Segundo
filme dos Beatles, “Help” teve como proposta primordial a diversificação, ao
usar conceitos diferentes em relação ao primeiro filme, “A Hard Day’s Night”.
Se no primeiro, a simplicidade em centrar esforços na banda, apoiada com
momentos de humor, foi a tônica, em “Help”, a proposta foi investir em uma
história mais robusta, a valorizar a dramaturgia e agregar elementos extras,
inclusive com certos elementos a mostrar-se fora da cultura Rocker.
Bem, teria
sido fácil produzir um filme nos mesmos moldes do anterior, com foco na banda,
sem maiores preocupações em contar-se uma história, envolver dramaturgia e usar
de quaisquer outros artifícios. Pois a banda estava ainda mais famosa, já a
colocar-se como icônica e pasmem, em pleno processo de expansão, ou seja,
atingira um patamar de popularidade tão grande, que um simples documentário
teria sido o suficiente para provocar frenesi nas portas das salas de cinema do
planeta inteiro, sem dúvida alguma, no entanto, optou-se por um filme mais encorpado,
e é evidente que tal determinação precisa ser enaltecida enquanto resolução
dessa produção, pura e simplesmente. E claro, pelo outro lado, a vontade de ter
produzido algo mais contundente, não significa que a meta tenha sido totalmente
cumprida em termos de qualidade cinematográfica e certamente que isso será
analisado no decorrer desta resenha.
Posta tal
reflexão como preâmbulo, cabe dizer agora que os tais ícones extra Rock aos
quais eu aludi no início da explanação, são múltiplos e interessantes, no
sentido de colorir o filme com outras
referências. Primeiro ponto: na mesma época, em termos de cinema mega
blockbuster, estava (e permaneceria por muitos anos, no futuro), em plena voga,
a fama em torno dos filmes a apresentar a saga do super agente secreto, James
Bond, também conhecido pela sua alcunha sob código: “Agente 007”. Criado pelo
escritor, Ian Fleming, como um personagem tipicamente inspirado em agentes de
serviços secretos a serviço da inteligência governamental, e embalado certamente pela
paranoia gerada pela Guerra Fria cinquenta/sessentista, o fato é que tal
sequência de filmes tornara-se um dos maiores fenômenos Pop da década de
sessenta, quase no mesmo patamar em termos quantitativos, ao que os Beatles
representavam para o Rock mundial nessa mesma época.
E para reforçar um ponto
em comum, a configurar dois trunfos da cultura Pop Britânica, portanto,
imbatíveis se colocados a atuar conjuntamente. Não foi exatamente o caso aqui
observado, mas a inserção de uma trama a envolver perseguição, fugas
espetaculares e tramoias obscuras, evidentemente que foi inspirada na saga de
James Bond.
Outro reforço
importante observado em “Help” e também a esbarrar em recursos muito bem
explorados nos filmes do agente 007, expressa-se através do uso (e abuso) do
recurso da aventura, inspirada na literatura infantojuvenil. Desde a
antiguidade, quando lembramos das “Mil e uma Noites”, a passar pela Idade Média
em meio a tantas histórias narradas por trovadores; nos livros de Julio Verne,
Allan Quatermain e depois de tudo isso, com a intensificação do bombardeio que
adveio via Comics/Histórias em Quadrinhos e multiplicado pela ação do cinema
e da TV, ficou patente que aventuras espetaculares a abordar temas como:
civilizações perdidas, sociedades secretas; seitas obscuras; tesouros guardados
a revelar poderes sobrenaturais, ações extraterrestres e super vilões munidos
por tecnologia de ponta, entre outros temas, causavam furor nas salas de cinema
e nas poltronas & sofás residenciais a empolgar crianças e adolescentes
fascinados a observar a tela da TV para assistir filmes e seriados com tal teor.
E ainda
acrescente-se mais um elemento: o humor. Piadas (boas ou não), a produzir o
típico humor britânico, carregado por sarcasmo, também representa uma faceta
observada em “Help”. Neste aspecto, os próprios componentes deixaram claro que
as piadas eram inspiradas em dois parâmetros que eles adoravam: os filmes dos
irmãos Marx (“Duck Soup”, sobretudo), e do programa radiofônico e que
posteriormente migrou para a TV britânica, “The Goon Show”, de onde saiu de
suas fileiras o talento extraordinário do comediante e ator, Peter Sellers.
Isso também fora observado no filme anterior, “A Hard Day’s Night”, como eu
mencionei, aliás, na resenha sobre esse filme, que também elaborei.
Por último,
sobre o quesito humor, há por registrar-se que nos bastidores do set de
filmagem, os rapazes estiveram suscetíveis às epidemias de gargalhadas e muitas
vezes, esse fator atrapalhou bastante o trabalho. Conta-se que as filmagens
atrasaram muito por conta dessas interrupções geradas pelas crises de euforia
da parte dos rapazes, isso sem contar o fato de que no período da tarde os
quatro componentes da banda tornavam-se quase que imprestáveis, a prejudicar o
andamento do cronograma da filmagem. O motivo das epidemias de risadas: o farto
uso de um tipo de cigarro que causava bastante fumaça, mediante um odor deveras
característico e a gerar em via de regra, a euforia. E o fato dos quatro componentes dos Beatles ficarem sonolentos
após o período do almoço: a ingestão de vinho em demasia. Bem, nem os membros
dos Beatles eram feitos de ferro e em segunda análise, eles não eram meninos
tão “bonzinhos”, como muitas pessoas acreditavam que fossem e colocassem
outrossim, a culpa antagônica aos Rolling Stones a estigmatizá-los como maus
meninos, na contrapartida.
Por último,
contudo a revelar-se fatalmente como o mais importante fator, para enaltecer o filme, é lógico que arrola-se a presença
do próprio Fab Four, com os seus membros a representar figuras icônicas do
imaginário Rocker/Pop de então, como os protagonistas do filme e a sua
música, a representar o ingrediente mais importante dessa receita, sem dúvida
alguma.
Sobre a
história/mote e roteiro, a ideia foi misturar todos esses conceitos a
imprimir aventura, mistério, suspense, paisagens paradisíacas e os Beatles a
viver tudo isso, além de uma rotina a falsear aos seus fãs, o conceito de que eles morassem juntos como se fossem
estudantes em uma “república”. Aliás, tal modelo de estruturação da história a
mostrar uma banda de Rock, cujos membros morassem juntos como se fossem irmãos
e a misturar as suas atividades musicais com mil confusões em seu cotidiano,
inspirou diretamente os produtores da série de TV norte-americana, “The
Monkees”, pouco tempo após o lançamento deste filme, a criá-la, não há dúvida.
Sobre o
filme em si, a história inicia-se em meio a um ritual macabro a envolver o
sacrifício humano de uma moça, possivelmente situado em algum obscuro ponto em
meio à selva de um país asiático, provavelmente algo entre a Índia; Bangladesh;
Paquistão ou Sri Lanka, ou seja, onde o Império Britânico esteve a dominar e a
gerar assim uma identificação imediata pelos trejeitos e sotaques observados,
com os ingleses a exercer um processo de controle.
No momento em que a moça vai ser abatida, a sacerdotisa, Ahme
(interpretada por Eleanor Bran), interrompe o sacerdote, Swami Clang
(interpretado por Leo McKern), ao observar que o ritual não pode ser cumprido,
visto que a moça a ser sacrificada está sem o anel considerado sagrado por tal
seita e imediatamente vê-se em um telão, uma aparição dos Beatles a cantar a
música título do filme, “Help”, com foco nas mãos de Ringo Starr, onde entre
vários anéis que ele de fato costumava usar (o apelido “Ringo” foi gerado por ele
chamar-se, Richard, mas também pelo fato dele ser conhecido, desde sempre, por
gostar em usar anéis espalhafatosos e a palavra, “Ring”, significar anel, em inglês).
Imediatamente, os membros da seita ficam enlouquecidos por ver o anel ritual no
dedo do Rock Star e vão à Londres com o intuito em capturá-lo e é bom observar
que em sua crença, quem o usa, é o eleito para ser sacrificado à Deusa Kali (nesta
comitiva está incluso um terceiro elemento, chamado Bhuta, interpretado por
John Bluthal).
Pausa para comentar que essa ideia não foi aleatória, mas fez
alusão à seita conhecida como: “Thuggees”, que existiu na Índia medieval e que
costumava realizar sacrifícios humanos em favor de tal Deusa, com a intenção de
garantir benefícios da parte dessa divindade, supostamente. Em suma, houve um
mínimo de pesquisa, mesmo que a real intenção no filme tenha sido satirizar a
questão. Bem, para gerar mais emoção à história, Ringo está com um problema em
relação ao anel, pois ele simplesmente não sai do seu dedo. Portanto, eis que
nesse pequeno detalhe de ordem anatômica, fica sustentada toda a ação do filme,
pois é em torno da perseguição à Ringo Starr, que tudo vai acontecer.
