na questão dos costumes em busca pela moralidade, não demonstrou incômodo com os palavrões inerentes em suas obras.

Cacilda Becker declarou publicamente, que Plínio era um homem que só usava palavrões em seu vocabulário cotidiano, porém,  mesmo assim, conseguia ser genial em seu uso dentro dos textos; Roberto Freire o chamou de "gênio"; Walmor Chagas só o elogiara com muita eloquência e bingo, a fama mostrou-se consolidada.


Em 1968, Plínio voltou à TV Tupi e como ator, participou de um momento revolucionário na TV. Ao atuar em "Beto Rockfeller", uma novela que ousou; inovou e quebrou paradigmas, Plínio interpretou um personagem secundário, mas que ficou muito querido do público. Ele viveu o "Vitório", o melhor amigo do personagem fanfarrão, Beto (Luis Gustavo), e a mostrar-se conhecedor, portanto, das falcatruas que o Beto perpetrava para inserir-se na alta sociedade e tentar aplicar golpes nos milionários.

Prosaico ao extremo, era um humilde mecânico a trabalhar em uma pequena oficina de bairro e vivia o dia inteiro sujo por conta da graxa e a pronunciar-se mediante o uso exagerado de um sotaque paulistano, ultra italianado e muito típico da Mooca, um tradicional bairro dominado por italianos na capital paulista. Claro que tal personagem caiu nas graças do povo e como interpretação, não deve ter exigido nenhum esforço maior de laboratório para a criação do personagem, pois foi quase uma representação de si mesmo, com macacão de trabalho, sujo de graxa e com aquela verborragia mega popular. Talvez tenha sofrido somente um pouco para coibir os palavrões, mas se Dercy Gonçalves conseguia o mesmo feito nas novelas e filmes em que atuava, Plínio também poderia, também...

A novela foi um estouro de audiência, por apresentar muitas novidades, tais como : uma trilha sonora criada a dedo e com exclusividade; diálogos mais modernos; ala jovem representada; enquadramentos ousados; cenários melhor caprichados, assim como na observação dos figurinos dos personagens e sobretudo, por quebrar o ranço que as novelas continham até então, ao imitar o formato do folhetim das novelas mexicanas e cubanas.

Um filme com os personagens de Beto Rockfeller e Vitório foi realizado em 1970. Teve o mesmo mote da novela, mas sem repetir outros personagens. Confesso que gosto bastante dele, embora reconheça que tenha ficado aquém da força que a novela obteve em 1968. Em 1973, uma nova novela foi produzida a tentar repetir o sucesso, com o nome : "A Volta de Beto Rockfeller". Beto e Vitório estiveram presenes nessa nova investida, entretanto, a novela fracassou, ao não angariar nem 10% do élan que a original de 1968. arregimentara.

Nesta altura, Plínio teve também um envolvimento com a música, pois escrevera espetáculos musicais a enfocar o samba e o carnaval. Anos depois, em 1974, um curioso LP foi lançado sob o título : "Plínio Marcos em Prosa e Samba", com a presença de Geraldo Filme, famoso sambista paulistano. 

De volta a falar sobre a sua atuação teatral, ao retroagir para 1968 o endurecimento do sistema em dezembro de 1968, via AI-5, tornou a censura mais rígida e implicou bastante, por extensão com a obra de Plínio. Até cerco militar na porta de teatros foi montado para impedir a encenação de suas peças e tudo ficou difícil, novamente. Daí em diante, foram muitas viagens à Brasília para tentar convencer a "intelligentzia" a liberar os espetáculos.

Plínio certa vez citou um desses diálogos com tais senhores que serviam a censura :
- "Por quê as minhas peças estão censuradas" ? 
- "Porque as suas peças são pornográficas e subversivas"
- "Mas por quê são pornográficas e subversivas" ?
- "São pornográficas porque tem palavrão e subversivas porque você sabe que não pode escrever palavrão e escreve"...

Para Plínio, o palavrão era a linguagem das ruas. Foi o que ouvia nas oficinas mecânicas; salões de barbearia; botecos; na cadeira do engraxate e entre os carregadores do mercado municipal... acuado então diante da intransigência dos reacionários, bandeou-se para a literatura. Talvez se escrevesse livros, não fosse tão perseguido.


