sábado, 26 de março de 2016

CD 8080 - 8080 - Por Luiz Domingues


Eis que eu recebi, recentemente, o trabalho de uma banda paulistana relativamente nova, mas formada por dois guitarristas da pesada, e muito tarimbados da cena Rocker da cidade de São Paulo.
Chamada como "8080", a banda liderada pelos ótimos, Chico Marques e Cláudio “Moco” Costa, apresenta o seu CD debut à cena artística, em grande estilo.
Ambos são amigos de longa data, oriundos da simpática cidade interiorana paulista de Marília (alô, MAC !), e que vieram batalhar a carreira na capital paulista, há mais de quinze anos, ao adquirir assim, o amplo respeito e admiração generalizada, ao atuar pela noite paulistana, com bandas tributo; ou a atuar como side-man para artistas em geral, e tornar-se produtores musicais, igualmente,  com muitas ações realizadas em estúdios. E agora, acertam a mão mais uma vez ao lançar-se como uma banda autoral, e mostrar assim, um trabalho sob forte apelo Pop, com muita substância musical e atributos múltiplos em seu trabalho.
Antes de avançar por esta resenha, eu devo esclarecer que, sim, o grupo, "8080" mostra fortemente a sua influência básica em torno do movimento "BR-Rock 80’s", mas também, ao contrário do que poder-se-ia imaginar, ao tratar-se de uma banda fundada por dois guitarristas, a intenção não foi fazer menção ao amplificador Marshall, modelo 8080, tampouco. Todavia, a explicação oficial vinda de ambos os guitarristas e mentores da ideia, tal numeração correspondia à placa de um carro que Chico Marques possuía, quando conheceu, Cláudio “Moco”Costa, lá na ensolarada cidade de Marília / SP, no início dos anos 2000. 
Entretanto, no cômputo final, acredito que a somatória das três hipóteses faz sentido, pois de fato há um sabor da década de oitenta no trabalho; existe o enfoque total das guitarras (daí a menção ao amplificador, fazer jus ao nome), e a explicação oficial é típica da cultura Rocker, ao atribuir um certo quê de misticismo em evocar um “sinal mágico”, certamente enviado pelos Deuses do Rock. Sobre o álbum homônimo, são dez faixas para ser saboreadas.
O talentoso, Chico Marques, um artista com múltiplos atributos

O disco abre com : “Todo Mundo Quer Amor”. Trata-se de um Rock bem para cima, festivo, e com muita influência do grupo carioca oitentista, Barão Vermelho. O trabalho das duas guitarras é excelente. Riff; base; solo, e contra-solos como manda o figurino do som com forte pegada Pop, com forte apelo radiofônico.

O vocal do Chico é límpido; com excelente emissão; dicção, e por dar o recado como Cazuza daria, mas em minha opinião, Chico tem mais atributos vocais, e por isso empolga, em meio ao alto astral da canção. A presença dos backing vocals em vocalises plenos em onomatopeias ao estilo : “Uh-uhs”, lembra a Rita Lee & Tutti Frutti dos bons tempos. A letra fala sobre o amor, sem grande arroubo poético, mas atende ao clima da música, com bastante eficácia.

Discreto, mas muito funcional, um órgão Hammond ao fundo faz uma base ao estilo “sombra”, que dá um charme e tanto para a canção. Esse teclado foi executado pelo próprio, Chico Marques.
         Ouça : "Down de te Amar", nesta postagem do You Tube

A segunda faixa, “Down de te Amar”, começa com um slide muito bem tocado. Lembra o som do "AC/DC" de certa forma, pelo Riff de Rock básico e envolvente. Nesta canção, um convidado especial atua, a destacar-se : Ricardo Cristaldi, um ótimo tecladista que somou muito ao trabalho. A intervenção dele ao Clavinete é sensacional, ao proporcionar um tempero da boa Black Music, com um balanço incrível. Impressiona também a extrema felicidade na escolha do timbre desse instrumento. Apreciei muito. Eclético, também colocou piano elétrico (que Billy Preston abençoe o Fender Rhodes !), e órgão Hammond, para enriquecer demais a música.
Chico e Cláudio brilham, igualmente, com guitarras super desenhadas e sensacionais, que passeiam com desenvoltura pelo "pan" do stereo, e os timbres são ótimos.A canção contém também, um ótimo refrão, além de um solo de guitarra para entortar a espinha de qualquer ouvinte sensível que aprecie o Rock'n' Roll.
Chico Marques, mais uma vez mostra o seu talento vocal, com uma interpretação ótima.
   Ouça : "Nosso Mundo é ainda Perfeito" no promo do You Tube

