sexta-feira, 30 de agosto de 2024

Filme: The Stoned Age (Dois Loucos na Noite) - Por Luiz Domingues

Existe uma boa quantidade de comédias a envolver o Rock, diretamente, entre as quais, algumas são excelentes e já foram objeto de minha análise. Há uma segunda categoria, a usar o Rock como mote, mas sob outros aspectos, mais indiretos, digamos e também se arrola algumas que são boas. Igualmente existe uma quantidade de filmes, a caracterizar uma terceira via, em tom de comédia a usar o Rock apenas como um pano de fundo e a despeito desse tipo de peça poder ser considerada menor no universo dos Rock Movies, algumas merecem uma menção, nem que seja pelo fato da boa trilha sonora utilizada como apoio ou por conter algumas menções interessantes, e é justamente o caso deste filme, “The Stoned Age”, que em português recebeu o nome: “Dois Loucos na Noite”. 
 
Aliás, tal título em português, apesar de haver colocado-se totalmente fora do contexto da intenção original da produção norte-americana, por incrível que pareça foi muito mais condizente com o seu teor, e ao longo da resenha o leitor vai entender bem qual foi a razão que eu fiz uso para defender tal tese, visto que a tradução livre a designar algo como: “A Era dos Drogados”, soaria pesado em demasia perante a nossa compreensão cultural luso-brasileira. 

Neste caso, os pontos que precisam ser salientados como positivos, na realidade são poucos. Em linha geral, trata-se de uma comédia popularesca, com forte conotação sexista e mostra-se reducionista, se levar-se em consideração que o machismo apresentado, apesar de supostamente retratar a mentalidade de uma época mais remota e a justificar-se como uma marca de um outro estrato cultural e ultrapassado em tese, é abominável, na prática. 
 
E reduz igualmente o conceito sobre o que representa realmente ser um Rocker, visto que a exemplificação aqui é superficial, no sentido em mostrar um bando de garotos incautos e imaturos que não são Rockers verdadeiramente, mas que seguramente apenas seguiram um modismo de ocasião, ao adotar o Rock como uma predileção musical por osmose e por conseguinte, usar longas cabeleiras e figurino condizente com o padrão setentista, mas sem nenhum ideal a justificar tal identidade, verdadeiramente.
Ora, se a comédia é fraca e os clichês abundam-na, por quê eu perdi o meu tempo em escrever uma resenha para esta peça cinematográfica que mostra-se seguramente subalterna dentro do universo dos Rock Movies?Justamente por que existe algo interessante a ser ressaltado, mesmo que tal fatores positivos estejam representados por apenas alguns detalhes ínfimos. 
 
Antes de comentar sobre a história retratada neste filme, eu preciso mencionar que a produção é bastante falha. Ao tratar-se de uma produção norte-americana e mesmo que tenha sido sob um padrão mediante baixo orçamento, é bastante precária a direção de arte (a fotografia também é muito ruim), algo surpreendente, aliás, pois o cinema norte-americano nunca deixa de caprichar, mesmo que a verba seja curta, nesse específico detalhe. Costuma ser impecável a retratação em um filme de época, um ponto de honra para o cinema estadunidense, no entanto, se a proposta deste filme foi ambientá-lo nos anos setenta, acredito que deixou muito a desejar, pois um espectador desavisado vai assistir e acreditar piamente tratar-se de um filme dos anos noventa, aliás, a data real quando ele foi realizado. 
Nesses termos, abundam pequenos detalhes, inclusive tecnológicos a denunciar objetos e outras questões ali mostradas que simplesmente nem existiam nos anos setenta. A começar pelo figurino, onde vê-se jovens, inclusive um dos protagonistas, a usar uma indumentária bem típica dos seguidores da moda “Grunge”, tipicamente noventista e talvez os responsáveis pelo figurino aprovaram tal indumentária, ao imaginar que lembrava a vestimenta usual de um Rocker setentista, no entanto, isso é algo tão gritantemente anacrônico, que decididamente depõe contra a obra. 
 
