quarta-feira, 20 de maio de 2015

Sujar; Pichar; Vandalizar, Destruir... - Por Luiz Domingues




O termo, “vandalismo”, vem da antiguidade, quando tribos de origem germânica, chamadas como, “Vândalos”, invadiram Roma, e provocaram uma onda marcada pela destruição; pilhagem e agressões generalizadas. Obviamente selvagens, eram considerados bárbaros pelos romanos e daí, a palavra, “vândalo”, ganhou conotação a designar pessoas dotadas com uma baixa qualificação cultural, disposta a destruir o patrimônio público e / ou privado; promover algazarras; agressões gratuitas contra pessoas inocentes a esmo etc.
Ao longo da história, tal conotação fortaleceu-se, e o vandalismo tornou-se o termo para designar esse tipo de ato provocado por essa gente. Bem, na antropologia; psicologia; semiótica; pedagogia, e até na pediatria, existe teses as mais variadas para explicar a motivação por trás desse tipo de atitude / mentalidade. Uma das mais usuais, é a de que no final da infância e começo da adolescência,  os hormônios estão a explodir, e isso necessita de um ponto de vazão.
De fato, isso procede, mas se fosse um fato normal buscar tal escape através da destruição, não haveria civilização, e nem as pinturas rupestres teriam escapado nas cavernas, não acha ?


Outra boa explicação vem da psicologia. A explosão da puberdade provoca a necessidade de autoafirmação para os meninos, através da extrapolação da energia bruta, para demarcar território entre os machos; e assim estabelecer lideranças entre grupos, na base do mais forte, ou a buscar sobressair-se pela inteligência bélica; para chamar a atenção das meninas. Como adendo à tese acima descrita, acrescento que nos últimos tempos, mudanças de parâmetros socioculturais fazem com que as meninas busquem o mesmo princípio, baseado na força bruta, com agressividade. Isso põe em cheque a tese de que as diferenças observadas em torno dos cromossomos e hormônios sejam estáticas e indissolúveis. Pois o fato das meninas possuir pouca quantidade de testosterona no seu organismo, não significa que não possam deter um grau de agressividade parecido com o dos meninos.
Independente disso, se testosterona fosse desculpa para destruir, recorro ao raciocínio expresso no primeiro item : não teríamos construído uma civilização; cultura; ciência; arte etc. A semiótica também fornece a sua visão para o caso. Se tudo é relativo na questão que estuda a relação entre significado e significante, obviamente que destruição; sujeira; rabiscos; dejetos e que tais, são considerados como fatores “feios”, mas relativamente, pois poderiam significar como elementos “bonitos”, sob outro ângulo. Claro, enquanto teoria meramente subjetiva, faz sentido, mas na prática civilizatória, isso não pode ser interpretado dessa forma simplista. Ninguém que tenha as faculdades mentais em ordem, rasgaria uma nota de cem dólares sob a alegação de que sob uma visão paralela do universo, aquela nota não contenha valor algum...


No campo da cidadania, é que os parâmetros para analisar tal questão, parecem ser os mais sensatos, e que perdoem-me os que desprezam a civilização, e sobre quais formatar-se as suas alegações em termos de ordem política; ideológicas, ou sociológicas.
A forjar uma ideia básica de que a urbe é uma mera extensão de sua habitação, o raciocínio perene é : você destrói sua casa; vive em um autêntico chiqueiro; gosta de condições insalubres de higiene e segurança; aprecia a feiura estética dos escombros ? Antes que alguém apresse-se em contra-argumentar, sim, eu sei que existe pessoas que vivem assim, e entre elas, há as que gostem em viver sob tais condições.
Tirante as pessoas acometidas de patologias de ordem mental, quem realmente aprecia viver dessa forma ? Portanto, ao apelar para o bom senso da maioria, e a excetuar-se alguns tipos de pessoas com comportamento não padronizado, tais como : os prejudicados por doenças de ordem mental; os que sejam sociopatas; misantropos; adeptos de seitas religiosas / filosofias radicais que preguem como norma o abandono das normas sociais, com renúncia absoluta dos valores, normas e parâmetros da sociedade moderna; os adeptos de sistemas políticos radicais baseados em niilismo; os seguidores de estéticas niilistas que buscam no confronto com a dita normalidade vigente, a sua razão de ser para expressar-se no mundo, e os simplesmente antissociais e dispostos a chamar a atenção pela excentricidade em portar-se como “do contra”, a pergunta que não quer calar é : para que praticam o vandalismo contra o patrimônio público e / ou privado ?


Primeiro ponto : tirante as pessoas situadas em setores “especiais” das quais eu descrevi acima, a maioria, teoricamente, gosta de viver em casas confortáveis; bem acabadas; bem decoradas ao seu gosto cultural, limpas e organizadas.
Falei algo absurdo ? E salvo algum acidente doméstico, ou até mesmo um momento de fúria esporádica, e motivada por uma briga familiar mais exacerbada, quem em sã consciência sai a vandalizar o próprio lar, a quebrar objetos, móveis e utensílios, espalhar sujeira e a pichar as paredes com rabiscos horrendos ? Reitero, nem percam tempo em contra-argumentar que exista pessoas com tal mentalidade, porque de pronto digo-lhe : sim, sei que existe, mas representam uma minoria ínfima.
Ao partir dessa premissa, se a cidade é uma extensão de nossas casas, por quê devemos aturar a destruição sistemática dos equipamentos urbanos; os monumentos; jardins & parques ? Por quê devemos acostumarmo-nos com o lixo espalhado nas ruas; calçadas quebradas; lixeiras estraçalhadas pelos vândalos ? Por quê vivemos em meio a escombros; odores fétidos; placas de sinalização rabiscadas ?
Enfim, por quê no Brasil ainda impera a mentalidade da miséria urbana, como padrão ? Então chego ao último item que teria uma possível explicação acadêmica : trata-se de uma questão cultural. Visto sob parâmetro sociológico, em países como a Finlândia; Suécia; Japão; Alemanha, e Suíça, para ficarmos em poucos exemplos apenas, a quase ausência de vandalismo em suas respectivas sociedades, denota um outro tipo de mentalidade cultural generalizada, e que faz toda a diferença, portanto. Em suma, como quase tudo o que envolve comportamento, a chave é : educação.
Se desde pequeno, o cidadão for educado para não considerar correto jogar a embalagem de uma bala no chão; não achar bonito rabiscar a parede com canetinha; a respeitar as regras de trânsito, mesmo como pedestre, e que os monumentos da cidade são objetos de arte, ao representar simbolismos importantes da sua própria história, tanto quanto os seus álbuns de fotografias de família, que ele não destruiria, acredito que em duas gerações, no máximo, a percepção mudaria. Portanto, o desafio educacional vai muito além da erradicação do analfabetismo, tampouco no tocante à melhora da qualificação para o “mercado de trabalho”. A grande tarefa é mudar a mentalidade de um povo que divide-se entre os que acham “bom” viver em um chiqueiro; e os que sentem resignação por esse status quo, pois simplesmente não acreditam que o Brasil possa ter outra qualificação sociocultural. De volta ao início da matéria, de onde vieram mesmo os vândalos, aqueles trogloditas bárbaros que horrorizaram Roma ? E o que tornou-se a Alemanha, séculos depois, senão um exemplo de organização social de altíssimo padrão civilizatório ? Pois é... a educação !
Matéria publicada inicialmente no Blog Planet Polêmica, em 2015

Nenhum comentário:

Postar um comentário