Hora para ouvirmos : “Nosso Mundo ainda é Perfeito”. Essa remonta mais a uma outra vertente do BR Rock 80’s. Lembra artistas mais orientados pelo Pop e menos Rock, como : Lulu Santos; Rádio Táxi; Kid Abelha, e até o Kiko Zambianchi. Existe intervenções de sintetizadores ao sabor dos anos oitenta, além de guitarras mais limpas, mas extremamente bem colocadas e tocadas.
           Ouça : "Amor ao Contrário na postagem do You Tube

“Amor ao Contrário” é uma bela balada. Contém um balanço dançante que certamente bebe da fonte do R’n’B e remete aos Rolling Stones, em sua produção sonora mais dos anos 1980. Há um violão providencial, tocado pelo Chico, a amenizar a harmonia, e uma grande profusão de arpejos, super inspirados vindos da guitarra do Cláudio.
     O grande, Cláudio "Moco" Costa, um guitarrista superb 

O refrão é muito bom, a observar um "crescendo", com uma linha melódica bem desenhada, não apenas pela criação da melodia em si, mas pelo ótimo tratamento de áudio, no acabamento final da mixagem, que o valorizou, bastante.

Eis a quinta faixa, “Ganhar ou Perder” onde a menção aos Rolling Stones e Barão Vermelho é total, a estabelecer uma combinação muito boa entre o riff e a melodia. Após um excelente solo, super Rock’n Roll, e um refrão com uma modulação harmônica sutil, mas bem instigante.
A sexta faixa, “Caso Encerrado” entra com riff forte, e uma voz dobrada muito bem engendrada. O fato do Cláudio ser também um bom técnico de som e ter feito a mixagem do álbum, certamente foi decisivo nessa ótima escolha de desenhos a passear pelo "pan". O stereo é muito bem aproveitado, com muitos detalhes, que deixaram o trabalho não só nesta faixa, mas no disco todo, muito rico.

“Você nem Liga”, a sétima faixa, contém uma certa aura reggae / ska, e lembra o trabalho do "Hanoi-Hanoi", de alguma maneira. O convidado especial, Ricardo Cristaldi colocou um naipe de metais sampleados, via teclados, bem arranjado, além de algumas pontuais intervenções de sintetizador ao longo da canção. Até o uso de um recurso tipicamente oitentista, o “clap”, é usado.
Cláudio arrasa no Wah-wah. Sutis também são alguns backing vocals a costurar o vocal principal, sob um arranjo bastante feliz.

“Simples” lembra os Rolling Stones, mas de uma outra época, mais sessentista, talvez pela batida que fez-me lembrar de uma canção como : “Child of the Moon”. Há mais uma ótima presença das guitarras, com timbres sensacionais, e um vocal dobrado e muito bem desenhado. Gostei da solução do "fade out" final, pois acho que foi perfeita.
A nona faixa, “O Certo é o seu Mal”, também apresenta um Riff forte e muito Rock’n’Roll. Mais uma que lembra o som do Barão Vermelho, fala sobre o amor, como quase todas as demais, mas com um pouco mais de acidez, desta feita, senão, vejamos :


“Fingindo ser tão Chic, pra ver se chama a atenção

Perdendo toda a classe se alguém te fala que não,

Tentando a noite inteira achar o seu alvo ideal”...


Trata-se, sem dúvida, de uma das melhores letras do álbum, em minha ótica.

“Apoteótico” entra a fazer jus ao nome, com um Riff ornado pelo Rock clássico e bem animado. O refrão envereda pelo Pop oitentista, super radiofônico e a pergunta é inevitável : por quê uma banda como o "8080", não está a ser executada nas emissoras de rádio ? Bem, sabemos a quantas anda a mentalidade no panorama da difusão mainstream... portanto, só lamento essa ausência.

Gostei da letra, com uma firmeza de propósito das mais salutares. O negócio é seguir em frente, sem espaço para o desânimo, mesmo que as coisas não estejam do jeito que gostaríamos que fosse a realidade.


