Artista genuíno de coração e alma, Paulo Valério, conhecido artisticamente como “Pevê”, lançou o seu segundo álbum. Versado pela influência nítida em torno das estéticas musicais oriundas das décadas de sessenta e setenta, Pevê é um artista que transita entre o Rock, Blues, Folk Music e a MPB, com grande desenvoltura.
Em seu primeiro disco, homônimo, ele já mostrara o seu valor ao apresentar um conjunto de boas canções e a realçar a poesia, este item a ser considerado como um valor obscurecido na música brasileira em geral nos últimos anos, todavia, o artista se coloca absolutamente coerente com as suas fontes inspiradoras já citadas e também pelo fato dele manter um forte apreço ao aspecto silvestre da vida no campo em meio à natureza e por dedução lógica, a enxergar a natureza com o olhar poético.
Nesse aspecto, através deste segundo trabalho que ele lançou, “Pevê II”, tal condição bucólica foi ainda mais realçada por conta do artista ter avançado mais ainda pelo lado Folk, a privilegiar as sonoridades amenas, sob teor acústico.
Antes de avançar sobre a resenha, fica o adendo ao leitor que para conhecer a minha impressão sobre o primeiro trabalho do Pevê, basta acessar o link abaixo:
http://luiz-domingues.blogspot.com/2018/12/cd-peve-paulo-peve-valerio-por-luiz.html
Sobre a musicalidade do álbum Pevê II, os sons dos violões se misturam à estridência típica da craviola, que remete ao cravo e a harpa em sua essência. O canto dos pássaros e a brisa que balança os galhos das arvores, garantem a paz bucólica o suficiente para que o ouvinte possa se manter com um estado de espírito propício para absorver a poesia e convenhamos, ante a vida moderna e urbana, fica cada vez mais difícil reunir condições adequadas para que tal experiência gere o impacto almejado.
Portanto, ponto positivo para a obra que tem esse poder de demarcar um cenário perfeito para o ouvinte, mesmo que ele esteja a ouvir o disco em um quarto de apartamento com vista para uma barulhenta avenida de uma cidade grande.
Para se vivenciar tal experiência campestre, basta acender um incenso, colocar o CD para tocar e fechar os olhos, que a música vai levar o ouvinte para essa realidade bucólica, certamente.
Sobre o áudio, eu gostei muito dos timbres e das muitas sutilezas propostas pelos arranjos e também valorizadas pela engenharia de som, que realçou tais detalhes no processo de mixagem do álbum.
Sobre a arte gráfica da capa, Pevê sabiamente usou a planificação exibida no seu primeiro disco, sob a arte de Luiz “Pinky” Maia, enquanto embalagem, haja vista a felicidade com a qual ele apresentou o seu álbum de estreia.
Nesse aspecto, o encarte em dobradura, mais uma vez traz um pôster do artista no seu verso, com a parte interna a apresentar as letras, uma boa ficha técnica e comentários do próprio artista sobre cada canção. Há também a inclusão de uma singela aquarela pintada pelo próprio Pevê, e que foi acrescida como ilustração no espelho da embalagem a abrigar o disco, a se tratar da representação de um pássaro, no caso o “Surucuá-da-barriga-amarela".
Chama a atenção na contracapa, a presença de um bonito release assinado por Egisto Dal Santo, músico e produtor de alto calibre na história do Rock gaúcho, que também é um escritor e pesquisador dos mais relevantes (vide: “Notas de Viagens – Aventuras e Desventuras no Rock Gaúcho”).
Na capa, desta feita o Pevê privilegiou o uso do tom verde, ou melhor ainda, o verde natural de uma paisagem campestre, com o artista em pessoa a desfrutar do cenário, na posse da sua craviola em mãos e o bandolim na relva, a mirar o horizonte e a ter mais afastado de si, duas vacas a se demarcar a ideia do campo bucólico.
Mais uma vez, Pevê tocou todos os instrumentos com apoio de alguns poucos convidados apenas, além do suporte artístico do pessoal da produção de áudio, lay-out gráfico e fotos.
Sobre as canções, eis as minhas impressões:
“Dentro das Manhãs, é isso mesmo, o despertar no campo, com o autor a reverenciar a oportunidade de travar contato com a natureza. Nesta música, há muita influência do Folk-Rock norte-americano do super grupo, "Crosby/Stills/Nash and Young" e do Rock rural setentista brasileiro de "Sá/Rodrix & Guarabyra", como o próprio artista comentou no encarte do seu disco e que vai de encontro ao que eu senti, igualmente, portanto, comungamos da mesma impressão, sem dúvida.
Gostei muito do Steel Guitar, ao me fazer lembrar do saudoso, Jerry Garcia em seus momentos mais “country”. Achei muito agradável o acréscimo de apitos a se induzir o canto de pássaros, mas com a devida parcimônia ao melhor estilo: “menos é mais”.
“Uma Canção” traz uma intenção rítmica em 6/8, bastante vibrante a se mostrar como um convite ao violão bem batido, a trazer uma sonoridade ibérica implícita e que também remete ao Folk-Rock nordestino do grande Zé Ramalho, como o Pevê realçou no seu comentário e conceito do qual estou de acordo.