Além do traquejo como dramaturgo, Plínio fora um jornalista prático, pois escreveu colunas em vários jornais, desde 1968 e o ato em escrever foi mesmo o seu forte.  Então, como escritor, lançou trabalhos interessantes. Com o formato do romance ou da poesia, Plínio pôs-se a ludibriar a censura e o preconceito, mas acima de tudo, sobreviveu. Ele lançou livros como : "Querô - Uma Reportagem Maldita"; "Histórias das Quebradas do Mundaréu"; "Inútil Canto e Inútil Canto pelos Anjos Caídos"; "Oração para um Pé-de-Chinelo"; "Prisioneiros de uma Canção" etc.

Aliás, sem nenhum pudor, costumava vendê-los como camelô em porta de teatros e shows musicais. Eu mesmo, Luiz Domingues, o vi a cumprir tal tarefa, muitas vezes na porta do Centro Cultural São Paulo, e mesmo sem nunca tê-lo abordado diretamente, eu admirei a sua absoluta falta de estrelismo, mesmo ao ser um grande artista. Outros em seu lugar recusar-se-iam em trafegar dentro  de veículos que não fossem limusines, mas o Plínio estava ali na sua humilde barraca, firme e forte, munido de seu inseparável cetro, a sua marca registrada enquanto persona performática.

A surpreender, sempre, eis que surgiu o boato nos anos noventa : Plínio marcos agora ministrava consultas com cartas de Tarô.


Foi verdade, mas o que ninguém soube, foi que o envolvimento dele com essa escola mística, veio de longe. Plínio estudava os arcanos maiores e menores, desde o seu tempo de circo. Tanto que chegou a escrever uma peça, "Madame Blavatsky", inspirado na grande musa da Teosofia, para provar que o seu conhecimento sobre o tema, não constituíra-se de um modismo de ocasião. E nos anos noventa, ele  lançou o curso de tarô : "O uso mágico da palavra". Por conta disso, ofereceu inúmeras palestras; workshops e oficinas. Lembro-me por vê-lo, inclusive na TV, em programas de variedades e talk-shows, para falar a respeito desse tema. Plínio Marcos deixou-nos em 1999, vítima de um derrame cerebral.

Recomendo a visita ao site oficial de Plínio Marcos, mantido pelos seus filhos, com um cuidado exemplar. É muito completo e dignifica a memória do artista criativo que ele foi. Baseei-me nele para a minha pesquisa :

http://www.pliniomarcos.com/index2.htm

Plínio foi incompreendido por muitos, mas a verdade é uma só : revelou-se um tremendo artista, a apresentar uma multiplicidade total e a despeito de ser execrado por alguns detratores que o  acusam em ter sido analfabeto e desbocado, ele fez incomensuravelmente mais pela cultura do que todos os seus detratores, somados. Ou seja, nada mau para quem só concluiu o curso primário e a cada dez palavras que costumava pronunciar, dez foram palavrões...


Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu, em 2014.

sábado, 22 de março de 2014

Buzina, um Tormento a Mais... - Por Luiz Domingues

Muito fala-se sobre o caos dos engarrafamentos gigantescos no trânsito e também sobre o impacto ambiental negativo que a brutal emissão de poluentes causa, inevitavelmente. Fala-se muito também (e com toda a razão), sobre as questões que envolvem a condução dos veículos, principalmente a absurda quantidade de irresponsáveis que dirigem embriagados, fora os transgressores, que não respeitam as regras básicas do trânsito. Hoje trago como tema, um outro transtorno pouco citado, mas tão nocivo quanto os demais, que arrolei acima : os excessos cometidos pelo uso equivocado da buzina...
Parece uma piada, se formos considerar como fato isolado, mas a realidade é outra, se levarmos em conta os milhões de neuróticos a transitar por aí e a fazer o pior uso possível do instrumento.

Sob uma rápida constatação, é triste verificar que as pessoas em geral tem a ideia errônea de que a buzina tem a mesma função de uma campainha ou telefone. Para tais pessoas que usam a buzina com essa função, fica a advertência de que estão equivocadas, pois é evidente que a buzina não foi instalada nos automóveis, com essa finalidade.