“Mesmo que eu tropece nos meus passos,

 Tudo o que eu quiser um dia eu faço,

Mesmo se eu tiver um ponto fraco,

Não me iludo mais, eu piso em falso,

Mesmo que eu me esqueça um pedaço,

Levo a maior parte nos meus braços,

Pra chegar inteiro no final”...


Nesse trabalho inicial, Chico e Cláudio tocaram todos os instrumentos, tirante as faixas onde o tecladista, Ricardo Cristaldi colaborou.
Chico Costa tocou guitarra; violão; órgão Hammond e foi coprodutor geral, enquanto Cláudio “Moco” Costa tocou guitarra e baixo; além de programar a bateria eletrônica; produzir; editar, e mixar o álbum. Por isso eu não mencionei baixo e bateria nas faixas, pela ausência de componentes oficiais nesse trabalho. Sobre a bateria, foi super bem programada, e é muito eficaz, com rara felicidade, até. Para o padrão Pop, é perfeita, ao atuar de uma forma reta, com discretas viradas etc e tal, mas deixo a ressalva que a banda já providenciou um baterista de alta técnica e fixo na formação (Lucas Melo), e que certamente vai gravar uma bateria mais humana e desenhada nos próximos trabalhos, para enriquecer ainda mais o trabalho do 8080.
      O promissor, Lucas Melo, um tremendo reforço para o 8080 

Sobre o baixo, Cláudio executou as linhas com grande firmeza, bom timbre e eficácia. Não apresentou grandes voos, mas apresenta-se bem agradável no contexto geral dos arranjos das canções. Uma outra boa nova, a banda já anunciou a presença de um ótimo baixista oficial, Silvano Andrade, que vai somar muito nesse trabalho, certamente.
                      Silvano Andrade, um baixista da pesada 

Mais uma particularidade dessa obra, é que ela foi gravada em uma noite tão somente, e segundo Chico e Cláudio, as músicas foram compostas; arranjadas; e gravadas, ali no calor do estúdio, ao mostrar mais um trunfo da dupla, ou seja, com a criatividade à flor da pele. Sobre a gravação, gostei muito da sonoridade geral, e como já salientei, os timbres dos instrumentos, sobretudo as guitarras, ficaram espetaculares, além de também chamar-me muito a atenção o tratamento dado às vozes, no processamento de mixagem. Gostei do padrão da mixagem, com tudo na frente, e que honra as tradições do Rock, em um dos aspectos que mais o consagraram, isto é, o fato de que todos os instrumentos são importantes no cômputo geral, portanto, Cláudio soube dar essa marca ao disco.
A respeito da capa, eu gostei bastante da ilustração. Trata-se de uma garota jovem; sensual; e muito voluptuosa, a mostrar-se bastante perigosa a apontar-nos um ostensivo revolver. Apesar de parecer agressivo, creio que a metáfora é outra, e não chocou-me, necessariamente. O responsável pela ilustração foi o artista gráfico, Paulo Argollo, que mostrou ter influência boa das "Comics", com traços bem marcantes.

Gravado; mixado, e masterizado no DaCosta Studio, em 2014. Produção geral de Cláudio Costa e Chico Marques.
Para quem fica o dia inteiro absorto nas Redes Sociais, a reclamar que o Rock brasileiro está caído, ou mesmo morto, digo com pesar que trata-se, infelizmente, de um preguiçoso, ou deliberadamente esse tipo de pessoa gosta de fazer o gênero, “reclamão”, ao destilar o seu insuportável discurso vitimista, ao disseminar o baixo astral e sob o sentido do derrotismo sem fim. Mesmo ao considerar-se que a difusão "mainstream" atual, está realmente dominada em sua totalidade, pelos agentes da subcultura (ou mesmo anticultura, o que é muito pior), por outro lado, existe uma cena artística a habitar o patamar "underground", a mostrar-se viva e pulsante, com dúzias, ouso dizer, centenas de bandas a apresentar muita qualidade, ao produzir música em todas as vertentes imagináveis.
Portanto, se ao invés dos lamentos, as pessoas tirassem as suas respectivas nádegas preguiçosas do sofá para ir prestigiar tais artistas nas casas de espetáculos onde costumam apresentar-se, ou se no mínimo, tivessem a mínima paciência para ouvir os seus trabalhos através dos canais disponibilizados na internet, e os compartilhassem pelas redes sociais, já seria um alento.


