quinta-feira, 14 de junho de 2012

Filme: The Day the Earth Stood Still (O Dia em que a Terra Parou) - Por Luiz Domingues

Robert Wise foi um diretor que nunca se fechou em um estilo apenas. Pelo contrário, por ser eclético ao extremo, ele sempre procurou desafios a cada produção, ao passar de um mundo a outro, sem cerimônias.  

E foi com esse espírito que desejou filmar uma película no estilo "Sci-Fi" e após ler mais de duzentos roteiros na pesquisa que empreendeu para buscar uma boa história que o motivasse, eis que ele escolheu: "The Day the Earth Stood Still" ("O Dia em que a Terra Parou", em português), aliás, uma sábia escolha, por sinal, pois com tal texto, abriu-se a oportunidade que lhe concedeu a rara honra da imortalidade alcançada no cinema, ao atingir o panteão dos clássicos.

A história inicia-se em um dia comum em Washington, D.C. cuja rotina é quebrada de forma extraordinária quando de súbito, uma nave espacial aterrissa próxima à Casa Branca.  

A reação comum de qualquer governo seria mobilizar o seu aparato militar de segurança e por tratar-se dos Estados Unidos da América, cuja mentalidade nacional é sempre pautada por essa reação, tal providência foi ainda mais exacerbada devido às suas tradições bélicas.

Evidentemente que em poucos minutos a nave viu-se cercada por tanques, fuzileiros navais armados até os dentes e com a Força Aérea a postos para um possível bombardeio ordenado pelo presidente.  

Cabe lembrar que em dez a cada dez filmes do gênero Sci-Fi produzidos pelos norte-americanos na década de cinquenta, época de seu esplendor, foram na verdade, metaforicamente alusões ao perigo da 'invasão de alguma nação hostil" a lhes impor um método de estrutura socioeconômica antagônica ao capitalismo que os norteia.

E claro, pelo fato da nave ter permanecido pousada sem nenhuma movimentação, gerou ainda mais expectativa e especulações, com a imprensa a cobrir ao vivo por rádio e TV.  Eis que subitamente abre-se um compartimento e um Ser alienígena sai a caminhar tranquilamente de seu interior. 

Trata-se de um humanoide, sem dúvida, por suas formas semelhantes à nossa, humanos terráqueos. Tal alienígena provoca uma angustiante expectativa sobre o que fará a seguir e os militares ali presentes estão com os dedos nos gatilhos, sempre a esperar a reação hostil (primeiro ponto para pensar: quem de fato é hostil, por natureza?). 

Tal Ser intergalático ostenta um objeto estranho em mãos e um soldado afoito dá-lhe um tiro de fuzil, traído pelo reflexo e ato falho. Mais tarde, o próprio Ser revelaria que o objeto seria um presente tecnológico a ser ofertado ao presidente norte-americano.

Então, um imenso robô sai da nave, naturalmente para defender o Ser alienígena e ataca os humanos hostis que feriram o seu protegido, ao desintegrar veículos e armas com um raio fulminante. Entretanto, ainda com forças para dar-lhe um comando, o alienígena ordena que ele cesse a reação. O alienígena é levado a um hospital e mesmo que possua uma aparência humana, contém uma fisiologia interna diferenciada da nossa, humana e que surpreende os médicos.

Claro, os militares, e as agências de inteligência como a CIA e o FBI assumem o comando e querem respostas. O alienígena chama-se: Klaatu (Michael Rennie) e mesmo ferido e atônito com a truculência dos terráqueos, insiste para falar com os principais governantes do planeta em meio a uma grande reunião, e assim, recusa-se a falar somente com os governantes norte-americanos (segundo ponto, Wise alfineta a arrogância de se considerar que o comando do planeta é uma atribuição de uma única nação). Contudo, ao sentir que a ignorância terráquea não dar-lhe-á chance para se fazer entender, Klaatu escapa do hospital e infiltra-se pela cidade, disposto a tentar um outro tipo de abordagem para fornecer o seu recado à humanidade.

Nesse ponto, ele assume uma identidade secreta a se apresentar como: "Mr. Carpenter" ao se vestir e tentar se portar como um humano comum e assim burlar a perseguição das autoridades humanas que estão em seu encalço e hospeda-se em um pensionato localizado em algum bairro da capital norte-americana, entre pessoas comuns.  

Nesse ambiente prosaico de uma pensão familiar, Klaatu/Mr. Carpenter conhece a viúva, Helen Benson (Patricia Neal) e seu filho, Bob, (Billy Grey). 

