Antes de falar sobre a obra em si, há de se destacar que a sua autora tem um currículo enorme e a apontar para uma completo ecletismo que se mostra absolutamente empolgante, na minha opinião. Nestes termos, Kátia Moraes é poetisa, sim, e das boas ao demonstrar através desta obra: "Diário da Moraes" uma capacidade enorme para explanar sobre múltiplas percepções de mundo e sempre a colori-lo de uma forma sagaz, a imprimir doses generosas de esperança a ser captada pelos seus leitores.
Mesmo quando a autora aponta para temas mais penosos, por exemplo a denunciar a injustiça e a desigualdade que permeia a caminhada desta humanidade tão egoísta e demarcada pela falta de empatia em nome de interesses escusos, ela o faz com a devida contundência que enobrece a revolta dos que se rebelam e se importam com seus semelhantes, e melhor ainda, sem perder a ternura jamais, como salientou um sábio personagem do passado.
A cantora que pinta, a pintora que transforma poesia em cores e formas...essa é Katia Moraes, uma artista completa
O que amplifica a sua sensibilidade como poetisa, sem dúvida alguma é a sua bagagem gigantesca como artista multifacetada. Portanto, ela dispõe de um cabedal de informações e sobretudo é amparada com tal estrutura que possui, exatamente por saber fazer uso de outras ferramentas além das utilizadas pela arte literária para transformar a sua poesia em algo substancial, no sentido de que as palavras que escreve tem o poder das cores pinceladas nas telas e das vibrações musicais emitidas por instrumentos. Em suma, essa diversidade que ela ostenta é seu predicado como artista total.
Kátia Moraes em plena performance ao vivo como cantora. Fonte: internet
Pois é, Kátia Moraes tem uma carreira vitoriosa no campo da música, com diversos CD's lançados, a arrolar participações em inúmeros projetos de fino trato no campo da MPB e também com o Pop Rock midiático, no sentido de que foi componente do grupo: "O Espírito da Coisa", uma banda de Rock dos anos oitenta que explodiu na percepção popular "mainstream" ao destilar um repertório construído mediante forte carga de ironia, quando tratou de aspectos da sociedade, em torno de seus maneirismos e contradições. O deboche usado com inteligência foi um trunfo dessa banda, que teve na canção, "Ligeiramente grávida", o seu momento maior de popularidade e tanto foi assim, que esse termo "pegou" como um bordão popular de intensa repercussão ao ponto de se tornar ouvido nas ruas, comumente.
Kátia Moraes também teve aproximação forte com o teatro, ao caminhar junto com membros do descolado grupo teatral, "Asdrúbal Trouxe o Trombone" e encenou Brecht em alto estilo (O Círculo de Giz Caucasiano), em pleno Parque Laje no Rio de Janeiro.
Já nos anos noventa, ela se mudou para Los Angeles, na Califórnia, e lá se envolveu com músicos norte-americanos de alto nível, a cantar e participar de muitos shows e gravações. Tempos depois formou uma banda com forte identidade brasileira e que brilhou ao gravar muitos discos (Sambaguru), que inclusive foi nomeada para o Grammy Latino graças a um dos seus discos ("Tribo").
Kátia Moraes a brilhar pelos palcos. Fonte: internet
Ela também comandou o projeto: Brazilian Heart Celebration, um espetáculo temático a homenagear grandes personalidades da MPB, de Noel Rosa a Tom Jobim, a passar por muitos outros nomes de enorme peso da música brasileira.
Como se não bastasse essa carreira musical prolífica, Kátia Moraes também atuou com a dança, pois sim, ela é igualmente uma dançarina expressiva que trabalhou com a Companhia de Dança Viver Brasil, entre outros trabalhos, e sabe interpretar a música pelos movimentos do corpo.
Locutora, atriz e dubladora da pesada, Kátia tem agenda cheia com as produções audiovisuais. Fonte: internet
Não obstante todos esses predicados somados, o cinema a capturou e a atuação como locutora, dubladora e atriz lhe rendeu muitos trabalhos significativos, ao atuar com filmes, seriados e animações.