É o tal negócio: o ator encena “Cyrano de Bergerac” no teatro, no período noturno e resolve aproveitar a mesma peruca para gravar as cenas de um filme ambientado entre os anos sessenta e setenta do século vinte, a interpretar um hippie, no dia seguinte pela manhã, ao imaginar que basta aparentar usar um cabelo longo para caracterizar bem tais épocas culturais tão distintas entre si, mas simplesmente não é assim que funciona. Por isso o departamento de arte, figurinos e cenários, tem que estabelecer um trabalho de pesquisa a mostrar-se minuciosamente estudado para fazer-se um filme de época, pois não é pela observação superficial que consegue-se o resultado ideal. E falhas assim, extraem a credibilidade do texto, mesmo que ele seja bom, pois fica a impressão amadorística a obscurecer o bojo da obra. Imagine então tal demérito em uma comédia rasa, sem substância no texto.
Bem, se esta comédia é fraca, contém falhas estruturais no tocante à sua produção e traz uma tonelada de clichês, alguns desagradáveis, inclusive, o que realmente salva-se nesta obra a justificar esta resenha? São dois pontos, e o primeiro deles é sobre a questão da trilha sonora. Ao ambientar a ação nos anos setenta, ao menos houve a preocupação em escolher canções de artistas dessa ocasião. Mesmo assim, ainda a ressaltar as falhas, há lapsos, pois houve por exemplo o caso de uma canção que somente fora lançada no início dos anos oitenta, mesmo que fosse pertencente a uma banda setentista (Blue Öyster Cult). 
 
Não sei nem o que dizer, pois o baixo orçamento disponibilizado não pode justificar a falta de uma pesquisa básica. Tirante esse erro lastimável, a trilha sonora é muito boa ao contar com músicas de artistas do calibre de: Deep Purple, Montrose, T.Rex, Black Sabbath, Foghat, Ted Nugent, Focus e outros, além de artistas da seara da Soul Music/Funk & Disco Music, casos do KC and The Sunshine Band, The Trammps e  B.T. Express entre outras.
E o segundo ponto positivo na película, é algo inusitado eu diria, pois parece muito pouco para justificar ser destacado, todavia, é uma menção curiosa. Trata-se da participação da atriz, China Kantner, como uma das protagonistas. O que tem demais essa moça, além de ser muito bonita (e à época dessa produção, bem nova), e por contar com o seu exótico nome, “China”, que é o seu nome de batismo de fato e não um apelido? Pois tal notoriedade não reside tampouco no fato dela ser uma norte-americana caucasiana e não oriental (e nem mesmo descendente de chineses), mas simplesmente por ser filha dos famosos, Paul Kantner & Grace Slick, respectivamente guitarrista e vocalista do grupo de Rock, Jefferson Airplane (e posteriormente da banda dissidente, Jefferson Starship), um dos mais famosos da cena psicodélica de San Francisco, nos anos sessenta. 
 
Se há algo verdadeiramente Rocker nesse filme, certamente que é a presença de China Kantner, embora o papel que ela tenha interpretado não tenha sido o de uma Rock Star ou coisa que o valha, mas ao contrário, a designá-la como a uma moça comum, e Rocker por conveniência, tal qual todas as outras personagens dessa trama.
Sobre a história, creio que não valha a pena narrar-se com um maior detalhamento, como eu costumo proceder em uma resenha de filme, pois realmente a sua trama é muito fraca, mas sobretudo, por considerar que descrever esse roteiro não acrescenta nada. Traçarei um resumo breve e destacarei algumas piadas um pouco mais sutis, algo raro em um filme que optou pelo humor mais rústico.
Muito bem, dois jovens adolescentes, Joe Connoly (interpretado por Michael Kopelow) e Michael Hubs (interpretado por Bradford Tatum), são hedonistas despreocupados com outras ocupações a não ser a busca incessante por noitadas regadas a bebedeiras e consumo de drogas, diversão barata mediante interesses em comum com outros garotos de sua idade, e sobretudo, a procurar pela companhia feminina em busca do sexo livre. Eles andam com um carro todo decorado mediante o uso de decalques auto adesivos a exibir logotipo de bandas de Rock setentistas e dirigem a ouvir cartuchos a conter os discos de seus grupos prediletos. Eis que eles são informados que haverá uma festa em algum lugar da cidade (Torrance, Califórnia) e que duas garotas muito bonitas, participarão. 
Nesse ínterim, a informação é vazada e outros rapazes também interessam-se em participar. A ideia inicial é invadir uma residência desocupada, algo bem trivial na cultura jovem norte-americana e neste caso, para reforçar a piada, a casa em questão pertence ao ator e cantor, Frankie Avalon, que fora muito famoso nos anos sessenta, na vida real, ao protagonizar inúmeros filmes juvenis ambientados na praia, ao ponto em ter sido adjetivado como um membro da “turma da praia”, na ocasião. Bem, confusões ocorrem entre os adolescentes, com brigas concretizadas pelas vias de fato e a polícia a acionada, com mais confusão a ser gerada.
Eis que as garotas em questão entram em cena. Lanie (interpretada por Renee Griffin) e Jill (interpretada por China Kantner), são duas meninas dotadas de uma beleza estonteante e as rapazes ficam desnorteados. O sexismo e o machismo inseridos no mote desse filme, reverbera em torno das expectativas geradas portanto entre os dois casais, visto que na mentalidade juvenil dos meninos, as garotas são meros objetos sexuais. Eles as consideram como: “chicks”, uma gíria tipicamente norte-americana que tem uma conotação mais pesada do que pensamos, pois denota exatamente a expectativa masculina padrão em torno da mulher objeto. 
 