Excitado pela visita do "homem do espaço", ou seja, o assunto do momento, Bob é um garoto típico daquela década, a se mostra  como um fã de astronomia, viagens espaciais e literatura Sci-Fi. Ao perceber que mesmo ao tratar-se de uma criança, este poderia ajudar-lhe, Klaatu/Carpenter estabelece amizade instantânea com ele e descobre que o garoto sabe onde mora o cientista mais proeminente da cidade. Claro, esta é uma licença poética gigantesca, mas mesmo assim, isso não abala a condução do roteiro.

Então, em uma tarde o garoto o leva à casa do suposto cientista, mas este estudioso proeminente não se encontra naquele instante em sua residência. 

No entanto, Klaatu/Mr. Carpenter insiste em vê-lo e mesmo ao ser convidado a se retirar pela empregada doméstica do cientista, eis que Klaatu forja a entrada no gabinete do "scholar" e vê uma equação matemática escrita na lousa/quadro negro de trabalho dele.

Ao analisar o raciocínio expresso nessa equação, Klaatu percebe que o professor não tem a resolução do problema, pois para chegar em tal conclusão, o professor precisaria ter acesso a um estudo avançado de física que seria inexistente no planeta Terra, absorto em um nível primitivo de entendimento da matéria ante a civilização mais avançada pela qual Klaatu pertence. 

O professor representaria o patamar máximo do entendimento dos humanos nessa questão naquele instante, entretenato, na contraposição, a se revelar algo muito elementar para os padrões da ciência conhecida no planeta de onde Klaatu veio. 

Pois então, ele toma a liberdade e completa a equação incompleta na lousa do gabinete do professor, para deixar posteriormente um bilhete, e assim estimular que o professor o contate para estabelecer maiores explicações que certamente farão o físico ficar estupefato.

Logicamente, o cientista, Jacob Barnhardt (interpretado pelo já veterano ator na ocasião, Sam Jaffe) fica boquiaberto com a resolução da equação e ao conhecer Klaatu, mesmo chocado com o fato dele ser um extraterrestre e detentor de uma cultura muitíssimo mais avançada (terceiro ponto, admite-se o fato implicitamente, mas sem cogitar que essa existência seja necessariamente hostil à humanidade e ao planeta Terra), ele percebe que tem muito a perguntar em nome da ciência e Klaatu compreende essa curiosidade científica, mesmo por que também é um cientista em sua civilização. 

Todavia, o tempo urge e o foco do alienígena é urgente para passar uma mensagem à humanidade. Ao perceber que o objetivo do alienígena é sério e muito nobre, o professor, Barnhardt, aceita de pronto colaborar e se os respectivos governos dos países não entenderem, então ele mesmo se prontifica a tomar tal providência e tratará de contactar o máximo de cientistas importantes que conhece, oriundos de diversas nacionalidades, para um encontro emergencial com Klaatu, e cujo objetivo será dar espaço para que o alienígena formule a sua mensagem e assim, que tal advertência fosse transmitida aos homens mais sábios do planeta, pelo menos (quarto ponto, mais uma alfinetada nos governantes e a sua costumeira surdez em relação aos "think tanks" não ideológicos, mas a serviço do progresso da humanidade).

Todavia, nesse ínterim Klaatu está a ser perseguido pelas autoridades que desejam capturá-lo a todo custo e nesse momento crucial, a mãe do garoto Bob e o namorado dela, Tom Stephens (Hugh Marlowe), desconfiaram da enigmática persona do Mr. Carpenter e pretendem entregá-lo às autoridades.  

Acuado e sem tempo, pois o teor da mensagem a ser dada para a humanidade é urgente, Klaatu lança um ultimato e durante alguns minutos, mediante os seus aparatos tecnológicos, ele força a interrupção da energia no planeta completamente, ao demonstrar força (quinto ponto, o ser humano só respeita a força bruta, em essência).

Perseguido, ele é novamente ferido e dessa vez, o robô (Gort) leva-o para a nave onde o submete a um tratamento mediante a tecnologia de medicina avançada de sua civilização, que o ressuscita. A mãe do menino, Helen presencia tudo, finalmente entende os propósitos de Klaatu e mesmo atônita com a presença do imenso robô e a tecnologia exótica da nave, passa a colaborar, também.

É muito significativa a cena na qual o alienígena, Klaatu ensina três palavras codificadas à Helen, que dão um comando ao robô para que esta criatura cibernética cesse as hostilidades e colabore. Em um momento de pânico com a sua presença ameaçadora, Helen lembra-se das palavras do idioma alienígena e as pronuncia ao robô: "Klaatu Barada Nikto", e assim, o robô imediatamente passa a obedecê-la.  

