segunda-feira, 4 de junho de 2012

Filme: Muscle Beach Party (Quanto Mais Músculos, Melhor) - Por Luiz Domingues


Na entressafra entre o declínio do Rock cinquentista e o início da Beatlemania (com a consequente ação natural do fenômeno conhecido como a "British Invasion", a caracterizar a invasão das bandas britânicas com os Beatles e os Rolling Stones em sua liderança), o panorama do Rock viveu um período em relativa baixa, tirante a presença da Surf Music (com os Beach Boys, The Ventures, The Shadows, Link Wray, e Dick Dale na sua linha de frente) e o pessoal super valoroso, oriundo das vertentes da Soul Music & R'n'B, a manter o nível da boa música Pop, em voga.

Tirante esses tais artistas citados anteriormente, houve uma safra de artistas mais comerciais a alcançar um destaque e nesse campo, pode-se também acrescentar que os europeus obtiveram uma ascensão, notadamente o Pop produzido na Itália e na França, sob uma primeira instância e com Alemanha; Espanha e Inglaterra, sob um segundo escalão (Cliff Richard e Tommy Steele reinaram nesse aspecto, no Rock britânico, pré Beatlemania). 

E nesse horizonte de início da década de sessenta, produtores hollywoodianos investiram em uma série de filmes ambientados nas praias californianas, a apresentar esse clima de ingenuidade juvenil da época, aliado a números musicais em torno desse panorama que citei no primeiro parágrafo. 

Praticamente ao estabelecer uma sequência, esses filmes repetiam diversos personagens, ainda que às vezes ao trocar-lhes os nomes fictícios. Antes porém, é preciso acrescentar que essa série de filmes de praia, os chamados, "Beach Party", não foram criados de uma forma espontânea, mas sob a inspiração decorrida do fato de que a atriz, Sandra Dee, houvera lançado dois filmes anteriormente, "Gidget" (1959), e "Gidget Goes Hawaiian" (1961), ambos produzidos pela Columbia Pictures a enfocar o universo adolescente.
Foi então que outra companhia concorrente, usou a mesma ideia ao produzir a famosa sequência dos filmes da "turma da praia". No entanto, não se caracterizou de uma mera cópia dos filmes protagonizados por Sandra Dee, no sentido que no caso dos tais "Beach Party", a opção foi centrar a ação nos jovens e sem a participação de pais e/ou educadores por perto. A participação de adultos centrou-se então em inimigos sabotadores, gangsters e até pela inclusão de elementos sobrenaturais ou alienígenas, a depender de cada filme e por conta do seu roteiro em específico.

Independente do contraponto a oferecer drama aos filmes, a base primordial fixou-se sempre nas estripulias juvenis, flertes e namoros, com os jovens a aproveitar a praia em grupo e por conta do ambiente praiano, participar de muitas festas regadas a música e nesse quesito, há uma riqueza no bojo da produção toda, visto que muitos artistas da pesada aparecem a tocar e cantar e em alguns casos, com reincidência em mais de um filme da sequência.

Outra característica ótima, sempre houve a inclusão de atores veteranos a viver vilões, predominantemente, mas também a fazer aquele contraponto da velha geração a ser considerada "esquare" ("quadrada"), e repudiar dessa forma a cultura jovem para que em muitos casos, pudesse ser caracterizada a render-se aos encantos do Rock, e assim reforçar a piada em torno do choque entre gerações.