A contrapartida é que as meninas também nutrem uma mentalidade semelhante, mas não em termos de submissão ou resignação em assumir um papel de inferioridade nas relações humanas, mas por usar tal predisposição machista como um ardil para obter o que desejam. A trocar em miúdos, é a atitude daquele tipo de garota que usa a sedução para manipular os rapazes e obter o que deseja deles, nem que seja o simples prazer em torturá-los psicologicamente, ao excitá-los com o uso da sensualidade insinuada e não a satisfazê-los a posteriori. Bem, não deixa de ser um tipo de machismo, igualmente.
Uma confusão ocorre e os rapazes caem em uma armadilha com outros oponentes a expulsá-los e prender as meninas, mas eis que eles conseguem fugir e resgatar as meninas, a pular muros pela vizinhança e até a usar a piscina alheia em algum momento. 
Uma vez na residência de Jill, eles ficam bem alterados e uma alucinação de Joe remete a uma visão do show do grupo, “Blue Öyster Cult e também visões com o “Eye Ball”, um ícone psicodélico em termos gráficos. 
 
Eis que Hubs & Lanie sobem ao quarto e Joe & Jill ficam embaixo a conversar. Joe, apesar de esforçar-se em ser desinibido, na verdade é tímido e demora muito para tomar uma atitude em relação à Jill e quando Joe desce, este diz que encerrara o sexo com Lanie e que esta aguardava por Joe no quarto, para praticar sexo com ele, igualmente. Ele vai ao quarto, mas quando chega ao recinto, a vê adormecida. Quando desce e bem desapontado por conta disso, flagra o amigo Hubs com Jill no sofá a beijar-se, ou seja, o amigo lograra um êxito duplo com as meninas e ele, Joe, não ficara com ninguém. 
Eis que o pai de Jill chega repentinamente em casa e sozinho, dá cabo dos adolescentes, inclusive dos demais que rondavam a residência, talvez na cena mais engraçada do filme, pelo inusitado em ver um homem de meia idade e sozinho, a abater muitos garotos fortes com menos da metade da sua idade e sem ser portador de nenhum super poder ou a carregar armas letais, no entanto imbuído apenas do seu poder braçal e humano, mesmo. 
Joe e Hubs conseguem fugir, a polícia enquadra os demais adolescentes bagunceiros e o filme encerra-se com a dupla a ouvir o som do Blue Öyster Cult no cartucho do carro, ao dar a entender que a rotina será mantida por mais um bom tempo por ambos, a cada nova noite em busca da diversão em meio aos anos setenta. E para o consolo de Joe, Jill deixara-lhe um bilhete, para que ele a procurasse em outro endereço, mais tarde. Destaca-se uma cena extra, onde os rapazes protagonistas aparecem com camisetas dessa banda e ao descobrir que são pirateadas e não oficiais, as recusam das mãos de Eric Bloom e Donald “Buck Dharma” Roeser, dois membros verdadeiros de tal banda citada, que aparecem como cambistas de seu próprio show. E o ator, Frankie Avalon, em pessoa, aparece para uma cena rápida a interpretar a si mesmo, como o dono da residência invadida.
Nos registros sobre a história desse filme, consta que a intenção inicial de seus realizadores, fora utilizar muitas músicas do Led Zeppelin como parâmetro para sedimentar a narrativa. No entanto, como é bem sabido, obter a permissão a usar os direitos autorais dos fonogramas e edição de uma banda desse porte, é muito difícil, para não dizer impossível, mesmo caso dos Beatles e dos Rolling Stones, portanto, optou-se por uma outra safra de artistas a compor a trilha e nesse quesito, como já informei, muitos sons ótimos são escutados.
Uma pena por outro lado, visto que pelo que eu entendi, a intenção da produção seria modificar significativamente o roteiro, ao utilizar as músicas do Led Zeppelin como um parâmetro ao estilo de um libreto de ópera, portanto, nesse caso o filme ganharia um outro verniz mais sofisticado, eu acredito.
 
