Séries baseadas em dramas
hospitalares são antigas na TV. Tal mote já foi bastante usado na
últimas décadas, e claro que no imaginário popular mais atual, a lembrança
recua até “Plantão Médico” (ER); Grey’s Anatomy; House; Scrubs, e outras
contemporâneas, mas o fato é que tal abordagem é bem mais antiga na história da
TV. Ao recuar na década de setenta, houve
a série, “The Rookies”, e um pouco antes “Julia”, com personagens enfermeiras
a protagonizar tais seriados. Entretanto, o recuo é ainda mais longínquo,
para remeter ao início da década de sessenta, com dois mega sucessos que entraram
para a história da TV : Dr Kildare e Ben Casey. No caso de Dr. Kildare, a origem do
personagem era bem mais remota ainda, ao atingir os anos trinta. Tal personagem, um jovem médico
residente de um hospital e que invariavelmente envolvia-se com o drama pessoal
de cada paciente, ao apresentar-se como um verdadeiro anjo da guarda; e também como psicólogo; assistente social; guarda costas; conselheiro, e até fiador (pasmem !), nasceu
enquanto personagem de novelas literárias. Fora criado portanto, por Max Brand, pseudônimo de
Frederick Schiller Faust.
Frederick na verdade, mantinha diversos
pseudônimos e foi, entre os anos dez, e os anos quarenta do século passado, quando
morreu, um dos mais compulsivos escritores norteamericanos, por haver deixado um número
absurdo de contos; novelas; historietas e congêneres literários, finalizados.
Ele escrevia sob vários estilos, mas
predominava o gênero Western entre as suas criações. As suas novelas ambientadas no velho
oeste norteamericano, fizeram sucesso como literatura popular, e alimentaram
bastante as radionovelas; cinema, e posteriormente a TV.
Dr. Kildare, no entanto, fora uma
pequena exceção em seu padrão, ao apresentar um personagem urbano, e solidário,
portanto destoante de um mundo urbano permeado por gangsterismo; crime, e
nas diversas mazelas exacerbadas pelo período de Pós-Depressão, de 1929. A primeira incursão do personagem, Dr. Kildare,
fora dos livros, deu-se no cinema, em 1937.
Em “Internes Can’t Take Money”, o
jovem médico envolve-se em um drama policial com clima “noir”, ao tratar da jovem
viúva de um gangster, que por sua vez, está a ser chantageada pelos comparsas
de seu falecido marido. A contar com atores de primeira linha do cinema trintista,
como Lyonel Barrymore e Barbara Stanwick, o personagem do jovem médico ficou a
cargo de Joel McCrea.
Sucesso na época, deu margem à MGM
para que desse continuidade, e assim lançar mais nove filmes a explorar a personagem, porém,
dali em diante com outro um outro ator a defender o galante médico, no caso, Lew Ayres, e Lyonel Barrymore, a interpretar o diretor do hospital. Nos anos 1950, a fama do personagem
estava consolidada, e possibilitou a sua introdução ao mundo radiofônico,
através das radionovelas. Contudo, com a TV a ganhar a cada dia mais
espaço, no início dos anos sessenta, eis que chegou à tela pequena, para transformar-se
em um tremendo sucesso.
A primeira temporada iniciou-se em
1961, com o então desconhecido ator, Richard Chamberlain, como o jovem Dr.
Kildare.
Para interpretar o Dr. Gillespie,
o seu mentor, e diretor do Hospital, assumiu o ator, Raymond Massey. Inicialmente, os produtores desejavam
James Franciscus, ou William Shatner para interpretar o Dr Kildare, no entanto, ambos
recusaram o papel. Shatner alegou que não queria ficar
preso a uma personagem fixa de seriado, acostumado que estava a fazer apenas participações
em diversas séries, desde o final dos anos cinquenta.
Mas curiosamente, cinco anos depois,
ficaria não só preso como protagonista de uma série, como faria a sua fama
indelével, ao interpretar o valente, Capitão Kirk, da nave espacial "Enterprise",
em "Star Trek" (Jornada nas Estrelas).
Nas quatro primeiras temporadas de Dr Kildare, o formato do seriado seguiu o padrão normal da época no tocante à metragem, e conclusão da narrativa em questão.
