Em meio a
euforia gerada pela explosão do Rock’n’Roll na América do Norte, a partir da
segunda metade dos anos cinquenta, muitos filmes foram produzidos a toque de
caixa para explorar tal filão. E por ter observado em geral essa característica da
pressa e sob baixo orçamento para trabalhar, tais filmes, em sua maioria, não
são primorosos pela produção, certamente, no entanto, dada a importância
histórica adquirida a posteriori, são pérolas documentais e portanto, notáveis de alguma forma.
Uma das tantas peças lançadas nesse rol, foi “Rock All Night”, dirigida por um
diretor que estava ainda a construir a sua fama em meio ao furor dos anos
cinquenta, um sujeito chamado: Roger Corman.
Como hoje em
dia (2019, quando escrevi esta resenha), é público e notório, Roger Corman é um diretor que é muito
mais conhecido pela sua extensa obra baseada principalmente nos gêneros do terror
e da ficção científica, a dita “Sci-Fi”. Entretanto, ele não limitou a sua
filmografia apenas para tais gêneros, pois há uma boa diversidade de estilos em
que ele trabalhou e inclusive, arrole-se igualmente a sua boa inserção no campo
dos filmes a abordar a juventude, principalmente pelos universos distintos a
envolver a música e as práticas automobilísticas. Além disso, Corman também
se aventurou pela psicodelia observada durante a década de sessenta, ao ter
filmado, “The Trip”, uma película cuja história tem tudo a ver com a lisergia
sessentista. No caso dos filmes anteriores e a envolver diretamente o Rock,
destaca-se dois de sua produção cinquentista, a saber: “Rock All Night” e “Carnival
Rock”, ambos lançados em 1957, e a usar praticamente o mesmo elenco de atores,
em ambos.
Outra
característica típica de Roger Corman, observada em quase todos os seus filmes,
principalmente nos seus maiores êxitos a enfocar o terror e o Sci-Fi, deu-se
com a sua capacidade para filmar sob baixo orçamento. Com pouca verba, Corman
nunca intimidou-se em dirigir e extrair o máximo das possibilidades mediante
parcos recursos técnicos, cênicos, fotografia e iluminação de segunda linha,
atores não famosos (com as devidas exceções para ser destacadas, caso do grande
ator, Vincent Price, que estrelou diversos filmes seus), direção de arte
paupérrima e efeitos especiais toscos. Registre-se que há diretores na história
do cinema que rendiam mais ante dificuldades estruturais, e Corman seguramente
figura nesse rol. Portanto, filmar a usar um cenário mal-ajambrado, com
fotografia simples em preto & branco, mediante o apoio de um elenco pequeno
e a contar com apenas cinco dias para concluir todas as tomadas, não foi
exatamente um drama para que Roger Corman entregasse o material bruto deste filme, “Rock
All Night” na mão dos responsáveis pela sua montagem/edição e pós-produção.
A história
foi baseada em um teleteatro encenado no programa, “Jane Wyman Presents The
Fireside Theatre”, no ano de 1955, e cuja história, chamada como, “The Little
Guy”, contava a proeza de um homem com baixa estatura cuja extrema valentia, garantia-lhe
a devida segurança para que enfrentasse bandidos armados e assim, ele salva um
grupo de pessoas, em uma situação limítrofe, e que haviam sido usadas como reféns por tais
marginais. O que ocorreu como adaptação, foi que o Rock foi inserido no
roteiro, para alinhavar a situação a conter números musicais e claramente
aproveitar a onda de euforia em torno do Rock’n’ Roll que explodia pelas rádios
e nas telas, através de vários filmes e isso sem contar que a TV também
repercutia fortemente a mesma cena. Dessa forma, ficou mais que justificada a pressa
da produção em colocar o filme rapidamente nas telas das salas de cinema,
exatamente como muitos outros estúdios também estavam a apressar-se para
aproveitar o mesmo embalo gerencial.
