Por exemplo, o “Folk” gaúcho tem
muita similaridade com a música latino-americana, por afinidades múltiplas a
começar pela geografia parecida. Os pampas, o frio e o vento, forjaram uma alma
parecida, que nem mesmo a diferença entre lusófanos e hispânicos foi capaz de
separar.
Outro ponto importante entre os
gaúchos e esses povos oriundos de países sul-americanos (principalmente os vizinhos do cone sul:
Argentina, Uruguai & Chile), se deu no apreço que os gaúchos nutrem pelo Rock. São Paulo foi assim também antigamente, contudo,
infelizmente perdeu essa identidade Rocker, há décadas.
Em meio à essa soma de ótimas influências, o
Rio Grande do Sul, há décadas tem lançado artistas muito inspirados, ao apresentar no bojo, uma MPB diferente, com aquele pé no Folk da música campeira gaúcha,
a se mesclar à moderna música urbana de Porto Alegre e o Rock em várias
vertentes, da psicodelia ao progressivo, do Hard-Rock ao Pop.
Pois foi baseado nesse caldeirão cultural dos pampas
que um duo extremamente criativo vem a construir uma carreira sólida no panorama
da moderna MPB, ao meu ver, ainda que esteja fora dos holofotes do mainstream,
pelo menos por enquanto e eu torço para que alcance esse caminho.
Trata-se do duo: “Quiçá, se Fosse”,
formado por André Paz e Róger Wiest, dois jovens compositores, cantores e multi-instrumentistas.
Como se não bastassem tantos
atributos, ainda há a questão da poética, na qual ambos demonstram esmero na composição das suas letras, ao buscarem inspiração em nomes do quilate de Fernando Pessoa,
por exemplo, além de observarem bem as tradições de Mário Quintana, Érico
Veríssimo e outras canetas fortes da literatura gaúcha.
Performáticos, mas não satíricos
como a também dupla gaúcha “Tangos e Tragédias”, o Quiçá se Fosse tem o respaldo de deterem formação como atores
e paralelamente à música, eles desenvolverem trabalhos regulares com grupos
teatrais.
Toda essa criatividade e qualificação
precisava se materializar além dos shows e vídeos que produzem e para tanto, em
2012, o duo lançou um DVD chamado: “SãoChico”, uma alusão à cidade gaúcha de São
Francisco de Paula, aonde tal material foi filmado.
A concepção do DVD foca na apresentação do duo a demonstrar toda a sua potencialidade criativa, mas de uma maneira
extremamente despojada.
Filmado em uma cabana isolada no
campo, longe do perímetro urbano da cidade citada, se mostram cenas do duo a executar
as suas canções, com absoluta tranquilidade e sob uma aura leve, que impressiona
muito positivamente.
Recheado por cenas do cotidiano da
dupla nesse processo de retiro, o DVD lembra muito a experiência da grande banda
sessentista “The Band”, quando da gravação de seu álbum de estreia, o excepcional,
“Music From Big Pink”.
Gostei muitíssimo do trabalho, ao
ver o DVD e posteriormente muitos vídeos do duo, ao vivo. Achei encantadora a criatividade em
usarem diversos instrumentos de cordas e percussão, para mesclar a linguagem do folk
acústico ao Pop-Rock e à MPB urbana.
Em uma canção como: “Cada Dia Mais”,
por exemplo, a sincronicidade dos músicos em gravarem bases ao vivo de percussão
e intervenções vocais estratégicas, disparadas pelo "delay" e a interagir com o
que continuaram a tocar por cima, ficou muito bonito.
Já em “Canção do Pó”, se engana quem
apressadamente deduzir que venha a se tratar de uma canção que faz uma apologia às drogas. Todavia, mediante uma divertida explicação prévia, o pó em questão é o grão de poeira,
como se estivéssemos a assistir um documentário sobre o assunto, no Discovery
Channel.
Para falar do projeto gráfico do DVD, é impossível não nos lembrarmos da capa do LP “Ummagumma” do Pink Floyd,
com a perspectiva da metalinguagem infinita. Não sei se pensaram nisso, mas
considerei sensacional a ideia do monitor de vídeo ligado, com a imagem de ambos
a interagirem em paralelo.
Os rapazes usam esse mesmo recurso também em: “Quem me Dera”,
ao estabelecer um jogral anárquico e divertido.
E assim, outras canções se sucedem,
sob uma atmosfera amena, muito agradável e poética.
Particularmente, pensei bastante na
tal “casa no campo” que Zé Rodrix imortalizou como canção, ao nos levar a crer que
o sonho hippie do artista a usufruir do seu recanto de paz em meio à natureza seria
plausível, enfim.
Em suma, se trata de um DVD muito bem produzido,
com a música sob muita qualidade perpetrada pelo duo, executada em performances a respeitar uma extrema
felicidade sonora.
Além da qualidade artística do
trabalho e da capacidade de ambos como multi-instrumentistas, existe uma boa dose
de humor, embora não seja um trabalho satírico por excelência e também pelo bom gosto na ambientação
da casa, fotografia e a conter um áudio com bastante qualidade.
Recomendo o trabalho, certamente, e
deixo o link para o leitor conhecer melhor o trabalho do “Quiçá, se Fosse”, para visitar
o seu Blog:
http://www.quicasefosse.com.br/
Comentário inspirado e perspicaz sobre o trabalho desta dupla brilhante e invulgar. Um trabalho ainda criança, e que vai render muitos frutos no futuro! Quem ainda não teve contato com esta arte está perdendo o melhor da festa que rola aqui neste cantinho do Brasil.
ResponderExcluirMas que bacana o seu comentário elogiando o texto !!
ExcluirDe fato, o trabalho do "Quiçá, se Fosse", tem qualidade e inspiração, inquestionável.
Tem muita gente boa espalhada por esse Brasil enorme e que não costuma dar oportunidade para artistas genuínos, que não fazem parte dos planos da máfia que domina a difusão cultural. Cabe a nós, fazermos o máximo para divulgar artistas desse quilate, ainda que através de um Blog humilde como o meu, uma mera gota d'água no oceano...
Que prazer receber a sua visita, amigo, que tanto ajudou a Patrulha do Espaço em suas andanças sulistas e que por isso, tem nossa eterna gratidão !