Muito bem,
então essa comissão formada por membros de tal seita fanática, vai a Londres e
tenta através de diversas artimanhas, resgatar o anel, ao ameaçar Ringo em
primeira instância, e aos seus demais companheiros de banda, por conseguinte. Em
meio à muitas cenas hilárias para mostrar tal perseguição, é óbvio que as gags
são montadas para provocar o humor, em via de regra, no entanto, são
construídas dentro do parâmetro que eu observei anteriormente, ou seja, a
orientar-se pelo campo da aventura, sobretudo, mas a trazer no bojo a ação de
filmes policiais e a envolver conspirações em geral.
Nesses termos, cenas
ocorridas em um restaurante indiano em Londres, são hilárias, assim como a
tentativa de Ringo em buscar apoio de um joalheiro para tirar o tal anel de seu
dedo, mas pelo fato desse ornamento estar constituído por algum tipo de
material imantado por alguma força sobrenatural que o valha, eis que as
ferramentas do joalheiro quebram e o anel permanece intacto. É pior ainda
quando Ringo procura um laboratório científico e submete-se a um tipo de
experimento avantgarde e mediante tal máquina futurista, caem todos os anéis de
suas mãos, menos o que ele precisa tirar... ora, o filme precisava continuar,
não era o momento ainda para livrar-se dele.
Neste ponto
em particular, os cientistas malucos, “Foot” (interpretado por Victor Spinetti)
e Algernon (interpretado por Roy Kinnear), ficam impressionados com a
indestrutibilidade do material que compõe o anel e também passam a perseguir
Ringo, ao vislumbrar a possibilidade em amealhar tal artefato para os seus
propósitos pseudocientíficos. Ou seja, Ringo e os demais, ganham mais dois
perseguidores.
A permear
tais trapalhadas, mostra-se o cotidiano fictício dos componentes dos Beatles.
Uma cena emblemática revela-os a chegar da rua e cada um entra em uma casa, a
denotar que são vizinhos. Senhoras idosas que moram nos arredores, comentam entre
si que gostam deles, pois são rapazes ordeiros, para reforçar a ideia que nem
todo cabeludo seria uma ameaça à sociedade. No entanto quando a cena é vista
pela perspectiva interna da casa, descobre-se que a casa é uma só, e em seu
interior, eles vivem em meio a uma série de engenhocas a conferir um aspecto
futurista e tecnológico aos padrões da época (1965), e certamente a buscar tal
referência em meio aos filmes de James Bond, como já eu comentei antes.
Ahme anuncia
que na impossibilidade do anel ser capturado, declara Ringo Starr como a pessoa
a ser sacrificada, para piorar a situação do baterista dos Beatles. Uma
artimanha inacreditável é feita quando um líquido preparado pelos membros da
seita é injetado por engano na perna de Paul McCartney, ao invés de Ringo e ele
encolhe, literalmente, para ficar inteiramente nu, e assim indefeso, protege-se
ao entrar dentro de um cinzeiro, ou seja, a denotar algo bizarro. Foot e Algernon também estão na cena com o
objetivo de apanhar o anel para si e isso gera mais confusão ainda.
A banda
resolve fugir para a Áustria e de fato, as cenas a seguir são realizadas em uma
pista de neve, típica para a prática do ski. É dessas cenas com os membros dos
Beatles super agasalhados, que saiu a capa do álbum, “Help”, com os quatro a
usar vestimentas especiais para suportar o frio extremo e a sinalizar com os
braços o código de pedido de socorro, que corresponde à palavra “Help”, na
tradução literal.
Em meio à perseguição, vemos os Beatles a fugir sob skis e
interferir em uma corrida. Há também o jogo do “curling”, um esporte típico
para ambientes com neve e um desses artefatos, estaria carregado com uma bomba
pelos perseguidores. Uma gag absolutamente nonsense, ocorre, quando em meio à
neve, o roadie dos Beatles, Mal Evans, aparece a nadar em buraco estabelecido aleatoriamente
e este improvável nadador pergunta aos rapazes para que lado fica o penhasco branco
de Dover (que vem a ser um rochedo belíssimo, por sinal e localizado na costa da Inglaterra), como se
estivesse a pedir uma informação de um endereço em um ambiente urbano. Passada
essa cena bizarra, fora do contexto, e sem outra saída para escapar de seus
algozes, Ringo e os seus amigos voltam para a Inglaterra.