Aqui há um pouco de peso, com o acréscimo do baixo e uma sutil utilização de teclados ao fundo. A percussão é bem colocada e as palmas de mãos ajudam a dar ritmo. A letra é curta, mas se mostrou bastante contundente. Destaco o verso:
“Uma canção é desatar os nós do coração”
A terceira faixa é “Iguaçu”, que tem uma linha de baixo que remete levemente ao trabalho dos "Secos & Molhados", em meio ao canto de pássaros, belos timbres de cordas acústicas, a sobressair a craviola e também o violão de doze cordas. Gostei muito também da linha melódica com uma certa intenção psicodélica sessentista.
“Lembranças”, a quarta faixa é um tema instrumental. Trata-se de um bom trabalho a se destacar o fraseado executado ao bandolim. É interessante a inclusão de um áudio ao final, com vozes.
“Momentos de Solidão” vem a seguir. Canção emotiva e delicada, é bluesy, levemente e se mostra nítida a influência de artistas do campo Folk-Rock, e neste caso, Neil Young vem à minha mente, assertivamente. Adorei os detalhes do arranjo, como pequenas frases ao violão, o bandolim tocado de forma contínua ao estilo italiano, percussão, baixo e backing vocals bem suaves.
Gostei da letra, a trazer uma reflexão sobre a existência da vida e o seu significado, enfim. Realço esse verso:
“Sendo como um rio que encontra o mar/Rumo à imensidão do oceano/Vida é se perder, se encontrar/O melhor lugar é dentro de você/ De você!”
“Estou Aqui”, é bem emotiva, igualmente. Gostei da harmonia e dos sutis contra-solos que garantiram um colorido muito especial à música.
“Queria Mais” é um samba a esbarrar na Bossa Nova, mas com um viés setentista irresistível, a lembrar o trabalho de artistas mais alternativos como Luiz Melodia, João Bosco e Jards Macalé. Tem um ritmo muito bom, e o acréscimo do surdão de samba, colocado bem no fundo e a ser executado apenas em alguns trechos e não o tempo todo, ficou sensacional, pois tirou a impressão do lugar-comum. E também a parcimônia do tamborim, mas neste caso proporcionado pela mixagem que o colocou em um espaço discreto, é um adendo e tanto ao arranjo. Em suma, ficou um samba estiloso a la "Trio Mocotó".
“Atlântico” é mais um tema instrumental muito interessante pelo seu arranjo, ao propor várias vozes vindas dos instrumentos acústicos. O ruído do mar foi capturado naturalmente segundo consta na ficha técnica do disco, ou seja, não se trata de um efeito de “plugin”.
“Despertar” é um som em que a craviola predomina e este instrumento é uma marca registrada nos trabalhos do artista. A sua sonoridade sui generis, a se mostrar aguda, gera um timbre belo.
Pevê canta como um trovador e dá o seu recado poético. Ele fala basicamente da força interior do Ser Humano nesta canção. Eis um trecho significativo:
“É preciso ter o caos dentro de si/Pra estrela dançarina nascer/Ninguém, pode construir em teu lugar”
“Minha Música” fecha o disco. Outro tema delicado em sua constituição harmônica e melódica, sobressai a qualidade do arranjo de cordas mais uma vez, mediante belas costuras feitas em fraseados bem inspirados.
Nesta canção, Pevê descreve a importância da música não apenas para ele, mas a abranger a amplitude máxima do mundo que precisa dessa ferramenta fundamental para seguir em frente.
“Falo através da minha música/Que me dá sentido/Que organiza o grito/Que há em mim”.
Para finalizar a análise, digo que o álbum traz a paz silvestre, reflexão meditativa, a beleza dos sons bem tocados e das boas melodias que realçam a poesia. Portanto, vale conferir!
Ouça na íntegra o CD Pevê II:
Eis o Link para escutar no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=b0HP21RwA78
CD Pevê II – Paulo “Pevê Valério
Gravado em dezembro de 2019 no estúdio Móvel de Palhoça/SC (faixas 1, 3, 4, 6 e 7) - Técnico de som: Nycollas Medeiros
Gravado entre abril e maio de 2020 no estúdio Green Box de Santo Amaro da Imperatriz/SC (faixas 2,5, 8, 9 e 10). Técnico de som: Marcelo Stock
A faixa 10 (“Minha Música”) foi gravada durante a sessão do primeiro disco.
Captação do som do mar de Florianópolis: Leandro Barbosa
Mixagem e masterização: Studio de Poche de Paris, França, entre janeiro e junho de 2020. Técnico de mixagem e masterização: Nycollas Medeiros
Capa, encarte, projeto gráfico e lay-out: Luiz “Pinky” Maia
Release: Egisto Dal Santo
Fotos: Claudia Laurent
Textos: Paulo “Pevê” Valério
Produção: Paulo “Pevê” Valério e Nycollas Medeiros
Direção geral: Paulo “Pevê” Valério
Paulo “Pevê” Valério: Voz, violões, craviola, bandolim, violão ressonador, Fender Steel Guitar, guitarra, baixo, teclados, percussões e apitos
Músicos convidados:
David Machado: Tamborim em “Quero Mais”
Nycollas Medeiros: Violão nylon em “Atlântico”
E com direito a uma bela dedicatória do artista ao resenhista aqui que vos escreve!
Para conhecer melhor o trabalho do artista, acesse:
https://www.facebook.com/PeveGuitarra
Canal do YouTube:
https://www.youtube.com/channel/UC07b44iKkufasjth_YXrNcg
Site:
Contato direto com o artista: