quarta-feira, 25 de junho de 2014

Big Boy, o Chacrinha do Rock'n' Roll - Por Luiz Domingues



A difusão do Rock, ao ponto em torná-lo um fenômeno de alcance mundial, vai além da genialidade dos artistas que deram o início de tal processo, durante a década de cinquenta. São muitos os fatores que contribuíram para que lograsse em êxito essa missão e isso é naturalmente fruto de muitos estudos por parte de musicólogos, historiadores etc. Entretanto, indubitavelmente, o papel das emissoras de rádio que compraram a ideia do Rock, enquanto estilo com possibilidades em âmbito Pop, no sentido comercial do termo, foi preponderante. Estende-se tal conceito à Black Music, notadamente em suas três ramificações mais Pop, também : Soul, R'n'B e Funk (o de "verdade"...).

Nesse contexto, não dá para deixar de citar, Alan Freed, um DJ americano que muito contribuiu para essa explosão toda 
          do Rock'n Roll naquela década.

Aqui no Brasil, muita gente valorosa  teve esse papel importante também nas emissoras de rádio, mas ninguém foi mais emblemático que um DJ carioca, que atuou decisivamente no Rio e em São Paulo, simultaneamente, chamado : Newton Alvarenga Duarte, mas que ficou conhecido pela alcunha de : "Big Boy". Nascido no Rio de Janeiro, em 1943, Newton "Big Boy", cresceu bastante influenciado pelo rádio e sobretudo pelo seu poder de encantar o ouvinte, ao introduzi-lo em novo mundo musical.

No seu caso em específico, a sua emissora predileta na infância e adolescência, foi a Mayrink Veiga, uma emissora que mantinha uma grande audiência nacional e pioneira, tocava o Rock'n' Roll como absoluta novidade, ali no frescor dos anos cinquenta. Escondido dos pais, Newton viajava regularmente à São Paulo, onde batia ponto nas melhores lojas da pauliceia, ao iniciar a formação de sua coleção de vinis fantástica. Em 1965, Newton entrou na faculdade de geografia da UFRJ, e ali formou-se em 1968.


Todavia, desde 1966, foi um locutor contratado pela rádio Tamoio e já em 1967, deu um salto na carreira, ao mudar-se para a Rádio Mundial, onde fez a sua fama em nível nacional.
Profundo conhecedor do Rock; Pop; Black Music;, Folk e outros gêneros, Big Boy detinha um carisma inacreditável e costumava criar bordões que caíram no gosto dos ouvintes, de uma forma avassaladora.

Beatlemaníaco assumido, foi à Londres em 1967, com o objetivo em entrevistar os Beatles, mas na base da pura vontade, sem nenhum tipo de credenciamento oficial, mesmo a estar em uma grande emissora brasileira. Deu muita sorte por encontrar Paul McCartney na rua, e este sensibilizou-se com o esforço do radialista brasileiro, e assim colocou o seu nome no mailing oficial dos Beatles, um privilégio que concedeu-lhe a chance para receber uma cópia do LP Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, antes da fábrica brasileira providenciar a distribuição nacional.

Nessa altura, Big Boy já assinava colunas em importantes jornais e revistas brasileiras. O seu estilo de redação seguira a mesma maneira esfuziante de sua locução no rádio. Big Boy era completamente louco para os padrões da locução radiofônica convencional que a maioria dos locutores "normais" usavam nessa época. De certa forma, ele seguiu o mesmo padrão anárquico e abusava do nonsense tanto quanto Abelardo Barbosa, o Chacrinha o fazia na TV. Big Boy aliás, também foi parar na TV, ao tornar-se um comentarista quentíssimo para cobrir o Rock, no Jornal Hoje, da Rede Globo e também com intervenções em outros programas jornalísticos daquela emissora.

Ele fez paralelamente uma carreira de sucesso em São Paulo, também, como locutor da Rádio Excelsior, a Máquina do Som. 

Por incrível que pareça, segundo consta em sua biografia, ele não tinha na verdade o menor jeito para ser um locutor, pois não possuía uma voz padrão de radialista. A sua voz era estridente, sem a presença de um timbre grave, sem a impostação padrão que espera-se, de forma paradigmática nesse métier...

