Sou músico e escrevo matérias para diversos Blogs. Aqui neste meu primeiro Blog, reúno a minha produção geral e divulgo as minhas atividades musicais. Não escrevo apenas sobre música, é preciso salientar ao leitor, pois abordo diversos assuntos variados. Como músico, iniciei a minha carreira em 1976, e já toquei em diversas bandas. Atualmente, estou a trabalhar com Os Kurandeiros.
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sábado, 1 de dezembro de 2012
Vera Cruz, a Hollywood Tropical - Por Luiz Domingues
Imediatamente no período do pós-guerra, a efervescência cultural na cidade de São Paulo foi muito grande. Formou-se grupos teatrais; cine-clubes e museus que não paravam em abrir e agitar a pauliceia, sob uma profusão muito acentuada, onde muitas dessas ações continham a generosa participação financeira e do empenho de trabalho de pessoas tais como : Francisco Matarazzo Filho (o popular, "Ciccilo" Matarazzo); um importante empresário das comunicações, Assis Chateaubriand e Franco Zampari. Ciccilo estava empenhado na criação de museus, principalmente, ao dar maior ênfase às artes plásticas, sua paixão maior. Mas foi um entusiasta de outros ramos artísticos, também.
Tanto foi assim, que auxiliou o seu amigo de infância, Franco Zampari a fundar o TBC, Teatro Brasileiro de Comédia, onde um polo de dramaturgia criou-se na cidade de São Paulo. Com a proximidade do advento da televisão no Brasil, graças aos esforços de Assis Chateaubriand e com apoio de Ciccilo, Franco Zampari percebeu que chegara o momento ideal para a realização de um outro sonho seu, ainda mais ambicioso.
Franco Zampari sonhava com a criação de uma companhia cinematográfica super estruturada, nos moldes dos grandes estúdios norteamericanos e europeus, ele sentiu esse momento borbulhante na cidade, com tantos indícios bons na área da cultura e comunicações, e assim lançou a Companhia Cinematográfica Vera Cruz. A base artística para a Vera Cruz poder iniciar-se, Zampari já possuía, com o excepcional elenco de atores e diretores que atuavam nos palcos do TBC.
Com o apoio de Ciccilo, um importante passo foi dado na questão logística, com a cessão de um enorme terreno que pertencia à família Matarazzo, na cidade de São Bernardo do Campo, na região do ABC paulista. Ali funcionava uma granja que foi desativada e onde então construiu-se as instalações da Vera Cruz, com os galpões para a função de set de filmagens; salas de edição, oficinas de cenotécnica; camarins; salas de figurino e produção em geral etc.
Em novembro de 1949, estava sacramentada a ata inaugural da Cia. Cinematográfica Vera Cruz e já em 1950, as suas primeiras produções estavam prontas : "Painel" e "Santuário", dois documentários dirigidos por Lima Barreto.
E no mesmo ano, foi lançado o primeiro longa-metragem, "Caiçara", dirigido pelo ator / diretor italiano, Adolfo Celi, que também dirigia peças teatrais no TBC, com regularidade. Zampari contratou técnicos franceses; italianos e ingleses, em princípio. Nos primeiros tempos, teve também o apoio decisivo de Alberto Cavalcanti, um famoso diretor de documentários, com carreira construída na Inglaterra, onde era muito respeitado.
E todo o equipamento importado, foi o que houve de melhor sob o ponto de vista da tecnologia, naquela época. Logo no primeiro filme longa metragem, "Caiçara", a Vera Cruz mostrou o que seria a sua marca registrada, com filmes tecnicamente sofisticados, a buscar superar o padrão de estúdios mais antigos como a Cinédia e Atlântida, onde o rigor técnico não era tão valorizado.
Ao não economizar, no afã em ter qualidade no padrão de primeiro mundo, Zampari passou a pagar salário fixo e altíssimo ao elenco de atores, para seguir a tendência de estúdios norteamericanos. Ele providenciou também uma estrutura extra, fora do âmbito do set de filmagens, para garantir o glamour dos artistas, no imaginário do público, certamente a seguir o padrão yankee na promoção do negócio.
Outros êxitos de público e crítica sucederam-se : "Angela"; "Terra é Sempre Terra"; "Apassionata", "Veneno"... e eis que surgiu : "Tico-Tico no Fubá", cinebiografia do compositor, Zequinha de Abreu, autor da famosa música que dá título ao filme. Ao seguir a cartilha do cinema norteamericano, o filme é cheio de recursos estilísticos típicos das cinebiografias de artistas da música, como os norteamericanos costumavam realizar, com maestria.