E tem mais...por ser artista plástica talentosa, ela desenvolveu uma espetacular linha de produtos diversificados que comercializa através de seu site, devidamente ilustrados com a sua arte peculiar e muito bonita. Não vou me aventurar a definir a sua estética, pois não tenho esse conhecimento para tal, mas ao ver a capa do livro "Diário da Moraes", devidamente ilustrado pela própria poetisa e constatar no seu site que a linha mestra de sua atuação nas artes plásticas segue o mesmo estilo, foi então que eu tive as minhas epifanias.
Dessa forma, eu acredito que posso ao menos interpretar de forma livre que o intenso colorido do qual ela faz uso e também pelos traços que desenvolve normalmente no seu trabalho como artista plástica, me sugere que há muita similaridade do seu estilo com artistas brasileiros fortemente influenciados pela brasilidade com forte teor afro, a lembrar o conceito do tropicalismo, na explosão de cores conquistada de forma acentuada. E eu senti também um quê de Art Pop sessentista. Posso estar redondamente equivocado na minha percepção por esse aspecto, mas passou-me a impressão de ser uma explosão de cores proporcionada pelo choque de Di Cavalcante com Andy Warhol, acrescido de pitadas do carnaval da Bahia, Carmen Miranda, Zé Celso Martinez e a laranjada batizada do Ken Kesey, tudo isso jogado em um liquidificador e assim, devidamente misturado, o resultado é impressionante.
A exuberante arte multicolorida de Kátia Moraes. Fonte: internet
Ainda a falar sobre a capa do livro, essa alegria é expressa pelas cores vivas, a sugerir o sol como fonte de energia primordial e dessa maneira, a vibração psicodélica que colore os cabelos do rosto humano feminino ali presente, denota no seu semblante a sensação de paz de espírito. Não achei uma nota oficial da parte da autora, mas quero crer se tratar de um auto-retrato e se eu estiver certo, ilustra de uma maneira muito feliz o conteúdo da obra, pois passa a sensação de bem-aventurança como um sinal de esperança na humanidade, apesar de todas as mazelas observadas no desenvolvimento da nossa espécie descritos através de muitas poesias por ela criadas, ao menos no meu entendimento.
Como é muito bem expresso pela autora do prefácio, a também escritora, Tereza Souza: "Kátia Moraes deveria se chamar 'Kátias', por sua multiplicidade de pessoas em uma só". Muito bem colocado, concordo com essa definição.
Um preâmbulo tão grande para falar sobre a autora se tornou uma necessidade óbvia para a composição desta resenha, pois explica a alta expressividade da poesia contida no livro: "Diário da Moraes". Posta essa última observação, falo sobre a obra em si.
Alguns dos poemas contém a sua tradução literal para o inglês, que advém na página seguinte, certamente a prestigiar os seus muitos amigos e fãs norte-americanos, sobretudo.
Logo no primeiro poema, "A Lista", há uma reflexão livre sobre a decrepitude da vida e que se amplia no sentido de buscar o questionamento sobre a desigualdade social que esbarra no vergonhoso colapso final do ser humano ante o descaso dos poderosos. A fé na boa intenção de quem sinceramente busca solucionar tal desequilíbrio social predomina através dos versos finais, ainda que a autora mensure realisticamente que isso vai demorar para ocorrer.A infância é citada, em "Juíza", mas de uma maneira sui generis, ao retratar a perfeita sintonia da criança com a sua espontaneidade e que normalmente gera desconforto entre os adultos, ou seja, é para considerar se quando crescemos não perdemos muito ao abandonar essa visão despojada e livre das amarras impostas pelas normas sociais.
As reminiscências pessoais abundam em "Foto na caixa", mas neste caso, não é preciso conhecer a história pessoal da autora, tampouco carece de explicações da parte dela, pois as imagens escolhidas para compor esta poesia nos proporciona uma viagem. É como assistir um filme, que não é seu, mas isso não importa, pois os pontos de confluência estão ali disponíveis para qualquer leitor acessar. E é bonito.