Basta fazer uma busca nos arquivos dos meus Blogs 1 e 2, e o leitor verificará que eu já enfoquei vários artistas com extrema qualidade, e que merecem o nosso apoio. É o caso do 8080, outra banda brasileira que eu recomendo !


Para conhecer melhor o trabalho dessa boa banda, procure a sua página no Facebook :




Procure também o seu canal oficial de You Tube :




E dá para ouvir o disco, igualmente no Soundcloud :

segunda-feira, 21 de março de 2016

De Onde vem os Políticos ? - Por Luiz Domingues





Desde sempre, a máxima espanhola que diz : “se hay gobierno en esta tierra, yo soy contra”, também domina o imaginário do brasileiro de uma forma muito contundente. Na maioria das vezes, as reclamações procedem, pois a má gestão grassa em todas as esferas da administração pública, mas também a falta de reconhecimento da parte da população, para com eventuais acertos e a boa vontade em acertar em muitos aspectos, é notória. Esse é um primeiro ponto a pensar-se.
Um outro aspecto, tão gritante quanto a constatação de que vivemos uma época em que nunca desvelou-se tanta corrupção, com uma roubalheira a atingir cifras inacreditáveis, que se bem usadas em ações públicas tão necessárias, melhorariam setores que estão moribundos, caso da saúde e educação pública; fora a segurança; saneamento e infraestrutura que estão em patamar insuportável. Portanto, um alimento e tanto para os “reclamões de plantão”, que mesmo que nada houvesse de errado no panorama da política, bradariam contra, veementemente e agora diante das provas cabais que surgem, tem prato cheio para berrar.
É nesse ponto que a reflexão mais aprofundada não avança e ficamos na superfície da análise popularesca, que não propõe enxergar os fatos de frente, com o povo a ficar no “oba oba” dos linchamentos morais, e agora com o advento das redes sociais da internet, isso ganhou proporção de histeria incontrolável.Além de pontuar que se há um agente corrupto, ele deve ser imediatamente investigado e se após um julgamento justo, com direito à defesa ampla e se realmente comprovado o seu malfeito, receber a sua devida punição exemplar, mas isso não significa que o órgão pelo qual atuava, agiu de forma institucional no ato do desvio e muito menos que isso tenha sido arquitetado por um partido político, indevidamente "demonizado" como um agente maléfico, por seus adversários ideológicos.
Vejamos um exemplo prático que aos nossos olhos parece estranho pelo choque de culturas muitos diferentes : no Japão, um político que é desmascarado em alguma falcatrua, sente tanta vergonha pelo fato em que envolveu-se, que ele automaticamente vai nutrir a vontade de morrer, desaparecer inteiramente, como única forma de  livrar-se da pressão que tal ato hediondo por ele cometido causou, com prejuízo à coletividade, e por conseguinte, a destruir a sua reputação pessoal, e pior ainda, ao envergonhar os seus familiares.
Isso é inimaginável na cultura brasileira "carnavalizada", onde nada envergonha e tudo pode ser cometido, não é mesmo ?
Então, eu  chego ao âmago da questão : se achamos normal urinar nas ruas; jogar lixo pelas calçadas; jogar entulho em qualquer lugar; destruir patrimônio público e privado; vandalizar; circular com bicicletas sobre calçadas; avançar o semáforo no sinal vermelho; perpetrar conversões proibidas, obstruir a entrada de garagens; furar filas; não respeitar idosos e deficientes físicos; mentir para obter vantagens pessoais; falar mal da vida alheia; praticar bullying; pedir objetos emprestadas e não devolvê-los ao seu dono; não honrar dívidas contraídas deliberadamente; gerar intriga; desdenhar das pessoas; e tantas e tantas falcatruas que o brasileiro comete diariamente e as considera como fatores corriqueiros, ou como dizem os mais dissimulados : “faz parte da nossa cultura”. Portanto, como podemos colocar o dedo em riste na face de certos políticos; agentes públicos e empresários que perpetram esse espetáculo deprimente de corrupção e desvio de verbas ? De onde vem o “jeitinho brasileiro” ?
A maldita concepção de “malandragem”, a cultura do “esperto que ludibria otários”, ou para ficar em uma gíria mais moderna, os “manés”. Essa ideia paradigmática que somos um povo cheio de malandragem, criou uma falsa noção de superioridade, que beira o ridículo. Todo brasileiro é “malandro”; é “esperto”, e ludibria facilmente os “manés” gringos...
Certo, então... nós somos malandros que aplicamos pequenos golpes e arrancamos dinheiro dos “trouxas” dos gringos que vem fazer turismo aqui. Muito bem, somos  “superiores” e eles, uns “otários”...
Os Finlandeses; dinamarqueses; suecos; norteamericanos; franceses; britânicos; alemães; suíços; japoneses... todos são uns otários, e nós é que somos “malandros”...
Diante dessa perspectiva, eu pergunto-lhe, meu caro leitor : de onde saem os políticos e os empresários que envolvem-se nas falcatruas de corrupção; propinas; favorecimentos e desvio de verbas públicas com lavagem de dinheiro e afins ? Tal categoria de "Seres" não são humanos desse mesmo seio pátrio ? Tais criaturas abomináveis não foram criados na mesma cultura da malandragem, que há séculos vem sendo valorizada e cantada em prosa e verso ?
Somos ou não somos um povo “macunaímico”, no pior sentido do conceito cunhado por Mário de Andrade, impregnado por valores equivocados, acerca das questões éticas ? Como podemos ser surpreendidos ao depararmo-nos com a roubalheira em todas as esferas do setor público, com as mãos dadas com as expectativas de boa parte da iniciativa privada, que acostumou-se com a máxima de que ”nada funciona se não molhar-se a mão dos agentes públicos e / ou políticos” ?