Foi um grande sucesso, sem dúvida, com a participação dos atores, Anselmo Duarte e Tônia Carrero, como protagonistas.
A seguir, a Vera Cruz lançou duas comédias incríveis, para revelar o talento de Amácio Mazzaroppi, com : "Sai da Frente" e "Nadando em Dinheiro".
Outro grande sucesso, ambientado no Brasil colonial, "Sinhá Moça", foi lançado em 1953.
Sob uma produção frenética, em ritmo de produção industrial (e foi isso mesmo), lançou-se no mesmo ano, "A Família Lero-Lero", outra comédia muito boa. "O Cangaceiro", de Lima Barreto, ganhou prêmios; prestígio entre os críticos e encantou o público.
"Uma Pulga na Balança" e "Esquina da Ilusão", foram mais duas comédias lançadas.
"Luz Apagada" foi um outro drama e trata-se de uma curiosa comédia dirigida por Ugo Lombardi (pai da atriz, Bruna Lombardi), chamada : "É Proibido Beijar". Tal filme causou um certo alvoroço na opinião pública, pelo tema abordado, ainda que fosse uma comédia romântica.
"Na Senda do Crime", um filme policial veio a seguir. Então, mais uma comédia sensacional de Mazzaroppi, chamada : "Candinho" (particularmente, é o meu filme predileto dessa fase dele, na Vera Cruz).
"Floradas na Serra" foi o único filme da carreira da grande atriz, Cacilda Becker (na verdade, ela esteve em outro, obscuro e produzido em 1947, mas para todos os efeitos, esse é o definitivo e isolado registro de seu talento, exibido no cinema). Inacreditável que uma atriz daquele quilate não tenha sido melhor aproveitada pelo cinema. É um grande filme, ambientado em Campos do Jordão / SP, com a história a girar em torno de pessoas internadas em uma clínica de recuperação para tuberculosos.
"São Paulo em Festa", foi o último documentário lançado pela Vera Cruz, dirigido por Lima Barreto. E os últimos longas, "Ravina", um thriller psicológico e "Macumba na Alta", uma comédia.
Depois disso, a Companhia Vera Cruz entrou em um processo de profunda crise, e encerrou atividades em 1958. Qual a razão de um estúdio desse porte, que produziu um material de qualidade artística indiscutível e a angariar sucesso de público e crítica, ter terminado dessa forma ?
Segundo pessoas ligadas à Vera Cruz, o que a prejudicou tremendamente foi o caótico acordo de distribuição, onde tornou-se refém desse elo da corrente do qual não tinha autonomia, pois ganhava apenas 40% da renda líquida das bilheterias obtidas nas salas de cinema. Zampari havia pensado em todos os detalhes, menos nesse aspecto, que era crucial para a continuidade financeira do estúdio, infelizmente, e assim não levou em conta tal dado vital, desde o início das atividades da Companhia.
Outro fator muito duro para a Vera Cruz, deu-se em torno das regras comerciais da época, pois o governo brasileiro pagava a diferença cambial da defasagem entre o dólar oficial e o paralelo, para os estúdios internacionais, ao fazer com que os distribuidores / exibidores desonerassem-se desse resíduo, portanto a preferir sempre exibir filmes estrangeiros, norteamericanos sobretudo, em detrimento da produção nacional.
Sendo assim, não houve meio da Vera Cruz continuar, lamentavelmente para o cinema brasileiro. Ficou o legado de grandes obras, com a parte técnica a observar muita qualidade e também a presença de grandes atores; técnicos, diretores e boas histórias filmadas.
Matéria publicada inicialmente no Site / Blog Orra Meu e republicada a seguir no Blog Pedro da Veiga, ambas em 2012.
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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012
Filme: 12 Angry Men (Doze Homens e uma Sentença) - Por Luiz Domingues
Por ser um profissional com origem na televisão, o diretor Sidney Lumet não poderia ter obtido um debut melhor no cinema, quando lançou o filme: "12 Angry Men" ("Doze Homens e uma Sentença"), em 1957.
Ao tratar-se de uma adaptação de um "teleplay" (roteiro para um filme feito especialmente para a TV), por ele mesmo escrito, Lumet conseguiu transpor para a tela grande ("screamplay", roteiro adaptado para o cinema), com muita maestria, um espetacular thriller psicológico e claustrofóbico, cuja história versa sobre doze jurados que reúnem-se em uma sala reservada de um tribunal de justiça, para decidir sobre a absolvição ou culpa de um réu, acusado de assassinato.
A ação passa o tempo todo dentro dessa sala e a divergência de opiniões e sobretudo as motivações entre os jurados proporcionam a dose forte em dramaticidade e brilhantismo na elaboração dos ótimos diálogos, para o filme.
