sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Filme: Turn me On, Dead Man - Por Luiz Domingues

A ideia primordial do livro: "Luz; Câmera & Rock'n ' Roll seria em princípio centralizar-se em torno da análise de filmes lançados sob a identificação clássica em torno do padrão em longa metragem, entretanto, desta feita eu abrirei uma exceção para incluir nesse seleto rol, um curta-metragem, pois dada a sua relevância e sobretudo a maneira criativa pela qual foi produzido, fica mais do que justificada a sua inclusão.
 
Falo sobre a película: “Turn me On, Dead Man”, baseada em uma história inspirada diretamente na biografia dos Beatles, porém a tratar-se de algo não relatado em sua história oficial, portanto, a mostrar-se altamente amparada em uma lenda urbana, por conter um episódio completamente fora de propósito, como premissa. Faz-se mister explicar-se a lenda construída em torno dos Beatles, anteriormente, para que este curta metragem possa ser compreendido melhor pele leitor.
Pois bem, em 1966, conta-se que os Beatles estavam a ensaiar em um determinado dia, e por conta de uma briga ocorrida e motivada por diferenças surgidas em torno do arranjo para uma música, Paul McCartney teria saído furioso do ensaio e ao dirigir o seu carro sob forte estado de emoção, e em meio à chuva, sofreu um acidente e veio a falecer. Por tal suposto caso ter ocorrido durante a alta madrugada, deu tempo para que os demais companheiros e sob a liderança do empresário, Brian Epstein, pudessem abafar o caso e rapidamente tomar providências para colocar um sósia perfeito em seu lugar, e assim, a banda pode tocar a carreira adiante, como se nada houvesse ocorrido. 
Tal lenda urbana cresceu muito naqueles anos posteriores, ao ponto de arregimentar uma enorme lista de supostos sinais secretos que estariam presentes nas letras das músicas e através de sinais inseridos subliminarmente em fotos e capas de discos. Um desses sinais, cita a questão do personagem, Billy Sheers, mencionado na letra da canção, “Sgtº Pepper’s Lonely Hearts Club Band”. Pois bem, esse Billy Sheers teria sido em tese, o rapaz contratado para substituir Paul MacCartney na banda e na vida, digamos assim. Outro dado interessante, e só vou citar mais este, pois tem a ver diretamente com este filme: no LP “White Album”, de 1968, consta no repertório de tal disco, uma faixa chamada: “Revolution Number 9”. Na verdade, não é uma música propriamente dita, mas uma faixa inteiramente experimental a conter rajadas de metralhadoras, permeadas por gritos, palavras proferidas de uma forma incompreensível, muitos efeitos sonoros louquíssimos e um trecho marcante, a conter uma locução monocórdica a repetir intermitentemente a expressão : “Number 9; Number 9; Number 9”...  pois nessa faixa altamente polêmica, segundo consta em mais uma lenda urbana, quando o ouvinte fazia com que a agulha da vitrola girasse no sentido anti-horário, seria possível ouvir-se a expressão: “Turn me On, Dead Man”, o que em tradução livre seria algo como: “Deixe-me ligado, Homem Morto”. Ou seja, a tal “backwards messanger” a denotar ser mais uma alusão subliminar e não confirmada, logicamente, a corroborar a ideia de que Paul McCartney houvera falecido em fevereiro de 1966, e desde então, um sujeito chamado, Biilly Sheers, estaria como um impostar a ocupar a sua identidade e por conseguinte, posto na banda. 
Pois foi nessa premissa absurda que construiu-se o argumento para esse curta-metragem, denominado: “Turn me On, Dead Man”. Ao contrário da clássica comédia, “The Rutles”, onde a sátira é explícita e toda a paródia construída inspira-se abertamente na biografia e sobretudo na obra dos Beatles, no caso de “Turn me On, Dead Man”, não fala-se em momento algum que seja inspirada nos Beatles e nem mesmo as músicas executadas são paródias que lembram as canções originais. Entretanto, tudo é montado para remeter aos Beatles.
 
Não se usa o nome da banda, tampouco dos nomes de seus componentes, mas é óbvio que está a retratar-se o Fab Four, ainda que os nomes sejam diferentes e as canções apresentem outras formulações melódicas. No entanto, a estética musical e toda a orientação do figurino, visual dos personagens; ambientação de época, nos anos sessenta, e outros detalhes desta produção, remete aos Beatles em 100 %.
A história começa com uma notícia chocante que é dada no estúdio onde essa banda ensaia. Um dos componentes sofreu um acidente e o clima torna-se desolador, naturalmente. Corte brusco e um flashback mostra a mesma banda em situações vividas poucos anos antes, com um sucesso retumbante a justificar o delírio da parte de fãs ensandecidas, cenas da banda a descer de aviões e receber a ovação de fãs ali presentes para recepcionar os rapazes, peças de portfólio a ilustrar o sucesso retumbante da banda etc. O filme segue com a mesma perspectiva, ao mostrar os rapazes a conceder coletivas de imprensa e também a apresentar-se em shows ao vivo. Tudo muito rápido, mas eficiente a mostrar ao espectador uma sequência coerente e mais que isso a deixar clara a alusão implícita aos Beatles em sua trajetória real. Isso reforça-se com a cena a mostrar a banda a conceder a coletiva de imprensa e ali, as respectivas personalidades dos músicos, tanto pelas respostas que formulam, mas também pelos trejeitos apresentados, deixa clara a representação dos Beatles. Mostra-se o empresário da banda a receber dinheiro, o que é um fato subliminar importante para descrever um ponto futuro do filme.
Bem, volta-se na narrativa ao momento de 1966, um pouco antes do acidente com o baixista da banda. Mostra-se o clima tenso no ensaio e o momento da discussão mais acalorada, quando ele abandona o trabalho e sai furioso do local. Ele entra no carro e sai a dirigir com bastante imprudência, devido ao nervosismo pela situação anteriormente criada e isso ocorre na calada da noite e sob a ação de um chuva intensa. 
Subitamente, ele freia bruscamente para não atropelar uma garota que surge em meio à estrada. Assustado, ele  a aborda para saber como ela está e oferece-lhe uma carona para levá-la para a sua residência. No entanto, no decorrer desse novo trajeto, a garota comporta-se de uma forma estranha e parece estar propensa a provocar um acidente verdadeiro. O artista (chamado, Blake), de fato perde a direção do automóvel e o acidente ocorre, ao mostrar-se fatal para ele. A garota sai na chuva, e não dá a entender ter machucado-se, e nem mesmo a importar-se com o ocorrido. Naturalmente que a metáfora é a explicação para a participação de tal personagem expresso em torno da moça e que veio para justificar a morte inevitável do músico, Blake.
 