A base protagonista ficava quase sempre para o casal de atores: Frankie Avalon e Annette Funicello, e as confusões armadas sempre foram montadas a apresentar vilões quase sempre atrapalhados, mais para atabalhoadas personagens defendidas por Jerry Lewis em suas comédias, do que para algo assustador, certamente. E claro, além de muitos números musicais no embalo da praia e inerente à sua típica descontração californiana, a ostensiva opção por mostrar belas garotas a usar apenas bikinis, quase que o tempo inteiro, foi um chamariz natural para atrair a audiência masculina, sobretudo o público jovem, infantojuvenil, e certamente que embalou os sonhos de milhares, quiçá milhões de jovens adolescentes do sexo masculino, ao redor do mundo.
Entre os artistas da música, tais filmes foram pródigos em apresentar um rol da pesada. Destaca-se a participação de: Stevie Wonder (então, bem jovem, adolescente e apresentado como "Little" Stevie Wonder), Nancy Sinatra, Donna Loren, The Beach Boys, The Supremes, Little Richard, Dick Dale & The Del-Tones, The Kingsmen, The Pyramids, The Hondells e The Righteous entre muitos outros.

O sucesso dos filmes da American International, motivou imitações da parte de outros estúdios, com filmes a repetir a fórmula, ipsis litteris. Assim como Frankie Avalon, James Darren que também era um ator/cantor, atuou com desenvoltura em favor da concorrência (Fabian, atuou também como galã/cantor),assim como Nancy Sinatra, Pamella Tiffin e outros jovens atores, a incluir mais artistas sensacionais da música, incluso britânicos, casos do The Animals e Dave Clark Five.
Sobre os astros veteranos e que foram convidados a participar, tais aparições foram realizadas dentro do espírito da obra, naturalmente, mas é bonito ver tais artistas, alguns deles que foram grandiosos na história do cinema, a participar com muita honradez, mesmo tendo em tese a simplicidade de tais produções.
Estrelas que participaram e em alguns casos, com reincidência: Buster Keaton, Mickey Rooney, Boris Karloff, Peter Lorre e Elsa Lanchester (esta, a noiva do Frankenstein!), entre outros. Havia também um elenco praticamente fixo que se repetiu em quase todos os filmes, a contar com: John Ashley, Luree Holmes, Jody McCrea, Salli Sachse, Michael Nader, Candy Johnson, Johnny Fain, Valora Noland, Andy Romano, Susan Hart, Linda Rogers e Jerry Brutsche.

Há por destacar-se  também a presença sempre recorrente do comediante, Harvey Lembeck, a interpretar o líder de uma gangue formada por motoqueiros (Eric Von Zipper), ao estilo do filme, "The Wild One", protagonizado por Marlon Brando.

Nos filmes, da turma da praia, tal gangue é conhecida como:"Rats". Muitos maneirismos a demarcar bordões e características de alguns personagens, permaneceram de um filme para o outro, como a expressão: -"Eric Von Zipper vai voltar", ou pelo uso de uma bizarra técnica para imobilizar pessoas em brigas, mediante um toque sutil, aplicado na nuca do adversário e a denotar ser algum tipo de técnica oriunda de alguma luta marcial oriental.
Ainda a falar sobre a série da American International, observa-se a presença de filmes como: "Beach Party", "Muscle Beach Party", "Bikini Beach", "Pajama Party", "Beach Blanket Bingo", "Won the Stuff a Wild Bikini" e "The Ghost in the Invisible Bikini".

É notório, somente a prestar atenção aos títulos dessas obras, que a tendência foi enfatizar as palavras: "Bikini", "Festa" e "Praia", ou seja, a verbalizar o foco de todos os filmes produzidos dessa sequência. Como em tese, tirante o mote de cada história, os filmes foram estruturados de uma forma praticamente igual, escolhi um somente para resenhar mais detalhadamente, e isso não significa  que eu o considere o melhor, tamanha a paridade observada entre todas as películas. Analiso a seguir, portanto, o filme, "Muscle Beach Party" ("Quanto Mais Músculos Melhor").
Nesta obra, a trama foi montada em torno da rixa entre a turma de Frankie Avalon, contra uma gangue formada por fisiculturistas. É bom registrar que a suposta "maldade" dos grandalhões é risível em linhas gerais, como se fosse uma encenação perpetrada por um teatro escolar, portanto, não é possível, nem remotamente, cogitar-se levar a sério, sob o ponto de vista ficcional. Pois então, após uma série de provocações e confusões, tudo acaba bem para os protagonistas, com Frankie e Annete a dançar felizes nas areais, surfar e paquerar.