Nas quatro primeiras temporadas de Dr Kildare, o formato do seriado seguiu o padrão normal da época no tocante à metragem, e conclusão da narrativa em questão.
Nesse trecho de um episódio acima, Barbara Eden entra em cena, e justifica a sua futura fama, a mostrar como Jennie seria um Gênio...
Em cerca de cinquenta minutos, uma história completa desenvolvia-se mediante a observação de começo; meio & fim, a respeitar o padrão de um filme longa
metragem.
Um dos mais sensacionais episódios,
chamado : “Duet For One Hand”, deu-se pelo argumento, mas também pela oportunidade de
colocar em cena, dois atores sensacionais do cinema das décadas de trinta e quarenta
: Basil Rathbone e Raymond Massey.
Massey era componente do elenco fixo da série,
e Rathbone, que foi um dos maiores, senão o maior intérprete do inspetor
Sherlock Holmes na história do cinema, interpreta um pianista concertista, que
enfrenta o Mal de Parkinson. São momentos ricos de interpretação entre
os dois veteranos atores, fora a trilha sonora especial para a ocasião, com
bastante Chopin no ar, para justificar o drama do pianista que vê as suas mãos
preciosas a falhar pela ação da doença. Outro ator de quilate que
participou, o britânico James Mason, estiloso como sempre, em sua interpretação garbosa.
Muitas figuras recorrentes nas séries
de TV, marcaram participações especiais, como : Lesley Ann Warren; Lee Meriwether;
Martin Balsam; James Earl Jones, Darren McGavin; Ricardo Montalban; Dean
Stockwell; David Opatoshu; Barbara Eden; Robert Reed; Sal Mineo;Yvette Mimieux; Yvonne Craig; Cesar Romero; Jack Lord, Leslie Nielsen etc.
E figuras gigantes do cinema, como : Ralph Bellamy; Claude Rains; Lauren Bacall; Celest Holm; Charles Bronson; Fred
Astaire, e Jack Nicholson.
Além do eterno capitão Kirk, Willian
Shatner, que recusou ser o intérprete oficial do Dr.Kildare, mas aceitou ser
ator convidado em um episódio.
Somente na quinta temporada, a
derradeira, de 1964-1965, a produção quis estabelecer uma guinada na formatação,
ao acreditar que a simples novidade da nova temporada ser exibida em cores, não
bastaria para manter a audiência, que sofria um desgaste, não pelo cansaço em
si sobre tal drama, mas pelo fato inconteste de que a concorrência estava muito forte nessa época.
E a mudança praticamente transformou
a série em uma novela, pois as histórias passaram a apresentar continuidade,
com o famoso gancho entre um episódio e outro etc. Entretanto, isso não impediu o cancelamento,
e infelizmente, e assim, encerrou-se a saga do jovem médico, e de seu mentor
experiente, na TV.
No Brasil, o sucesso que a série fez
foi muito grande, também. Era exibida pela saudosa TV
Excelsior, na década de sessenta, com uma grande reprise na TV Bandeirantes na década
posterior, até sumir da grade da TV, nos anos vindouros.
Richard Chamberlain tornou-se um galã
mundialmente famoso, mas não conseguiu construir uma carreira significativa no
cinema por conta dessa fama, ao permanecer confinado ao mundo da TV, com
participações em TV Movies, sendo estigmatizado posteriormente
mesmo, como um ator de Mini Séries, pecha da qual culminou em livrar-se mais.
Para seguir o padrão alto das produções norteamericanas, é claro que a trilha musical de Dr. Kildare, mostrou-se bem caprichada.
Para seguir o padrão alto das produções norteamericanas, é claro que a trilha musical de Dr. Kildare, mostrou-se bem caprichada.
O tema de abertura, chamado “Three
Stars Will Shine Tonight”, composto por Jerry Goldsmith (em parceria com Pete
Rugalo e Hal Winn, ou seja, um grande compositor e maestro, a ostentar uma carreira brilhante,
basta examinar o seu currículo), é bastante bonito.
Claro, ao aproveitar a fama da série
à época, Richard Chamberlain foi incentivado a arriscar-se como cantor, e até gravou
a versão do tema de abertura da série, sob um dos discos que lançou no mercado,
mas que sinceramente, nada acrescentou musicalmente, tampouco à carreira dele, como ator.