Se o espectador
atual de 2019, quando escrevi esta resenha (com o século XXI em pleno curso e quase a atingir a sua terceira
década), não mantiver a devida paciência em assistir tal filme, com a consciência
em entender o contexto de 1957, e sobretudo, também levar em conta que este
filme foi feito às pressas, e a conter a simplicidade total em sua realização, tornar-se-á
difícil nutrir algum tipo de simpatia natural por ele, a não ser que tal
espectador seja um Rocker inveterado e disposto a aceitar a sua simplicidade em
prol dos números musicais, tão somente. Pois a sua história é absolutamente
simples e inverossímel, em via de regra. Que fique avisado portanto o leitor
que nunca o assistiu e pretende conferi-lo após ter lido esta resenha.
Pois então,
a história gira em torno de um grupo de pessoas, que são desconhecidas entre si
e estão no ambiente de uma casa noturna. Há uma rápida inserção de tais
personagens em cada mesa, para delinear superficialmente quem são e o tipo de
conflito particular que os envolve. Alguns números musicais ocorrem, e claro
que são interessantes, pois tem artista de peso ali envolvido, caso do grupo
vocal “Rn’B, “The Platters”, acompanhado pelo grupo de Eddie Beal, e a destacar-se
a presença do famoso saxofonista barítono, Eric Dolphy, além da cantora, Nora
Hayes e do grupo, “The Blockbusters”.
O tal homem com baixa estatura, apelidado
sugestivamente como “Shorty” (interpretado por Dick Miller), é o protagonista a
adotar uma atitude valente, quando enfrenta diversos conflitos ao longo da
noite, sem abalar-se, inclusive quando ocorre a pior situação, ao adentrar o
ambiente dois assassinos que estavam a ser perseguidos pela polícia após a
realização de um ato de latrocínio. Pois tais homens entram no ambiente, muito
nervosos e colocam todas as pessoas ali presentes, em situação de sequestro, a
usá-las como reféns para suplantar a ação policial que os persegue. Há abusos,
quando ao aproveitar-se da situação gerada, tratam por provocar humilhações nas
pessoas ali subjugadas, ao dar a entender que cogitam inclusive, abusar de
algumas moças jovens presentes no recinto.
Pois o tal “Shorty”,
não se abala e imobiliza os dois meliantes com uma facilidade incrível e tal
cena final é tão fora da realidade que causa espécie. Bem, trata-se de uma ficção a enaltecer a
valentia de uma homem com baixa estatura e pouca força muscular, portanto eu sei que é
mote do mini conto e que serviu como base, mas chega a ser risível a cena crucial onde ele ataca os
bandidos e arranca-lhes as armas. Tudo resolvido enfim, a polícia que cercava a
casa noturna, prende os meliantes e todos os sequestrados vão para a casa,
aliviados. “Rock a noite inteira” passa a ser um título irônico, portanto,
visto que a conotação dupla com a expressão fica clara em sua resolução.
Somente
isso, então? Em suma, a história resume-se a esta pequena sketch, todavia,
apesar da trama bem simples e construída sob uma produção modesta, o filme reúne
alguns méritos enquanto peça dramatúrgica, por incrível que pareça, ante tais
condições. E a primeira condição positiva a ser arrolada, dá-se com a
diversidade das personagens, embora isso tenha sido retratado de uma forma sucinta.
Por mostrar um pouco de cada envolvido nessa condição desagradável em estar em
meio a um sequestro coletivo, o filme ganhou um pouco mais de substância,
embora eu admita que não tenha sido algo absolutamente inovador em termos de
mote para narrar uma história, pois na literatura policial e no cinema, por
consequência, tal tipo de situação já havia sido colocada em cena, por centenas de vezes.
Portanto, com a devida ressalva, deixo claro que neste caso, o uso de tal
clichê policialesco serviu ao menos para dar mais corpo ao filme.