A acrescentar outros atores que participaram, cito: Clifton Collins Jr. (como Taks), Kevin Kilner (como o policial Dean), o comediante Taylor Negron (como Clerk), David Groh (como o pai lutador de Jill), Michael Wiseman (como o irmão de Crump), Art Chudabala (como Mike Dick), Daniel Collins (como Crump), e outros.
Escrito por James Melkonian e Rich Wilks, foi dirigido por James Melkonian. Lançado em 1994, é tratado como uma produção barata e consequentemente como uma atração menor, feita para ser exibida no máximo na sessão da tarde, para ser assistida sob soslaio enquanto cochila-se no sofá, após o almoço, mas pelo teor sexual e a envolver cenas com drogas e bebidas, além do linguajar chulo, ao pensar bem, acredito que seja mais adequado em assistir-se em meio a uma eventual sessão coruja, no avançar da madrugada e com a certeza que os pais estejam a dormir, caso o espectador seja um adolescente, tal qual os atores protagonistas deste filme. 
 

Brincadeiras à parte, esse filme realmente transitou em exibições desse teor, sem maior destaque. Ainda assim, foi lançado em formato VHS na época e posteriormente ganhou versão em DVD. Está disponível no YouTube, na versão integral e gratuita, na época em que escrevi a resenha (2019).

Esta resenha foi escrita para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll, em seu volume III, com a leitura disponível a partir da página 254.

quinta-feira, 15 de agosto de 2024

Filme: Loving You (A Mulher que Eu Amo) - Por Luiz Domingues

Segundo filme com o mega astro do Rock, Elvis Presley, “Loving You” (“A Mulher que Eu Amo”), teve o mérito de impulsionar a ideia de Elvis a abraçar o cinema como algo a mais do que um veículo a dar sustentáculo à sua carreira musical tão somente, mas sobretudo para que ele considerasse com carinho a hipótese de manter uma carreira dupla e foi o que ocorreu, no decorrer do tempo.
 
Isso por que em sua primeira aparição, no filme: “Love me Tender”, na prática fora um encaixe a caracterizar mais uma das artimanhas do seu astuto empresário, o “Colonel” Tom Parker. Tanto que o papel de Elvis foi secundário em tal película, haja vista a obviedade de Elvis não ser ator e nem cogitar isso, nessa primeira investida. 
Todavia, tudo mudou à medida que a carreira musical de Elvis revelou-se em plena efervescência, ao possibilitar que viesse a tornar-se daí em diante (e cada vez mais), em paralelo, uma realidade em sua trajetória. E também o fato dele ter sido considerado um galã, portanto a demonstrar uma enorme potencial para extrapolar a fronteira da música, mesmo a levar-se em consideração o fato em cantar muito bem (uma verdade absoluta), mas a tornar-se doravante também um “Movie Star,” com forte poder erótico a atrair a atenção do público feminino (no caso, é dizer: ainda mais...).
 
Portanto, todos esses fatores certamente foram levados em consideração quando resolveu-se investir com tudo na carreira como ator, em paralelo e desta feita, a tornar Elvis o ator protagonista, um fator que doravante foi tornado uma constante. Com a carreira musical a explodir e não sendo possível parar tudo para fazer o curso da “Actors Studio” ou similares, e daí adquirir técnica como ator, propriamente dita, Elvis entrou no turbilhão do cinema como um ator prático, digamos assim e certamente que foi amparado pelos atores profissionais tarimbados, não apenas neste, “Loving You”, como em todos os filmes posteriores pelos quais ele participou e sobretudo pela orientação dos diretores com quem lidou. 
Se em “Love me Tender” houve uma participação tímida do Rei do Rock e naturalmente fora algo compreensível se amparado pelo fato dele não ser ator ainda na ocasião, em “Loving You”, creio que a inibição inicial de sua parte para saber lidar com um set de filmagem fora rompido, e é bem possível (essa é uma dedução de minha parte e não estou a afirmar categoricamente), que ele tenha absorvido a situação, sob o ponto de vista psicológico, ou seja, enfrentou com coragem qualquer resquício de insegurança que pudesse conter em seu íntimo ao assumir tornar-se um ator, enfim. 
 