Em
princípio, a Scotland Yard vai finalmente proteger os rapazes, entretanto, a
corporação designa para tal missão, um inspetor fraco, chamado: Gluck
(interpretado por Patrick Cargill). Vem então a famosa cena em que os Beatles
tocam em um campo aberto, com a proteção do exército real britânico, mediante a
presença de tanques de guerra e soldados armados por todos os lados (tal cena
foi filmada na planície de Salisbury).
A seguir, os Beatles escondem-se em um
palácio e quase são capturados pelo tresloucado, Foot. Em outra cena, a banda
chega a um Pub e quando Ringo tenta apanhar o seu copo e não consegue
alcançá-lo, George Harrison acidentalmente mexe em uma alavanca e tal ato aparentemente
banal, abre um alçapão, onde Ringo cai. Tratava- se de uma armadilha preparada
pelos membros da seita. Ringo cai em uma espécie de calabouço, onde um feroz tigre
está ali presente. Como sair dessa situação? Eis que o inspetor, Gluck instrui
os rapazes a adotar uma medida bizarra: o animal é controlado se ouvir a
melodia principal, oriunda da nona sinfonia de Beethoven. Ringo a assovia e em
seguida, todos que tentam resgatá-lo, reforçam o coro improvisado (e
desafinado). Essa resolução é tão nonsense que nem é possível acreditar que tal
cena tenha sido escrita com a intenção humorística.
A banda
viaja para as Bahamas e ali, em meio a uma ambiente praiano, mesmo em meio ao
perigo do qual fogem, parecem turistas “bon vivant” a aproveitar a vida,
inclusive cercados por belas garotas a usar biquínis insinuantes etc. e tal.
Logo aparecem os membros da seita fanática, os cientistas inescrupulosos e os agentes
da Scotland Yard a propiciar correrias desenfreadas.
Os outros membros da banda
usam máscaras com as feições de Ringo para despistar os seus perseguidores, mas
não houve escapatória, Ringo foi finalmente capturado, por Foot, a bordo de um
navio pirata, e o cientista maluco, obcecado pelo anel, planeja cortar o dedo
de Ringo, sem nenhum pudor. Ahme, a sacerdotisa, aparece e oferece à Foot, um
frasco a conter uma essência de uma certa orquídea, que conteria poderes
sobrenaturais.
Clara menção às drogas alucinógenas, foi o momento lisérgico do
filme, embora com 1965 em pleno curso, esse tipo de abordagem ainda não fosse a
pauta do dia, fator que entraria em maior visibilidade, a partir de 1966, de
uma maneira geral.
Ringo e Ahme caem na água e são resgatados pelos membros da
seita. Na praia, Clang inicia rapidamente o ritual para concluir finalmente o
objetivo dos fanáticos. No entanto, a cena torna-se um inevitável pastelão,
pois o anel cai do dedo de Ringo, miraculosamente, e este ao sinalizar para os
seus companheiros, percebe que a solução definitiva para tirá-lo do perigo,
seria apanhá-lo na areia e rapidamente colocá-lo no dedo de Ahme e assim
transferir a indicação de sacrifício, para ela. No entanto, Ahme, por sua vez,
tenta passar o anel para Foot, ou seja, torna-se uma confusão generalizada ao
estilo dos filmes dos Irmãos Marx, como os componentes dos Beatles realmente
declararam ter buscado inspiração para atuar.
Para
finalizar e esta é uma informação vital (estou a brincar, leitor): quem
finalmente vê-se com o anel no dedo, é Bhuta, um dos membros da seita e ele
passa a ser o novo perseguido pelos demais. O nadador que aparecera nos Alpes
austríacos (interpretado por Mal Evans), surge novamente a procurar o caminho
marítimo para atingir os rochedos brancos de Dover e uma máquina de costura
aparece na praia, mediante uma tarja que afirma homenagear o invento de tal
máquina, o senhor, Elias Wowe, em 1846, e sobre tal final inusitado, eu creio
que nem merece ser analisado, acredito, em face ao seu caráter abstrato, para
ser bem gentil, com o autor da ideia. Nos créditos, ao som da abertura da
Ópera, “O Barbeiro de Sevilha”, o anel é colocado em destaque e os Beatles
ainda interagem com gracejos.Fim da história.