Vejo portanto com bons olhos a ação da Polícia Federal; Ministério 
Público e demais órgãos envolvidos na determinação de apurar denúncias múltiplas que estão em alta voga na mídia, mas ao deixar a ressalva de que toda denúncia deve ser investigada a fundo e muitas vezes isso não acontece, com engavetamentos indevidos e uma velada torcida de um grupo “B” que deseja apenas explorar as sujeiras do grupo “A”, e por conseguinte, blindar a sua “turma” e por agir na pior prerrogativa possível, ao abaixar o nível das discussões, ao patamar da mentalidade das torcidas uniformizadas de clubes de futebol, ou seja, “os nossos bandidos são mais queridos que os seus”...
Ora, enquanto não mudarmos a mentalidade, e leia-se uma quebra de paradigma histórica, ficaremos no limbo da civilização, a chafurdar no terceiro mundo e reclamar o do político safado que desviou milhões, blá blá blá e com uma agravante, pois nem todo denúncia é verdadeira, pois ao bel prazer dos interesses escusos, provas nem sempre são requisitadas, a bastar apenas a convicção de quem deseja apenas levar vantagem.


A consciência de que essa cambada formada por ladrões, sai do mesmo povo em que eu e você fazemos parte, precisa ser enfrentada de frente e a nossa missão (e eu quero crer que você leitor, não compactua com a imoralidade e tem caráter ilibado), começa pelo verdadeiro clamor que a camada honesta da população tem que fazer, que é mudar completamente a mentalidade do nosso povo e isso só será possível mediante um mutirão pró-educação, de forma maciça.


Talvez a atual geração esteja perdida, lamento ser realista e dizer isso, mas se os bebês que agora nascem, começarem a ser criados com outra mentalidade, há esperança, aliás, sempre há. Políticos e empresários corruptos e corruptores, não vem de Marte; Saturno ou de outra galáxia. São apenas brasileiros que cresceram a acreditar na ideia de que somos todos “malandros” e nada se consegue com trabalho honesto e lucro justo.
Cresceram a ouvir os pais e os avós, a dizer-lhes que tudo só resolve-se com o famoso e famigerado artifício do “jeitinho”. Certamente que tais pessoas ouviram os seus professores a dizer-lhes que as “brechas da Lei permitem muitos deslizes”, e que imoralidade ou amoralidade não são tão graves se são passíveis nas aberturas vergonhosas que o texto capcioso das leis lhes dão margem. Entraram na vida adulta a considerar “normal” pagar e pedir propina; que fiscais são apenas achacadores oficializados; que “obter vantagem em tudo” é uma virtude...
Que investigue-se;  prove-se; julgue-se e castigue-se, todo corrupto e logicamente com o devido ressarcimento da verba surrupiada, aos cofres públicos (bem entendido, sem outros desvios a pensar-se em mirabolantes fundos a fomentar a criação de supostas instituições). Que se cobre a ação implacável para todos que cometeram atos ilícitos, sem exceção e doa a quem doer. Mas que cheguemos à conclusão de que ser “malandro” é vergonhoso, tanto quanto achar que os gringos são “otários”. Compare os países de primeiro mundo ao Brasil e tire a sua conclusão sobre quem são os verdadeiros “trouxas”...
Chega de "bundalização" Chega de malandragem!