Ainda no auge do sucesso televisivo
do seriado, uma versão no formato das histórias em quadrinhos, chegou às bancas
da América, ao angariar um patamar de sucesso moderado, pois o público infantojuvenil, fiel
consumidor da HQ, não identificou-se inteiramente com a personagem, e o público feminino, principalmente, preferiu acompanhar na TV, para ver o galã
Chamberlain, e não através der um desenho.
Em 1972, a MGM decidiu produzir um
remake da série. Como sempre, algum produtor deve ter
argumentado na reunião de pauta, que a história era boa; a personagem carismática,
e que valia a pena trazê-la à tona novamente com roupagem "moderna", a usufruir
da tecnologia mais avançada, blá blá blá... claro que não logrou êxito, como é quase
uma praxe para um remake, mas essa gente parece não aprender com a constatação,
enfim.
Mesmo a carregar um pouco no drama,
Dr. Kildare marcou história na TV, e deixou saudade entre os seus fãs, ao abrir
o caminho para outros seriados baseados no ambiente hospitalar, e que seguiriam
a fórmula dos conflitos de bastidores a misturar-se aos problemas de saúde dos
pacientes, e principalmente no embaralhamento de seus dramas pessoais, com o
dos médicos e enfermeiros.
Que eu saiba, não saiu no Brasil um
DVD Box Set oficial com as cinco temporadas completas. Tenho conhecimento sobre a existência de cópias
incompletas, disponíveis em sites mantidos por colecionadores, apenas.
No cômputo geral, Dr Kildare foi uma
boa série, a explorar os conflitos humanos diante da iminência da doença como
pano de fundo, e assim explorar bem a ideia original das novelas escritas por Max
Brandon (Frederick Schiller Faust), o criador da personagem.
Gostava de assistir Jornada nas Estrelas. Esse ator era galã e muito bom mesmo! Não tive a oportunidade de assistir Dr. Kildare. Mas pelo o que escreveu, deve ter sido bem interessante. Gostaria de ter assistido .
ResponderExcluirGosto muito de suas matérias Luiz. Sempre que posso, leio e comento.
Parabéns como sempre! e obrigada por compartilhar.
William Shatner recusou ser o ator protagonista de Dr. Kildare, mas poucos anos depois ficaria famoso como o Capitão Kirk, de Star Trek (Jornada nas Estrelas).
ExcluirQuanto à Dr. Kildare, existem fragmentos de episódios no You Tube, com dublagem brasileira de época. Já nos Estados Unidos, tem Box Set DVD com a série completa, mais extras etc e tal.
Muito grato pela sua participação !!
Você tinha razão, nâo assisti a essa série. Pelo que escreveu achei interessante, principalmente pelas curiosidades, só as participações especias da Barbara Eden, William Shatner, que quem diria nâo queria ser estigmatizado por um personagem, ironia do destino... já valem a pena, fora a trilha sonora do Jerry Goldsmith que nâo necessita de apresentações. Muito rico e informativo seu texto, valeu Luiz!!
ResponderExcluirEssa série teve momentos marcantes, sem dúvida. Apesar da minha tenra idade, quando de sua exibição no Brasil, a partir de 1962, tenho boas recordações dela.
ExcluirComo acontece com toda série que faz sucesso na América, a possibilidade de atrair muitos astros da TV e do Cinema para fazer participações especiais, foi grande. No caso de Barbara Eden, ela ainda não havia ficado famosa, mas pela cena que escolhi para ilustrar a matéria, dá para notar como sua beleza estonteante iluminava a tela.
E quanto à Jerry Goldsmith, sem comentários...simplesmente um gênio.
Grato por ter lido e comentado !!
Nossa Luiz!!!! Mais uma vez vc me remeteu lá atrás...à sala da casa dos meus pais...que delícia de texto!!!! Claro que eu assistia Dr. Kildare!!! garotinha, era fãzassa!!! Confesso que, muitos anos mais tarde, quado soube que o Richard Chamberlain era gay fiquei muito desapontada...era um galã, para mim!!! Sensacional o trecho com a Barbara Eden! Adorei!
ResponderExcluirQue maravilha ter lhe proporcionado uma viagem no tempo e esse contato querido com sua infância e o seio familiar.