Bem, a notícia chegou aos seus companheiros e o empresário mostra o seu lado frio e antes mesmo que eles caiam aos prantos, propõe a ideia de montar-se uma farsa, com a imediata busca por um sósia e assim não gerar nenhum prejuízo à carreira da banda, que prosseguiria na mesma rotina mantida pelo sucesso e consequente possibilidade para angariar-se muito mais dinheiro do que a banda já havia ganho. Em princípio, alguns chocam-se com tal proposta absurda, mas o escrúpulo e a comoção pela perda do companheiro, logo passa e assim, acham um sósia perfeito e a banda segue os seus planos normalmente, sem que nenhum fã ou jornalista, perceba tratar-se de uma farsa em torno de haver um impostor a passar-se pelo Blake. Há uma menção explícita sobre a faixa “Revolution Number 9”, neste instante, pois o tal sósia ganhara uma prosaica premiação em uma feira provinciana, por conter o número “nove” de uma rifa ou coisa que o valha. 
A saga da banda prossegue e daí, pontos cruciais da trajetória dos Beatles são insinuados em fatos decorridos em 1967 & 1968, para avançar-se até o final da banda em 1970, com o tal sósia de Blake a viver normalmente, como se fosse ele e certamente inspirado diretamente na trajetória de Paul McCartney. O filme encerra-se a marcar a ideia de que o verdadeiro Blake, falecera em 1966, a reforçar a lenda urbana fomentada e uma cena a mostrar uma perspectiva toda montada para remeter ao efeito das ditas “backwards messangers”, que grupos de Rock inseriam em seus álbuns para ser ouvidas subliminarmente (não apenas os Beatles brincaram com esse efeito), quando os discos eram tocados ao contrário na pick-up das vitrolas, mostra uma voz a afirmar, por reiteradas vezes a frase: “Blake is Dead”.
 
Muito bem, esta obra tem muitos pontos positivos. Primeiro, pelo capricho da produção, pois esmerou-se em ter uma direção de arte, figurino, maquiagem & cabelo, iluminação & fotografia, mas sobretudo por conta de sua trilha sonora, a apresentar uma ótima qualidade. Gostei muito também do roteiro, igualmente, muito bem engendrado, a condensar de uma maneira muito eficaz a história em torno de parcos vinte e poucos minutos de duração deste curta-metragem. E também gostei da direção, pois a trama toda tem um distanciamento interessante, em que as emoções são mostradas, é claro, mas o tempo todo, fica a impressão de haver um filtro usado para nunca deixar o espectador envolver-se em demasia, algo bastante incomum em qualquer audiovisual, certamente.
 
Joe Reegan interpretou Blake, Dave Moscow interpretou, John. Brian Gattas interpretou Sam, Luke Edwards interpretou Charlie, Brian Ruppenkamp interpretou Ryland, Duke Straud interpretou Jack Fowler, Kalia Fullerton interpretou Adelia/Kalia Pamela, Patrick Holland, interpretou Giles.
 
Sobre a parte musical, uma banda gravou a trilha, chamada: “Rock Ensemble”. Roteiro escrito por Adam Blake Carver e Tyler Knell. Direção de Adam Blake Carver. O filme foi lançado em junho de 2009.
 
Inicialmente exibido em festivais e salas de cinema de arte, teve uma repercussão em canais de TV a acabo, notadamente em programas ligados à música e certamente repercutiu fortemente em meio aos fãs dos Beatles com bastante repercussão em mídias geridas por fã clubes e afins. 
Não tenho informação sobre a existência de um DVD desse curta ou mesmo que ele esteja inserido em algum DVD coletânea ou em outro meio. Existe um livro com o mesmo título, no entanto, e que nada tem a ver com esta produção cinematográfica, mas trata da questão da lenda urbana em tono da suposta morte de Paul MacCartney, em 1966. Foi escrito por Andru J. Reeve.
 
Esta peça pode ser assistida no YouTube, dividida em duas partes, e tal divisão mostra-se até incompreensível, visto tratar-se de um curta metragem com apenas vinte e dois minutos de duração, mas tudo bem, o importante é que esteja disponível.
 
Esta resenha foi escrita para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll" e está disponível para a leitura através do seu volume II, a partir da página 259.  

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