Quando Charles De Gaulle, então presidente da França, afirmou que o Brasil não era um país sério, lá no longínquo ano de 1968, os brasileiros ficaram ofendidos. Ora, falou alguma mentira ?
Recentemente, 2016, uma reportagem repercutida na mídia norteamericana, afirmou que o povo brasileiro costuma dança nu pelas ruas, em meio à uma epidemia terrível, perpetrada pela ação de um mosquito a transmitir-lhe três doenças graves, alheio à catástrofe, ao referir-se ao carnaval. Os seus pares brasileiros  ofenderam-se, ao afirmar que o jornalista que assinara a matéria foi preconceituoso para com a nossa nação. Com a epidemia a alastrar-se pela profusão de mosquitos (algo corriqueiro em um país tropical), o povo brasileiro abriria mão do seu carnaval (eu sei que a festa atrai divisas, mas convenhamos, o dinheiro que entra pela via do turismo, dilui-se em mil bolsos e não necessariamente reflete-se em ações públicas concretas que beneficiem a coletividade) ?

Pois é, quando eu vejo protestos e alguns justos, até, penso na superficialidade que atravanca-nos. Muito bem, não é só pelos vinte centavos do aumento da tarifa dos ônibus urbanos, mas nunca  chega-se ao verdadeiro âmago da questão, ou seja : você, brasileiro, está disposto a deixar de ser “malandro” e não furar a fila ? Pense nesse aspecto antes de arranhar a sua panelinha, na varanda gourmet da sua residência...
Matéria publicada inicialmente no Blog Planet Polêmica, em 2016

segunda-feira, 14 de março de 2016

Parque da Aclimação - Por Luiz Domingues




Em meados do século XIX, um dos caminhos que conduzia os tropeiros vindos do interior do estado, rumo ao porto de Santos, passava por um caminho tortuoso e montanhoso entre o centro de São Paulo e o bairro do Ipiranga, para acessar o caminho do mar. Um fazendeiro chamado, Carlos Botelho, comprou um loteamento nessa área em 1892, e como ele havia morado em Paris, onde formara-se como médico, trouxe a ideia em usar o seu loteamento como um parque ao estilo dos inúmeros que conhecera na capital francesa. Ao batizá-lo como : “Jardin D’Acclimatation”, baseado em um determinado parque existente em Paris, tal nome, posteriormente foi aportuguesado para “Jardim da Aclimação” e mais do que pensar em um parque para a convivência e bem estar, dos moradores do bairro, ele também pensou em montar um zoológico particular.
Dr. Carlos Botelho, retratado em uma pintura assinada pelo artista plástico, Benedito Calixto 

Tal zoológico foi o primeiro da história da cidade de São Paulo, e ao ir além, foi a primeira sede da Sociedade Hípica Paulista (que posteriormente mudou-se para a sua sede própria no subdistrito de Monções, no bairro do Brooklin), e conteve também um complexo com laboratórios de pesquisas para produtos agropecuários. Naturalmente que a sua área era muito maior em relação à que abriga o atual Parque da Aclimação e tirante as suas atividades científicas, havia equipamentos de recreação (salão de bailes; rink de patinação e salão de jogos), e era aberto ao público em geral com a cobrança de um ingresso no valor de 300 réis.
Ao final dos anos trinta, a família Botelho já havia vendido vários lotes de seus inúmeros terrenos no entorno do Parque, e apresentava dificuldades em manter o Parque, e dessa forma, o então prefeito, Prestes Maia, propôs que a prefeitura comprasse o parque, com tal negócio a oficializar-se em janeiro de 1939, pela quantia fechada em torno de 2850 contos de réis. Daí em diante, o parque alternou momentos sob bons cuidados, com fases de completo abandono por parte do poder público.
  O controverso prefeito de São Paulo em 1955, William Salém