De fato, não é nada “brilhante” a atuação de Elvis em “Loving You”, mas é nítida a sua pequena evolução nesse quesito, ao ponto de haver assumido o protagonismo de uma forma digna. Nos filmes posteriores, “Jailhouse Rock” e “King Creole” que são muito melhores (em termos musicais, inclusive), ele melhoraria ainda mais, ao provar que na base da insistência e sobretudo pela prática contínua, ele de fato evoluiria ao ponto de ser considerado um ator, ainda que no patamar mediano, nesse aspecto, pois na prática, ele foi  mesmo um grande cantor.
Bem, postas essas colocações iniciais, ao falar detidamente sobre “Loving You”, a história é interessante, pois traça um paralelo com a própria carreira musical de Elvis, ao mostrar a história de um rapaz simples do interior que é descoberto por acaso como um talento musical e ascende. Nesses termos, o seu personagem foi desenvolvido a mostrar o temperamento de um bom rapaz com valores arraigados, e que fora educado a dizer: “sim senhor” e “sim, senhora”, para toda pessoa mais velha, e a mostrar-se sempre solícito a atender-lhes os desejos, mesmo que fossem impertinentes.
 
Naturalmente que tal postura cândida colocara-o como um garoto obediente e que por conseguinte não contesta a tradição e o conservadorismo da sociedade e por dedução, a desenhá-lo isento de uma rebeldia Rocker, propriamente dita. No entanto, há o contraponto da liberdade musical que expressa-se mais incisivamente a partir deste filme e ficou ainda mais proeminente no posterior, “Jailhouse Rock”, mais pela performance em termos de mise-en-scène, é preciso salientar e cabe uma explicação. 
Aconteceu que a base musical deste filme não foi o Rock’n’ Roll in natura, embora haja a sua representação, ainda que em menor escala, mas sobretudo baseado nas tradições da Country-Music e ainda mais fechada na raiz do tradicional "Country & Western', a acionar o seu cancioneiro mais interiorano. Ora, algo muito bom e naturalmente uma das predileções do próprio Elvis em sua formação pessoal, portanto, um elemento mais que confortável, pois revelou-se ótimo, igualmente, para que ele pudesse brilhar musicalmente. 
 
A ação do filme inicia-se a mostrar um modesto show realizado na praça pública de uma pequena cidade interiorana (Delville/Louisiana). Um artista bem tradicional dentro do universo da música Country & Western, apresenta-se em meio a uma espécie de feira local e há o oportunismo de um político em angariar votos para a sua candidatura a governador, algo corriqueiro, aliás, não apenas no âmbito norte-americano, é bom frisar (o candidato a governador é um sujeito chamado: Jim Tallman, interpretado por Ralph Dumke). 
Tal artista em questão é Walter “Tex” Warner (interpretado por Wendell Corey). Logo de início, é uma maravilha verificar que a banda de Tex, contém a banda verdadeira de Elvis como a formar o seu núcleo duro, nas figuras de Scotty Moore (guitarra e voz); Bill Black (contrabaixo acústico e voz) e DJ Fontana (bateria e voz), acrescidos de outros músicos, no caso, os membros do “The Jordanaires”. Com esse super time de músicos, a base musical bem feita garantiu-se. 
A agente de Tex é uma bela mulher charmosa, chamada: Glenda Markle (interpretada por Lizabeth Scott), que arguta, ouve uma conversa a esmo a dar conta que um rapaz que trabalha como entregador de bebidas, é reconhecido na cidade por cantar bem. O rapaz citado chega então para entregar a remessa de bebidas a abastecer a feira, e trata-se de: Deke Rivers, interpretado por Elvis Presley. 
Glenda o aborda e o convida a subir ao palco para cantar uma canção. Deke mostra-se tímido a princípio, mas enfim sobe ao palco, apanha um violão emprestado, combina uma música com a banda e faz a sua performance, onde a timidez é deixada de lado inteiramente, pois ele canta e movimenta-se no palco mediante grande desenvoltura. Mais que isso, Glenda percebe que a performance de Deke faz as meninas da plateia entrar em frenesi e por ser publicitária, evidentemente que Glenda logo projeta que esse rapaz apresenta um carisma fora do comum e o aborda em seguir, mediante uma proposta de trabalho.
 