A questão da maternidade é colocada na pauta pelo poema: "Eu Discordo". De fato, é tão ampla a questão da reprodução que abre campo para uma licença poética ampla que extrapola os limites da biologia. As artes em todas as suas manifestações podem gerar frutos que podem ser considerados filhos de seus criadores. Nesse sentido, o artista deixa muitos filhos neste mundo, não resta dúvida.
Daí em diante (e para não provocar mais "spoilers"), a autora nos apresenta outros poemas a desenvolver sobre muitas questões muito interessantes. Ela discorre sobre a sensibilidade, também sobre a sensação do improviso que todo músico sente no palco, e sim, Kátia Moraes é uma ótima adepta da poesia cantada, igualmente.
Misturam-se muitos signos libertários e progressistas a denunciar a dor do preconceito e da opressão. O Blues que evoca a dor, mas que também espelha a beleza. O teatro como instituição e que provoca a reflexão e os raros políticos que não conspurcam a nobre arte do diálogo em detrimento do vergonhoso conluio fisiológico. São muitos poemas a abordar tais temas e a homenagear personas proeminentes que muito se esforçam em torno das nobres causas.
A artista, a sua arte na parede e no peito a estabelecer uma perfeita sintonia sensorial. Fonte: internet
A dança que expressa todos os sentimentos e sensações pelos poros do corpo, as impressões sobre a vida como o brasileiro a leva e pela ótica dos estrangeiros, o medo infantil pelas admoestações e histórias exageradas contadas pelos adultos para assustá-las, tudo isso consta nos poemas ricos de ideias e de fácil leitura pelo poder da síntese, que é muito bem observado pela autora.
A comida, ah... depois de tantas cores, notas musicais e suspiros provocados pelos poemas, na parte final do livro eis que o tema da gastronomia foi abordado. Sensorial na mesma intensidade, os sabores também merecem a exaltação e assim, Kátia Moraes nos prova que os poemas também podem ser degustados, com tempero.
Para encerrar a obra, a "Pescaria" nos revela que o poeta não pode ficar desatento. As ideias vem e vão e sob uma velocidade estonteante, a nadar freneticamente para abandoná-lo. É preciso estar atento e forte como Gal Costa nos dizia com feliz propriedade, pois o poeta precisa pescar as palavras com enorme precisão antes que elas fujam, simples e decididamente, já que elas escapam sob uma velocidade estonteante.
Como análise final, acrescento que a leitura se mostra leve pelo seu estilo, mas intensa pela riqueza das imagens propostas. Impressiona também a diversificação de temas abordados, pelas citações e até pelas dedicatórias ali expressas.
Livro saboroso, tátil, colorido, enfim, que espelha com fidedignidade a alma artística multifacetada da sua autora, uma artista talentosa e que se expressa de inúmeras formas, incluso como poetisa inspirada.
Ficha técnica:
Livro: "Diário da Moraes"
Autora: Kátia Moraes
Edição: Henrique Lopes e Kalyne Vieira
Projeto gráfico e capa: Editora versiprosa
Ilustração de capa: Kátia Moraes
Editora Versiprosa
https://www.editoraversiprosa.com.br/
Para conhecer melhor os muitos atributos artísticos de Kátia Moraes, acesse:
Canal de YouTube para conhecer a sua carreira musical:
https://www.youtube.com/@katiamoraes9893/featured
Instagram para conhecer a sua atuação nas artes plásticas:
https://www.instagram.com/brazilianheartmusickatiamoraes/
Visite o seu site, completo a abranger todas as facetas da sua carreira artística e também a oferecer uma incrível linha de produtos customizados com a sua arte ilustrativa:
https://www.instagram.com/brazilianheartmusickatiamoraes/
Neste link em específico do site, se acessa a linha de produtos customizados pela artista:
http://www.katiamoraes.com/brazilian-heart-shop-visual-art