Somente em 1955, a mando de William Salem, que assumira a prefeitura provisoriamente (através de uma manobra tresloucada e que fora perpetrada pelo ex-prefeito Janio Quadros, que eleito governador do estado e a contar como o seu vice na prefeitura, e também eleito vice governador, José Porfírio da Paz, abriu-se o  caminho para que Salém, presidente da Câmara Municipal e terceiro na sucessão, comandasse a cidade de São Paulo por um curto período de menos de seis meses). No entanto, curiosamente, Salém cumpriu ações positivas em seu curto mandato "tampão" e entre elas, ao fazer uma grande reforma no Parque, e por construir a sua famosa concha acústica, próxima ao grande lago.
Logo a seguir, em 1956, criou o campo de futebol com dimensão no padrão profissional e a contar com uma pequena arquibancada. Tal equipamento é considerado oficialmente um estádio da Prefeitura (embora dotado de uma capacidade diminuta), tanto quanto o Pacaembu.
Nos anos 1960, infelizmente os prefeitos que exerceram mandatos nessa década, deixaram o parque de lado e os registros jornalísticos da época dão conta de que o parque ficou imundo, mal cuidado e perigoso, por ser habitado por mendigos e malfeitores. Uma reportagem publicada em 1969, no jornal : “O Estado de São Paulo”, chegou a cravar a advertência de que o Parque devia ser evitado pelos moradores do bairro, tamanha a sua insalubridade e periculosidade. Há relatos também sobre carros desgovernados que foram parar no topo de árvores frondosas, a despencar de uma avenida lateral, com características sinuosas, e no alto de um declive, daí a queda em precipício de tais bólidos.
Somente em 1972, sob a administração do prefeito, Figueiredo Ferraz, uma nova reforma foi feita e que mantém as linhas gerais que o Parque apresenta até os dias atuais e inclusive ao haver providenciado a colocação de grades e estabelecer o fechamento da visitação em determinado horário para o uso ao público em geral e a evitar a frequência suspeita de pedintes; meliantes & afins.


A concha acústica passou a ser usada com bastante sucesso. Shows musicais sob várias vertentes; festas folclóricas; aulas abertas de educação física; gincanas escolares; grupos de praticantes de artes marciais, enfim, ali já aconteceu de tudo.
Foi histórico o show dos Mutantes que ali ocorreu em 1973, com o tempo chuvoso e risco de choques para os componentes da banda. A partir do início dos anos 1980, com apoio do Jornal do Cambuci (que mais tarde passou a chamar-se : Jornal do Cambuci & Aclimação), e a ação de um jovem empreendedor chamado, Dalam Junior, o Parque passou a abrigar um evento fixo denominado : “Praça do Rock”, realizado uma vez por mês aos domingos, na concha acústica.
 
Eu, Luiz Domingues, a tocar com a A Chave do Sol, em uma edição do evento, "Praça do Rock", em agosto de 1984, na Concha Acústica do Parque da Aclimação

Tal evento ganhou vulto, e entre 1983 e 1985, fez muito sucesso, inclusive ao atrair a atenção midiática e eu mesmo, Luiz Domingues, ali apresentei-me em três edições desse evento, com a minha banda nos anos oitenta, chamada, A Chave do Sol, com bastante sucesso e perante multidões a contar com milhares de pessoas.
Mas somente em 1986, os moradores do bairro ganharam uma longa batalha burocrática e conseguiram o tombamento do Parque, pois sempre pairava no ar a possibilidade da prefeitura sucateá-lo e vendê-lo para as incorporadoras, a saciar a sua sanha pela especulação imobiliária. Menos mal, que isso não ocorreu.
Não faz muito tempo, já nos anos 2000, houve uma época difícil para os usuários do Parque que amargaram mais um descaso da prefeitura, ao permitir que o lago ficasse totalmente poluído e muitos animais aquáticos e também aves, morressem.
Com muito custo e pressão sobre as autoridades, providências foram tomadas e o Parque superou mais essa crise.
Hoje em dia, ele segue como um verdadeiro oásis em meio à selva de pedra, para atender os moradores do bairro da Aclimação, e também dos bairros vizinhos. Relativamente perto do Parque do Ibirapuera, culmina em ser um elo verde coligado e entre os bairros da Aclimação e Vila Mariana, que são vizinhos e demais bairros do entorno, é comum a grande quantidade de pássaros que voam de um parque para o outro, fora o benefício de dois parques muito arborizados e com boas opções sócioesportivas e culturais para os cidadãos paulistanos que habitam tais bairros do entorno. 
Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu, em 2016