A ideia é simples, Glenda deseja que Deke junte-se a Tex e divida o show em turnê por várias cidades pequenas em estados do sul dos Estados Unidos, bem dentro do espírito do público rural que aprecia a Country Music, normalmente. O rapaz reluta um pouco, pois nem cogitava cantar profissionalmente, mas pondera que é uma oportunidade e assim embarca na excursão. Nesse momento é mostrada uma sucessão de cenas rápidas a mostrar o comboio de carros da trupe pela estrada e as várias placas das estradas a indicar cidades onde cumprem os shows, tais como: Haroldsville, Baker, Jordan etc. Deke é tímido e conservador normalmente, mas solta-se quando dirige, pois gosta de acompanhar o comboio com o seu próprio carro e a pisar forte no acelerador. Ele também aprecia estabelecer manobras ousadas para brincar com os demais durante o percurso.  
Uma cantora bem jovem, praticamente adolescente, faz parte da trupe, chamada: Susan Jessup, interpretada por Dolores Hart, que estreou no cinema com esse filme e voltaria a atuar como par romântico de Elvis em mais um filme no futuro, no caso, “King Creole”, aliás, o meu filme predileto dentro da carreira cinematográfica do Rei do Rock. 
 
Uma característica engraçada para provocar a piada inocente, desde a primeira aparição de Deke com essa banda, ele costumava devolver o violão com uma corda arrebentada e quando a turnê melhora e tal trupe passa a apresentar-se em teatros mais categorizados, eis que ele ganha um violão de ótimo nível, e brincam com ele ao dizer-lhe que agora ele é que será responsável pelas cordas que normalmente arrebenta.
Naturalmente que à medida que a excursão progride, os holofotes brilham mais para Deke e nesse caso, Tex, um artista mais velho e sem nem metade do carisma, incomoda-se. É sugerida uma troca de posição do nomes dos artistas nos cartazes e na porta dos teatros onde apresentam-se e ele incomoda-se com a ascensão de Deke, que inclusive, a cada dia provoca mais frisson nas plateias, principalmente entre as meninas. 
 
Nesse ponto é preciso destacar que se a base das cenas dessas apresentações é a Country Music, ouve-se Rock’n‘ Roll também e nesses números mais apimentados, Deke age como o Elvis da vida real ou seja, usa de sua tradicional mise-en-scène que arrancava uivos das garotas pelas insinuações sob apelo sexual e naturalmente choca os mais velhos, conservadores por natureza, que o assistem. Isso gera problemas e a agente, Glenda, tem trabalho para contornar os ânimos mais acirrados.
 
Uma cena a explicitar tal tipo de conflito, mostra bem esse caso e pode-se afirmar que inicia-se aí (embora no filme anterior isso houvesse sido insinuado), o famoso trinômio obrigatório em termos de clichê, para todos os filmes de Elvis em sua carreira cinematográfica:
 
A) Elvis canta; 
B) Elvis dá soco em bandidos e 
C) Elvis beija muitas garotas e ao final, fica definitivamente com a mais bonita.
Pois eis que Deke/Elvis, está a alimentar-se tranquilamente dentro de uma lanchonete e algumas garotas percebem a sua presença ali. As mais ousadas abordam-no e alguns rapazes incomodam-se com esse assédio das meninas para com o galã. O mais impetuoso desses rapazes contrariados o provoca, ao ponto em partir para cima em embate verbal, ao propor que Deke prove que realmente saiba cantar. Deke coloca uma música para tocar, mediante a ação de uma Jukebox (nada mais cinquentista, sensacional, portanto) e canta em cima do disco que roda na pick-up, além de dançar na pista. 
Todos vibram, menos o rapaz que o desafiou (Ken Becker, que aliás ficou sem nome para o seu personagem neste filme, porém, esse ator participaria de muitos outros filmes de Elvis, no futuro). Uma briga irrompe ao final, e Deke nocauteia o seu oponente, para o delírio da plateia. A polícia é chamada pelo dono do estabelecimento, mas Deke sai antes da casa.
 
Glenda é uma mulher ousada para a sua época, pois age com métodos inusitados para promover os seus artistas e em especial, Deke, pois chega ao ponto em contratar duas mulheres idosas para comparecer a um show e tecer duras críticas à Deke, em voz alta, justamente para provocar uma reação das suas fãs jovens e assim aproveitar-se desse tumulto a ser registrado pela imprensa. Bem, na vida real, o “Colonel” Tom Parker não media esforços para promover a carreira de Elvis a usar factoides como esse e até piores. 
Em outra cena, Deke sai do palco extenuado, com as garotas da plateia em frenesi na plateia de um teatro. Ele vai ao camarim, guarda o seu violão e não percebe que uma garota ali infiltrara-se. Trata-se de Daisy Bricker (interpretada por Jana Lund). É uma das primeiras, senão primeira insinuação do papel de uma "groupie" em relação a um astro do Rock (se bem que neste filme, a personagem Deke seja mais um Country Star), em um Rock Movie. Jovem e bonita, ela o agarra, mas ao pressentir a confusão pois essa moça possivelmente seria menor de idade, ele tenta a todo custo desvencilhar-se, com o intuito de expulsá-la do camarim antes que alguém a veja. 
 