Bem, se
visto com a ótica conservadora, o filme é tolo e constrangedor em muitos
aspectos. No entanto, sob uma visão mais livre, enxerga-se no todo, uma boa
tentativa de se misturar muitos conceitos, para tornar a obra mais substancial do
que um simples registro da banda a tocar. Por outro lado, talvez a pensar no anseio
padrão dos Beatlemaníacos, isso teria
sido ainda mais conveniente do que assistir a banda na tela com a preocupação
de ver os seus ídolos a atuar como atores e sobretudo com a obrigação em conter
uma história a justificar a dramaturgia. Creio que entre os quatro componentes,
somente Ringo Starr apresentava um certo potencial para aventurar-se como ator,
e não foi à toa que isso já havia sido notado no filme anterior, “ Hard Day’s
Night” e seria também aproveitado no filme posterior, o telemovie, “Magical
Mystery Tour”, que seria filmado e lançado em 1967.
Tenho
certeza no entanto, que cansaço a parte em ter que enfrentar as agruras de um
set de cinema, sem deter traquejo para serem atores (já falei da exceção sobre
Ringo), os componentes da banda divertiram-se em participar dessa aventura, sem
dúvida alguma. Da parte de Brian Epstein, o empresário dos Beatles, certamente
que o filme representou uma oportunidade para fomentar ainda mais a fama da
banda, que nessa altura já mostrava-se consolidada em âmbito mundial, no entanto, a ambição ampliar esse domínio,´por incrível que pareça. Sob o ponto
de vista de George Martin, o produtor musical da banda e dos executivos da
gravadora EMI, claro que o filme atrelado ao álbum foi ótimo para os negócios,
igualmente. E finalmente para o diretor, Richard Lester, foi a oportunidade em
mostrar mais serviço, visto que em “A Hard Day’s Night”, que ele também
dirigira, o roteiro bem mais simples, não deu-lhe a oportunidade para trabalhar
com algo mais substancial. Portanto, “Help” foi uma peça importante para a
banda e igualmente para todos os que trabalharam ou usufruíram dessa peça
cinematográfica, à época.
As críticas
recebidas à época, da parte da imprensa, dividiram-se. Alguns mais ortodoxos,
certamente que não foram benevolentes com o filme, mas isso já fora esperado,
certamente pela produção. O importante foi que a despeito de certas opiniões em
contrário, o filme deslizou facilmente sobre a fama que a banda já ostentava
sob um patamar inimaginável.
Para ilustrar, e trazer assim uma lembrança
pessoal minha, eu não assisti o filme em uma sala de cinema à época, pois detinha
entre cinco e seis anos de idade na ocasião, mas conheço pessoas mais velhas
que tiveram essa oportunidade e jamais esqueço-me do depoimento da esposa de um
tecladista com o qual eu toquei em uma banda, no início dos anos oitenta, ao
contar-me que fora adolescente na época e assistira “Help” no cinema, por sessenta
e três vezes seguidas.
Esse grau de entusiasmo do qual ela relatou-me, mensura
bem o comprometimento dos jovens com a banda, no calor de seu lançamento. Neste
caso, é preciso salientar que os meios de comunicação disponíveis nos anos
sessenta, eram terrivelmente limitados, portanto, um filme (neste caso, o
segundo, com os Beatles a protagonizá-lo e a conter músicas inéditas), no
imaginário do jovem fã dessa banda à época, foi algo grandioso ao extremo. Bem
diferente da juventude atual, que acostumou-se a ter qualquer conteúdo
disponível através da internet, no momento em que assim o desejar, vinte e
quatro horas por dia. Em suma, o impacto de “Help” em 1965, foi enorme, e muito
maior revela-se, se analisado pelo prisma da proporção em relação aos meios
possíveis daquela época em termos de difusão.
Sobre a
música, eis a melhor parte, sem dúvida, sem demérito à dramaturgia; roteiro,
mote e produção em geral, mas claro que ao tratar-se de Beatles, seria o caso
de relembrar o comercial protagonizado pelo genial compositor, Adoniran
Barbosa, difundido na TV brasileira nos anos setenta, quando ao fazer
propaganda de uma marca de cerveja, dizia: -“nós viemos aqui para beber ou
para conversar?” Pois é, independente
do filme, o que interessa mesmo é o som dos Beatles, ou estou a exagerar?
Nesse quesito, a banda não desapontou de forma alguma.