Sabedor disso, criou aquele estilo estridente, a explorar na verdade o que poderia ter sido a sua maior dificuldade para ingressar na profissão, mas que tornou-se, ao contrário, um trunfo. A sua maneira par expressar-se com aquela dose de loucura, teve tudo a ver com o Rock. Popular e adorado, aventurou-se em produção de eventos, ao emprestar o seu prestígio para o "Baile da Pesada do Canecão", onde até cinco mil jovens costumavam reunir-se para dançar ao som do melhor do Rock e da Black Music, de 1970, ou seja, somente pérolas escolhidas a dedo pelo DJ que conhecia música com profundidade. Algum tempo depois, o sucesso retumbante animou-lhe a voar solo e quando comprou o seu equipamento privado, passou a organizar o seu próprio evento. A partir desses bailes, tornou-se também um produtor fonográfico, ao assinar coletâneas com músicas que tocava em seus bailes. Ao perceber que tornara-se quase um personagem, Chico Anysio o convidou para participar de seu programa humorístico. Big Boy participou a interpretar o personagem "Índio Jerônimo", que fazia parte da patota de hippies liderados por "Lingote", um hippie zen interpretado pelo próprio, Chico, e que só comunicava -se monossilabicamente.


Big Boy entrevistou Stevie Wonder; James Brown e Mick Jagger;  e também tornou-se produtor musical da gravadora Odeon. Ele ganhou o seu programa próprio na TV Globo, denominado : "Hello Crazy People", título inspirado em seu bordão mais famoso. 

Todavia, antes já tinha estrelado um programa na TV Record, o "Papo Pop", que dava espaço para artistas do Rock brasileiro, tais como : Raul Seixas; Secos & Molhados e Joelho de Porco, por exemplo. "Papo Pop" foi o nome de sua coluna em jornais e revistas.

Assumiu a seguir no Rio de Janeiro, a programação da Rádio Eldorado e criou a Eldo Pop, onde costumava tocar discos de Rock Progressivo na íntegra, sem intervalos, um escândalo no meio radiofônico, pois quebrava o padrão Pop das músicas regidas pelos parcos três minutos e meio de duração, em detrimento de peças com até vinte e três minutos, como se fossem suítes de música erudita.

Em São Paulo, passou a comandar a rádio Excelsior, em 1976.

Em março de 1977, Big Boy teve uma crise asmática fulminante, dentro de seu quarto, no hotel em que estava hospedado em São Paulo. Uma nova produção sensacional que ele faria para a TV Globo, foi ao ar de forma póstuma, pois não deu tempo dele aproveitar o sucesso que foi o "Rock Concert", doravante. E a sua última coluna impressa falava sobre a iminente vinda do Genesis, espetacular grupo progressivo britânico, ao Brasil, dois meses depois.

Infelizmente o grande Big Boy deixou-nos e perdeu esse grande concerto de Rock, ocorrido em 1977. Big Boy deixou um legado e tanto. Foi mais que um locutor que inventava bordões populares e ultrapassou a imagem louca de sua figura a bordo de uma voz esganiçada, visual & postura enlouquecidas e tambem pelo seu carisma absurdo.

Na verdade, foi um ´tremendo apaixonado pela música; pelo Rock e pelo prazer em colecionar discos, que por conhecer a matéria com o requinte de um catedrático no assunto, sabia o que falava e por ter esse conhecimento, aliado ao seu estilo e carisma, impressionava e conferia credibilidade em seu trabalho. Não quero usar clichês, mas é inevitável não deixar de mencionar que um jornalista / DJ / locutor e produtor musical desse calibre, faz falta para o Brasil.

Todo mundo morre, é fato da vida, mas foi uma tremenda fatalidade perdê-lo com apenas trinta e três anos de idade.

Recentemente, a  sua família criou uma página sensacional no Facebook, onde o mote é disponibilizar o máximo de material possível de sua atuação nos meios de comunicação nos anos 1960 e 1970.

Muito mais que um museu virtual, a página tem vida, ao parecer que ele mesmo cuida das postagens e está entre nós ainda. Ao pensar bem, é claro que está.

Recomendo visitas e segui-la, sem dúvida alguma.
https://pt-br.facebook.com/pages/Big-Boy-Rides-Again/565152540194400


Hello Crazy, people... Big Boy Rides Again !
Matéria publicada inicialmente no Blog Limonada Hippie, em 2014  

2 comentários:

  1. Sem qualquer sombra de dúvida um dos ícones da rádio. Infelizmente morreu cedo.
    Belíssima matéria Luiz. Justa homenagem e lembrança. Grande abraço!

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    1. Kusdra :

      Nós que temos a mesma faixa etária, sabemos bem a importância que o Big Boy teve para a difusão cultural brasileira.

      Um tremendo agitador como ele foi, faz uma falta danada hoje em dia, principalmente se levarmos em conta que vivemos um momento tristíssimo com a música em patamares abaixo do mais abissal subsolo.

      Muito grato por ter lido e comentado !

      Grande abraço !

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