Nesse ínterim, Glenda estava pelos corredores doa bastidores a conduzir fotógrafos a serviço de jornais que fariam fotos de Deke no camarim. É claro, conflito dramatúrgico armado, eis que quando Glenda abre a porta, Deke está aos beijos com Daisy e os fotógrafos são rápidos para registrar tal flagrante. Glenda fica bastante incomodada, aparentemente por tal publicidade ser negativa aos negócios, mas fica implícito que pensava em Deke de outra forma em seu íntimo.
Em mais uma ação publicitária, Glenda arquiteta que Deke leve Susan para visitar os pais da moça em uma fazenda, no entanto, isso faz com que um romance implícito ocorra entre os jovens. Glenda mais uma vez demonstra sentir ciúmes do cantor, por conta de perceber algo entre ele e Susan. 
 
Eis que o veterano cantor, Tex também se cansa de ser sobrepujado e briga com Glenda, por conta do contrato estar a favorecer Deke. Ele também percebe que Glenda interessa-se por Deke, pessoalmente e isso ajuda a deixá-lo mais irritado, pois ele e Glenda foram casados no passado, um fato obscuro até então.

Deke ganha um carro caríssimo, contudo não imagina que por trás desse automóvel há um ardil arquitetado por Glenda. Ele resolve então contar um segredo seu à Glenda. Eles dirigem-se a um remoto cemitério interiorano e lá, Deke mostra à Glenda, a tumba de... “Deke Rivers”. A sua explicação é prosaica. Ele fora um menino órfão e após um incêndio no orfanato onde fora criado, resolveu adotar a identidade de outra pessoa, no caso, o falecido e real (na ficção, bem entendido), Deke Rivers.
Um show mais grandioso vai ocorrer em um teatro, mas o prefeito da cidade proibira-o, ao atender reclamações provenientes de uma associação de pais, ao alegar que a música de Deke seria perniciosa aos jovens. Bem, não o Country & Western que permeou o filme quase inteiro, mas o Rock’n’ Roll, certamente e nesse termos, Glenda planeja então realizar o show em um estúdio de TV. Isso sem contar que uma reunião marcada com autoridades e com a presença de tal associação de pais, faz com que Glenda tenha que gastar a sua saliva para convencer os conservadores que o Rock’n’ Roll não seria o monstro que essas pessoas pensavam ser.
 
Nesse ínterim, Deke descobre que Glenda houvera mentido sobre a origem do carro caro que ele recebera e que havia um seguro de vida obscuro por trás, a dar margem a uma percepção de falcatrua. Deke e Glenda, antes de brigar, chegam a beijar-se, mas não passa disso, visto que as decepções de lado a lado foram maiores e na verdade, Deke estava interessado mesmo em Susan e além do mais, Deke não gostou de descobrir que Glenda e Tex formam casados no passado, informação omitida essa que ele toma como uma tentativa de conluio de ambos para controlá-lo o tempo todo. 
Deke sai nervoso a dirigir o seu carro em alta velocidade e o show começa. A apreensão sobre o cantor não voltar ao teatro para participar do espetáculo, gera nervosismo nos bastidores. Glenda vai atrás dele e rasga o contrato, para mostrar o seu arrependimento sobre tê-lo manipulado. Deke volta a tempo, entre no palco e canta a balada, “Loving You”, que dá título ao filme e que já havia cantado anteriormente, quando na cena da fazenda, em momento romântico que tivera na companhia de Susan. Depois disso, Tex fica furioso com a volta e sobretudo pelo sucesso de Deke com a plateia, predominantemente feminina. 
 
O final é bem mais Rock’n’ Roll, com as garotas a enlouquecer e a mostrar-se aquelas senhoras veteranas, contratadas para hostilizar, a princípio a demonstrar contrariedade, mas posteriormente a cair no Rock, igualmente, ou seja, um tipo de clichê que seria repetido inúmeras vezes em outros Rock Movies no futuro. Deke está em seu apogeu, canta em meio às pessoas na plateia, com grande euforia a envolvê-lo e após a apresentação, faz as pazes com Tex e Glenda no camarim. Então, para fechar bem em clima de romance, Tex e Glenda beijam-se na porta do camarim, e lá dentro, Deke e Susan seguem a mesma orientação.
Muito bem, filme simples, porém simpático e bem feito para o padrão de uma comédia musical romântica, mostrou certamente que o caminho para Elvis brilhar também no cinema, seria um adendo em sua carreira e não um mero recurso para gerar factoide publicitário. 
 