“Help” marca
exatamente a linha divisória entra as duas fases criativas na história dos
Beatles, em termos musicais. Foi o último álbum a manter a sonoridade inicial
do grupo, em torno do Rock’n’Roll tradicional com raízes cinquentistas, R’n’B,
Baladas e Folk Music de uma forma bem ampla, em linhas gerais. Daí em diante,
ainda em 1965, mas já através do álbum, “Rubber Soul”, a banda passou a experimentar
e ousar, sobretudo e em 1966, com o lançamento do LP “Revolver”, isso
escancarou-se de vez, ao abrir caminho para o LP “Sgtº Pepper’s Lonely Hearts
Club Band” em 1967, e assim em diante. No entanto, não é demérito algum
classificar,“Help”, como um trabalho a representar a primeira fase da banda,
pois mesmo a soar com bastante simplicidade musical e sobretudo a usar de uma
linha de poesia bem ingênua nessa fase, ao citar as letras das músicas, o
trabalho tem muitos méritos.
Além da
canção “Help” (que é muito forte por si só), título do álbum e do filme, é
muito significativa a presença de óticas canções tais como: “Ticket to Ride” (esta,
uma excelente peça, por sinal), “You’re Going to Lose That Girl”, You’ve Got to
Hide Your Love Away”, “I Need You”, The Night Before e “Another Girl”, além de
menções à outras canções do repertório da banda, inseridas na trilha, como “A
Hard Day’s Night”, “I’m Happy Just to Dance With You”, “You Cant’ Do That” e “From
Me to You”. O repertório do álbum, foi baseado nas canções especialmente feitas
para compor a trilha do filme (as sete primeiras que eu citei), e reforçados
por mais algumas músicas que haviam sido lançadas recentemente em formato “single”
(compacto).
O filme foi
lançado com pompa e circunstância, naturalmente, no London Pavillion Theatre de
Londres, em 29 de julho de 1965, com a presença da Princesa Margaret, duquesa
de Snowdon na plateia a prestigiar o lançamento, o que denotou a importância
que a família Real Britânica devotou ao quarteto, tamanho o seu benefício já
expressivo na ocasião, em termos de royalties a reverter em impostos para o
fisco inglês. Houve época em que os Beatles renderam tanto, que tal cifra entrou
para a estatística do governo, como uma dos maiores geradores de PIB do Reino
Unido, ou seja, como se The Beatles fosse uma mega empresa industrial ou do
ramo primário das commodities. E não por acaso, a Rainha Elizabeth ofertou
comandas aos quatro componentes da banda, exatamente dois meses depois, em
cerimônia oficial, realizada em 29 de setembro de 1965.
“Help” foi escrito
por Marc Behn, com roteiro do próprio, Marc Behn e Charles Wood. Produção de Walter
Shenson. Direção de Richard Lester, um diretor norte-americano que era radicado
na Inglaterra e entrou para o imaginário dos fãs dos Beatles como um agregado
da carreira da banda, por ter dirigido os dois primeiros filmes do grupo: “A
Hard Day’s Night” e “Help”.
Tirante o sucesso
mastodôntico que o filme obteve nas salas de cinema, obviamente que seguiu a
cadeia natural da exibição, ao passar na TV, mas com uma certa parcimônia,
visto que o controle sobre a obra dos Beatles sempre foi muito mais restrito do
que outros artistas, portanto, a ideia sempre foi monetizar ao máximo a obra. Em
cima desse conceito, a quantidade de versões que foram lançadas deste e de
outros filmes da banda, é grande, em todos os formatos e muitas vezes a repetir
lançamentos dentro do mesmo formato, a apresentar versões com extras ou sob mixagem
e/ou masterização diferenciada ou a inventar Kits com a inclusão de produtos
adicionais como camisetas, bonés e outros, para incentivar o consumo do mesmo
produto, por diversas vezes.
Na internet para achar um portal que exiba
gratuitamente tal filme na íntegra, é muito difícil por conta das restrições
legais. A despeito desse mercantilismo exacerbado, é claro que eu recomendo
assistir o filme, “Help”, pois a música dos Beatles sempre valerá a pena, e o filme
em si é para ser encarado nos dias atuais como algo divertido, sem a
necessidade do espectador preocupar-se em buscar sinais metafóricos, na obra, pois
não há o menor sinal de profundidade, mesmo que tenha-se abusado da inserção de
colocações bizarras dentro desse roteiro.
Esta resenha foi escrita para fazer parte do livro: "Luz; Câmera & Rock'n' Roll, através do seu volume III e está disponível para a leitura a partir da página 198.
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