Nesses
termos, vê-se um grupo de personagens que não são exatamente exemplos de
candura, pois há ali sentados sobre as mesas, alguns vigaristas contumazes,
incluso o próprio, “Shorty”, que não é necessariamente um homem honrado, mas uma
espécie de malandro de rua e exatamente por ser experiente nesse tipo de
expediente, é que ele domina a cena ao enfrentar algumas confusões, e sobretudo
ao dominar os dois bandidos que usam as pessoas como reféns. Em princípio, é
confusa a reação generalizada, visto que os malfeitores matam um homem a sangue
frio e o fato de haver um corpo estendido no piso da casa noturna, parece não
causar uma grande comoção entre as pessoas. Somente depois desse cadáver ser retirado dali, foi
que tais pessoas, usuárias da casa, notaram estar em uma situação perigosa e
esboçaram assim, mostrar temor em seus respectivos semblantes.
Outro mérito é
naturalmente a música. Há inclusive a inserção de uma cena muito interessante a
mostrar uma tímida aspirante a cantora que está na casa para mostrar o seu
valor, mas nervosa ao extremo, desafina vergonhosamente quando canta o sucesso:
“The Great Pretender”. Enquanto canta e mal por sinal, as pessoas nas mesas não
disfarçam o seu desconforto auditivo com a fraca apresentação de Julie (interpretada
por Abby Dalton).
Ironizada pela sua apresentação, ela não suporta o revés e
abandona o palco aos prantos, para refugiar-se no toilette da casa. Quando os
bandidos entram no ambiente e aterrorizam os seus frequentadores, Julie é um
dos alvos dos assaltantes, exatamente por ser muito bonita e como havia
fracassado como cantora, eis que os bandidos a obrigam a cantar e nesses
termos, a sentir pavor pela situação, Julie passa a cantar um blues, muito bem,
a soltar a voz. Tem artista que só funciona sob forte emoção, talvez tenha sido
essa a mensagem que Roger Corman quis enfatizar com tal cena.
Em suma, o
filme é isso e creio que valha a pena assisti-lo principalmente pela boa música
exibida e também pela curiosidade em verificar uma encenação sui generis.
Corman assinaria no mesmo ano, outro filme, como já disse e a aproveitar quase
o mesmo elenco, “Carnival Rock” e cuja resenha eu também no meu livro e se encontra disponível neste Blog.
Outros
atores não citados anteriormente: Russell Johnson (como Jigger), Ed Nelson
(como Pete), Jeanne Cooper (como Mabel), Barboura Morris (como Syl), Robin
Morse (como Al), Mel Welles (como Sir Bop), Richard Cutting (como Steve), Chris
Alcaide (como Angie), Jonathon Haze (como Joey) e outros.
Escrito por
Charles B. Griffith, que baseou-se no conto televisivo, “The Little Guy”, de David
P. Harmon, foi dirigido e produzido por Roger Corman. Tal obra foi lançada em abril
de 1957.
Esse filme
não fez um estrondoso sucesso nas salas de cinema, certamente pela sua modesta
produção e sobretudo por ter sido sobrepujado por outros filmes contemporâneos
mais robustos, notadamente as produções a envolver, Elvis Presley, como ator
protagonista e galã instantâneo, no entanto, tornou-se cultuado entre cinéfilos,
tanto foi assim que o diretor, Quentin Tarantino, que é um fã declarado deste
filme, anunciou nos anos 2000 que pretendia refilmá-lo. Tal projeto não foi
anunciado até este momento de 2019, mas nada impede que ele o retome, em algum
momento.
Claro que
esse filme passou bastante em canais abertos ao longo das décadas de sessenta e
setenta; chegou à TV a cabo e ganhou a sua versão em DVD, nos anos dois mil,
embora não haja registro de que tenha sido lançado no formato VHS, antes, nos
anos oitenta ou noventa.
Esta resenha foi preparada para constar no livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll" em seu volume III, a partir da página 368.














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