Ao investir em diálogos absolutamente bem engendrados e por contar com um elenco de atores, espetacular, Lumet fez um filme que surpreende, exatamente por ter o efeito contrário que pudesse supor-se que teria, ao apontar para o tédio gerado entre tais jurados populares, pessoas comuns e desprovidas de embasamento jurídico, ante uma longa discussão jurídica da parte de um promotor público e o advogado de defesa.
Sim, pois o que se espera de um filme centrado sob uma ação claustrofóbica, dentro de uma sala de jurados, em que doze homens, alguns ali com baixa capacidade intelectual, que irão decidir um veredicto e mais parecem ansiosos para decidir de forma rápida e se livrarem de tal obrigação maçante?
Naturalmente, um filme entediante, arrastado, que tenderia a não deixar o espectador leigo em termos de mundo jurídico/forense, focado, não é?
No entanto, muito pelo contrário, o filme é eletrizante do começo ao final, com os diálogos mordazes travados entre os personagens e a exploração de cada um ali envolvido entre os jurados, em suas nuances psicológicas as mais diversas.
E aí brilha o roteiro e a condução magistral de Sidney Lumet, além da dramaticidade imposta pelo ótimo elenco de atores.
Sem a intenção de comentar o filme em minúcias e a provocar os ditos "spoilers", digo apenas que a história é centrada no momento em que os membros de um corpo de jurados formado por pessoas comuns, o dito "júri popular", reúne-se na sala reservada para decidir o veredicto de um réu acusado de assassinato.
As provas são muito contundentes contra o réu e o promotor praticamente já deixara clara para todos ali escalados para tomar a decisão final, a sua a culpabilidade como praticamente de um crime letal.
Dessa forma, alguns jurados mal entram na sala e já declaram a sua decisão pessoal. Alguns, com ética, a pensar na melhor resolução da justiça, outros por pura mesquinharia, pois querem livrar-se disso e voltarem para a casa em tempo de não perder o futebol ao vivo a ser exibido na TV.
Naquele instante inicial a determinação seria praticamente unânime em prol do veredicto da culpa, sem dúvida. Mas sob uma primeira avaliação, a contagem em prol da condenação do réu contabilizou o placar em torno de 11 a 1. Neste caso, a Lei norte-americana é clara sobre a condenação à pena de morte só é validada, mediante a unanimidade. Ora, todos os dez votantes pela condenação, se revoltam com o único voto pela absolvição e neste caso, alguns ficam intrigados para tentar entender a linha de raciocínio tão adversa desse votante contra e outros, ficam com absoluta raiva pela questão da postergação pura e simples.
Entretanto, esse sujeito que votou contra, semeou uma dúvida sutil, porém muito cabível e para desespero dos afoitos, prorrogou a decisão final. Momentos tensos seguem-se, e um a um, passa a mudar de opinião diante da argumentação do homem que votara contra.
Henry Fonda, um ator que era considerado fleumático em Hollywood, interpretou esse homem que semeou a dúvida entre os jurados. Não poderia ter sido uma escolha mais sábia da parte do diretor, Sidney Lumet.
Fonda, com a sua típica fleuma no tom da interpretação, deu a credibilidade ao personagem, no sentido de prender a atenção do espectador para buscar entender a sua linha de raciocínio, que é brilhante.
Ed Begley, Jack Warden, Lee J.Cobb, Martin Balsam, Jack Klugman, E.G. Marshall, John Fiedler, Edward Binns, Joseph Sweeney, George Voskovek e Robert Webber, são os ótimos atores, alguns já bem tarimbados à época, que interpretaram os demais jurados.
E a cena final é emblemática: ao saírem do fórum, sob o amanhecer após uma madrugada vivida sob tensa batalha verbal, cada jurado sai para um lado, sem falar um com o outro, ao se revelarem destinos diferentes após terem estado juntos por cansativas horas para adotar uma difícil decisão a ser tomada, coletivamente.
Cada um foi cuidar da sua vida e o rapaz que seria condenado, foi absolvido, pois realmente provou-se a sua inocência e nesse caso, nunca o ditado: "a pressa é a inimiga da perfeição", soou tão preciso. E mais do que isso, o senso da justiça prevaleceu, a mostrar um sistema jurídico que não toma decisões precipitadas mas busca a verdade de forma implacável, a se mostrar soberano.
Matéria inicialmente publicada no tópico: "12 Angry Men", aberto por eu mesmo, na comunidade, "Sidney Lumet", da extinta social Orkut, em 2010.
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