Ele jamais foi um grande ator, mas aprendeu a atuar com uma desenvoltura bastante razoável doravante e salvo ter sido prejudicado por muitas produções absolutamente prosaicas, principalmente nos anos sessenta, em seu bojo, "Loving You" pode ser considerada uma obra digna e com até pontos fortes, a juntar-se com outras boas obras, tais como: “Jailhouse Rock”, o filme posterior e “King Creole”, o quarto, estes muito bons a transbordar musicalidade e por que não (?), a exibir um Elvis quase ator profissional, praticamente com uma desenvoltura bastante aceitável. 
“Loving You” tem uma boa trilha sonora, certamente, amparada pelas canções compostas pela genial dupla, Jerry Leiber e Mike Stoller. O single com as canções “Loving You” e “Let me Be Your Teddy Bear”, vendeu mais de um milhão de cópias na época, um número muito expressivo aos padrões da década de cinquenta. Outras canções apresentadas: “Mean Woman Blues”, “Got a Lot o’ Livin’ to Do”, “Lonesome Cowboy”, “Hot Dog” e “Party”.
 
A crítica ficou bem dividida. Alguns jornais enaltecerem o fato de Elvis ter melhorado como ator em relação ao primeiro filme, “Love me Tender”. Outros, foram desdenhosos, bem naquela linha de tecer considerações apocalípticas sobre o artista então em início de carreira, ao decretar que ele seria rapidamente esquecido pelo público, com o decorrer do tempo, aliás, um tipo de consideração que mais revela despeito do que análise técnica. E também a apresentar ataques à performance musical de Elvis Presley, principalmente no tocante ao seu gestual, que era considerado escandaloso aos padrões da época. Ou seja, no bojo, tudo muito normal aos padrões da mentalidade dos anos cinquenta.
 
Esse filme teve uma estratégia de lançamento inusitada. Ao contrário do padrão normal dos estúdios hollywoodianos, quando se lançava inicialmente em salas de cinema mais grandiosas do centro das grandes cidades e só posteriormente, em cinemas de bairro e em cidades pequenas, “Loving You” estreou diretamente nesse circuito mais popular. Certamente foi mais um ardil proposto pelo "Colonel" Tom Parker, o astuto empresário de Elvis Presley, pois ele fora pródigo em arquitetar artimanhas para promover o seu contratado. Essa estratégia em quebrar o protocolo tradicional da distribuição de filmes na América, recebeu até um apelido : “Presley Pattern” (padrão Presley). 
Uma curiosidade sensacional, na cena final de Deke, a cantar no teatro, os pais de Elvis, Vernon e Gladys Presley foram convidados a participar da figuração, em meio às pessoas sentadas na plateia.

Baseado no conto: “A Call From Mitch Miller”, escrito por Mary Agnes Thompson, segundo os roteiristas que o adaptam ao cinema, Herbert Baker e Hal Kant, foi acrescentado como tempero extra, várias histórias reais protagonizados pelo Colonel Tom Parker. Direção a cargo de Herbert Baker.
 
O filme foi lançado em julho de 1957, com sucesso e leve-se em consideração o fato que a partir do filme anterior, até a sua pausa para servir o exército, Elvis lançou muitos filmes, portanto, somado ao seu estouro musical onde computa-se também a super exposição nas emissoras de Rádio e TV, o tempo todo, portanto, talvez com menos proeminência simultânea, o filme pudesse ter atingido números melhores, mas o que angariou à época, foi considerado bastante satisfatório. 
É evidente que posteriormente foi exibido na TV aberta tradicional, mediante muitas reprises ao longo dos anos sessenta e setenta e foi lançado em formato VHS nos anos oitenta; visitou os canais da TV a cabo e seguiu a cadeia dos lançamentos em formatos mais avançados para a venda domiciliar, mediante o advento do DVD e o Blu-Ray. Na Internet, está disponível para ser visto gratuitamente, sem restrições, ao menos no momento em que escrevi esta resenha, em 2019. 
Esta resenha foi escrita para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll, e alojada no seu volume III, com a leitura disponível a partir da página 243