No elenco deste filme, além dos já citados, Frankie (interpretado por Frankie Avalon), e Dee Dee (interpretada por Annette Funicello), apresenta-se os atores: Luciana Paluzzi (como Condessa Juliana), John Ashley (Johnny), Peter Turgeon (como Theodore), Jody McCrea (como Dreadhead), Candy Johnson (como Candy) e outros.
Os fisiculturistas da trama, de fato eram praticantes do esporte e não atores profissionais. 

Há por destacar-se também a participação especial do veterano ator, Peter Lorre, astro do cinema clássico, participante de grandes obras do cinema, dos anos 1920 a 1950, principalmente, e que neste caso, tal estrela fez a famosa "ponta" para abrilhantar este filme em específico, a interpretar o senhor Strangdour.

Sobre a relação com o Rock, propriamente dita, a parte musical dá-se através dos números, que são sensacionais. Dick Dale, o grande guitarrista da vertente da Surf Music, atuou com a sua banda: "His Del-Tones". A cantora, Donna Loren, canta uma música acompanhada por Dick Dale. Richard Christian, Gary Usher e o líder dos Beach Boys, Brian Wilson, forneceram seis canções para o filme.

Frankie e Annette também eram cantores na vida real e sendo assim, cantavam igualmente neste, e nos outros filmes da série. Todavia, creio que um outro grande momento musical, ao meu ver, deu-se com a presença em cena de um adolescente esguio e deficiente visual. Ao cantar, dançar e tocar gaita com grande desenvoltura, ele ganha a cena e faz valer a pena assistir tal filme, apenas por esse detalhe. Trata-se de um então ainda desconhecido, Stevie Wonder, que faria jus ao apelido, algum tempo depois dessa película, lançada, ao deslanchar como um verdadeiro gênio musical, completo e a constituir-se, portanto, em uma "maravilha" musical. Muito reprisado nos canais de TV aberta, foi durante anos, diversão garantida para animar as férias escolares, em meio à famosa exibição da "sessão da tarde".
A reação da crítica, à época de seu lançamento, foi até respeitosa em relação a este filme, dado o fato de que fora o segundo da série e assim,já mostrou-se resignada com a ideia de que a sequência delineada a repetir a fórmula em torno de uma proposta super popular, não poderia sugerir haver alguma intenção da parte da sua produção em marcar presença como uma peça de arte, mas pelo contrário, o objetivo fora buscar o entretenimento juvenil, tão somente.

Escrito por Robert Dillon, foi dirigido por William Asher, que assinaria a direção de outros filmes dessa turma da praia, igualmente. Fez um bom papel nas salas de cinema na época; foi reprisado por incontáveis vezes na TV aberta, em sessões de TV vespertinas, inclusive no Brasil, na famosa "Sessão da Tarde", e também em canais de TV a cabo, inclusive em festivais temáticos a exibir todos os filmes da sequência em maratonas. Saiu em versão VHS e no DVD, certamente, e também consta em Kits a conter a coleção inteira, com todos os filmes da franquia reunidos, ou seja, um luxo para os colecionadores. Na internet, é encontrado com facilidade para ser assistido na íntegra.

Eu considero essa linhagem de filmes, da dita "turma da praia", predominantemente como comédias românticas juvenis, porém, pela fartura de números musicais nele contidos, podem sim, ser considerados como Rock Movies e nesses termos, ingenuidade e anacronismo a parte, eu creio que vale a pena olhá-los com carinho.






Resenha publicada inicialmente no Blog do Juma, em 2012. Esta resenha foi revista e ampliada, para ser incorporada ao livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll", a constar em seu volume I, a partir da página 259.

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