Pior, é achar que ela tem o poder de intimidação, como se fosse uma palavra de ordem e imposição de uma pessoa sobre a outra, ao denotar a prepotência de quem considera-se poderoso dentro de sua "arma" ambulante. Existe também o uso pela euforia. Usa-se a buzina como se fosse a melhor maneira para extravasar momentos marcados por uma alegria pessoal. Geralmente associa-se o uso indiscriminado da buzina, para comemorar conquistas esportivas, notadamente dos clubes de futebol, e inevitavelmente vem à lembrança o clichê : imagine na Copa...

Carreatas sob cunho político e / ou religioso e por motivações menos cotadas, também colaboram bastante nessa poluição sonora.

A buzina como instrumento de galanteio, é outra modalidade bastante acessada. Chamar a atenção das mulheres, ao usar a buzina, é uma prática comum, principalmente em países latinos. Como instrumento de impaciência, é então uma das maneiras mais comuns para pressionar outros motoristas. O semáforo ainda está a exibir a cor amarela e o cidadão colocado atrás, já aperta o seu instrumento com contundência, para exigir a arrancada de quem ainda espera o sinal verde.  ser acionado à sua frente.

No período noturno, e no avançar pela madrugada, a insegurança pública é a desculpa para não respeitar-se os semáforos e aí, mesmo que haja perigo de colisão ou atropelamento, você é advertido com bastante veemência, pelos motoristas ao seu redor, para não parar, e assim ser forçado a desrespeitar os sinais. É o tal negócio : se para, enfrenta a fúria do motorista que acha que você o "atrapalha", mas também corre o risco da abordagem de bandidos. Contudo, se avançar, muito provavelmente a multa chegará em sua casa pela infração, e basta haver uma câmera instalada no semáforo...

A questão da "Lei do Silêncio" é uma regra pouco respeitada. Buzinas usadas sem parcimônia, agressivamente, ou por autênticos idiotas ébrios, ecoam pelas madrugadas, pouco a importar-se com a perturbação do sono das pessoas alheias e diga-se de passagem, muito pelo contrário, o objetivo é azucrinar, mesmo...

Hospitais; casas de repouso de idosos; clínicas; creches, & berçários; velório... nada disso importa aos energúmenos de plantão, se resolvem apertar a buzina em seus respectivos volantes.


No texto da Lei, é clara a atribuição da buzina. Basta ler o artigo 41 do Código Brasileiro de Trânsito. Ela é um item de segurança, que serve para advertir outro motorista ou pedestres, sobre  a iminência de um acidente, ou para anunciar uma ultrapassagem, no caso de um ambiente pouco sinalizado, caso de pequenas estradas vicinais, por exemplo. Somente isso...

E mesmo assim, o uso é recomendado com certa "suavidade", ao ser sugerido desferir toques rápidos e na menor quantidade possível, muito diferente das animalescas buzinadas com o punho a apertar o volante com bastante ênfase, como geralmente observamos nas ruas. Diante de tantas irregularidades, parece que o melhor caminho é o educacional, mas receio que o trabalho apenas surtirá efeito em um médio / longo prazo, se começarmos a educar as crianças com noções de cidadania; respeito e civilidade, imediatamente, pois quanto aos "buzinadores" adultos da atualidade, parece que não hã mais solução para corrigi-los..


Matéria publicada inicialmente no Blog Planet Polêmica em 2014

sexta-feira, 14 de março de 2014

Evitar a Escassez é o Desafio - Por Luiz Domingues

Já faz tempo, comenta-se através da mídia, a dramática diminuição dos recursos naturais hídricos. Não obstante o fato da população mundial aumentar em progressão geométrica, na via inversa, o esforço da máquina governamental para equilibrar essa equação pênsil, não logra êxito, pela brutal demanda e muitas vezes por negligência e a observar interesses escusos, mesmo.