ExcluirMinha lembrança de Dr. Kildare é igualzinha, ou seja : sala de estar do "Lar, Doce Lar"; Papai; Mamãe & Vovó em volta, e os olhinhos grudados na tela da jurássica TV de válvulas, tubo enorme e imagem preto-e-branco...
Chamberlain foi um galã que ainda sofreu com a intolerância no cinema e TV, numa época onde os produtores chegavam a colocar cláusula em contrato, para assegurar a blindagem absoluta da homossexualidade de atores e atrizes, sob a pena de ter prejuízos com a eventual descoberta desse fato.
O caso mais gritante foi o de Rock Hudson, que assim como Chamberlain, escondeu sua homossexualidade até onde pode, quando sucumbiu nos anos oitenta, pela Aids e por ser um dos primeiros casos entre artistas famosos e a medicina da época ainda estar despreparada para enfrentar tal doença, foi um escândalo vê-lo definhar daquela forma e ainda com uma saraivada de críticas maldosas pelo fato da doença ser atribuída à prática pederasta.
Quanto à Barbara Eden, sensacional, mesmo. Barbara era (é) lindíssima e o sortudo ator Michael Ansara que o diga...
Oi, Luiz
ResponderExcluirQue legal! Adorei relembrar dr. Kildare. Costuma assistir com o meu pai.
É bom saber que o dr. House não é o único famoso na TV!
Parabéns, pelo artigo!
Abracos!
Que lembrança maravilhosa, Janete...
ExcluirMeu caso também, assistia Dr. Kildare acompanhado de meus pais e minha avó paterna.
De fato, muito antes do Dr. House, Dr. Kildare e Ben Casey fizeram história na TV, como personagens médicos.
Muito grato pela participação !!
Gostei muito de relembrar essas séries!
ResponderExcluirEram super interessantes e emocionantes, havia muito sentimento envolvido, acho que as pessoas eram mais solidárias e envolvidas com os sentimentos alheios e sofrimentos também!
Bjus
http://www.elianedelacerda.com
Você observou com muita propriedade : nessa época, as pessoas eram muito mais dóceis, fraternais e sensíveis.
ExcluirEm tempos de luta árdua pela sobrevivência, aliada à banalização da violência e stress absoluto no cotidiano permeado pela truculência, sinto muita falta dessa docilidade de outrora.
E nesse caso, uma série dramática como Dr. Kildare, que tratava de questões tão humanas, permeadas pela iminência da morte e da dor / doença, havia o elemento da solidariedade.
Indo além, tratando especificamente da medicina, numa série como Dr. Kildare, a preocupação dos médicos e enfermeiros com o bem estar dos pacientes era um reflexo desse humanismo perdido no tempo e no espaço. Hoje, se não tem plano de saúde ou apresenta um cheque calção num valor astronômico, o paciente é convidado a se retirar do saguão do estabelecimento hospitalar.
Ou seja, saudade do Dr. Kildare...
Grato por ler e comentar !!
Beijo, amiga !
Olá. tinha 4 anos e assisti a ultima temporada do Dr Kildare com minha mãe. Era uma série excelente e de muita audiência, acho que exibida pela saudosa e extinta TV Excelsior. Gostaria de pedir a TCM para reprisa-la, mas acho que é pedir demais...
ResponderExcluirOlá !!
ExcluirAntes de mais nada, estou muito feliz por sua visita ao meu blog, e mais ainda pela postagem de comentário.
Exatamente, Dr.Kildare foi exibida pela TV Excelsior de São Paulo, nos anos sessenta.
Receio que o canal TCM mudou sua mentalidade, faz um certo tempo até, pois o conceito de "vintage" para eles passou a ser as décadas de oitenta e noventa do século XX, apenas, e produções mais antigas não tem mais vez em sua grade.
Só pelo fato da produção de TV dos anos 1950 e 1960 ser em preto e branco em sua maioria (as produções em cores começaram em 1966), inviabiliza a exibição, sob a alegação de que as novas gerações não suportam assistir nada em PB. Uma pena que se baseiem numa mentalidade tão rasteira.
Visite sempre o meu Blog ! Tenho outras matérias falando de séries de TV antigas, e muito sobre cinema.
Abraço !!