Cena final: Klaatu reaparece ressuscitado e fala sob improviso aos cientistas internacionais que o professor Barnhardt conseguiu reunir em uma reunião muito improvisada, ao ar livre. Boquiabertos, os cientistas ouvem o alienígena falar de forma veemente, sem meias palavras: 

-"Temos observado à distância o lento desenvolvimento do planeta Terra. Enquanto digladiam-se entre si com guerras, matança e nada fazem para coibir a miséria, doenças e outras mazelas, nada fazemos para interferir no seu livre arbítrio. Mas agora que começam a desenvolver armas nucleares e preparam-se para fazer viagens espaciais, não vamos tolerar que espalhem essa matança por outros planetas. Portanto, estejam avisados, se persistirem com essa mentalidade, nós os aniquilaremos, em prol do equilíbrio na galáxia".

Dado o recado, Klaatu ingressa na nave, acompanhado de Gort e decola de volta ao seu planeta.

É simplesmente de arrepiar a verdade moral no discurso do alienígena e essa verdade supra ideológica é o sexto ponto crucial no filme de Wise.  

"The Day the Earth Stood Still" teve enorme sucesso e foi um pioneiro no universo dos filmes de ficção científica a envolver contatos com seres extraterrestres, exatamente ao mostrá-los não como invasores hostis como geralmente a maioria dos filmes os mostra, principalmente nas produções norte-americanas, sempre preocupadas em usar a metáfora para aludir ao perigo de invasões e destruição da sua forma de pensar a civilização. 

A mensagem de paz e mesmo que passada com aspereza contundente, foi uma inovação nesse tipo de abordagem em meio ao universo dos filmes e literatura Sci-Fi.

O termo: "Klaatu Barada Nikto" e a saudação manual feita por Klaatu, tornou-se febre nos Estados Unidos e espalhou-se pelo mundo. Essa saudação foi inclusive usada como inspiração para se criar a clássica saudação do fictício povo vulcano, representado pelo personagem, "Sr. Spock" (Leonard Nimoy), o oficial de ciências da nave Enterprise, na série clássica dos anos 1960, Star Trek (Jornada nas Estrelas).
O filme influenciou até o ex-presidente Ronald Reagan, que o citou em uma reunião com o líder soviético, Mikhail Gorbachev, em 1985, quando disse-lhe que se o Klaatu aparecesse e puxasse-lhes as orelhas, seria muito mais fácil para se resolver as diferenças entre as nações...
O filme é extremamente bonito, com ótima direção, efeitos especiais e fotografia a se considerar a sua época, logicamente. Contém muito bom elenco, trilha sonora espetacular (que influenciaria decisivamente o produtor de TV, Irwin Allen, quando este criou o seriado: "Lost in Space", em 1965). E o ator protagonista do filme, Michael Rennie fez uma participação espetacular nessa mesma série, no episódio duplo: "The Keeper", da primeira temporada de 1965/1966.

Em 1974, o ex-baterista dos Beatles, Ringo Starr, outro fanático pelo filme, lançou o LP "Goodnight Vienna" e usou a roupa do personagem Klaatu, a nave cenográfica e o robô Gort para a fotografia da capa desse seu álbum. Eu posso imaginar o quanto ele se divertiu para produzir essa fotografia, ao brincar de "ser o Klaatu", um personagem icônico para qualquer criança ou adolescente no início dos anos cinquenta.

Bem mais próximo de minha pessoal realidade trivial, conheço a banda Klatu, que desenvolve um bom trabalho autoral em torno do Rock psicodélico, progressivo e experimental e cujo nome é explícita e declarada influência do filme.  

Recentemente, foi filmado um remake desse filme. Claro, tem uma tecnologia incrível de efeitos e nesse quesito nem pode ser comparado ao clássico de 1951, mas sinceramente, para o meu gosto pessoal, essa movimentação toda em torno da versão moderna, não me comoveu e eu certamente prefiro a versão original, de 1951.

O meu caso pessoal com o filme é bem típico da forma de impacto que um menino de dez anos de idade tem pelo gênero Sci-Fi, normalmente. Demorei para vê-lo pela primeira vez, mas valeu a pena, pois o assisti no primeiro semestre de 1971, quando eu tinha onze anos de idade, incompletos. A despeito da enorme defasagem a demarcar vinte anos do seu lançamento, fiquei muito impactado pelo filme e a mensagem final da história, ficou a reverberar na minha imaginação, por semanas. E certamente a perpetuar-se.
Trata-se, sem dúvida de um dos meus filmes prediletos do gênero Sci-Fi e o recomendo, sem pestanejar.
Resenha publicada em uma comunidade "Robert Wise", da extinta Rede Social Orkut, como tópico aberto por eu mesmo, Luiz Domingues, em 2010.

2 comentários:

  1. Um dos meus filmes preferidos de Ficção científica,o remake não ficou tão bom quanto o original... brilhante texto Luiz abraços.

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  2. Concordo contigo ! A versão clássica é muito melhor. Essa moderna é barulhenta como é o cinema atual, mas vazia em conteúdo e sem o mínimo impacto.

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