Como se não bastasse tais fatores, devemos considerar também a questão do calor escaldante. Muito comenta-se sobre o aquecimento global via camada de ozônio e nesses termos, fenômenos naturais como o assustador, "El Niño", por exemplo, embora algumas correntes da ciência discordem e acusem certos colegas em cometer o ato do exageêro nessa perspectiva, para favorecer certos governantes que lucrariam com tal ideia a ser disseminada (neste caso, correntes que negam tal perspectiva também pode ser mancomunada com outros interesses escusos). Como leigo da ciência e cidadão comum, portanto longe da realidade dos bastidores da política, não descarto nenhuma hipótese, mas constato pessoalmente : a cada ano, a sensação de calor parece mais forte e o inverno não é mais rigoroso como em décadas passadas, pelo menos onde eu nasci, cresci e moro, a cidade de São Paulo.

Diante de tal quadro, é público e notório que a matemática caminha para o quadro do colapso total e resta-nos apenas saber quando ocorrerá. Campanhas publicitárias governamentais já nem faz efeito mais.

As pessoas parecem não sensibilizar-se com tal questão, por mais tétrica que seja a perspectiva mostrada em tal propaganda e pior, parece achar que os cientistas exageram ou que trata-se de uma mera mentira estrutural, a serviço de alguma teoria conspiratória.
O fato, é que ao pagar a conta da água, o cidadão comum pensa que a tarifa é alta por uma simples questão de cupidez de lucros (claro que tem um elemento de verdade nisso, também), e ao pagar, sente-se no direito em gastar a água o quanto desejar, de uma forma indiscriminada, como se fosse um bem de consumo oriundo de uma fonte inesgotável.


E não é assim que funciona, infelizmente. O desperdício é total, em todos os setores. É rara a empresa; indústria; comércio ou organização prestadora de serviços que observa um plano de metas para a economia de água, bem estruturado.

O próprio governo, que sabe melhor do que ninguém da real situação, muitas vezes dá um mau exemplo, mesmo que eu reconheça ser quase impossível controlar uma máquina mastodôntica a contar com milhares de funcionários etc. No entanto, "mea culpa, mea maxima culpa"... o cidadão comum pouco colabora com tal questão. Ao pensar constituir-se em uma tarefa prosaica e inútil pela insignificância de seu ato isolado (e oculto), o cidadão tende a considerar que o seu sacrifício pessoal pouco ajuda no cômputo geral e daí, não mensura que outras pessoas possam ter o mesmo raciocínio errado.

Nesse caso, se ao escovar os dentes, eu deixo a torneira aberta, gasto cerca de vinte e cinco litros de água, mas se milhares, quiçá milhões de pessoas, praticar o mesmo ato impensado, quantos litros serão desperdiçados ?

Basta dar uma volta pelo bairro em um dia pela manhã e observamos as donas de casa e / ou empregadas domésticas, a empurrar, literalmente, a sujeira da calçada, mediante o uso de jatos d'água provenientes de uma mangueira. Certo, não sou eu que pagarei a conta ao final do mês dessas pessoas, mas e o desperdício, não afeta-me diretamente ao esvaziar-se as represas ?

Eu sei que esse hábito diminuiu muito nos últimos anos, mas ainda existe muita gente que faz da lavagem do automóvel da família, aos sábados, a sua terapia ocupacional. Em média, são cerca de seiscentos litros d'água jogados na calçada, um verdadeiro absurdo.

Faz calor no Brasil tropical em pleno verão, eu sei. Em algumas  regiões do país onde a sensação é uma constante, sentir-se suado e pegajoso o dia inteiro, ao impelir naturalmente que as pessoas busquem tomar mais de um banho por dia. Sabe qual é a média de uso de água, em um banho com quinze minutos de água a escorrer sobre o corpo ? Cento e oitenta litros a esvair-se pelo ralo...

Enfim, os governantes agem mal por muitos motivos; as corporações estão pouco a importar-se para tudo e para todos, somente a pensar em arrancar dinheiro dos consumidores (sim, para eles, não somos pessoas, mas "consumidores"), mas deixo a pergunta : e você ?


O que você realiza em seu cotidiano para colaborar, mesmo que o seu esforço pessoal não seja visível ? Pois é, a água está a findar-se e se não mudarmos os nossos hábitos pessoais rapidamente, passaremos por um sufoco assustador... e vai ocorre em breve.